Na quarta-feira, 05 do mês corrente, o Brasil amanheceu sob o impacto de mais uma tragédia devastadora: homem, estranho à creche, mata quatro crianças na cidade de Blumenau, em Santa Catarina. Petrificado, fui, aos poucos, despertando do que julgava um pesadelo até tomar conhecimento completo dos fatos.
A fuga do real, um frágil escudo da minha fraqueza interior, me fez mergulhar no silêncio absoluto e pensar sobre a perversidade sem limite. Mudo e triste, ia levando os dias na esperança da cura pelo remédio do tempo.
Recebi conselhos ajuizados: amigo, todo dia as tragédias se repetem; enfrente ou adoeça gravemente; reflita e tente compreender para se colocar ao lado dos que, solidários, não desfalecem diante das patologias individuais e sociais; contraponha a fé que ilumina e a força que transforma, abraçando o engajamento nas causas que se antepõem a todo tipo de violência.
Nada, porém, que aliviasse uma profunda inquietação: o que leva um ser humano a cometer crime tão hediondo? Cético em relação às certezas definitivas, restou-me assumir a consciência do mundo real em que habitam, dentro de cada um de nós, anjos e demônios em permanente conflito.
O primeiro impacto para retomada da consciência veio com a manchete do Estadão “Barbárie vai à escola”. Uma triste coincidência: a escola é (ou deveria ser) o berçário da civilização; espaço de acolhimento, cuidados em que são plantadas sementes civilizatórias de modo a separar o humano do não-humano. Ali, prevaleceram, no gesto destruidor, extrema crueldade e a negação dos afetos naturais que levam até os animais a protegerem seus semelhantes.
A história está repleta de exemplos em que civilizações, para além da guerra cometeram, com requintes inacreditáveis, crimes de genocídio.
Não faltaram notáveis pensadores que identificaram na violência traços sádicos culturalmente reprimidos e, na raiz, as pulsões de vida e de morte.
Neste sentido, as autoras do livro O mal que nos habita (Gwen Adsead, psiquiatra forense do Reino Unido e a escritora e dramaturga Eileen Horn – Companhia das Letras, SP, 2022), cujo título tomei emprestado para o artigo, após vasta experiência de psiquiatra e psicoterapeuta com criminosos violentos, escreveram: “Um fio condutor importante foi meu estudo de afeições na infância em relacionamentos e sua associação com a violência posterior”.
É o ponto de partida das monstruosidades que se alimentam de fatores culturais. socioeconômicos, relacionais e as mensagens políticas que, ostensiva ou sutilmente, fomentam impulsos de medo, ódio e vingança. A propósito, a famosa frase do então primeiro-ministro do Reino Unido, John Major, “A sociedade precisa condenar um pouco mais e compreender um pouco menos”, resultou em graves consequências, acirrando o apetite público por punição.
A violência é uma doença contagiosa e fatal para os sentimentos de solidariedade e esperança. E mais: nos retira a sensibilidade de olhar para as pessoas, sabendo que nós somos mais parecidos do que diferentes. No entanto, o mal que nos habita acende a capacidade de luta pela paz interior e a mobilização inspiradora para continuar abrindo portas e criando espaços que ofereçam um bem que transforma e não nos pode ser tirado: a educação.
A creche Cantinho Bom Pastor vive e viverá, cuidando um dos outros, educando a todos e oferecendo ao próximo o amor universal da comunhão.
Ótima reportagem de Lira Neto, publicada hoje noDiário do Nordeste,(leia aqui)documenta a história que é indispensável para entender a tragédia que se passa na reserva ianomami, onde pessoas estão morrendo como moscas por conta da devastação e do envenenamento dos rios provocados pelo garimpo ilegal estimulado durante o governo Jair Bolsonaro.
É a trajetória do Projeto de Decreto Legislativo apresentado pelo então deputado de primeiro mandato, em 1993, pretendendo anular a demarcação das terras indígenas para aquela etnia, assinado um ano antes, por Fernando Collor, sob o argumento que não se poderia destinar áreas de fronteira para reservas e, entre outras razões, que a área era “riquíssima em madeiras nobres e minerais raros”.
