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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

27
Nov22

Os sete erros fatais de Bolsonaro na pandemia

Talis Andrade

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“Quantas mortes poderiam ter sido evitadas no Brasil?" 
 
 
Por Cida de Oliveira
 
O enfrentamento da pandemia pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) está entre os piores do mundo e permitiu 75% das quase 690 mil mortes pela covid no Brasil. Ou seja, 517 mil, segundo especialistas. As conclusões estão no Dossiê Abrasco Pandemia de Covid-19, lançado nesta quinta-feira (24), no encerramento do 13º Congresso que a Associação Brasileiro de Saúde Coletiva (Abrasco) realizou em Salvador.

Com mais de 300 páginas, o documento com cópia enviada ao grupo de trabalho sobre Saúde da equipe de transição do governo eleito é um diagnóstico da condução da pandemia. E indica as alternativas a serem adotadas pelo novo governo no enfrentamento de uma pandemia ainda longe de acabar.

A constatação de que graças a Bolsonaro o Brasil está entre os piores do mundo na condução da pandemia de covid vem do cruzamento de dados epidemiológicos, sob várias abordagens metodológicas. Cruzando números de população e mortes por covid-19 no contexto global, os autores identificaram, em 22 de março de 2022, que o Brasil concentrava 2,7% da população mundial. Mas respondia por 10,7% das mortes por covid no mundo. Um evidente descompasso entre as duas proporções.
 

Mortalidade acumulada por covid no Brasil
 
 

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A mortalidade acumulada por covid (número de óbitos por 1 milhão de habitantes) também mostra a desproporcionalidade dos óbitos no Brasil. No mesmo 22 de março de 2022, enquanto a média global da mortalidade acumulada era de 770 para cada grupo de 1 milhão de pessoas, a aferição no Brasil indicava 3.070 mortes para o grupo de mesmo tamanho. Ou seja, quatro vezes mais que a medida global.

Segundo os autores, “diante dessas práticas erráticas, é natural que se questione se o resultado desastroso relativo ao número de casos graves e de óbitos era evitável”. Ao se comprar as mortes por covid ocorridas no Brasil com as de outros países, é possível estimar o excedente de óbitos relativos à má conduta do governo federal. Ainda considerando a data de 22 de março, o ranking dos países com relação à mortalidade indicava o Brasil na décima quinta posição entre, aproximadamente, 200 países.

Já entre os 10 países mais populosos do mundo, o Brasil apresentava a maior mortalidade acumulada, sendo o único com mais de 3.000 mortes por 1 milhão de pessoas. Entre os países do bloco BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), o Brasil também era o país com maior mortalidade acumulada.
 

Mortes que poderiam ser evitadas
 
 

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Em uma abordagem agregada, que compara a mortalidade geral nos anos da pandemia e a projeção dos óbitos baseada em anos anteriores, é possível observar que, de 30 de abril de 2020 a 31 de março de 2022, o número de óbitos manteve-se sempre acima de 10% em relação aos anos prévios à pandemia. A única exceção ocorreu em 31 de outubro de 2021, quando a aferição registrou 5,83%. O ponto mais alto da série histórica foi aferido em 31 de março de 2021, quando o número de óbitos além do esperado chegou a 82,88% em relação aos anos anteriores à pandemia.

“Dessa forma, é possível especular que, caso o país tivesse seguido o padrão médio global, três de cada quatro mortes por covid-19 ocorridas no Brasil teriam sido evitadas. Essa assertiva não está apoiada no método convencional de estimação de mortes evitáveis. Contudo, abordagens convencionais somente serão factíveis ao final da pandemia, quando as estatísticas oficiais estiverem corrigidas quanto ao sub ou sobre registro de dados”, diz trecho do capítulo “Quantas mortes poderiam ter sido evitadas no Brasil? O impacto dos fracassos no enfrentamento da pandemia’, do Dossiê Abrasco.
 

Lista dos 7 erros de Bolsonaro

Para ajudar a compreender esse resultado macabro, que Jair Bolsonaro tenta negar, a Abrasco listou os sete erros cometidos pela gestão negacionista contra a covid.
- Baixa testagem, isolamento de casos e quarentena de contatos;

- Uso de uma abordagem clínica, e não populacional, para enfrentar a pandemia;

- Desestímulo ao uso de máscaras;

- Promoção de tratamentos ineficazes;

- Atraso na compra de vacinas e desestímulo à vacinação;

-Falta de liderança do Ministério da Saúde e inexistência de um comitê de especialistas;

- Falta de uma política de comunicação unificada.

O desmonte da saúde no governo Bolsonaro

 
 
 
18
Ago22

Mulher que morreu em fila da assistência social no DF estava doente e não podia trabalhar

Talis Andrade

Janaína Araújo morreu em fila do Cras, no DF — Foto: Arquivo pessoal

Janaína Araújo morreu em fila do Cras, no DF — Foto: Arquivo pessoal

 

Por Laura Tizzo, TV Globo

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A mulher de 44 anos que morreu enquanto aguardava atendimento na fila do Centro de Referência em Assistência Social (Cras) do Paranoá, no Distrito Federal, estava doente e não podia trabalhar. Por isso, Janaína Araújo tentava conseguir o Benefício de Prestação Continuada (BPC), um auxílio de um salário mínimo pago a idosos e pessoas de baixa renda que têm algum tipo de deficiência.

A companheira de Janaína, que preferiu não se identificar, contou à da TV Globo que a mulher era hipertensa, obesa, sofria de síndrome do pânico, depressão e ansiedade. As duas viveram juntas por 10 anos.

De acordo com a companheira, Janaína estava com a saúde debilitada e sem poder trabalhar, e queria o benefício para ajudar nas contas de casa. Janaína tentava há oito dias atendimento no Cras.

Nesta quarta, ela decidiu passar a madrugada na fila para conseguir uma senha. No entanto, começou a se sentir mal.

Testemunhas contaram que Janaína dormia no carro, quando uma amiga pediu ajuda e disse que ela estava passando mal. "Quando a gente chegou lá, ela estava com sintomas de que estava enfartando", contou uma mulher que preferiu não se identificar.

