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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

21
Jul21

Os militares que vestiram a carapuça

Talis Andrade

 

por Jorge Gregory 

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Não fosse trágico, o caso Davati serviria como um excelente roteiro para uma comédia pastelão. Um bando de pilantras bolsonaristas, daquele tipo de malandro especialista em aplicar o conto do vigário em rodoviária de cidade do interior, envolve do mais baixo escalão até o Secretário Executivo do Ministério da Saúde em um golpe revestido de um primarismo absolutamente inacreditável. No centro desta piada de mau gosto estão Cristiano Carvalho, o tipo de malandro que não acerta uma, um cabo da Polícia Militar e um pastor evangélico.

Para termos uma ideia de quem é Cristiano Carvalho, logo no início do depoimento, o senador Eduardo Braga revelou que o suposto profissional de vendas havia requerido o auxílio emergencial no ano passado. Por mais que a crise sanitária tenha imposto dificuldades a profissionais de vendas, difícil acreditar que alguém qualificado a assumir a representação de uma empresa internacional no Brasil tenha tido necessidade de apelar a tal recurso de sobrevivência. Ocorre que não só Cristiano não era o que ele vendia, como também não passa de um larapiozinho. Conforme revelou o Poder 360, o currículo de Carvalho é recheado de cargos que nunca exerceu, em empresas pelas quais nunca passou. Em síntese, um estelionatário.

Quanto à empresa que ele representava, a Davati, esta abriu há apenas um ano e pertence a Hernán Cardenas. Um cubano empresário nos Estados Unidos. É obviamente um exilado e negócios de exilados cubanos normalmente não são dos mais recomendáveis. Quanto à empresa, há evidências de que já tenha aplicado golpe envolvendo vacinas no Canadá e claramente pretendia também aplicar no Brasil. É absolutamente inacreditável que Cardenas pudesse obter a representação de qualquer laboratório, especialmente do AstraZeneca ou Jansen. O mais interessante desse enredo é que Cardenas não encontrou Carvalho ao acaso ou por um processo de seleção de executivos.

A ligação entre Cardenas e Carvalho se estabeleceu por meio do coronel reformado da Aeronáutica, Gláucio Otaviano Guerra. Coincidentemente, um coronel que, segundo apurou o blog DCM, vive nos Estados Unidos, onde tem uma empresa de consultoria. Coincidentemente também, muito coincidentemente, o irmão mais velho de Guerra é ex-policial federal acusado de pertencer às milícias do Rio de Janeiro e ter ligações muito próximas a Queiroz, aquele mesmo das rachadinhas de Flávio Bolsonaro.

Carvalho tentou fazer crer em seu depoimento que conheceu Dominguetti em janeiro deste ano e que o cabo o procurou pois tinha uma demanda de vacina. Dominguetti, cabo da Polícia Militar de Minas, mesmo Estado de Carvalho, segundo se pode apurar nas suas redes sociais e de seus familiares, também é, coincidentemente, um fanático bolsonarista. Dominguetti teria vindo a Brasília passear e, também por coincidência, teria se encontrado com um tal coronel Odilon, que o apresentou ao pastor Amilton e ao coronel Blanco. Amilton e Blanco, também assumidamente bolsonaristas.

E aqui já temos mais dois coronéis na jogada, Odilon e Blanco. Papo vai, papo vem, Dominguetti deve ter lembrado que ouviu falar que um determinado sujeito, em Minas Gerais, representava uma empresa americana que tinha vacinas para vender e descobriu, sabe-se lá como, o telefone do tal Carvalho. Ou talvez Dominguetti tenha consultado no Google “oferta de vacinas Covid” e descoberto o Carvalho. Me enganem que eu gosto.