O projeto chegou a ir a plenário, para votação em urgência, recusada pela maioria da Câmara.
Bolsonaro jamais desistiu de tirar a terra dos índios e, em 2003, conseguiu desarquivar seu projeto, para ser novamente rejeitado quatro anos depois.
Sempre foi sua ideia fixa, uma espécie deMein Kampf,ao ponto de ser objeto de 44 pronunciamentos em seus mandatos. Em 2015, ele bradava:
“A reserva ianomâmi, lá em Roraima, e um pedacinho no Amazonas, tem duas vezes o tamanho do Rio de Janeiro, para 9 mil índios! Isso é um crime! O Brasil tem que ser nosso!
É possível acreditar que o desastre humanitário que está sendo revelado agora é resultado apenas de desídia ou incompetência deste homem?
Os antecedentes mostram que a destruição daqueles índigenas – aliás na mesma região onde ele disse ter se interessado em “ver o índio sendo cozinhado” – sempre foi uma obsessão de Bolsonaro.
É uma questão de honra para o nosso país levar esta monstruosidade aos tribunais. E não é possível fugir, desta vez, da palavra infamante: genocídio.
São Sebastião-SP, 20/02/23. Reprodução da internet
Por Altamiro Borges
No início da noite desta segunda-feira (20), o site G1 fazia um balanço parcial da tragédia das chuvas no litoral de São Paulo: “37 pessoas morreram e quase 2,5 mil tiveram que sair de casa... Estradas foram interditadas e seis cidades estão em estado de calamidade. Buscas ainda são realizadas para localizar 40 desaparecidos em São Sebastião”. A tendência é que o número de mortos e desabrigados cresça nas próximas horas.
De notícia positiva, em mais este triste episódio, o site informava que “o presidente Lula interrompeu sua folga na Bahia e sobrevoou as áreas afetadas. Ao visitar São Sebastião, anunciou ajuda”. E também anunciou que “a Caixa Econômica Federal vai liberar saque calamidade do FGTS em municípios do litoral de SP atingidos pelas chuvas. O valor para retirada é de até R$ 6.220,00”. O restante do noticiário é só desgraceira.
Corte de 99% da verba para desastres naturais
Chama a atenção na cobertura da mídia, porém, a ausência do nome do genocida Jair Bolsonaro. Em mais essa tragédia – que não tem nada de exclusivamente natural e divina –, o “capetão” tem a sua digital criminosa. Em 2 de dezembro do ano passado, o site Mídia Ninja postou matéria com o título: “Bolsonaro corta 99% da verba destinada a enfrentamento de desastres naturais”. O texto tratava dos estragos das chuvas principalmente em Santa Catarina e no Paraná – estados bolsonaristas que sequer receberam a visita do então presidente.
Conforme registrava, “os recursos de obras emergenciais de mitigação para redução de desastres sofreram uma redução do governo de Jair Bolsonaro (PL) de R$ 2,8 milhões para R$ 25 mil, no orçamento de 2023. Se forem mantidas as quantias que estão na proposta de Orçamento apresentada pelo governo ao Congresso, o corte será de até 99% nos recursos voltados para obras emergenciais, redução e mitigação de desastres naturais. O enxugamento do orçamento do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) também atinge verbas para a ‘execução de projetos e obras de contenção de encostas em áreas urbanas’. Neste setor, houve um corte de 94% do recurso, saindo de R$ 53,9 milhões, neste ano, para R$ 2,7 milhões para 2023”.
Prova da ausência total de empatia do fascista e do seu ministro da Economia com a sofrida população, o site lembra que “o corte nestas áreas por Bolsonaro e pelo ministro Paulo Guedes foi proposto ainda em setembro de 2022, meses depois do desastre em Petrópolis, na região Serrana do Rio de Janeiro, onde morreram mais de 230 pessoas por causa das chuvas”.
