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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

21
Jul21

Golpistas entrelaçados e a PEC da Democracia (e música)

Talis Andrade

voto impresso.jpg

 

 

por Carol Proner

- - -

Inconfundíveis são as mãos de Michel Temer quando começam a tirar a luva imaginária ou a desnudar-se do nada fazendo lembrar o personagem infantil “meu malvado favorito” antes de cometer a próxima maldade. 

Assim descreveu a jornalista Denise Assis ao comentar gestual do ex-presidente ainda em 2017, quando a rapina nacional só estava começando.

E precisamente podemos imaginá-las se auto acariciando ou entrelaçando apertadamente o segredo de uma nova estratégia golpista, o semipresidencialismo, sob aplausos entusiasmados de setores da elite que topam tudo, menos Lula-lá.

O Ministro do STF Ricardo Lewandowski foi certeiro ao apontar a recente estratégia e alertar para os riscos de um passado que muitos prefeririam esquecer, os perigos desta “ligeira variante do parlamentarismo que volta a circular às vésperas das eleições de 2022”.

Em outro flanco, ataca o fator militar propriamente dito. Da ambiguidade da cúpula que tem críticas a Bolsonaro às explícitas notas de apoio das Forças Armadas ao governo genocida, têm sido recorrentes as ameaças de setores militares ao processo eleitoral de 2022, militares que topam tudo, menos Lula-lá. 

Entrelaçados e unidos contra a democracia, os interesses golpistas fazem nós de marinheiro. Um em particular, o “nó de defensa” que serve para proteger o costado de seus interesses variados e evitar o perigo da esquerda no poder.

Mas há resistência. Nas ruas e nas instituições, há os que não aceitam fazer parte da continuidade farsesca de golpes continuados. 

Há os oportunistas, claro, os resistentes de ocasião, criativos na formulação de teses como essa do semipresidencialismo. Há os editorialistas da terceira via fracassada buscando um tal ponto médio e sugerindo a ordem do pódio presidencial. E há também os que perceberam, ainda que tardiamente, que não se negocia a democracia sem o risco do autoritarismo contaminar o ar que respiramos. 

Mas o prêmio vai para os que resistiram desde o início, os que perseveraram e agora colhem os frutos nas intenções de votos. Em 2022 a democracia estará de volta e só um golpe peripatético e grosseiro poderá evitar que o país volte para os trilhos. 

Eis a importância da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 21/2021) de iniciativa da deputada do Perpétua Almeida (PCdoB) e que visa regular a ocupação de cargos políticos por militares. 

A iniciativa visa conter os murros impressos em notas de alarde, recuperando as ideias da Doutrina Góis Monteiro, do fim da República Velha, que limita o envolvimento da caserna na política partidária. A doutrina celebra a altivez das Forças, o papel fundamental para a defesa e o desenvolvimento do país, ao mesmo tempo que exige distanciamento da política partidária e da identificação ideológica de qualquer governo.

Essa é, aliás, a vontade do Constituinte de 1988 que estabeleceu o papel das Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, como instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina e destinada à defesa da Pátria e à garantia dos poderes constitucionais. 

Se, por um lado, não existe Estado forte sem Forças Armadas confiáveis e conscientes de seu papel, o que temos visto nos últimos tempos é o irrefreável derretimento da imagem da corporação militar cada vez mais identificada com um partido militar, caracterizado por escândalo de corrupção entre integrantes de diferentes graus de hierarquia firmando novos pactos de silêncio e esquecimento.

Fato é que o entrelaçamento de mãos e punhos golpistas associa também as debilidades de cada setor, acumulando todo tipo de crise. É bem possível que a vocação da PEC 21/2021, que tem sido chamada de PEC da Democracia, formalizada com 189 assinaturas de deputadas e deputados de todos os partidos, seja a de devolver às Forças Armadas brasileiras algum grau de valorização e de respeito nacional enquanto devolve à sociedade a serenidade dias e noites sem assombração.

 

 

17
Jul21

Artistas lançam clipe em ato por impeachment de Bolsonaro (vídeo)

Talis Andrade

 

Para marcar a manifestação na entrega de 30 mil assinaturas pedindo o impeachment de Jair Bolsonaro, artistas lançaram o clipe “Desgoverno"

 

 

Nesta quinta-feira (15), conhecidos nomes da classe artística brasileira participaram de uma transmissão ao vivo, com parlamentares da oposição, que marcou a entrega de um manifesto de artistas pelo impeachment de Jair Bolsonaro, que reúne mais de 30 mil assinaturas de artistas de vários segmentos, representantes de movimentos ligados à cultura e setores da sociedade civil.

Para marcar a manifestação, aconteceu o lançamento oficial do clipe “Desgoverno".