Estabelecida a conexão da seção bolsonarista mineira com a seção brasiliense, o trio definiu suas estratégias. O coronel Blanco, que havia trabalhado como adjunto do diretor de importação, Roberto Ferreira Dias, abriria, por intermédio deste, as portas do Ministério da Saúde. O pastor, por meio dos canais bolsonaristas neopentecostais, tentaria chegar diretamente em Bolsonaro ou Michele. Nesse meio tempo, Blanco conseguiu um encontro dele e Dominguetti com Dias em um restaurante onde negociaram a divisão do butim. Já o pastor descobriu que tinha menos cacife do que imaginava e, por meio das redes bolsonaristas, estabeleceu um novo caminho, contatando o coronel Hélcio Bruno, presidente de uma organização envolvida com o Gabinete do Ódio. Mais um coronel entrou na jogada.

Por meio do coronel Hélcio Bruno, a dupla Carvalho e Dominguetti conseguiu audiência com o secretário executivo do Ministério da Saúde, coronel Élcio Franco. Na reunião estavam presentes, além de Élcio Franco, os coronéis Boechat e Lima. A reunião decidu pela absurda indicação do pastor Amilton como representante do governo junto à Davati, assim como pelo encaminhamento de proposta ao Ministério de fornecimento de vacinas da Jansen. O contrato seria assinado entre a ONG do pastor e o Ministério. Obviamente o esquema não foi para frente, pois a tal ONG certamente não tem nenhuma qualificação para firmar tal contrato, mas o fato é que, nessa história toda, saiu coronel pelo ladrão.

No caso Covaxin, a mutreta foi mais sofisticada. Ao que tudo indica, foi montada pelo Centrão, mais especificamente pelo esquema do deputado Ricardo Barros. Utilizando-se de uma empresa da cidade do parlamentar como representante da fabricante, a assinatura do contrato logrou êxito e o que mais chamava a atenção, embora não constasse no contrato, era a insistência de que os pagamentos fossem efetuados antecipadamente e a uma empresa offshore, sediada em um paraíso fiscal. Em que pesem as suspeitas sobre a integridade da Precisa, seria natural que a fabricante a remunerasse pela representação. Porém, uma vez que os pagamentos seriam remetidos a empresas situadas em paraíso fiscal, certamente a representante brasileira não seria a única a ser remunerada. Se o esquema era do Centrão, não se pode desconhecer o envolvimento de Élcio Franco e Pazuello, pois o contrato foi negociado e assinado por eles.

O último caso de maracutaia que tomamos conhecimento é o da World Brands, uma empresa de Itajaí, Santa Catarina, cuja atividade principal, segundo pude apurar, é o comércio atacadista. Talvez até importe bugigangas para lojinhas de R$ 1,99, mas vacinas e produtos farmacêuticos, seria muitíssimo pouco provável. Segundo ficou evidente com o vídeo divulgado na semana que passou, esta absurda negociação foi conduzida diretamente por Pazuello. Ainda está por ser revelado quem intermediou a reunião que resultou no vídeo.

Nos casos da dupla Carvalho e Dominguetti e da World Brands, é impossível que a cúpula do Ministério, totalmente militarizado por Pazuello, não tivesse consciência de que a AstraZeneca e a Sinovac, cuja representação está legalmente delegada à Fiocruz e ao Butantã, respectivamente, jamais designariam outros representantes para negociar seus imunizantes no Brasil. Ou seja, Pazuello e Franco tinham absoluta clareza de que as vacinas oferecidas pelos intermediários com quem negociaram com pagamento antecipado nunca seriam entregues e de que negociações diretamente com os representantes legais ocorreriam a um custo bem menor. Em outras palavras, o que fica absolutamente evidente nesses três casos é que tanto a ala militar do Ministério como a ala representante do Centrão estavam atrás de treta, de maracutaia, e não de vacinas. Isso que apenas estes três casos vieram à tona até agora.