Socorro

 

Pessoas dormem em frente à unidades do Cras para conseguir senhas de atendimento no dia seguinte — Foto: TV Globo/Reprodução

Pessoas dormem em frente à unidades do Cras para conseguir senhas de atendimento no dia seguinte — Foto: TV Globo/Reprodução

 

Outras pessoas que também estavam na fila contaram que Janaína começou a passar mal por volta das 4h. As testemunhas disseram que tentaram chamar o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), mas não receberam socorro. Janaína foi levada ao hospital por populares.

Em nota, a Secretaria de Saúde informou que a vítima se sentiu mal por volta das 20h de terça-feira (16), mas não procurou atendimento médico. De acordo com a pasta, "às 4h18, houve um registro de chamado realizado ao Samu, no entanto, aos 41 segundos, a ligação foi interrompida pelo solicitante".

 

 

Registra-se que o médico regulador sequer teve oportunidade de ser informado do quadro da paciente", diz a secretaria.

 

A pasta disse ainda que, às 4h26, Janaína deu entrada no Hospital Regional do Paranoá com "rosto roxo, corpo rígido e pupilas médio fixas". A vítima passou por ressuscitação cardiopulmonar, mas não resistiu e teve óbito declarado às 5h.

 

Foi solicitada necropsia do corpo para identificar a causa da morte", informou a secretaria de Saúde do DF (que ressurte diante da morte)

 

 

Atendimento

 

População tenta atendimento no Cras do Itapoã, no DF — Foto: TV Globo/Reprodução

População sofredora tenta atendimento no Cras do Itapoã, no DF — Foto: TV Globo/Reprodução

 

O Cras é responsável por serviços como cadastramento ou atualização dos dados no CadÚnico, para que pessoas de baixa renda possam ser incluídas em programas como Tarifa Social de Energia Elétrica e BPC, além de dar direito ao Auxílio Emergencial e ao Auxílio Brasil, entre outros benefícios.

 

O benefício que Janaína buscava, o BPC, paga um salário mínimo a idosos com mais de 65 anos e a pessoas com deficiência que não conseguem garantir o próprio sustento. No entanto, na capital, desde junho, dezenas de pessoas têm passado madrugadas nas filas dos Cras, em várias regiões de Brasília, para conseguir acesso a benefícios sociais (veja detalhes abaixo).

No Cras, número de senhas disponibilizado diariamente pela Sedes não é suficiente para atender a todas as solicitações. Por isso, os usuários muitas vezes precisam dormir na fila, para garantir o atendimento.

A situação tem levado a reclamações, além de conflitos entre as pessoas que aguardam atendimento. Na semana passada, a Polícia Civil do DF também abriu uma investigação para apurar uma denúncia de venda de vagas na fila dos centros.

A suspeita é que criminosos tenham se aproveitado da dificuldade no atendimento (de falta de governo federal e falta de governo estudadual) para cobrar até R$ 100 e garantir um lugar na fila. (Nem em tempo de eleições os governantes aparecem. Transcrevi trechos)

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03
Ago22

Pretendem acabar com o voto secreto: Bolsonaro diz que proposta dos militares é de entrar na cabine e filmar votação de eleitores

Talis Andrade

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Bolsonaro também reclamou que o TSE ignorou o mando de militares palacianos, o chamado centrão das mamatas

 

Bolsonaro também reclamou que o TSE ignorou propostas de ocupação militar do Tribunal Superior Eleitoral, para manter o mando dos marechais de contracheques no orçamento paralelo e secreto dos ministérios e empresas estatais. 

O 'dia do foda-se', do 'acabou porra', anunciado pelo general chefe do serviço secreto Augusto Heleno estava marcado para o dia 12 próximo, ou 7 de Setembro na parada de tanques sobre Copacabana ou no dia 1 de outubro, véspera das eleições, da festa cívica democrática do povo nas ruas, para julgar candidatos, para eleger os melhores governantes, os políticos que representam os sem teto, os sem terra, os sem nada. Os que passam fome, os parentes que perderam pais e filhos e irmãos e companheiros e companheiras na fila do SUS, nos corredores dos hospitais, nas chacinas das polícias, na estratégia de propagação da covid, para obter o malefício da imunidade de rebanho.

Em mais uma estratégia para conturbar o processo eleitoral, Jair Bolsonaro (PL) afirmou nesta quarta-feira (2), que as Forças Armadas apresentaram ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) uma proposta para filmar a votação de eleitores e, no final do dia, checar os dados.

Colocando o sistema eleitoral atual em descrédito, ele afirmou que “não adianta verificar a urna como eles [o TSE] querem, uma semana antes”. 

Segundo ele, é necessário que essa avaliação seja feita no dia da votação. As declarações foram dadas em entrevista à rádio Guaíba e reproduzida em reportagem do portal Metrópoles.

“Podemos pegar seiscentas urnas e checar nesse dia. São quase quinhentas mil no Brasil. É uma boa amostragem. E como é que é feito esse teste? As pessoas vão votando e sabendo que estão sendo filmadas. ‘Olha, você vai ser filmado agora. Você quer votar aqui aleatoriamente em quem você quiser, independente da sua vontade, né'”, explicou.

“A pessoa topa, então elas são filmadas. E, no final do dia, com esse filme pronto, você vê quem essa pessoa digitou. ‘Ah, foi tantos votos no Onyx Lorenzoni’, por exemplo. Então vai ter que aparecer tanto pro Onyx, tanto para um deputado federal, tanto para um deputado estadual… Sem problema nenhum”, disse.

Ora, ora, Bolsonaro quer fazer medo, ameaçar o eleitor: o soldado do Exército, de metalhadora, filmando quem vota. Ou o soldado da Polícia Militar, com um revólver, um soldado das chacinas nas favelas, vigiando o pobre, o negrinho dar o seu primeiro voto aberto. O voto de cabresto. O voto nos milicianos para presidente, senador, governador, deputado federal, deputado estadual. 
 
Ora, ora, a presença militar, ou policial, na cabine de votação, é a pior das corrupções: é votar com o cano da metralhadora na cabeça, a 'faca de ponta baioneta' no coração.
 
Nas ditaduras militares, o capitão ou general presidente vence sempre. Acontecia no Brasil nos tempos dos coronéis, o voto de papel com o nome do candidato. Se o diabo do voto não aparecesse na contagem, o eleitor estava morto. Levava uma pisa, e era sangrado.
 
