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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

11
Out21

Os senadores da CPI da Covid envolvidos com médicos da escola de Mengele, o anjo nazista da morte

Talis Andrade

bolsonaro onu tratamento precoce.jpeg

 

 

A CPI da Covid tem que denunciar senadores envolvidos na necropolítica. Pela divulgação de medicamentos ineficazes.

Hospital da polícia militar do RS testou proxalutamida sem autorização da Anvisa em pacientes com Covid-19

Pacientes internados no Hospital da Brigada Militar de Porto Alegre receberam remédio fabricado na China e tratado por Bolsonaro como a “nova cloroquina”. Não havia liberação para testá-lo em seres humanos na capital gaúcha.

 

Participação na CPI da Covid

Os responsáveis pelo experimento, segundo o major médico Christiano Perin, foram o endocrinologista Flávio Cadegiani e o infectologista Ricardo Zimerman, que trabalha como especialista terceirizado no hospital desde 2017, e teria sido o coordenador principal dos testes rodados na capital gaúcha. 

Em maio, Zimerman depôs na CPI da Covid a convite do senador Luis Carlos Heinze (PP-RS), para defender o uso de medicamentos ineficazes contra o coronavírus, de antiparasitários a antimaláricos. Na ocasião, também defendeu o uso de antiandrogênicos, como a proxalutamida. Outro suposto estudo semelhante ao de Porto Alegre, mas realizado em Manaus na mesma época, com participação de Cadegiani e Zimerman, está sob investigação da Conep por indícios de irregularidades e infrações éticas. O órgão prepara uma denúncia ao Ministério Público Federal com base em uma apuração interna sobre as irregularidades cometidas no estado do Amazonas.

 

Topa tudo por dinheiro

Essa ideia de testar bloqueadores de testosterona para conter o coronavírus existe desde o início da pandemia e tem sido promovida pela Applied Biology, um centro de pesquisas norte-americano focado em inventar e patentear terapias contra a calvície. Um dos idealizadores da tese do potencial dos antiandrogênicos contra a Covid-19 foi o presidente da empresa, o dermatologista norte-americano Andy Goren, que se define como um especialista na “descoberta de novas terapias”.

Infográfico: Pedro Papini

 

Antes mesmo de publicar o primeiro artigo sobre a teoria ou testar sua eficácia clinicamente, a empresa deu entrada para uma patente do tratamento antiandrogênico contra a Covid-19 nos EUA ainda em março de 2020, com menos de dois meses de pandemia decretada. Esse pedido de patente da Applied Biology tem validade internacional desde julho de 2020, após ter sido registrado na Organização Mundial de Propriedade Industrial (OMPI), na qual o Brasil é signatário. Isso significa que, no caso da aprovação de eventuais tratamentos antiandrogênicos contra a Covid-19, governos e hospitais deverão royalties à Applied Biology pela invenção. E o tratamento com proxalutamida sequer seria a primeira patente da clínica norte-americana no Brasil, que já reserva royalties a duas terapias para calvície criadas pelo centro de pesquisas.

Inicialmente, o tratamento em vias de ser patenteado para Covid-19 previa o uso de outros antiandrogênicos já disponíveis no mercado, como a dutasterida. A escolha pela proxalutamida como droga-propaganda da teoria surgiu após a Kintor, a farmacêutica chinesa que fabrica o medicamento, fazer sua primeira oferta pública de ações na bolsa de valores de Hong Kong, em maio daquele ano. Desde a sua fundação, em 2009, a startup opera no vermelho. A empresa se beneficiou de uma mudança de lei no mercado de capitais chinês que permitiu a oferta de ações de companhias que operam no prejuízo – mas a crise financeira que surgiu no início da pandemia atrapalhou parte do otimismo da startup, que foi forçada a fechar as portas de um centro clínico em Miami. A ideia da abertura das ações era viabilizar os trâmites necessários para a comercialização da proxalutamida, que recém concluía estudos preliminares que sugeriam sua potencial eficácia contra o câncer.