Diante de tais fatos, reagir como reagiu Braga Netto à manifestação de Omar Aziz – que apontou a existência de uma banda podre das Forças Armadas –, é vestir a carapuça. Braga Netto e toda a turma de generais ligados a Villas Boas sabiam muito bem com quem estavam se associando e que estavam carregando as Forças Armadas junto. Não era segredo para ninguém a ligação de Bolsonaro com as milícias cariocas e muito menos suas práticas de rachadinha. Sabiam, esses generais, que estavam se juntando a um bando de pastores charlatões e empresários picaretas, que vão desde os “veios da Havan” com seus negócios escusos a golpistas de rodoviária como Cristiano Carvalho. Não serão ameaças de “não nos investiguem que reagiremos” que irão absolvê-los por terem colocado as instituições militares nesse lamaçal de corrupção e bandidagem. Serão julgados pela história por sua associação com o genocídio e com a corrupção. Esperamos que a banda sadia, se houver, comece a reagir e a extirpar de suas fileiras essa banda podre que só faz manchar ainda mais a imagem das Forças Armadas.

 

10
Jul21

Dono de empresa envolvida no escândalo da vacina Covaxin é acusado de calote de R$ 8 milhões

Talis Andrade

vacina bolsonaro.jpeg

 

 

Francisco Maximiano, da Precisa Medicamentos, é processado pelo Fundo de Previdência da OAB, e envolvido na comercialização da pior vacina e super cara com o governo Bolsonaro

 

 

por Octávio Guedes, Marcelo Gomes, Marcelo Bruzzi e Anna Carolina Papp

- - -

O empresário Francisco Maximiano, dono da Precisa Medicamentos e queridinho do governo Bolsonaro, não vive só de vacinas. Seus negócios são como o coronavírus, tem várias cepas. Uma delas chama-se Rompro e é acusada de dar calote de R$ 8 milhões no fundo de Previdência da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Rio de Janeiro.

Maximiano está sendo processado pela OABPREV -RJ, que pediu a apreensão de bens da Rompro e do empresário para garantir que os aposentados e pensionistas não paguem a conta. Os jornalistas Marcelo Bruzzi, Marcelo Gomes e Ana Carolina Papp investigaram a história e trazem mais detalhes aqui.

Antes, porém, o blog dá a primeira dose de informação para contextualizar.

Com a "cepa" Global, Maximiano é acusado de dar um golpe no Ministério da Saúde. Recebeu R$ 20 milhões e não entregou os medicamentos.Foto: Reuters/Ueslei Marcelino

O governo pagou R$ 20 milhões referente à compra de remédios de alto custo que nunca chegaram às mãos de pacientes de doenças raras. O contrato foi firmado durante o governo Michel Temer, quando o ministério da Saúde era chefiado pelo atual líder de Bolsonaro na Câmara, deputado Ricardo Barros (Progressistas-PR). Esse calote matou, principalmente, quantas crianças? Taí um morticínio jamais investigado e devidamente punido os assassinos hoje poderosos milionários 

 

Ele (Maximiano) criou, então, uma variante da Global, a Precisa Medicamentos, que é um fenômeno. Conseguiu vender a vacina mais cara de todas para o governo Bolsonaro. Assinou contrato no dia 25 dia de fevereiro e, nove dias mais tarde, o coronel do Exército Élcio Franco, então Secretário Executivo do Ministério da Saúde, mandou ofício pedindo mais US$ 50 milhões.Por que o número 2 do Ministério da Saúde usa um broche de caveira? | VEJA

Coronel do Exército Élcio Franco, um militar de muitas caveiras, substituto do general da ativa Eduardo Pazuello no comando do Ministério da Saúde

 

Funcionários do Ministério alertavam sobre irregularidades no processo que, mesmo assim, ia adiante. O dinheiro já estava reservado. Ia ser pago para uma empresa em Singapura, cujo o nome não aparece no contrato, que aliás, não tinha fiscal naquele momento. Maximiano representou a única vacina cujo processo de negociação teve a participação do presidente Bolsonaro. Ele sinalizou para o governo da Índia que compararia a Covaxin.Deputado quer que Bolsonaro seja enquadrado na Lei de Segurança Nacional |  Poder360

Negacionista, defensor da imunidade de rebanho, e do tratamento precoce (kit cloroquina, kit me engana), capitão Jair Bolsonaro promoveu a ocupação militar do Ministério da Saúde, para comprar vacina super, superfaturada

 

Por fim, outra "cepa empresarial" de Maximiano, a XIS Internet Fibra S.A. mereceu carinho especial do senador Flávio Bolsonaro. Em outubro de 2020, o senador intermediou uma reunião por videoconferência entre Maximiano e o presidente do BNDES, Gustavo Montezano.