Mais de 8 milhões de brasileiros vivem em áreas de risco
“Uma pesquisa do Observatório dos Desastres Naturais mostrou que, nos últimos 10 anos, os óbitos causados por excesso de chuvas e suas consequências no Brasil somaram 1.756. Até setembro, as vidas perdidas por inundações neste ano já chegam a 457, o que representa mais de 25% do total de mortes na década... Em 2018, a partir do cruzamento de dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e do último censo feito, em 2010, pelo IBGE, identificou-se que mais de oito milhões de pessoas vivem em áreas de risco no Brasil”.
O governo Lula – em conjunto com os governos estaduais e prefeituras realmente comprometidos com o povo – terá muito trabalho nos próximos quatro anos para reverter esse quadro de abandono e desprezo à vida.
Que porrada! Poucas vezes na vida me senti tão arrasado ao terminar de ver um filme e, ao mesmo tempo, encantado com a excelência que atingiu o cinema brasileiro, após anos de destruição sistemática da nossa cultura.
No dilacerante filme-documentário "Quebrando Mitos" sobre a "masculinidade catastrófica" do governo de Jair Bolsonaro, de Fernando Grostein Andrade e Fernando Siqueira, lançado esta semana no país, o Brasil é um corpo estendido no chão, recolhido pelos dois jovens cineastas para fazer a mais completa autopsia da grande tragédia brasileira.
Partindo dos seus dramas pessoais, Andrade e Siqueira, homossexuais assumidos num país homofóbico, machista, misógino e violento, que glorifica a ignorância e a estupidez humana, tiveram que sair do Brasil para um autoexílio em Los Angeles, quando Bolsonaro assumiu o poder, para poder montar em paz e segurança o filme das suas vidas, ameaçadas pela intolerância galopante.
Como foi possível chegarmos a esse ponto de degradação humana, tão bem retratado no filme, com o país de cócoras, devastado por um exército de ocupação?
Bolsonaro seria incapaz de fazer isso sozinho. Foi preciso um trabalho coletivo, envolvendo muita gente de poder político, religioso e militar, amplos setores da elite nacional, e eu diria que até com a ajuda de forças de fora, para abalar os alicerces institucionais desta grande nação.
Essa gente agora não vai querer largar o osso. É tudo muito assustador. Vai levar décadas para apagarmos essa chaga da nossa história.
"Está tudo ali, a ponto de doer", escreve o amigo Fabio Altman, em sua brilhante resenha na revista Veja, sobre o "tempo da insensatez", onde recolhi esta síntese do que acabei de ver:
"A apologia do machismo. o ataque às políticas de proteção ao meio ambiente; a promoção das milícias; o descaso irresponsável com a pandemia; a transformação da fé dos evangélicos em massa de manobra e o culto às mentiras como atalho de ascensão nos corredores de Brasília, até a eleição de um deputado apagado como presidente da República".
O primeiro capítulo dessa tragédia, contado com grande destaque no filme, aconteceu na verdade antes da posse do inominável: o assassinato da vereadora Marielle Franco, até hoje não esclarecido, que revela as origens milicianas do grupo levado ao poder em Brasília nas ondas da Operação Lava Jato, numa joint venture com a polícia e a justiça americanas.
Está lá o cenário macabro das covas rasas abertas nos cemitérios da Amazônia, durante a pandemia, tendo ao fundo a floresta que arde em chamas com a cumplicidade do governo que liberou as boiadas, o garimpo ilegal e a pesca predatória, sem esquecer de falar no assassinato de Dom e Bruno, os esquartejados símbolos da resistência.
Estão lá as marchas dos fanáticos gritando "Mito!", as poças de sangue dos pobres lavadas nas favelas, os desafios à Justiça, a grosseria das declarações cafajestes do presidente, como se estivéssemos assistindo a um thriller de terror, mas é tudo real.
"Tem história que um dia dormirá nos livros e enciclopédias, mas tem também a sensibilidade de tocar no que sempre soou tabu, mas que não pode mais: a repressão, por vezes silenciosa, imposta ao grupo LGBT", assinala Fabio Altman. Na narração em primeira pessoa, Gostein conta ter sido estuprado duas vezes e forçado a perder a virgindade com uma coelhinha da Playboy aos 17 anos (seu pai, Mario de Andrade, foi editor da versão brasileira da revista).
