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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

27
Jul23

Justiça condena União, Funai e MG por campo de concentração indígena durante ditadura militar

Talis Andrade
A ditadura militar brasileira removeu o povo Krenak de suas terras e o levou para um campo de concentração chamado Fazenda Guarani, onde indígenas de diversas etnias eram submetidos a trabalho forçado, tortura e outros tipos de violência física e psicológica. A população Krenak foi reduzida a apenas 50 indivíduos durante aquele período. Foto: Márcio Ferreira, 1989 / Instituto Socioambiental (ISA).

O povo Krenak foi expulso de suas terras e obrigado a viver confinado em uma fazenda. O governo ainda criou uma prisão indígena e formou uma guarda composta por pessoas de várias etnias para causar desagregação da cultura

Por Thais Pimentel, G1

A 14ª Vara Federal de Minas Gerais condenou a União, a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o governo do estado por violações dos direitos humanos e civis do povo indígena Krenak – que vive na Região do Vale do Rio Doce – durante a ditadura militar.

Em 1972, homens, mulheres e crianças foram expulsos de suas terras pelo governo e obrigados a viver confinados na Fazenda Guarani, pertencente à Polícia Militar (PM), em Carmésia, a mais de 300 quilômetros de distância de suas terras. A medida foi tomada para facilitar a ação de posseiros vizinhos que tomaram os mais de 4 mil hectares dos indígenas.

“Era um campo de concentração. Famílias inteiras ficaram confinadas, presas mesmo, por anos nesta fazenda”, disse o procurador da República Edmundo Antônio Dias, autor da ação que tramitava há seis anos.

Em 1969, o governo militar já havia criado o Reformatório Agrícola Indígena Krenak, um presídio que chegou a abrigar 94 pessoas de 15 etnias, vindas de 11 estados brasileiros.

“Eles não sabiam por que estavam sendo presos. Alguns eram detidos por causa de bebida ou por terem saído de áreas demarcadas. Não havia julgamento. A tortura era comum. Eles ainda eram obrigados a fazer trabalhos forçados”, disse o procurador.

 

Guarda e tortura

 

Outra violação foi a criação da Guarda Rural Indígena, composta por pessoas das aldeias que vigiavam e puniam os presos. A primeira turma foi treinada pela Polícia Militar de Minas Gerais e era composta por 84 indígenas de diferentes etnias e regiões do país, entre elas Craós (Maranhão), Xerente (Goiás), Carajás (Pará), Maxacali (Minas Gerais) e Gaviões (Tocantins).

A medida causou desagregação dentro do grupo, ferindo a cultura e o espírito de irmandade entre os povos.

A única foto que documenta uma cena de tortura durante a ditadura militar é de um indígena em um pau-de-arara sendo "exibido" em Belo Horizonte, na presença de autoridades como secretários de estado. O evento era a formatura da 1ª turma da Guarda Rural Indígena.

 

O que determina a Justiça

 

Segundo a decisão da juíza federal Anna Cristina Rocha Gonçalves, a União, a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o governo do estado terão que realizar, em um prazo de seis meses, "após consulta prévia às lideranças indígenas Krenak, cerimônia pública, com a presença de representantes das entidades rés, em nível federal e estadual, na qual serão reconhecidas as graves violações de direitos dos povos indígenas, seguida de pedido público de desculpas ao Povo Krenak".

A Funai também terá que concluir o processo administrativo de delimitação da terra de Sete Salões, considerada sagrada para os indígenas. Só em 1993 que os Krenak conseguiram parte dos 4 mil hectares originais de volta. Porém, esta área ficou de fora.

“A decisão acontece em um momento muito importante que é a discussão do marco temporal das terras indígenas. Se esta questão vigorasse, e não o que determina a Constituição, estas pessoas jamais teriam conseguido retornar para sua terra. Porque isso só aconteceu depois da constituição de 88. Eles ainda estavam na Fazenda Guarani’, disse o procurador.

26
Jul23

O Holocausto originário brasileiro durante os anos de chumbo

Talis Andrade

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Um triste ensaio sobre o genocídio de povos originários durante os anos 1970 e suas consequências nos dias atuais

Por Ben hur Nogueira

Em 1969 em Resplendor, pacata cidade mineira de poucos habitantes localizada no Vale do Rio Doce, a 440 km de distância da capital Belo Horizonte, era instaurada uma das páginas mais ensurdecedoras da história Sul-Americana e, principalmente, brasileira durante a ditadura militar. Era criado pelos militares e financiado por empresários o Reformatório Krenak, comandado pelo capitão Manoel Pinheiro, chefe da polícia do estado de Minas Gerais: um ambiente tomado pela tortura, trabalho análogo à escravidão, estupro, onde boa parte dos confinados, de origem originária, era submetida a tratamentos mentais de razão pífia e desumana, influenciados por militares a não falar sua língua nativa.

Estima-se que mais de 100 indivíduos foram entregues a este ambiente escusado, sendo eles pertencentes a mais de 10 regiões diferentes do Brasil, e submetidos a longas sessões de tortura e repressão cultural.

Nenhuma indenização foi entregue a quaisquer família destes e, apesar de ser fechado em 1972, este mórbido e fúnebre ambiente deixou um triste legado inacabado no que tange ao genocídio originário brasileiro, um genocídio que apesar de longínquo, tendo durado mais de 520 anos em nosso continente, não teve fim.

De antemão, é importante ressaltar que em 1500, antes da invasão colonialista portuguesa, eram aproximadamente 3 milhões de habitantes originários que residiam em nossa pátria-mãe. Um número bastante discrepante do indicador divulgado ano passado, que apontou apenas 1.626.876 deles habitando e ainda resistindo contra constantes invasões de fazendeiros e donos de terras – algo remanescente dos tempos colonialistas, quando a possessão de terras, e eventualmente suas riquezas naturais, valiam mais que uma vida.

Outrossim, além do Reformatório Krenak, havia outros ambientes financiados pelo governo brasileiro que tornavam as práticas tortuosas cada vez mais cotidianas na vida dos originários.

Um desses, a famigerada Fazenda Guarani, localizada a 200 km de distância de Belo Horizonte, assim como o Reformatório Krenak, foi uma espécie de “campo de concentração-originária” estabelecida e financiada por militares e membros do governo em 1973, um ano depois do fechamento do Reformatório.

Militantes originários resistentes à repressão autoritária foram entregues a esse sombrio ambiente, onde mais uma vez técnicas de tortura ensinadas em escolas clandestinas – que de certo modo eram financiadas pelo governo daquela época – eram postos em prática.

Qualquer originário que resistisse seria entregue e, segundo relatos da época, uma vez levado era tratado como animal ao ser despejado em vagões.

Enquanto na televisão a mídia patrocinada pelos militares trazia canções populares e visões de um país utópico sem miséria, a realidade trazia elementos antagônicos. Eram elementos mórbidos e sem cor. Era um Brasil que nunca vimos em qualquer livro de história. Um país tomado por covardes e assassinos que nunca pagaram por seus crimes, mas receberam cortesias como nomes de pontes e viadutos. Isso poderia ser o fim, mas, contudo, parece ser apenas o começo de um ensaio sombrio e porventura longinquamente inacabado, já que nos anos sucessores veríamos tragédias atrás de tragédias. Veríamos um país dividido por colonizadores e aqueles que morreriam lutando por uma terra que era sua por direito, um enredo remanescente de qualquer conto do escritor mineiro Guimarães Rosa (continua)

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