Entendido em sangreira, Bolsonaro sabe como fraudar uma eleição com voto impresso. Sabe prometer a grana dos vinhos, dos licores, do uísque, do filé, da picanha, do salmão, do leite condensado para os rituais nazistas, do Viagra, prótese peniana tamanho não família (25 cm) e lubrificante íntimo, enquanto o povo passa fome.
 
 
A fome uma exclusividade da população civil. 33 milhões de brasileiro passam fome. 116 milhões sofrem de insuficiência alimentar, e os gorilas comendo, os cavalões comendo. 
 
 
 
ALIADOS DA VASSALAGEM DAS FORÇAS ARMADAS
 
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ImageA charge colorida  de Benett tem dois quadros. O título é "O Coração de Dom Pedro chega ao Brasil", em vermelho. No primeiro quadro uma multidão olha o coração sem vida, murcho e acinzentado dentro de uma taça. No segundo quadro a turba avança sobre o órgão do falecido imperador, com garfos e facas na mão e gritando "Caaaaarneeee!!!".
 
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Ivan Valente
@IvanValente
É preciso investigar fortemente essas relações nada republicanas entre a presidência da Câmara e o prefeitura de Rio Largo em Alagoas. Como em uma telenovela, os próximos capítulos talvez deslindem melhor essas estranhas relações.Image
 
 
 
Chacinas são parte da sangreira 
 
 
 
 
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Taí as forças armadas, as polícias estaduais e federais desconheciam... Estas 1.200 pistas para os aviões são do tráfico geral. A polícia do Rio aposta que os capos traficantes proprietários de aviões, fazendas, milionárias contas bancárias... residem nas favelas das chacinas
Guga Chacra 
@gugachacra
Com chamada na primeira página e mais uma página inteira interna na edição impressa, NYTimes publica gigantesca reportagem sobre como mais de 1.200 pistas de pouso secretas são usadas pela mineração ilegal no Brasil
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26
Jun22

"O Brasil hoje fede a Bolsonaro", diz Hildegard Angel

Talis Andrade

Charges Archive - Página 35 de 99 - Jornal Plural

 

247 - A renomada jornalista Hildegard Angel fez um longo desabafo neste domingo (26) no Bom Dia 247, na TV 247, esbravejando contra a normalização do governo Jair Bolsonaro (PL).

A partir do escândalo de corrupção no MEC, que, segundo investigações da Polícia Federal, consistia em um esquema de propinas comandado pelo ex-ministro da Educação Milton Ribeiro em troca da liberação de recursos da pasta, a jornalista chamou atenção para a roubalheira "a céu aberto" que acontece sob o nariz de Bolsonaro.

Por falar em nariz, a jornalista declarou que o Brasil atualmente fede a Bolsonaro, a "bosta". "O odor do Brasil está fétido. Não é cheiro de excremento, é cheiro de Bolsonaro, que é muito pior. É cheiro dessa família. E eles foram ungidos aos céus, ao paraíso, pela Fiesp, com leniência do STF, pelo Judiciário, pelos grandes bancos, pelo mercado financeiro, pelas famílias 'de bem', pelos evangélicos e, sobretudo, pelos católicos. O que é isso? A grande mídia nos enfiou pela goela, pela garganta profunda do Brasil esse veneno chamado Bolsonaro, embalado em transgênicos. O que é isso? Vamos abrir nossos olhos. Não podemos encarar de forma passiva o escândalo que explodiu, está aí. Até a mulher do Milton Ribeiro recebeu R$ 50 mil. Que história é essa? Vamos ficar achando que agora caímos na rotina dos absurdos do Bolsonaro?"

"Isso é um roubo a céu aberto, aquele céu do Planalto, aquele céu azul sem fim. Está fedendo. Isso está nos apertando a garganta. Nós somos aquela republiqueta de bananas que foi a republiqueta dos Trujilo nos anos 40, 50. Regredimos até lá em termos de moral, porque agora o roubo é escancarado. E você vê que o Moro, o paladino da justiça brasileira, se aliou a essa gente, gente de quinta classe que se aboletou no Palácio do Planalto colecionando mansões enquanto eles desativam o Minha Casa, Minha Vida. Que ódio eles têm dos pobres! Que ódio! Quem é que serve o seu cafezinho no Palácio? É pobre! Quem é que dirige o seu carro oficial? É pobre! E a família da Michelle [Bolsonaro]? Paupérrima. Não tem consideração nem pela origem da sua mulher. Que gente é essa? Que gente detestável é essa? Que nojo! Que repúdio! Que repugnância! Não dá para respirar. Se fosse cheiro de esterco era bom, porque o esterco, de cavalo, de boi, tem um cheiro interessante, revigora memórias afetivas, agradáveis, de campo, de fazenda. Mas não. É cheiro de bosta mesmo, dessa família que assim se parece. Depois da morte do Bruno e do Dom e depois do assassinato dos indígenas, filmado lá no Mato Grosso do Sul, se isso não explodir agora, morreremos todos. Se não morrermos fisicamente, morreremos fisicamente, eticamente, a nossa dignidade. Não podemos permitir que roubem a merenda das crianças, os livros, as cartilhas escolares, o reboco da escola. O que é isso, gente? Vamos acordar. a UFRJ vai fechar em setembro porque não vai ter dinheiro. O SUS está totalmente depreciado porque querem privatizar, querem entregar nossos equipamentos, nossos hospitais para as redes dos grandes hospitais. O que é isso? Nós temos que reagir. Isso não é entretenimento! Nós não fazemos jornalismo de entretenimento. É essa minha raiva", concluiu Hildegard.

 
 
 
 
16
Dez21

Em um governo que abraçou a morte, a liberdade é para poucos

Talis Andrade

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Em discurso no Palácio do Planalto na semana passada, Jair Bolsonaro, o genocida de plantão, comparou o chamado “passaporte vacinal” a uma “coleira no povo brasileiro”, repisando uma vez mais a mentira de que as medidas de prevenção à covid-19 são autoritárias e ameaçam nossa liberdade.

E asseverou, em tom de falsa preocupação: “Cadê a nossa liberdade? Eu prefiro morrer a perder a liberdade”.