Ufa! Agora, voltamos para "cepa" Rompro.

Como vocês, o trabalho de investigação de Gomes e Bruzzi:

Contrato assinado pelo Ministério da Saúde no valor de R$ 1,6 bilhão para a compra de 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin

vacina.jpg

 

As suspeitas de irregularidades em contratos da Precisa Medicamentos e da Global Saúde com o Ministério da Saúde não são as únicas envolvendo o empresário Francisco Maximiano.

O fundo de Previdência da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Rio diz ter sido vítima de um calote. E entrou na Justiça cobrando mais de oito milhões de reais de Maximiano.

A OAB-PREVB Rio de Janeiro é o fundo de pensão, sem fins lucrativos, que atende aos advogados do estado e seus parentes. Atualmente, a OAB-PREV Rio tem cerca de 5 mil cotistas.

Com as contribuições mensais de cada um, o fundo contrata uma gestora para investir no mercado financeiro. E é aí que essa história esbarra em um personagem que veio à tona nas investigações da CPI da Covid sobre a Covaxin: o empresário Francisco Maximiano.

Em 2015, a gestora responsável pela OAB-PREV investiu em debêntures da Rompro Participações S.A. Na ficha da Receita Federal, Maximiano aparece como um dos sócios da Rompro. O endereço cadastrado é uma sala em um centro empresarial, em Barueri, na Grande São Paulo.

Debênture é um título de dívida emitido por uma empresa que não seja uma instituição financeira. Ou seja: em vez de a companhia ir ao banco tomar um empréstimo, ela capta recursos diretamente com investidores. O dinheiro é devolvido com juros num prazo determinado.

Pelo contrato, a Rompro retornaria o investimento para a OAB-PREV Rio em 108 parcelas mensais, com o primeiro pagamento em março de 2016 e o último previsto para 2025. Mas, segundo o Fundo de Pensão dos Advogados do Rio, as parcelas não têm sido pagas pela Rompro desde março de 2018.

Em outubro de 2019, a OAB-PREV entrou na Justiça do Rio de Janeiro para cobrar essa dívida. Até aquele momento, segundo o Fundo de Pensão, o valor era de R$ 8,2 milhões. Nesse processo, a OAB-PREV pediu à Justiça o bloqueio dos bens da Rompro e de Francisco Maximiano, até o valor total da dívida. Em 8 de abril de 2021, a Justiça do Rio mandou a Rompro e Francisco Maximiano pagarem a dívida com a OAB-PREV no prazo de três dias a partir da citação, mas negou o pedido de bloqueio dos bens deles.

Procurada pela GloboNews, o advogado que representa a OAB_PREV Rio de Janeiro não quis gravar entrevista, mas disse que, até agora, a Rompro e Francisco Maximiano não pagaram a dívida.

Em junho, a pedido da OAB-PREV, a Justiça do Rio encaminhou o caso para a Justiça de São Paulo.

Nesse processo, o Fundo de Pensão da OAB do Rio de Janeiro cita o nome de outra empresa de Maximiano e também velha conhecida do Ministério da Saúde: a Global Gestão em Saúde S.A. A OAB-PREV Rio afirma que a Rompro tinha objetivo de investir os recursos captados pelas debêntures na Global, da qual, na época do investimento, o fiador Francisco Maximiano era presidente do conselho de administração e diretor presidente. A Global também é acusada de dar um calote.

O Ministério Público Federal afirma que a empresa ganhou, em 2018, R$ 20 milhões do Ministério da Saúde e não entregou os medicamentos.