Em meio a esse circo de horrores, tem espaço também para as belas cenas da história de amor de Grostein e Siqueira, em contraste com os gritos de "imbrochável" pronunciados por Bolsonaro e repetidos por seus devotos em Brasília, na pajelança cívico militar do último dia 7, em que até tratores e grupos religiosos desfilaram pela Esplanada dos Ministérios num espetáculo grotesco, que prosseguiu no Rio de Janeiro com exibições da Marinha e da Aeronáutica, motociatas e corridas de jet-sky, com a apoteoso sobre um trio elétrico de Silas Malafaia.
Nenhuma ficção de Glauber Rocha seria capaz de superar a realidade desta grande tragédia brasileira autopsiada pelos dois Fernandos nesse documentário que todos deveriam ver _ se possível, antes da eleição de 2 de outubro.
Mas, preparem-se: é uma porrada na boca do estômago.
Até o momento, há o registro de 33 desaparecidos comunicados à Delegacia de Descoberta de Paradeiros. Ruas de Petrópolis continuam sendo desobstruídas pela prefeitura
A tragédia provocada pelo temporal em Petrópolis, no estado do Rio, no último dia 15, provocou até o momento a morte de 229 pessoas.
Segundo a Secretaria de Estado da Polícia Civil do Rio (Sepol), entre os mortos 203 corpos foram identificados e liberados. Outros sete não identificados receberam liberação mediante coleta de material genético e ordem judicial.
Ainda conforme a Sepol, o PRPTC recebeu 16 fragmentos de corpos, sendo que nove já foram liberados. Até o momento, há registro de 33 desaparecidos comunicados à Delegacia de Descoberta de Paradeiros (DDPA).
Forças russas atacaram cidades ucranianas, incluindo a capital Kiev, com artilharia e mísseis de cruzeiro neste sábado (26) pelo terceiro dia consecutivo, e a agência de notícias russa Interfax disse que tropas de Putin capturaram a cidade de Melitopol, no sudeste do país.
Autoridades ucranianas não estavam imediatamente disponíveis para comentar sobre o destino de Melitopol e o ministro das Forças Armadas da Grã-Bretanha, James Heappey, questionou o relatório, dizendo que a cidade de cerca de 150.000 pessoas ainda estava em mãos ucranianas.
"Todos os objetivos do primeiro dia da Rússia... e até mesmo Melitopol, que os russos alegam ter tomado, mas não podemos ver nada que comprove isso, ainda estão nas mãos dos ucranianos", disse ele à rádio BBC.
Pelo menos 198 ucranianos, incluindo três crianças, foram mortos e 1.115 pessoas ficaram feridas até agora na invasão da Rússia, segundo a Interfax citou o Ministério da Saúde da Ucrânia. Não ficou claro se os números incluíam apenas vítimas civis.
O prefeito de Kiev, Vitali Klitschko, disse que 35 pessoas, incluindo duas crianças, ficaram feridas durante os combates noturnos na cidade.
Klitschko disse que atualmente não há grande presença militar russa em Kiev, embora tenha acrescentado que grupos sabotadores estão ativos. O sistema de metrô agora está funcionando apenas como abrigo para os moradores da cidade e os trens pararam de funcionar, disse ele.
Cães farejadores
Enquanto isso, no alto do Morro da Oficina, o trabalho dos bombeiros e socorristas continuava na busca de desaparecidos. Com a ajuda de cães farejadores e informações de parentes, eles formavam grupos, atuando em determinadas áreas onde era provável a localização dos corpos.
As equipes são guiadas pelo faro dos cães da corporação, alguns vindos de outros estados. É o caso dos bombeiros catarinenses Thiago Amorim, com a cadela Moana, de Itajaí, e Guilherme Galli, com o cão Sasuke, de Lages, ambos animais da raça Labrador.
“A gente emprega os cães com intervalos necessários para o descanso deles. Tudo é feito de acordo com a saúde física do animal. Eles não são colocados em nenhuma condição que não estejam aptos para atuar. Grande parte das vítimas que foram encontradas nesta tragédia foi por indicação dos cães. Estamos há oito dias atuando aqui. É uma situação que cansa não apenas a parte física, mas também a parte mental, do humano e do cão”, contou Amorim.