A frase foi reiterada dias depois pelo Ministro da Saúde (da saúde!), o médico (médico!) Marcelo Queiroga, que lançou mão dos versos do hino da independência – “Ou ficar a pátria livre ou morrer pelo Brasil” –, escrito há quase dois século e no contexto de construção do Estado nacional, para justificar a declaração presidencial.

Não foi a primeira vez. Em maio do ano passado, em reunião com Dias Toffoli, então presidente do STF, ao defender a flexibilização do isolamento social sob o pretexto de salvaguardar a saúde econômica do país, Bolsonaro afirmou a necessidade de preservar “um bem muito maior até que a própria vida (…) a nossa liberdade.”

Antes como agora, é possível ler as falas do presidente a partir de diferentes prismas: a reação de um governante incompetente e insensível, diante de uma tragédia sanitária pela qual é grandemente responsável; o quanto sua personalidade autoritária é refratária às críticas; ou ainda como um egoísta ressentido ao ver negada a satisfação imediata de seus desejos narcísicos.

Tudo isso é verdade. Mas não é suficiente, me parece, para elucidar o que está efetivamente implicado em uma fala que, disfarçada pela aparente imaturidade, expressa um vínculo que está no cerne do governo Bolsonaro, e do próprio bolsonarismo. Refiro-me ao nexo entre Bolsonaro, seu governo, e o neoliberalismo, que a gestão da pandemia escancarou tragicamente.

Uma associação cuja ressonância extrapola os limites de Brasília. Principalmente no início da pandemia, não faltaram vozes empresariais que, preocupadas com a diminuição da atividade econômica e, consequentemente, de seus lucros, não apenas minimizaram a pandemia, como as mortes que ela já começava a produzir.

Se a declaração infame do fundador e dono da rede Madero, Junior Durski, em que arriscou o prognóstico de mortes e desdenhou, com base nessa expectativa, que “não podemos parar por 5 ou 7 mil pessoas que vão morrer”, repercutiu mais intensamente, ele não estava sozinho.

Nas semanas e meses seguintes, a ele se juntaram, entre outros, Luciano Hang, da Havan; Roberto Justus; Alexandre Guerra, do Giraffas; e Abílio Diniz, ex-presidente do grupo Pão de Açúcar.

Mais recentemente, em agosto último, foi Fábio Rigo, herdeiro da marca Prato Fino, quem deu o tom do escárnio. Em suas redes sociais, atacou o SUS (“Quero mais que seja vendido”), sem o qual nossos mortos seriam em número ainda maior, e defendeu o que chamou de “lei da selva”: “Quem pode mais chora menos. Lei da selva. Tive covid e não me fez cócegas. Prefiro o covid do que essa merda de vacina”.

Também nesses casos é possível atribuir a indiferença pela vida e a truculência verbal dos empresários à sua opção ideológica e a adesão ao bolsonarismo. Mas não se trata apenas disso.

Com Bolsonaro e Queiroga, os empresários compartilham uma visão de mundo segundo a qual a vida, e mais particularmente a vida dos outros, não tem outro valor além de integrar a grande engrenagem do mercado. Que os primeiros falem em nome da liberdade e os segundos, da economia, pouco importa. Na lógica neoliberal, não há liberdade que não seja individual, e tampouco se é livre fora dos limites do mercado.

 

Neoliberalismo e autoritarismo

 

Não é de hoje que autoritarismo e neoliberalismo caminham pari passu.

Em 1927, Mises festejou o papel que o fascismo desempenhou na “contenção” do bolchevismo, cujo sêmen, fértil, ele encontrava no interior das democracias europeias do pós-guerra e seus primeiros experimentos de bem-estar social. Para Mises – que foi conselheiro econômico do governo austro-fascista de Engelbert Dollfuss –, a potência autoritária e antidemocrática do fascismo, “salvou a civilização europeia”.

Mais próximos de nós no tempo e no espaço, são amplamente conhecidas as declarações de apoio de dois dos principais herdeiros de Mises, Milton Friedman e Friedrich Hayek, a Pinochet e ao golpe de Estado que derrubou Salvador Allende em 11 de setembro de 1973, instaurando uma das mais terríveis e violentas ditaduras da história recente da América Latina.

Alheio ao terror de Estado e aos milhares de chilenos assassinados pelo regime, Hayek chegou a afirmar, em entrevista de abril de 1981, que embora fosse, pessoalmente, contrário às ditaduras “como instituição de longo prazo”, uma ditadura “pode ser um sistema necessário para um período de transição. Às vezes, é necessário que um país tenha, por um tempo, uma ou outra forma de poder ditatorial”.

Conhecendo a proximidade e a simpatia dos “Chicago Boys” por “uma ou outra forma de poder ditatorial” no Cone Sul, é mais fácil contextualizar a alusão ao AI-5 feita por Paulo Guedes, em novembro de 2019. Naquela ocasião, nosso ministro da Economia recorreu à memória do Ato Institucional como uma alternativa política e de Estado, para conter a ameaça de levantes populares como os que ocorriam, principalmente, no Chile.

São mentirosos, portanto, os discursos que defendem uma espécie de continuidade natural entre democracia, liberdade e neoliberalismo. Como regime de governo, o neoliberalismo encontra terreno fértil no enfraquecimento da democracia e na produção de um imaginário onde inexistem quaisquer outras possibilidades de invenção democrática.

A desvalorização da política, da esfera pública e de propósitos coletivos, da construção do comum, substituídos pela lógica concorrencial e da guerra de todos contra todos, que está no cerne do neoliberalismo, não apenas atestam sua face antidemocrática, como assinalam suas muitas convergências com a experiência do fascismo.

E que incidem no modo como o discurso neoliberal compreende a própria noção de liberdade. Como qualquer outra coisa ou mercadoria, ela não é percebida em sua dimensão política e social, mas como aquilo que se possui e concede, ao indivíduo – junto com o Estado, uma das mais bem sucedidas ficções do Ocidente – o direito de usá-la a seu bel prazer.  

No Brasil de Bolsonaro e do bolsonarismo, particularmente, o desmonte da democracia e o cerceamento das liberdades são favorecidos pela profunda desigualdade que impõem, a milhões de pessoas, a necessidade imperiosa de lutar, cotidianamente, pela sobrevivência em um país, além de economicamente fragilizado, devastado em sua capacidade de mobilização política.