E foi com outra empresa de Francisco Maximiano que o governo Jair Bolsonaro negociou a compra de vacinas. A Precisa Medicamentos atuou como intermediária de um contrato assinado pelo Ministério da Saúde no valor de R$ 1,6 bilhão para a compra de 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin.

O contrato foi suspenso depois de denúncias de irregularidades que estão sendo investigadas pela CPI da Covid no Senado.

Ticiano Figueiredo e Pedro Ivo Velloso, advogados de Francisco Maximiano e da Precisa Medicamentos, enviaram um comunicado, dizendo que "esse é um assunto que está sendo tratado na Justiça, no qual não há irregularidades e que todos os esclarecimentos serão prestados às autoridades". "É importante deixar claro que, além de ser um assunto privado, trata-se de uma empresa sem o menor vínculo com a Precisa Medicamentos e com a importação de 20 milhões vacinas, este sim um assunto que deveria ser de interesse público."

vacina fruto conhecimento.jpg

 

 
05
Jul21

OS NEGÓCIOS ESCONDIDOS E GASTOS LUXUOSOS DO EMPRESÁRIO QUE PODE ARRASTAR BOLSONARO PARA O IMPEACHMENT

Talis Andrade

vacina rima com propina.jpg

 

 

Quebras de sigilo da CPI da Covid revelam que Francisco Maximiano, dono da Precisa, ocultou empresas e renda – enquanto faz compras na Prada e Burberry

 

 

DONO OU SÓCIO de nove empresas em endereços valorizados e cujos capitais sociais ultrapassam os R$ 40 milhões de reais, Francisco Emerson Maximiano omitiu em sua declaração de imposto de renda que tem participação em seis delas. São justamente as mais valiosas e com negócios com o governo federal, como a Precisa Medicamentos e a Global Gestão em Saúde. As informações constam em documentos da Receita Federal entregues à CPI da Covid, analisados pelo Intercept.

A Precisa está no olho do furacão após a denúncia apresentada pelo deputado federal Luís Miranda, do DEM do Distrito Federal, sobre irregularidades na compra da vacina Covaxin. O político diz que o irmão dele, um servidor do Ministério da Saúde, sofreu pressão para aprovar o negócio, aparentemente suspeito.

O detalhe que mais causou alarme foi a nota fiscal para o pagamento antecipado de 45 milhões de dólares do Ministério da Saúde a uma empresa que não aparecia no contrato, a Madison Biotech, sediada em Singapura, um paraíso fiscal. Miranda levou as suspeitas para Jair Bolsonaro, e o presidente teria respondido que se tratava de “rolos” de Ricardo Barros, deputado federal pelo PP do Paraná e líder do governo na Câmara.

A Precisa fez a intermediação do negócio entre o governo e a farmacêutica indiana Bharat Biotech, fabricante da Covaxin. A empresa de Maximiano já estava na mira de autoridades mesmo antes de Miranda colocar a boca no mundo. Ela é suspeita de vender testes de covid-19 superfaturados e em quantidade superior à necessária ao governo do Distrito Federal, comandado por Ibaneis Rocha, do MDB.

Apesar dos vários negócios suspeitos que o rodeiam, ele informa oficialmente às autoridades tributárias levar uma vida frugal, de acordo com documentos.

Da declaração pessoal de imposto de renda dele, entregue à Receita Federal com atraso em 7 de junho passado e que faz parte do acervo da CPI,  constam rendimentos de apenas R$ 52 mil em um ano. O valor equivale a uma renda mensal de R$ 4,3 mil, montante que Maximiano gastou em apenas uma compra de supermercado, em Brasília, no dia 27 de março de 2020, segundo os documentos da comissão, requisitados pelos senadores a partir da quebra de sigilo fiscal do empresário.

O pagamento no débito foi feito na Super Adega, mercado que oferece vinhos e bebidas luxuosas em Brasília. Essas informações constam nos extratos bancários da conta do empresário no C6 Bank. Já descontados os gastos daquele dia, o saldo dessa conta corrente estava em R$ 19.620,66.

Para conseguir os extratos de Maximiano, CPI quebrou o sigilo fiscal do empresário.