Em 25 de janeiro, no primeiro mês do governo Bolsonaro, o rompimento da barragem da MinaCórrego do Feijão, operada pela Vale, resultou na morte de pelo menos 270 pessoas. Trata-se da maiorcatástrofe ambiental provocada pela ação humana em solo brasileiro. "A pior do mundo em 3 décadas" informou em manchete a BBC de Londres.
Fevereiro, 08: Dez pessoas morreram e quatro ficaram feridas em um incêndio de grandes proporções noCentro de Treinamento Ninho do Urubu, do Flamengo, em Vargem Grande, no Rio de Janeiro. As chamas começaram por volta das 5h. A maioria dos mortos era de adolescentes jogadores da base do time carioca, entre 14 e 17 anos. O alojamento, onde ficavam atletas da base cujas famílias moravam longe ou fora do Rio de Janeiro, foi totalmente destruído pelas chamas.
Março, 13: Em Suzano, a 50 km de São Paulo,dois atiradoresentraram em uma escola e dispararam contra alunos e funcionários. Cinco estudantes, uma diretora e uma coordenadora da escola foram assassinados pelos ex-alunos Guilherme Taucci Monteiro, 17 anos, e Luiz Henrique de Castro, 25.
Obedecendo a um pacto de morte, ambos se suicidaram assim que a PM chegou à instituição de ensino. Antes, Guilherme já havia matado o tio, Jorge Antônio de Moraes, 51 anos, alvejado no escritório da loja de veículos dele.
Setembro, 12: Umincêndio atingiu o Hospital Badim, na rua São Francisco Xavier, no Maracanã (zona norte doRio de Janeiro). Os bombeiros confirmaram que 12 pessoas morreram. Ao todo, 103 pacientes estavam internados na unidade no momento do incêndio.
Segundo o que funcionários relataram à polícia e publicações nas redes sociais, o incêndio teria começado por volta das 18h15 em um prédio antigo onde funcionava o setor de laboratórios do hospital.
Dezembro, 1º: Uma perseguição policial com troca de tiros durante umbaile funk em Paraisópolis, zona sul de São Paulo, deixou nove pessoas mortas após serem pisoteadas. Outras sete ficaram feridas. Segundo a polícia, os militares realizavam a Operação Pancadão na região, quando dois homens em uma motocicleta atiraram contra os PMS. Após os disparos, a moto fugiu para o baile funk.
Com isso, os agentes começaram a perseguir os suspeitos, que entraram na festa que reunia cerca de cinco mil pessoas. Os jovens foram pisoteados e a maioria morreu por asfixia e trauma na medula. Um vídeo gravado de uma casa da região mostra a movimentação da polícia e também a correria das pessoas que estavam na noitada. Veja:
Importantes livros historiam a desumanidade capitalista, a crueldade assassina do neocolonialismo, a ambição das minineradoras estrangeiras, o entreguismo dos governos de Minas Gerais e do Brasil
Para passar a boiada do ministro Ricardo Salles, o governo Bolsonaro iniciou a destruição da maior floresta tropical do mundo, com o fogo e a serra elétrica o desflorestamento da Amazônia, a contaminação dos rios com o mercúrio da mineração invasora e ilegal, a violência relacionada à regularização fundiária, demarcação de terras e reforma agrária na Amazônia Legal e no Cerrado. O holocausto, o genocídio dos povos indígenas. (Continua)
Tenho desde sempre uma forte ligação com Petrópolis. A família de minha avó paterna, Laura de Oliveira Xavier, é de lá. Trago da primeira infância algumas faíscas de memória, todas felizes.
Há exatos vinte anos e meio tenho uma casa no distrito de Araras, um tanto distante do centro, onde passo metade da semana e me sinto especialmente abrigado.
Faço esse relato para explicar que a tragédia vivida pela bela cidade me dói de maneira especial. E, ao mesmo tempo, reforça a minha mais profunda indignação.