As prometidas e permanentemente anunciadas medidas de austeridade, as reformas econômicas, o desmonte da educação e dos serviços públicos, o menosprezo pelos direitos das comunidades e grupos sociais vulnerabilizados, reforçam, entre nós, a percepção de que a liberdade é, antes, um privilégio que a poucos é dado ter e exercer.

Não é casual ou gratuito, mas um projeto executado com rigor e método, a ênfase no discurso meritocrático de valorização do indivíduo e o desmantelamento das redes mais amplas de inclusão e proteção social. Frequentemente associadas, no discurso bolsonarista, à esquerda e ao fantasma do comunismo, elas são representadas como uma ameaça à “verdadeira liberdade”, basicamente, viver sem ser constrangido ou coagido, pouco importam as circunstâncias.

Como parte da ideologia neoliberal, mesmo o Estado é reduzido à sua função de polícia – e no caso brasileiro, também sua função de milícia. Seu papel não é mais o de assegurar, ainda que parcial e provisoriamente, mecanismos políticos e institucionais que minimizem as desigualdades. Mas garantir, pela força das leis ou das armas, as condições de uma liberdade que, não ultrapassando as fronteiras do indivíduo, autoriza, legitima e justifica que sempre os mesmos sejam livres.

É por isso que para Bolsonaro é preferível “morrer a perder a liberdade”. Ele sabe, como o sabe a elite neoliberal que o apoia, que não há o menor risco de que eles precisem, em algum momento, fazer essa escolha.

Enquanto milhões de brasileiras e brasileiros estão condenados a viverem sem liberdade e sob a iminência da morte, vitimados seja pela covid, a fome ou a violência policial, Bolsonaro e a elite neoliberal que o apoia, gozam o privilégio de quem gerencia os mecanismos que permitem a manutenção e reprodução de suas próprias vidas e de sua liberdade. Sustentadas, ambas, pelo sofrimento e o desaparecimento de outros tantos.

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01
Out21

Sobre médicos e monstros

Talis Andrade

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por Cristina Serra

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São estarrecedoras, mas não exatamente surpreendentes, as denúncias envolvendo a operadora de planos de saúde Prevent Senior. A suspeita de que há algo de podre na rede de hospitais da empresa abriu nova e necessária frente de investigação na CPI da Covid. 

Entre as irregularidades, estariam a prescrição abusiva de medicamentos e tratamentos ineficazes, sem que os pacientes e seus parentes tivessem sido consultados. As ilicitudes apontadas incluem ainda ameaçar os médicos de demissão para que receitassem esses remédios, e também fraude de suposta pesquisa científica, prontuários e atestados de óbito, o que resultaria em subnotificação de casos de Covid.

Tudo isso é grave, criminoso e cruel, mas se encaixa na lógica do modelo de negócio dos planos de saúde. Para capturar incautos, prometem mundos e fundos. Na prática, dificultam o acesso aos serviços, sobretudo se o paciente precisar de uma internação, um dos itens mais caros do setor. 

Mal ou bem, é assim que funciona. Mais mal do que bem, tanto que os consumidores frequentemente têm que recorrer à justiça para que muitas dessas arapucas cumpram o que já está nos contratos. Aí vem uma pandemia e o tal modelo de negócio implode porque, de uma hora para outra, milhares de clientes precisam dos leitos mais caros, em UTIs, e por muito tempo. 

No caso da Prevent Senior, voltada para o público idoso, o mais afetado nos primeiros meses da pandemia, não é difícil imaginar o estrago na margem de lucro. Daí para empurrar cloroquina goela abaixo dos pacientes e vender a ilusão de que eles poderiam se tratar em casa é um pulo.

Esse caso nos faz refletir sobre médicos e monstros e nos mostra que saúde não pode ser tratada como negócio. A alternativa, nós já temos. É preciso fortalecer e aumentar o investimento no Sistema Único de Saúde, o nosso SUS, porque saúde é direito humano e coletivo.

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04
Set21

Quem quer paz que defenda a democracia e combata o fascismo

Talis Andrade

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por Gilvandro Filho

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Quem quer paz que seja de paz, nunca de guerra.

Quem quer paz que rejeite de maneira rotunda e inadiável o fascismo quando ele ameaça tomar conta do país.

Quem quer paz que condene o genocídio de quase 600 mil de brasileiros, vítimas do descaso com a política de saúde e da negociata em que se transformou o processo de compra de vacinas pelo governo.

Quem quer paz que bote na cadeia quem enriqueceu à custa de remédio fajuto, como se fosse isto cura de pandemia.

Quem quer paz que leve às barras dos tribunais quem pratica rachadinha, tungando o salário alheio para engordar o seu próprio orçamento.

Quem quer paz que investigue, condene e puna quem transforma os cofres públicos em propriedade familiar.

Quem quer paz que preserve a natureza e puna exemplarmente quem permite a grilagem, o desmatamento desmedido e ainda bote pra tomar conta do ministério do Meio Ambiente investigado por crime ambiental.

Quem quer paz que defenda os povos originários, entendendo suas necessidades e direitos.

Quem quer paz que não permita racistas no comando de órgãos referenciais como a Fundação Palmares.

Quem quer paz que não se alinhe aos líderes fascistas e belicistas do planeta.

Quem quer paz que não aceite a destruição da educação e da cultura nem entregue a gestão dessas áreas a quem não tem educação e muito menos cultura.

Quem quer paz que dê condições dignas ao trabalhador e não faça o contrário, empurrando leis que impedem a aposentadoria e precarizam o trabalho.

Quem quer paz que devolva ao país a condição de um povo alimentado e não um lugar no Mapa da Fome.

Quem quer paz que bote para comandar a economia alguém minimamente capaz de entender o país em que vive.

Quem quer paz que ponha um freio na venda indiscriminada e irresponsável de armas de fogo e encare com coragem o lobby da indústria armamentista.

Quem quer paz que não profane crianças fazendo com elas fotos com mãos imitando arminhas de fogo.

Quem quer paz que respeite os direitos humanos, as mulheres, o lgbtqia+ e seja frontalmente contra qualquer tipo de discriminação.

Quem quer paz que nunca ameace de morte os adversários políticos partidários e quem não pensa igual a si.