 

O histórico de movimentação revela ainda pagamentos à vista em lojas de luxo, como R$ 3 mil na Prada, R$ 1,9 mil na Burberry, em São Paulo, e R$ 890 na Casa Ouro, em Brasília.

Os documentos revelam gastos aparentemente incompatíveis com a renda declarada do empresário.

 

Em outro documento da quebra de sigilo, um termo de refinanciamento de uma moto, identificamos um endereço em que Maximiano declarou ter residência em Brasília. A casa indicada fica no Setor de Mansões Dom Bosco, no Lago Sul. Como o próprio nome do bairro indica, é uma das áreas nobres da capital federal.

A moto é uma BMW R 1200 GS Adventure. Em resposta à CPI, a montadora indicou que pelo veículo, entre janeiro de 2020 e maio de 2021, Maximiano já pagou R$ 38 mil em carnês emitidos pelo Santander. O modelo, do ano 2019, custa em torno de R$ 85,4 mil, segundo a tabela Fipe.

Documento sobre financiamento de moto BMW de alto padrão revelou endereço declarado de Maximiano em bairro de mansões de Brasília.

Maximiano tinha depoimento marcado na CPI para a quinta-feira. Mas, na quarta-feira, conseguiu um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal que lhe dá o direito de ficar calado perante os senadores, e a audiência foi adiada. Como ele é investigado pela CPI e pela Polícia Federal por causa dos testes vendidos ao DF, ganhou o direito de não produzir provas contra si mesmo. A nova data ainda do depoimento ainda não foi anunciada.

Francisco Emerson Maximiano

Francisco Emerson Maximiano. Foto: Reprodução

Endereços top

Na declaração de imposto de renda pessoa física de 2021, Maximiano declarou ser sócio da Frasdec Assessoria e Consultoria de Investimentos, 6M Participações e de uma empresa individual com o nome dele – além da Drogaria Interfarmácia, já extinta. A empresa que leva o seu nome tem como endereço um condomínio de luxo no Morumbi, bairro de classe alta na zona sul da capital, e é considerada inapta pela Receita Federal por omissão de informações.

Mas um levantamento da Receita Federal que também está em posse da CPI revela que ele também é sócio ou dono da Precisa Medicamentos, Global Gestão em Saúde, Primares Holding e Participações, Farmaserv, BSF Gestão em Saúde e SaúdeBank Assessoria Estratégica e Financeira.

A Global, por exemplo, é uma sociedade anônima com capital social de mais de R$ 26 milhões e da qual ele é listado na Receita Federal como presidente.

Com isso, Maximiano consegue o prodígio de repetir em 31 de dezembro de 2020 o patrimônio que possuía 365 dias antes: exatos R$ 288.991,29. Mas é improvável que o valor seja verdadeiro.

Deixar de declarar participações em empresas na declaração de imposto de renda não configura uma fraude tributária. Mas os senadores da CPI podem querer perguntar a Maximiano porque ele deixou de informar isso à Receita e também se não recebeu nenhum pagamento isento ou sujeito a tributação exclusiva de empresas como a Precisa (capital social de quase R$ 13 milhões e negócios de R$ 15, 7 milhões com o Ministério da Saúde), a BSF Gestão em Saúde (capital social de R$ 2 milhões, que não tem negócios com o  governo federal) ou a própria Global.

Delegado da Polícia Civil e membro da CPI, o senador Alessandro Vieira, do Cidadania de Sergipe, nos disse que, apesar dos depoimentos relevantes e “midiáticos”, o trabalho silencioso de quebras de sigilo e análise de dados é mais efetivo para a CPI.

“Os indícios são de ocultação de patrimônio e sonegação fiscal, que podem apontar, com o aprofundamento das investigações, para enriquecimento ilícito e lavagem de dinheiro”, argumentou o senador, falando sobre Maximiano.

A Precisa funciona numa avenida de um parque industrial em Itapevi, na região metropolitana de São Paulo. Segundo os documentos da Receira, Maximiano é sócio-administrador da companhia, que informa à Receita Federal um sócio pessoa jurídica: a Global.