Na época, as ações da Kintor foram vendidas a preços entre HK$ 17,80 e HK$ 20,15 (em valores de dólares de Hong Kong), o equivalente a R$13,30 e R$ 15, segundo o câmbio do período, conforme a calculadora do Banco Central. Dois meses depois, em julho de 2020, a farmacêutica fechou uma colaboração com a Applied Biology dias após o pedido da patente para a terapia antiandrogênica ser registrado pelos norte-americanos. Hoje, com mais de um ano de parceria e as especulações sobre a eficácia da proxalutamida contra a Covid-19, o valor das ações da companhia em Hong Kong atingiu HK$ 79,95 em julho deste ano, o equivalente a R$ 54 por ação, uma valorização de quase 350%, que tem atraído ceticismo de agentes do mercado financeiro. 

Um dos motivos dessa desconfiança são informações duvidosas divulgadas pela própria Kintor a investidores: em julho, os chineses anunciaram uma aprovação emergencial para uso da proxalutamida no Paraguai que não existiu, conforme apuração da Agência France-Press. Procurado, o Ministério da Saúde paraguaio não respondeu às tentativas de contato do Matinal. No caso da Covid-19, a vigilância sanitária paraguaia depende das aprovações de nações vizinhas para autorizar vacinas em caráter emergencial – porém, o órgão não explica bem como funciona o processo para a aprovação de outros medicamentos contra o coronavírus. Sobre o caso, a Kintor Pharmaceutical se limitou a indicar as informações oficiais contidas em seu site, que não respondiam a nenhuma das perguntas enviadas.


Após a divulgação de resultados sem revisão de cientistas do estudo com indícios de fraude no Amazonas, em 11 de março, as ações da Kintor Pharma valorizaram mais de 300%. Fonte: Google Finance

 

O endocrinologista Flávio Cadegiani, um dos coordenadores do experimento realizado em Porto Alegre, foi diretor clínico da Applied Biology, conforme sugerem os “conflitos de interesse” apontados pelo próprio médico nos artigos sobre a proxalutamida que assinou com pesquisadores da companhia. Junto a Andy Goren, o presidente da empresa norte-americana, Cadegiani se reuniu com o ministro de Ciência e Tecnologia Marcos Pontes no ano passado com o objetivo de promover a teoria antiandrogênica no país. Desde ao menos outubro de 2020, o médico promove o uso da proxalutamida em supostos testes clínicos, inclusive com postagens públicas em suas redes sociais e recrutamento de voluntários via WhatsApp – o que não é usual em pesquisas médicas por criar um viés em que apenas os pacientes com tendência a “acreditar” na terapia são selecionados.

Além do experimento realizado no Hospital da Brigada, a dupla Cadegiani e Zimerman também assinou a pesquisa que amparou a criação do TrateCov, um aplicativo promovido pelo Ministério da Saúde que receitava um combo de medicamentos sem eficácia contra a Covid, como cloroquina, hidroxicloroquina e ivermectina, e que foi tirado do ar após dez dias, em janeiro, por causa da recomendação de doses cavalares dos medicamentos para crianças. O estudo que amparou a iniciativa do governo brasileiro teve participação da Applied Biology, e incluiu perguntas sobre calvície aos pacientes do app. O próprio aplicativo TrateCov foi hospedado nos Estados Unidos. Na época, mais uma vez, essas inconsistências motivaram questionamentos da Conep.  

No início do ano, a mesma Applied Biology, com apoio da Kintor Pharmaceutical e em parceria com o grupo hospital amazonense Samel, rodou o já mencionado estudo clínico com indícios de irregularidades no estado do Amazonas, com participação da dupla de médicos. Nessa época, Ricardo Zimerman havia viajado para Manaus a convite do Ministério da Saúde para promover o uso de cloroquina no estado por meio do TrateCov. Lá, encontrou-se com Cadegiani e passou a auxiliá-lo na pesquisa com proxalutamida. Em seguida, os dois médicos ampliaram o uso do medicamento para o Hospital da Brigada Militar, onde Zimerman trabalha. O infectologista gaúcho havia sido convidado pela pasta para viajar ao Amazonas por indicação do médico Helio Angotti, o secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde da pasta, um dos principais entusiastas do tratamento precoce no governo federal, que apresentou o experimento com proxalutamida realizado no Amazonas ao presidente Jair Bolsonaro.  