Confira a lista de artistas que participaram do clipe: Aílton Graça, André Abujamra, Andrea Horta, Bárbara Paz, Camila Pitanga, Chico Salem, Dani Nega, Denise Fraga, Dira Paes, Danilo Grangheia, Ellen Oléria, Elisa Lucinda, Fabiana Cozza, Julia Lemmertz, Letícia Sabatella, Luís Miranda, Gero Camilo, Malu Galli, Marco Ricca, Matheus Nachtergaele, Sandra Nanayna, Zahy Guajajara, Zeca Baleiro e Zélia Duncan

Blog do Noblat
Artistas lançam clipe em ato por impeachment de Bolsonaro
CONGRESSO EM FOCO - Desgoverno
Desgoverno - Zeca Baleiro e Joãozinho Gomes ARTISTAS CONTRA BOLSONARO. Confira o clipe "Desgoverno", composição de Zeca Baleiro e Joãozinho Gomes

 

23
Mai21

A CPI da Poesia: os poetas mortos

Talis Andrade

 

por José Ribamar Bessa Freirea /Taqui Pra Ti

“Só a poesia possui as coisas vivas. O resto é necropsia”
 (Mário Quintana)

Quem está tentando matar a poesia no Brasil? Para identificar os autores de tais ações foi criada na Câmara de Deputados a CPI da Poesia, que tem o poder de convocar até os mortos. No entanto, como seu foco abrange narrativas literárias e outras formas de expressão artística, indo além do ato poético em si, talvez devesse se chamar a CPI da Poética. De qualquer forma, sua presidente, a deputada federal Joênia Wapixana (Rede/RR), intimou várias testemunhas, advertindo que os mentirosos podiam sair dali presos.

O primeiro depoente vivo foi o cartunista e poeta Ziraldo, 88 anos, criador na época da ditadura militar de uma cor denominada Flicts, que servia de vacina contra a tristeza e a depressão e era o encanto das crianças. Ele fez um histórico da quadrilha poeticida cujo comandante, nascido em 1955 em Glicério (SP), odiava versos, uivava e latia cada vez que via um poeta vivo. O seu lema era “Ódio a Ode”. Perseguia ferozmente o Flicts, ameaçando-o com uma “arminha”, quando então exibia cor e esgar estranhos. Por isso, foi apelidado de Grrrr-au-au.    

Convocado do céu, onde reside há quase dois anos, o cantor João Gilberto, inventor da bossa nova e celebrado no mundo inteiro, confirmou à CPI que Grrrr-au-au abominava aquilo que ignorava. O comandante da quadrilha nunca havia ouvido uma música sua, não decretou luto oficial por sua morte, limitando-se a comentar: “Parece que era uma pessoa conhecida”. Citou Caetano Veloso que na ocasião se manifestou chocado com o tom de desprezo e a ignorância de Grrrr-au-au. No final, o depoente indagou à presidente se podia cantar “Chega de Saudade”.

–  Não. Quem tem que cantar aqui é o MC Reaça – interrompeu aos berros o Pit Bull Rachadinha, que nem era membro da CPI, mas sugeriu que fosse convocado do inferno, onde reside, o autor do Proibidão do Grrrr-au-au para quem “as feministas merecem ração na tigela e minas de esquerda tem mais pelo que cadela”. Instaurou-se uma balbúrdia e a sessão foi suspensa. 

O idiota e os bocós

Os trabalhos foram retomados com o depoimento de um vizinho de João Gilberto no céu. Era o poeta e cronista Aldir Blanc, vascaíno doente, coautor de A Cruz do Bacalhau, morto em decorrência do Covid-19, sem que houvesse qualquer manifestação da então fugaz secretária de cultura Regina Duarte, emudecida também diante das mortes do escritor Rubem Fonseca, do cantor Moraes Moreira, do ator Flavio Migliaccio e do teatrólogo Jesus Chediak.

Aldir, autor de Mestre Sala dos Mares e O Bêbado e a Equilibrista, chutou o pau-da-barraca ao traçar o perfil do chefe da quadrilha com aquele estilo que desenvolveu em sua coluna nos semanários O Pasquim Bundas:

– Grrrr-au-au nunca leu um único soneto em sua vida e queixou-se dos livros “que têm excesso de palavras”. Taxou as publicações com impostos altos, mas eliminou a tributação para a compra de armas. Quando se apropriou da cor verde-amarela foi para enganar os incautos e trouxas e, dessa forma, disfarçar a sua baba gosmenta, o seu olhar alucinado de cachorro doido, como no poema de Zeca Baleiro. Declarou guerra à literatura, alegando que o Brasil tem que deixar de ser um país de maricas. Destilou preconceitos homofóbicos ao afirmar que quem gosta de poesia é gayzinho. Chamou de idiotas as pessoas que em razão da pandemia até hoje ficam em casa escutando música e lendo poemas.

Em seguida, a CPI quis ouvir o poeta Manoel de Barros, vindo do Pantanal do Olimpo, a toca de Zeus. O relator Mário Juruna indagou se a poesia merecia ser exterminada como pregava o Imbrochável Grrrr-au-au e se era mesmo diversão de “idiotas”.