Esta, por sua vez, tem como endereço declarado o 28º andar de um imponente arranha-céu envidraçado em Barueri, também na grande São Paulo. A Global divide o endereço a BSF Gestão em Saúde, da qual é sócia. O prédio na Avenida Tamboré também é indicado pelo empresário à Receita Federal como seu domicílio

Centro empresarial Canopus Corporate Alphaville

A Global, uma das empresas de Maximiano, tem endereço declarado em prédio de alto padrão em Barueri.

 

Outras empresas apontadas como de Maximiano pela Receita funcionam em endereços igualmente caros da capital paulista. A Primares Holding e Participações e a SaúdeBank Assessoria Estratégica e Financeira dividem duas salas comerciais num edifício com fachada de granito e vidros espelhados da avenida Faria Lima, Itaim Bibi, bairro de alguns dos escritórios mais caros de São Paulo. No mesmo prédio, um andar inteiro está disponível a um aluguel mensal de R$ 90 mil.

A não mais que 100 metros de distância, na mesma avenida e num prédio igualmente nababesco, está registrada a 6M Participações, em que Maximiano é sócio da esposa, Andrea Cecília Furtado Maximiano.

Da 6M Participações, entre 2020 e 2021, Maximiano recebeu R$ 137 mil. As transferências foram efetivadas em 13 depósitos feitos na sua conta do C6 Bank. Os valores variaram de R$ 2 mil a R$ 24 mil por transferência.

Nós procuramos os advogados Ticiano Figueiredo e Pedro Ivo Velloso, que defendem a Precisa Medicamentos e Maximiano. Por e-mail perguntamos:

  • Por que Maximiano não declara participação em todas empresas das quais é sócio ou dono?
  • Por que declara rendimentos de R$ 52 mil em 2020 se teve gastos e movimentações acima disso?
  • Por que o valor patrimonial seguiu exatamente igual em 2020 e 2019?
  • A casa do Lago Sul, que declarou à BMW ser sua residência em 2019, e a moto BMW que ele paga mensalmente estão registradas em nome de quem? Por que não estão declarados no imposto de renda?

Em nota, os advogadores não responderam às perguntas. Eles se disseram perplexos com “a quantidade de informações inverídicas e maliciosas que estão sendo difundidas, com o único objetivo de gerar um caos político e prejudicar a vacinação da população brasileiro”.

“A Precisa Medicamentos é a representante do laboratório indiano Bharat Biotech no Brasil e seguiu em todas as tratativas com as autoridades os mais rigorosos critérios de integridade e ética, e atendeu de imediato todas as exigências do Ministério da Saúde para a venda da vacina Covaxin. A empresa e Francisco Maximiano estão à disposição da CPI para esclarecer os fatos, rebater as ilações maliciosas difundidas com o objetivo de frustrar uma contratação de suma importância para todos”, acrescentaram os representantes de Maximiano.

covaxin

 

As aventuras de Maximiano na Índia

As suspeitas sobre os negócios de Maximiano vêm desde o governo Michel Temer, quando Ricardo Barros foi ministro da Saúde. Entre 2016 e 2018, a Global recebeu por medicamentos que nunca entregou. Em ação na justiça, o Ministério Público Federal constatou irregularidades e tenta há quase três anos fazer com que a empresa devolva R$ 19 milhões e pague indenização de R$ 100 milhões. O caso rendeu uma denúncia de improbidade contra Barros, a Global e outros envolvidos nas negociações. Barros e a empresa negam irregularidades.

Mas foi com Bolsonaro no Palácio do Planalto que a empresa viu seus negócios com o governo federal explodirem em espantosos 6.000%. Talvez isso explique a desenvoltura com que Maximiano transitou pela Índia para negociar a compra de vacinas Covaxin pela Precisa, contando em seus périplos com a ajuda da embaixada brasileira em Nova Délhi.