Na época, Bolsonaro se animou com a divulgação dos supostos resultados milagrosos da droga e chegou a usar um almoço que debateria a demissão do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello para discutir uma eventual aprovação do uso emergencial do medicamento. A Anvisa marcou duas reuniões com uma consultoria especializada em regulação de medicamentos contratada pela Applied Biology para discutir a aprovação da proxalutamida no Brasil, mas o escritório desmarcou e nunca mais procurou a agência reguladora. 

Em abril, o governo federal tentou convencer a Fiocruz a produzir a proxalutamida no Brasil, diante da falta de interesse de farmacêuticas da iniciativa privada brasileira. À Fiocruz, a Kintor Pharmaceutical garantiu que poderia entregar 100 milhões de comprimidos do medicamento ao País a partir de junho, segundo uma reportagem da CNN Brasil, mas as negociações novamente travaram na falta de anuência da Conep aos experimentos realizados no Amazonas. 

No mês seguinte, em maio, na CPI da Covid, o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, chegou a ser perguntado sobre uma eventual aprovação do uso da proxalutamida pelo senador Eduardo Girão (PODE/CE), um dos defensores do uso do medicamento. Torres relatou o que discutiu sobre o remédio em conversas realizadas nos dias 11 e 15 de março, das quais participaram a Applied Biology, autoridades da Anvisa e o médico Flávio Cadegiani. “Um dos pontos que apresentamos foi, sim, a necessidade da interlocução com a Conep, porque, sem ética em pesquisa, absolutamente, não dá para fazer nada, a ética tem que prevalecer na seleção dos voluntários testadores, enfim, é fundamental. E esse grupo não voltou mais a nos contatar”, respondeu Torres na ocasião

Apesar dos entraves burocráticos e regulatórios, a droga continuou a ser defendida por Bolsonaro. Em julho, o presidente voltou a defender a liberação da droga. Com isso, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, reforçou que o medicamento precisa ser melhor estudado. [Transcrevi trechos de reportagem de Pedro Nakamura (com edição de Marcela Donini e Sílvia Lisboa e checagem de Juan Ortiz) para Matinal Jornalismo. Leia mais ]

Anvisa veta uso de remédio defendido por Bolsonaro contra a COVID-19Charges - Fotografia - Folha de S.Paulo

O medicamento proxalutamida, que vinha sendo testado no tratamento da COVID-19 no Brasil, foi barrado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A Diretoria Colegiada da agência reguladora decidiu, por unanimidade, suspender o uso da droga em pesquisas científicas no país e a importação da substância. A proibição foi feita de forma cautelar diante de denúncias e investigações que estão sendo feitas a respeito dos estudos com o fármaco, exaltado pelo presidente Jair Bolsonaro.

Em agosto, o Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul abriu um inquérito civil público para investigar o uso irregular da proxalutamida em testes no Hospital da Brigada Militar, em Porto Alegre. A medicação teria sido aplicada em cerca de 50 pacientes, em um ensaio supostamente clandestino, apesar de a Brigada ter assegurado que "o estudo obedeceu às exigências dos órgãos competentes e as normas legais aplicáveis aos procedimentos em questão" - afirmou em nota.
 
Porém, a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), órgão vinculado ao Conselho Nacional de Saúde (CNS) - responsável por autorizar a realização de pesquisa com seres humanos no país -, negou ter recebido "qualquer solicitação para a realização de estudo com a substância proxalutamida no Hospital da Brigada Militar de Porto Alegre" [Transcrevi trechos de reportagem de Maria Eduarda Cardim, para o Correio Braziliense]. É desconhecido o número de mortos nesse experimento nazista à Mengele em Porto Alegre. 
 