– Bocó é um que gosta de conversar bobagens profundas com as águas.  Bocó é aquele homem que fala com as árvores e com as águas como se namorasse com elas – respondeu o poeta. 

– Mas afinal, o que é poesia? – perguntou o relator.

– Todas as coisas cujos valores podem ser disputados no cuspe à distância servem para poesia. Quando as aves falam com as pedras e as rãs com as águas, é de poesia que estão falando. Há muitas maneiras sérias de não dizer nada, mas só a poesia é verdadeira. A linguagem da poesia força a realidade a se manifestar, escava suas profundezas e traz à tona as situações fundamentais da condição humana, como queria Alfred Doblin. Por isso ela é odiada pelo Grrrr-au-au.

O outro capitão 

O último a depor nesta primeira etapa da CPI foi o ator estadunidense Robin Williams, que reside hoje no andar de cima, mas viveu na tela o papel do professor de literatura no filme “Sociedade dos Poetas Mortos”. Ele declarou que rompeu com o autoritarismo do colégio tradicional, uma espécie de “escola sem partido”, combatendo seu caráter castrador e repressivo. Seu depoimento forneceu elementos para a CPI dimensionar a poesia:

– Nós não lemos e escrevemos poesia porque é algo bonitinho, mas porque somos membros da raça humana, existe um poeta dentro de cada um de nós – ele disse.

Confessou ainda que orientou seus alunos a escreverem poemas, lidos em um clube secreto que funcionava numa caverna perto da escola. Lá, escondidos da repressão, promoviam saraus de poesia. O diretor, que estudou na mesma cartilha de Donald Trump, demitiu o professor e mandou-o recolher seus pertences na sala de aula. Ali, ele recebe uma homenagem dos estudantes, que sobem nas carteiras da sala seguindo a lição de rebeldia contra a autoridade burra, saudando-o e reconhecendo sua liderança: “Captain, my captain”. Esse era o “outro capitão”, o capitão inteligente.

– É simples assim – disse o professor aos membros da CPI. Um manda e os outros desobedecem. Ordens que atentam contra a espécie humana não devem ser cumpridas.

A CPI da Poesia vai ouvir ainda inúmeros poetas e músicos: Drummond, Manuel Bandeira, João Cabral, Castro Alves, Luiz Gonzaga, Pixinguinha, Clementina de Jesus, Patativa do Assaré, Cecília Meirelles, Adélia Prado. Cora Coralina, os poemas eróticos de Hilda Hilst e tantos outros.  Drummond vai dizer por que perguntou em A Flor e a Náusea: “Crimes da terra, como perdoá-los?” e explicar se existe ódio sadio expresso nos versos: “Meu ódio é o melhor de mim, com ele me salvo e dou a poucos uma esperança mínima”. Qual a diferença deste para o ódio do Grrrr-au-au?

Serão convocados poetas amazonenses, entre eles Thiago de Mello para saber se continua cantando no escuro, além de Luiz Bacellar, Elson Farias, Aldizio Filgueiras, Dori Carvalho, Luiz Pucu, que devem se pronunciar sobre as ameaças à Zona Franca feita por Grrrr-au-au com o objetivo de impedir que a CPI da Poesia identifique os autores do poeticidio.

Por último, a CPI ouvirá poetas indígenas, entre eles Eliane Potiguara, Graça Graúna, Zélia Puri, Ailton Krenak, Davi Kopenawa, Dauá Puri, Ademário Payayá, Cristino Wapixana, Tapixi Guajajara e Daniel Munduruku que acaba de se apresentar para uma vaga na Academia Brasileira de Letras (ABL). Eles dirão se o poema abaixo de Miguel Panemaxeron Surui está mesmo anunciando o fim dos latidos de Grrrr-au-au e do pesadelo vivido pelo Brasil.

Passam os anos, passa a vida
Passa o tempo, passam as coisas,
Passam perto de mim as pessoas,
Passa dentro de mim o amor.
Por que isso comigo se passa,
Se já nem sei mais quem sou?

P.S. 1 – O ódio de Grrrr-au-au aumentaria se soubesse que no sábado (22) foram lançados dois novos livros. De manhã Pequenas conquistas perdidas com 45 crônicas do poeta Dori Carvalho. E logo onde? Nada menos que no Amazonas, que ele sonha deixar sem uma árvore em pé. E à tardinha, no Rio, o romance Morte Certa de Dau Bastos, professor de literatura na UFRJ.

P.S. 2 – Este texto se inspirou numa conversa telefônica com meu amigo Guillermo David, diretor nacional de Coordenação Cultural da Biblioteca Nacional da Argentina. Ele está relendo Guimarães Rosa e eu revisitando Julio Cortazar. “Os que amam a literatura estão salvos porque têm onde se refugiar nesses tempos sombrios” – ele disse. Daí a ideia de que a poesia é uma vacina de esperança. 

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