“Recebi, em 6 de janeiro [de 2021], representantes da Associação Brasileira das Clínicas de Vacinas, em visita à Índia para tratar com a companhia indiana Bharat Biotech da importação de vacinas contra a covid-19 para o Brasil”, relatou, em telegrama reservado ao Itamaraty, o embaixador André Aranha Corrêa do Lago.

No documento, datado de 7 de janeiro passado e que está em posse da CPI, ele prossegue, rememorando uma reunião ocorrida na embaixada: “Falou, em nome dos membros da delegação, o senhor Francisco Maximiano, presidente da Precisa Medicamentos. Indicou que a presente visita à Índia era, ao mesmo tempo, parte de uma relação comercial já existente, que se diversificou em vista da pandemia, e de um esforço de estreitamento das relações com companhias indianas, razão pela qual o perfil da delegação era ‘mais elevado do que o habitual'”.

Noutro telegrama, datado de 5 de março, o embaixador Aranha informa que “representantes da empresa brasileira Precisa Medicamentos retornam à Índia para negociar com a Bharat Biotech aumento do número de doses da Covaxin”.

“O presidente da Precisa Medicamentos atualizou-me com relação às tratativas com a Bharat Biotech, que se haviam iniciado em missão anterior à Índia. Até o momento, 37 milhões de doses de Covaxin teriam sido contratados, e a nova visita da empresa brasileira à parceira indiana, a iniciar-se na próxima segunda-feira, 8/3, teria como objetivo negociar o aumento da quantidade de doses a serem adquiridas”, explica Aranha.

“Do número inicial de doses, 20 milhões foram comprados pelo Ministério da Saúde brasileiro, em contrato celebrado em 25/2, com opção de compra de outras 12 milhões de doses. A empresa teria reservado as 5 milhões de doses restantes para o setor privado nacional”, prosseguiu o diplomata.

Aranha também escreveu: “Maximiano adiantou que a relação da Precisa Medicamentos com a Bharat Biotech, que tem-se estreitado nas últimas semanas, deverá evoluir, no futuro próximo, para o estabelecimento de uma ‘joint venture’ no Brasil, a chamar-se ‘Bharat Latam’. Destacou que, com a ‘joint venture’, seria possível utilizar a expertise e a capacidade produtiva da Bharat Biotech em diversos tipos de vacina, para explorar o potencial do mercado privado de vacinação do Brasil, aludindo à concentração desse mercado entre três empresas tradicionais do setor farmacêutico”.

Ao contrário do patrimônio declarado, os planos de Maximiano eram vultosos.

 

Correção: 4 de julho, 11h50

Uma versão anterior deste texto informava incorretamente que o pagamento requerido pela Madison Biotech era de R$ 45 milhões. Na verdade, era de 45 milhões de dólares – ou aproximadamente R$ 225 milhões de reais, pela cotação de sexta-feira, 2 de julho. A informação foi corrigida.

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26
Jun21

EMBAIXADOR BRASILEIRO NA ÍNDIA AVISOU GOVERNO BOLSONARO QUE COVAXIN TEVE ‘PROCESSO OPACO’ DE AUTORIZAÇÃO

Talis Andrade

(Agra - Índia, 27/01/2020) Presidente da República Jair Bolsonaro durante visita ao Taj Mahal.Foto: Alan Santos/PR

 

Telegrama diplomático foi enviado dois meses antes do governo brasileiro comprar 20 milhões de doses da vacina

 

26
Jun21

VÍDEO: INTERCEPT BATEU NA PORTA DA EMPRESA DE SINGAPURA QUE PEDIU US$ 45 MILHÕES ADIANTADOS PELA COVAXIN

Talis Andrade

Site mostra a sede da Madison Biotech – Angelo RigonBatemos na porta da empresa que pediu adiantamento pela CovaxinCoronavírus - Empresa que cobrou US$ 45 mi adiantados do governo por  Covaxin funciona em prédio sem identificação de Singapura - 25/06/2021

Uma mulher disse que ali, num prédio sem qualquer sinalização da empresa, a Madison Biotech está registrada

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