Unesco denuncia 200 mortes com experiência bolsonarista da proxalutamida no Amazonas como "das mais graves da história"

Arquivos josef mengele - Rede Brasil Atual

A Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) considerou a denúncia de 200 mortes de voluntários de pesquisa clínica com a proxalutamida feita no Amazonas uma das infrações éticas mais graves da história da América Latina. A declaração foi divulgada nesse sábado (9) por meio da Rede Latino-americana e Caribenha de Bioética (Redbioética-Unesco). A informação foi publicada pelo jornal Folha de S.Paulo.

A Unesco deu seu posicionamento, após a Conep (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa) fazer uma denúncia à Procuradoria-Geral da República no mês passado. A entidade é responsável por regular a participação de seres humanos em pesquisas científicas no Brasil.

Jair Bolsonaro defendeu o uso da substância no combate ao coronavírus, mas o remédio não teve eficácia comprovada contra a Covid-19. O uso da substância em pesquisas científicas também foi vetado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no começo do mês passado.

De acordo com o comunicado da rede de bioética da Unesco, a denúncia da Conep incluiu graves violações dos padrões éticos de pesquisa com a proxalutamida. "É ética e legalmente repreensível, conforme consta do ofício da Conep, que os pesquisadores ocultem e alterem indevidamente informações sobre os centros de pesquisa, participantes, número de voluntários e critérios de inclusão, pacientes falecidos, entre outros", disse.

"Qualquer alteração em um protocolo de pesquisa deve ser aprovada pelo sistema de ética em pesquisa local", afirmou.

Por que o senador Marcos do Val deu “ombrada” no deputado Luis Miranda?

O deputado Luis Miranda passou a ser conhecido depois que denunciou ao presidente Jair Bolsonaro favorecimento na compra das vacinas Covaxin pelo Ministério da Saúde, crime que vem sendo investigado pela CPI da Covid 19.

Escreve Caio Barbieri: Em mensagens disparadas por WhatsApp no dia 23 de março deste ano, as quais o Metrópoles teve acesso, Luis Miranda questionou ao ajudante de ordens de Bolsonaro o motivo da falta de respostas do presidente sobre a pressão sofrida pelo irmão dele, Luis Ricardo Miranda, que é concursado do Ministério da Saúde, para autorizar a aquisição do imunizante indiano. 

“Bom dia irmão, o PR [presidente da República] está chateado comigo? Algo que eu fiz? Só precisamos saber o que fazer em uma situação como essa”.

Como resposta, o militar que assessora o presidente da República respondeu: “Bom dia. Negativo, deputado. São muitas demandas. Vou lembrá-lo”.

“Obrigado irmão! Você sabe que a vontade é de ajudar. Estamos juntos”, agradeceu o deputado, mas acabou ficando sem respostas.

Esta denúncia levou os irmãos Miranda à CPI. 

Pressão

À coluna Janela Indiscreta, ainda nesta quarta-feira (23/6), o deputado Luis Miranda afirmou que o coronel Marcelo Pires foi um dos nomes dentro da alta cúpula do Ministério da Saúde a pressionar o irmão dele, Luis Ricardo Fernandes Miranda, para a compra da Covaxin.

O militar chefiava desde janeiro a Diretoria de Programas do ministério, mas foi exonerado em meados de abril após a chegada do atual ministro Marcelo Queiroga.

“O coronel Pires foi um dos que pressionou meu irmão a assinar a compra da Covaxin, mas o processo estava todo errado e cheio de falhas. Esse foi um dos pontos que levamos ao presidente Bolsonaro sobre o que estava acontecendo no Ministério da Saúde”, garantiu o congressista em conversa exclusiva.

vacina disfarce.jpg

No print encaminhado à coluna Janela Indiscreta, o militar que ocupava a diretoria da pasta escreveu: “Obrigada, meu amigo, estamos com muitos brasileiros morrendo. Precisamos fazer tudo para ajudar. O representante da empresa veio agora a noite falar com o Elcio para agilizar a LI para embarcar as vacinas esta semana. Quatro milhões”.