Quem quer paz que não ameace jornalistas, sobretudo e de forma covarde, profissionais mulheres.

Quem quer paz que não ameace o resultado das eleições porque se desenha um resultado que não lhe será favorável.

Quem quer paz que rejeite o uso de fake News nem financia com verbas públicas veículos que se utilizam desse expediente.

Quem quer paz respeite os poderes constituídos, o Legislativo e o Judiciário, aceitando com civilidade suas decisões.

Quem quer paz que preserve a democracia e repila com vigor manifestações que têm como objetivo único exterminá-la.

Quem quer paz que lute pelo impeachment de um presidente raso e vulgar, que não tem porque estar no cargo, que acumula dezenas de pedidos de impedimento e tem contra si inúmeros crimes de responsabilidade, claros e intransferíveis.

Quem quer paz que abra bem os olhos e que, ano que vem, não permita outra experiência desastrosa como a que o país vive desde janeiro de 2019.

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18
Ago21

Militares: do autoritarismo ao ridículo

Talis Andrade

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por João Paulo Cunha /jornal Brasil de Fato
 
Durante muito tempo os militares arrogavam uma aprovação que nunca era bem explicada. Considerada uma instituição respeitada pela maioria da população, até mesmo porque escondia sua vocação autoritária sob a capa da seriedade e disciplina, atravessou décadas como uma espécie de reserva moral a ser acionada em momentos de crise.

A história mostrou a falácia desse mito. Os militares saíram dos quartéis sempre que foi necessário preservar interesses de classe, ainda que metidos em argumentos como a segurança nacional, o desenvolvimento mesmo sem povo, e o anticomunismo acima de tudo. Nesse jogo, mostraram sempre sua carranca violenta e antidemocrática.

Mesmo assim, as Forças Armadas mantinham intocada outra mitologia orgulhosa e contida, que fazia par com o autoritarismo escancarado: a competência profissional. Se fosse preciso, era só convocar os fardados de todas as patentes para consertar os estragos, tapar buracos e caiar calçadas. Além das tarefas militares, ostentavam um positivismo de raiz, meio engenheiro, meio estafeta.

Pau para toda obra, os militares seriam na vida prática o que os evangélicos parecem exibir no campo dos valores para a classe média: não querem ser como eles, mas reconhecem que são confiáveis e não criam caso. Ambos obedecem por DNA o comando superior, seja laico ou sagrado. A ética evangélico-militar era a consagração do estado de submissão, tão ao gosto de um estrato que gosta de ser servido.

Além da defesa do autoritarismo como remédio para desvios populares ou esquerdizantes e da eficiência como superação da ineficiência do funcionalismo civil até que a privatização nos liberte, os militares seriam ainda protegidos do risco da corrupção. Os mecanismos de controle, o peso da disciplina e o rigor das punições seriam salvaguardas contra o monstro. Militar corrupto já nasceria morto. 

É claro que o elemento mais ativo dos atributos da honestidade da corporação - a falta de transparência - não era evocado. Como as denúncias eram tratadas no interior da própria instituição, com leis e juízes próprios, além da censura absoluta, os desvios nunca se tornavam públicos. A corrupção dos militares era uma impossibilidade lógica, já que o ato de transgressão implica em seu conhecimento público.

Retorno do recalcado

Pois bem, Jair Bolsonaro, um mau militar de acordo com seus próprios superiores durante sua atribulada carreira, vem contribuindo para desonrar as Forças Armadas nesses três parâmetros. Afastado por insubordinação, reformado para não receber punição mais grave, sem qualquer histórico de contribuição para o Exército, o ex-capitão oferece um exemplo clássico do que Freud chamava de “retorno do recalcado”.

Simplificando, quando um sujeito tem seus desejos negados pela realidade, tende a recalcar a insatisfação, desenvolvendo sintomas neuróticos que afastem o risco de angústia e tristeza pela sua derrota na vida. Em outras palavras, para não assumir que tem defeitos, projeta sua infelicidade nos outros. O recalcado sofre porque é cheio de defeitos e porque o outro tem méritos que ele não tem.

O inconsciente, para onde vai o recalque, não perdoa. É aí que entra em cena o retorno do recalcado. Como o sujeito não dá conta de seu fracasso, ele transforma o que foi reprimido, distorcendo a realidade. O resultado pode vir nos atos falhos, nas fantasias de onipotência, numa variada gama de sintomas neuróticos, na busca incessante de inimigos. Ou tudo isso junto, como no caso de Jair Messias.

Bolsonaro retornou seu recalque ao Exército fazendo todo o possível para destruir seu maior objeto de identificação. Seu amor ao militarismo é uma forma de ódio mal resolvido. Por isso ele precisa humilhar superiores hierárquicos, chamar de “sua” a corporação, defender estratos menos valorizados dos contingentes armados e se cercar do pior para não parecer tão ruim.

Militares em baixa

Assim, o reformado-recalcado contribuiu para desmoralizar os militares e tirar deles o conceito, ainda que questionável, de portadores de valores positivos para grande parte da população e dos próprios conscritos. Nunca os militares estiveram tão em baixa na sociedade. Perderam os três pilares que sustentavam seu mito: a autoridade, a competência e a honestidade.

A autoridade foi maculada pela sucessiva troca de titulares de cargos de comando das forças. O presidente foi rebaixando os critérios de seleção e desagradando cada vez mais os setores que defendiam a autonomia militar. Além de estampar a divisão, o que para os militares é uma forma de indecência institucional, foi perfilando oficiais dispostos a tudo, inclusive a apequenar a função de órgão de Estado a mera correia de transmissão de governo.

A competência se desmanchou como o inchaço da máquina pública de detentores de patentes, da ativa e da reserva, sem qualquer impacto na qualidade dos serviços prestados. Para ficar num exemplo paradigmático, o general Eduardo Pazuello se tornou a expressão da inépcia militar. Cercado de militares por todos os lados, conseguiu interferir até mesmo na mais estruturada política pública do país, o SUS, com seu choque de ineficiência.