Até o momento em que escrevo são 117 mortos e ao menos 116 desaparecidos. É a pior tragédia da história da cidade de Petrópolis. Sim, sim, há pouco mais de dez anos houve tragédia ainda maior, com mais de 900 mortos, mas em todo o município, que é extenso. Na cidade propriamente dita foram 74.
As imagens que circulam intensamente desde o mesmo entardecer da terça-feira são chocantes e dolorosas. Agora mesmo acabo de ver a filmagem de várias pessoas tentando desesperadamente sair de dois ônibus mergulhados na correnteza de lama e sendo levadas pelas águas. Terão sobrevivido?
Na quarta-feira vi o desespero de uma jovem mãe tentando, com uma enxada, resgatar a filha que estava soterrada. Não conseguiu. O corpo morto da menina foi encontrado no dia seguinte.
Por todos os lados circulam pedidos de doações. Petrópolis precisa de comida, de água, de roupas e colchões para quem perdeu tudo.
Pois precisa disso e de muito mais. O que estamos vendo não é, ao contrário do que dizem os incautos ou os ignorantes ou os cúmplices, um desastre causado pela fúria da natureza.
Não, não: como bem disse há décadas o escritor uruguaio Eduardo Galeano, a natureza não se enfurece. Ela apenas reage ao que fazem com ela.
O que estamos vendo em Petrópolis é o resultado do que se vê Brasil afora: a ocupação desenfreada de áreas de risco, de zonas abandonadas, e na imensíssima maioria dos casos essa ocupação é feita pelos pobres ou miseráveis.
É o resultado das brutais desigualdades sociais que encobrem este país de vergonha e miséria.
E também o resultado da incompetência pública dos governantes. Sim, sim: de prefeitos, governadores, legisladores e dos presidentes. Da falta radical de políticas de preservação, de urbanização e principalmente de moradias populares.
Se algo se avançou nessa direção durante um tempo, hoje o que temos é puro retrocesso.
Em 2017 um estudo da Defesa Civil alertou que na cidade de Petrópolis havia quinze mil imóveis em áreas de risco de destruição – leia-se: alto risco. E nada foi feito.
Ou melhor, uma coisa o governador bolsonarista Claudio Castro fez: no ano passado, cortou para pouco menos da metade o dinheiro previsto em orçamento para programas de prevenção de riscos e resposta a desastres ambientais no estado do Rio de Janeiro. O resto teve outro destino.
Não é preciso ser urbanista ou especialista para entender o que eles todos dizem: a falta de uma política habitacional destinada às camadas mais pobres da população é a verdadeira causa das invasões desenfreadas de zonas de risco, tanto terras públicas como abandonadas pelos donos.
E enquanto nada for feito, novas tragédias vão acontecer.
Não, não, a culpa não é da natureza. A culpa é da injustiça social escandalosa de nosso país e da irresponsabilidade de nossos governantes.
Sérgio Cabral, Pezão, Francisco Dornelles, Wilson Witzel e Claudio Castro. Em 11 anos, o Rio de Janeiro teve cinco governadores e nenhum deles conseguiu desenvolver e colocar em prática um plano de prevenção eficiente para evitar que as chuvas que frequentemente caem na Região Serrana se tornassem grandes tragédias nacionais.
O ano eleitoral está aí e a força da farsa que conhecemos em 2018 será renovada.
Rememoremos: no 18 Brumário de Luís Bonaparte, Marx apontou para uma relação fundamental entre estética e política ao afirmar que a história se repete como tragédia e como farsa.
A farsa é uma imitação da tragédia que intensifica seu efeito utilizando o grotesco como estilo. Lembremos que a farsa do Ubu Rei de Alfred Jarry, que em tudo lembra Bolsonaro em seu desejo de comer e matar, já era uma imitação debochada da tragédia de Macbeth de Shakespeare.
Tragédia e farsa são duas formas teatrais, mas são também parâmetros estéticos da política. Se a tragédia pauta o mundo pelo heroísmo, pelo belo, pelo sublime e pelos altos valores, a farsa pauta-o pelo contrário disso tudo. Nesse contexto, a oposição entre Lula e Bolsonaro é evidente e dispensa explicações.