Bolsonarista e propagandista do tratamento precoce, do kit cloroquima, o kit me engana, o senador Marcos do Val não gostou do atrapalho dos irmãos Miranda, que colocaram uma pedra no meio do caminho do gabinete paralelo e o gabinete de Bolsonaro.

O deputado Luis Miranda (DEM-DF) e o senador Marcos do Val (Podemos-ES) se desentenderam durante intervalo de sessão da CPI da Covid na sexta-feira 25/6. No vídeo é possível ver que outros parlamentares precisaram apartar a briga entre as partes.

Marcos do Val é instrutor da SWAT desde o ano de 2000 e membro de Honra da SWAT de Beaumont no Texas desde 2003. Fundador e instrutor-chefe do CATI - International Police Training, inc, primeira e única empresa de treinamento policial Multinacional da atualidade, com filiais na Europa e EUA. Criador das inovadoras técnicas de IMOBILIZAÇÕES TÁTICAS®, hoje difundidas em várias unidades policiais ao redor do mundo. Treina policiais para derrubar com pernada, golpe de mão e ombrada

Do Val era mediador da entrega do kit covid (vide tags). Victor Fuzeira e Luciana Lima registraram: Luís Miranda reclamou da briga. “Aqui mesmo, no intervalo. Sempre admirei o Marcos Durval, e ele teve um descontrole comigo. Onde está a nossa história?”, disse. Onde? Uma história que precisa ser contada. Ninguém bate no próximo, dentro do Senado, de graça. 

 

vacina chacina.jpg

 

 

17
Jul21

A paixão dos homens pela masculinidade tacanha de Bolsonaro

Talis Andrade

Image

 

por Isabela Venturoza

- - -

 

Bolsonaro participou sábado (26), em Chapecó, Santa Catarina, de mais uma de suas “motociatas”. A última edição havia acontecido no dia 12 de junho, em São Paulo, e reuniu milhares de homens em apoio ao presidente. Tal evento foi definido pela escrita cirúrgica de Durval Muniz Albuquerque Jr. como “um verdadeiro desfile de adictos da testosterona”.

Para o historiador, como também foi sinalizado em outros meios de comunicação, grande parte dos presentes na “motociata de Jesus” eram homens, em sua maioria brancos, conduzindo motocicletas de marcas e modelos nada semelhantes àquelas que os entregadores de aplicativo utilizam, e que pareciam muito à vontade ao seguir o capitão, materializando uma grande manada fascista.Bolsonaro vincula Cristo a passeio de moto em SP - Blog da CidadaniaEditorial | Por que o Fora Bolsonaro? | Opinião

Que me perdoem os cientistas políticos pelo uso indiscriminado do termo “fascista”, mas não consigo pensar em uma palavra melhor ao observar milhares de homens se sentindo representados por um governo autoritário como o de Bolsonaro. 

Essa adesão fervorosa de alguns à figura de um homem intelectualmente limitado, cujas ações destrutivas e o temperamento descontrolado fazem manchete semana a semana, me impressiona ao mesmo tempo que agrava a dificuldade que encontro para dormir quando deito a cabeça no travesseiro à noite.

O fato é: Bolsonaro e o que ele representa ao desfilar pelo mundo gritando com jornalistas, minando relações diplomáticas, numa cruzada em defesa da cloroquina em detrimento da ciência, entre tantas outras trapalhadas cujos efeitos serão sentidos fortemente nos próximos anos, dizem muito.

Dizem muito porque foram eleitos por uma parcela significativa da população e porque mesmo hoje, com uma economia em frangalhos e 500 mil mortes na conta, seguem encontrando defensores apaixonados. Por que o presidente e o que ele representa provocam tanta paixão no imaginário de alguns?

Para refletir sobre essas questões, é preciso olhar para a história e perceber que por mais que ainda convivamos com inúmeras desigualdades sociais, é inegável que muita coisa mudou nas últimas décadas. Muito se alterou no mundo e no Brasil especificamente. O “lugar das mulheres” foi em certo sentido desestabilizado. Não estamos mais esperando em casa, reduzidas ao papel de mães e esposas. Somos parte importante do mercado de trabalho e nossos interesses e atividades ultrapassam em muito a figura de um companheiro e o espaço doméstico.