O general agravou a crise sanitária, não foi capaz de comandar uma política unificada de combate à pandemia e nem mesmo em sua especialidade, a logística, foi capaz de garantir oxigênio, vacinas e outros insumos a tempo de evitar mortes. Nem mesmo a simples operação de distribuir imunizantes foi realizada sem falhas patéticas como confundir Amazonas com Amapá. Para humilhar ainda mais sua origem, defendeu a obediência burra na internet e a bajulação ilegal numa aglomeração política de motociclistas decadentes.

CPI da Covid

Com relação à honestidade, a CPI da Covid no Senado está cumprindo o papel de exposição e investigação de algumas das maiores e mais detestáveis operações de corrupção da história do país. Roubo, antecedido e seguido de mortes. Centenas de milhares de mortes. Atravessadores, propinas, intermediários, fabricantes de vermífugos e outros remédios imprestáveis para a doença, falsos empresários, reverendos e outros personagens escrevem uma farsa macabra.

Se conectam teorias negacionistas, defesa da morte como estratégia de contenção do vírus por imunidade coletiva, descaso com fabricantes respeitados na comunidade internacional, contatos com empresas suspeitas de fraudes, incentivo à fabricação de medicamentos ineficazes, pedidos de propinas denunciados pessoalmente ao presidente. O enredo, que é sórdido, tem várias pegadas militares. De coronéis-assessores do Ministério da Saúde a soldados-vendedores, a corrupção tem sempre o pano verde da farda, disfarçado em ternos, rondando os negócios.

O retorno do recalcado foi um trabalho psicopatológico eficiente da parte do presidente. A autoridade do Exército, que seria demonstrada pela autonomia da instituição, se tornou autoritarismo tacanho exercido pelos mais fracos da caserna, dispostos a tudo para corresponder às demandas do desejo do chefe. Se durante a ditadura militar eram as próprias Forças Armadas que impunham seu desiderato, hoje seguem ordens de um subalterno alinhado com a mais rasa extrema direita. Uma espécie de militarismo do baixo clero.

Corrupção em larga escala

A competência das forças armadas, aparentemente capaz de interferir quando necessário em vários setores da administração pública e mesmo na área privada, se mostrou com incapacidade técnica desprezível, das grandes políticas às tarefas mais chinfrins. Os militares que enxameiam o poder civil deixaram às claras que o melhor mesmo seria voltar para os quartéis e deixar o trabalho dos adultos nas mãos de profissionais.

E, finalmente, a honestidade está revelando a contraface da corrupção em larga escala. Em todas as denúncias que vieram à tona envolvendo a pandemia, sempre escapa uma patente, das menos às mais estreladas. Nem mesmo as fatiotas civis escondem o avesso pressentido dos uniformes, do soldado de Alfenas ao general da ativa especializado em logística. Sem falar dos laboratórios militares e das indústrias químicas que entraram no Ministério Militarizado da Saúde pela porta da frente.

Mas Bolsonaro não aquieta o facho em matéria de humilhar quem o humilhou. Com o desfile patético de máquinas de repressão imprestáveis no Eixo Monumental de Brasília, desceram mais um nível: o ridículo. Se era para pôr pressão nos congressistas que votavam a volta do voto impresso, não funcionou. Se foi para mostrar poder de fogo, deu chabu. Haja recalque.
 
29
Mai21

Le Monde chama a atenção para a alta mortalidade de crianças por Covid-19 no Brasil

Talis Andrade

Jornal Le Monde chama a atenção para a mortalidade de crianças por Covid-19 no Brasil

Jornal Le Monde chama a atenção para a mortalidade de crianças por Covid-19 no Brasil © Reprodução Le Monde

O site do jornal francês Le Monde traz, neste sábado (29) uma reportagem sobre os altos números de mortalidade de crianças no Brasil por conta da Covid-19. Desde o início da pandemia, mais de 2.800 crianças menores de 10 anos morreram de Covid-19 no Brasil. Destas, mais da metade tinha menos de 1 ano de idade. Os dados são da ONG Vital Strategies.

Esses números assustadores, diz Le Monde, não podem ser comparados com os de nenhum outro país do mundo onde existem dados sobre o assunto (na França, por exemplo, apenas 13 crianças e adolescentes menores de 19 anos morreram de Covid-19). Acima de tudo, são dois a três maiores do que os divulgados pelo Ministério da Saúde.

O motivo é que os dados da ONG Vital Strategies incluem crianças que morreram de dificuldade respiratória aguda de causas desconhecidas, na maioria das vezes o resultado de Covid-19 não diagnosticada. “Mas os números reais são indiscutivelmente ainda mais importantes. A subnotificação é imensa ”, diz Fátima Marinho, epidemiologista que coordenou o estudo, em entrevista ao Le Monde.

Isso causou um rebuliço no Brasil, já devastado pela epidemia (459 mil vítimas no total), onde, como em outros lugares, os mais jovens não são considerados vulneráveis. “Desde o início, essa retórica foi definida ao dizer que a Covid só mata os idosos. Está errado. A mortalidade é muito alta em todas as faixas etárias e até entre as crianças”, insiste Fátima Marinho.

Em pessoas mais jovens, no entanto, os sintomas diferem daqueles dos adultos. “As crianças sofrem com tosse, problemas respiratórios, mas também com muito vômito, diarreia e dores abdominais...”, observa o pediatra Ricardo Chaves, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

"Mais raramente, alguns morrem dos efeitos da chamada síndrome 'PIMS' [para síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica]: uma inflamação generalizada dos órgãos que afeta algumas crianças e pode ocorrer várias semanas após a infecção por Covid", acrescenta o médico.

Uma evolução "rara" em direção à morte

No Brasil, diz o texto, todos se perguntam sobre a influência da variante P1 no drama infantil. Esta última, mais contagiosa, responsável pela maioria das infecções, também é suspeita de ser mais letal. “Essa nova cepa gera uma carga viral maior. Crianças com comorbidades - câncer, asma, diabetes etc. - têm, portanto, maior probabilidade de desenvolver formas graves e sucumbir ao vírus”, afirma Fátima Marinho.

Mas, sobre o assunto, as opiniões estão divididas “Nenhum estudo ainda mostra que a P1 é mais agressiva contra os mais novos. Crianças doentes, mesmo bebês com co-morbidades e infectados com a variante, geralmente não desenvolvem formas graves e sua condição muito raramente evolui para a morte ", disse Marcelo Otsuka, membro da Sociedade Brasileira de Doenças Infecciosas.