Todo o governo de Bolsonaro se dá no clima da farsa, cada um dos seus ministros é um farsante que destrói aquilo que deveria construir e ele é o próprio bobo da corte que usurpou o lugar do Rei preso por mais de 500 dias com a ajuda de personagem secundário, o juiz ladrão, que, com a ajuda da mão nem tão invisível do Império, resolveu ele mesmo ocupar o papel principal.
Não é demais repetir que o governo bolsonarista é uma farsa que imita a tragédia da ditadura militar, em si mesma farsesca. Moro é continuação da farsa, na condição de ex-ministro de Bolsonaro, o “Bolsonaro que sabe usar talheres” ou pelo menos não finge comer no cocho com direito a set de filmagem em volta, como ficou exposto nas redes há poucos dias. A produção cinematográfica de Bolsonaro está ainda na frente da produção jornalística da rede Globo que sabe muito bem como construir personagens e tramas. Contudo, as novelas do jornalismo não são tão bem feitas como as novelas propriamente ditas e o segredo do roteiro no qual o corrupto que grita contra a corrupção é, ele mesmo, um corrupto, está claro demais para conquistar espectadores para um próximo capítulo.
Antes se seguir com a análise dessa narrativa que está sendo construída diante dos olhos costurados com as próprias tripas dos espectadores, é preciso ter em mente que, apesar da desvantagem essencial de uma imitação, o efeito de poder continua vivo nela. A cultura do escamoteamento e da camuflagem serve para os procedimentos estéticos, como implantes capilares e dentes falsos atualmente em moda, para bolsas e roupas de marca fabricadas na China, mas também para a política. Porém, nesse jogo pérfido, quem tentar parecer melhor do que é, tende a se dar mal (isso vale para todo o espectro político).
Além disso, lembremos que os personagens infames, ridículos ou grotescos produzem efeitos de poder justamente por meio da desqualificação de seus discursos. No discurso desqualificado Moro é bom, mas ele ainda precisará intensificar a sua performance se quiser assumir o lugar de Bolsonaro. Quando se escolhe um ator para um trabalho, ele é escolhido justamente por competências prévias, mas a recepção das massas parece estar sendo mal calculada nesse caso. Os fascistas sempre subestimam a população e precisam emburrecê-la para poder contar com ela. A enganação precisa ser bem feita, porque as massas são maleáveis e podem mudar de direção se perceberem que outros podem ter razão.
Assim, para ser um bom candidato, Moro precisa de um pouco mais de apelação carismática, algo que e ele naturalmente não tem e que Bolsonaro esbanja. Para este último era fácil, bastava capitalizar o mau gosto, que é um capital maior do que nunca na cultura depois da guerra contra a democracia. Moro resiste a fazer esse papel. Em que pese a tentativa de começar a tentar falar grosso, evitando a sonoridade vocal que lhe rendeu o apelido de Marreco de Maringá, ele não tem a virilidade necessária exigida no momento fascista em que o machismo histérico tem sido bem importante (falaremos sobre isso em um próximo artigo).
Todos os personagens da direita-extrema-direita que querem aceder ao poder têm buscado se inscrever no padrão estético do grotesco ou do ridículo desde 2016. Nesse sentido, para Moro, melhor seria assumir o “marreco” do que tentar disfarçar. Ele poderia conquistar o voto de indignação ou o voto por deboche que levou figuras como Tiririca ao poder. Janaína Paschoal, Kim Kataguiri, Alexandre Frota e tantos outros chegaram ao poder em 2018 apenas porque se inseriram nessa mesma lógica estética.
Nesse contexto, Bolsonaro foi um sucesso a partir do Golpe de 2016 ao produzir um tipo de farsa na segunda potência. Ao assumir a sinceridade da farsa ele conseguiu re-enganar a todos e, senão livrar-se da marca da mentira, pelo menos redimensiona-la a seu favor. Para o seu eleitorado a sua paradoxal “sinceridade” vale mais do que tudo. Ele pode praticar todo tipo de crime e ilicitude e ainda será defendido pelas pessoas identificadas com o ídolo. A mentira diária de Bolsonaro é parte da retórica do desnorteio que ele pratica tão bem e que funciona num looping renovando diariamente o estupor dos críticos, assim como o êxtase de seus adoradores.