No Brasil, inclusive, uma mulher foi eleita presidenta. E é sintomático que ela tenha sido destituída para ser sucedida mais tarde por um sujeito como Jair Bolsonaro. Em outras esferas, políticas de caráter afirmativo e uma real discussão sobre as desigualdades raciais e de classe no Brasil se refletiram em transformações na composição dos estudantes de ensino superior e no poder de consumo de brasileiras e brasileiros. Passamos a andar de avião.

Contudo, tais mudanças – ver pretos, pobres, mulheres e homossexuais em espaços antes negados a eles – incomodou a alguns. Principalmente aqueles a quem antes eram reservados os lugares de excelência na sociedade. Mas não só. Além dos privilegiados, também aqueles que sonhavam em ganhar entrada VIP nessa festa se sentiram atacados pela ideia de que toda brasileira e brasileiro têm direitos e devem ter acesso a oportunidades.

Homens brancos de classe média se tornaram os principais ressentidos com a “bagunça” que havia se tornado o Brasil e Bolsonaro caiu como uma luva ao prometer restituir a norma: não apenas “Deus acima de tudo, Deus acima de todos”, mas pisar no pescoço e esmagar qualquer fração de discurso a favor da equidade. 

O avanço dos conservadorismos, das bancadas da “bala, boi e bíblia”, não veio junto à exaltação dos direitos das mulheres ou de uma defesa de sua participação irrestrita na sociedade. A mensagem transmitida por essa política contemporânea vem reafirmar as fantasias de poder e de identidade de homens brancos, nas quais eles falam mais alto, eles ocupam o espaço público e eles tomam as decisões.

Mulheres cuidam de coisas menores ou figuram como Carla Zambelli ao lado de Bolsonaro como aquela única garota que fica com os meninos no recreio e olha com certo desdém para as outras meninas.

A cruzada dessa masculinidade de Bolsonaro, atenuada em outros homens que fazem parte de seu círculo ou que com ele se relacionam para receber uma fatia do bolo, objetiva trazer de volta algo que nunca existiu plenamente, mas que sempre alimentou as fantasias dos homens e, por consequência, as assimetrias entre eles e as mulheres. 

 

Não é a primeira vez que um
homem se sente ameaçado
por um mundo mudando à
sua volta e não é a primeira
vez que ele recorre a alguma
mitologia perdida de um
poder patriarcal anterior
ou de um supermacho
infalível para restituir a
“ordem” desse mundo.

 

A literatura no campo das masculinidades, tanto em termos de livros de autoajuda quanto de uma bibliografia científica, registra ao longo da história o que alguns vão chamar de “crise da masculinidade”. Ela inclusive fala de respostas que vão variar em termos de resgatar um “masculino mítico” e sua força baseada na homossociabilidade entre homens fazendo “coisas de homens” ou mesmo de um movimento organizado pelos direitos dos homens.

De qualquer forma, estamos falando de uma masculinidade que não aceita ter suas bases alteradas. E sua base muitas vezes é o poder inconteste, principalmente por subalternos. 

Nesse sentido, a expressiva presença de homens nas motociatas de Bolsonaro e sua adesão a uma narrativa que muitas vezes nega a vida de quem não lhe é espelho, na verdade, não surpreende. Ela é uma resposta desesperada e ao mesmo tempo zombeteira aos nossos avanços.

A fantasia deles se erige sobre motos potentes e barulhentas, mas nós estamos aqui há muito tempo, à pé. Nunca foi fácil. O mundo segue girando e continuará mudando.

Claudio Mor on Twitter: "MORtoon - Genociata #mor #charge #governobolsonaro  #jairbolsonaro #bolsonaro #motociata #motoqueiros #pandemia #coronavirus  #covid_19 #forabolsonaro #foragenocida… https://t.co/XMOtxvnw2C"

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