O pesquisador se baseia em outro estudo recente, publicado pela National Pediatric Society. “As pessoas de 0 a 19 anos representam 25% da população brasileira, mas em 2020 eram responsáveis ​​apenas por 2,46% das internações e 0,62% das mortes ligadas à Covid”, explica Otsuka. 

Esses indicadores também tenderam a melhorar durante os dois primeiros meses de 2021, apesar da disseminação da variante P1 (1,79% para internações e 0,39% para óbitos).

Falha na atenção primária

Para explicar a morte de tantas crianças no Brasil, os cientistas avançaram com outras explicações. A primeira estaria relacionada ao mau estado crônico do sistema de saúde e, em particular, da atenção primária. De acordo com as Nações Unidas, 14 em cada 1.000 crianças morrem, em média, no Brasil antes do quinto aniversário: o dobro da média dos países da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico).

“Crianças de comunidades negras e indígenas, em áreas rurais ou favelas, são particularmente afetadas. Nessas populações, a exposição ao vírus é muito alta, a doença se espalha rapidamente e as comorbidades em crianças são mais importantes. O atendimento no hospital público é tardio e muito precário. Daí uma mortalidade altíssima”, explica Francisco Ivanildo Oliveira, infectologista do hospital infantil de Sabará (SP).

A tendência não deve melhorar. Após uma breve calmaria, os indicadores brasileiros voltaram ao vermelho. Embora apenas 10% da população tenha recebido até agora uma dose dupla da vacina, os especialistas prevêem até 300.000 mortes a mais até o final de agosto. Um verdadeiro massacre, crava o jornal francês.

“O relaxamento geral dos controles e o distanciamento social podem contribuir para o surgimento de novas mutações no vírus”, teme Paulo Ricardo Martins Filho, epidemiologista-chefe da Universidade Federal de Sergipe.

 
23
Abr21

Paris Match retrata desigualdade abismal entre saúde pública e medicina de luxo em SP

Talis Andrade

Cemitério de Vila Formosa, o maior de São Paulo, acelerou abertura de covas diante dos recordes de mortes de Covid-19 no Brasil.Cemitério de Vila Formosa, o maior de São Paulo, acelerou abertura de covas diante dos recordes de mortes de Covid-19 no Brasil. AP - Andre Penner

 

A tragédia da epidemia de Covid-19 no Brasil é apresentada em uma reportagem de oito páginas na edição semanal da revista Paris Match. A chamada de capa "Hospital de ricos e inferno de pobres" prepara os leitores para um mergulho nas desigualdades aberrantes que enfrentam os moradores pobres de São Paulo infectados pelo coronavírus, enquanto a classe A se refugia no atendimento de elite do Hospital Israelita Albert Einstein. 

O hospital, localizado no bairro do Morumbi, abriu as portas para a publicação francesa. "Aqui se salva os ricos", escreve a Paris Match, exibindo em página dupla a imagem de um homem intubado, cercado por 12 médicos e enfermeiros, na UTI de Covid-19 do estabelecimento paulista. "Enquanto a taxa de mortalidade dos intubados no Einstein é de 40%, este percentual sobe para 80% nos hospitais públicos superlotados de São Paulo", informa a reportagem. 

"No Einstein, o paciente é rei e os serviços oferecidos são de um hotel cinco estrelas", nota a Paris Match. Além dos serviços de manobrista, heliponto, vários restaurantes e "escritórios de seguradoras de saúde com ares de agências bancárias", o que deixa a administração da instituição mais orgulhosa é a central de monitoramento que permite controlar os parâmetros vitais de cada paciente em tempo real. Esta excelência tem um custo que pode alcançar € 1.500 a diária, cerca de R$ 10 mil, relata a revista.

Mais adiante, a Paris Match mostra uma foto noturna do Cemitério da Vila Formosa, usado por famílias das classes C, D e E. O horário de funcionamento foi ampliado até 22 horas, para dar conta da demanda de vítimas da Covid-19. Na escuridão, famílias abraçadas acompanham um sepultamento. A publicação explica que os coveiros desse cemitério trabalham em ritmo frenético e chegaram a enterrar 420 cadáveres em uma noite. 

Paris Match lembra que o coronavírus foi introduzido no Brasil pela população mais rica, que pode se oferecer viagens para o exterior e os melhores serviços de saúde. Mas a primeira vítima oficial da doença foi uma empregada doméstica do Rio de Janeiro, contaminada por seu empregador. "Um símbolo devastador", observa a publicação. 

Para um brasileiro, essas observações podem parecer banais, mas para os franceses, que dispõem de uma rede pública hospitalar que dá atendimento gratuito a toda a população, sem distinção de classe social e renda, a medicina de luxo causa perplexidade.

Brasil contradiz ditado popular e impõe preço à vida 

Ouvido pela reportagem, o oncologista Drauzio Varella repete que esse vírus não é nada democrático. "Os ricos têm mais chances de se proteger do que os pobres, e o Brasil pagará nesta pandemia o preço de suas monstruosas desigualdades sociais", constata o médico. Um dado sanitário citado por Varella endossa esta realidade: 35 milhões de habitantes não têm acesso a água potável no Brasil, não tendo condições, portanto, de lavar as mãos para se proteger do vírus. 

A jornalista enviada ao país ressalta que os cientistas brasileiros não têm mais palavras para alertar sobre a gravidade da catástrofe, denominada de "Hiroshima brasileira" e "maior tragédia nacional". 

A revista prossegue sua longa reportagem lembrando a que ponto o negacionismo do presidente Jair Bolsonaro tornou o Brasil um pária internacional, uma fábrica de variantes temida em todo o mundo. Fala do pavor que tomou conta da classe A de São Paulo quando os leitos de UTI esgotaram no Einstein e foi preciso recusar pacientes até a direção abrir novas vagas.

Por fim, explica que os pacientes que possuem um seguro-saúde no Brasil devem depositar uma caução de R$ 30 mil (€ 4.500) na maioria dos hospitais particulares, antes de serem admitidos na UTI. Contrariamente ao ditado popular que afirma que a vida não tem preço, no Brasil ela tem, e o valor é 27 vezes superior ao salário mínimo, conclui a reportagem. 

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