Bolsonaro não finge quando é falso. Eis o sentido da farsa autêntica. Por isso, pode aparecer encenando como um porco sem perder o seu eleitorado. Assim, enquanto Moro permanecer tentando parecer o que não é, não haverá futuro para ele. É preciso que ele assuma a sua verdade como um bom cínico deve fazer se quiser tornar o cinismo uma tecnologia de poder efetivo. Moro precisa fazer mais circo agora que não tem mais seu Lula preso e nem o espetáculo da Lava-Jato para se capitalizar como um punitivista como gosta a sociedade conservadora. Todas as vezes em que ele fez isso, ele cresceu na opinião pública. Ao resistir de se entregar ao Moro ele acaba com o seu maior potencial. Não basta ser ridículo, é preciso entregar-se ao papel.
A farsa é a forma da política na era da razão publicitária, uma estrutura estética, narrativa, teatral, performática. Ela é o único modo pelo qual muitos fazem política e chegam ao poder. E como há um viés de ficção na farsa política, e não de simples mentira, fica muito difícil para a população perceber que se trata de um jogo, de uma cena. A mentira se explicita, a ficção se escamoteia e tudo se torna tecnologia política. Uma tecnologia política é um dispositivo composto de estratégias e táticas, discursos e práticas, entidades e instituições, todas unidas pelo mesmo princípio.
Se a farsa é uma tecnologia política, isso quer dizer que o jogo é a mentira, a enganação, a desinformação em geral, daí as fábricas de fake news, as empresas que se alimentam de ódio, um afeto que ajuda a instaurar o clima de guerra necessário ao processo de conservação do poder. O gabinete do ódio é o maior negócio da nação e não há previsão de sua derrocada, ao contrário. O que deu certo em 2018 continuará em ação de modo turbinado em 2022.
Por isso, nesse momento, todos devem se unir contra a grande farsa fascista, mas sem consciência disso e lançados em jogos de poder, muitas vezes infantis, não será fácil superar a extrema-direita e suas habilidades inescrupulosas que reforçam a cada dia a força da farsa.
247 -“Está nas livrarias ‘Recurso Final’ do repórter Paulo Markun. Conta a vida e a morte de Luiz Carlos Cancellier, o reitor da Universidade Federal de Santa Catarina que foi preso em setembro de 2017 pela Operação Ouvidos Moucos, da Polícia Federal”, relata o jornalista Elio Gaspari, em suacolunano jornal Folha de S.Paulo.
Gaspari relata que o reitor “nunca fora ouvido e tinha domicílio certo e sabido. Passou dois dias na cadeia, foi algemado e colocado numa espécie de jaula. Libertado, foi proibido de entrar na universidade. Semanas depois, matou-se, aos 58 anos, pulando do sétimo andar de um shopping. No bolso, deixou um bilhete: ‘A minha morte foi decretada quando fui banido da universidade."
”Quando Cancellier foi publicamente humilhado, a operação Lava Jato estava no seu esplendor. Passados quatro anos, "lava-jatismo" tornou-se um neologismo da língua portuguesa”, segue o jornalista.
“Sob o pretexto de fazer justiça, fazem justiçamento, ou justiça com as próprias mãos. Desconstroem um dos principais pilares da democracia, que é a garantia dos direitos individuais. Como a observância das fases do processo legal foi desrespeitada, prevaleceu uma equivocada visão particular e subjetiva de um grupo de agentes públicos”, diz Gaspari.
“Essa tragédia precisa ser permanentemente relembrada por oferecer uma valiosa e triste oportunidade de refletirmos sobre o desespero de um inocente que veio a pôr cobro à sua própria vida, depois de sofrer a desgraça de ter a sua honra aguda e injustamente destroçada, revelando o que pode acontecer a uma pessoa quando a democracia e seus freios deixam de existir para ela”, defende o jornalista.