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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

23
Out20

“A PF, em larga escala, é comandada pelos EUA”, diz autor de livro sobre a Lava Jato (vídeo)

Talis Andrade

 

Por Daniel Giovanaz, no Brasil de Fato - O almirante Othon Luiz Pinheiro, considerado o pai do programa nuclear brasileiro, foi vigiado de perto pela Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos (CIA) durante a ditadura civil-militar (1964-1985). De volta à democracia, tornou-se alvo do Poder Judiciário e recebeu a maior pena entre todos os condenados na operação Lava Jato.

Para entender como os dois episódios se conectam, é preciso ler A Geopolítica da Intervenção (Geração Editorial, 2020), escrito pelo advogado Fernando Augusto Fernandes durante a quarentena. Em 19 capítulos, o autor faz uma revisão histórica da doutrina de segurança nacional à Lava Jato, desnuda a visão de mundo de membros do Poder Judiciário e denuncia a submissão das instituições a interesses estrangeiros.

A história do almirante Othon não está descrita no livro, mas na entrevista concedida por Fernandes ao Brasil de Fato. Defensor de investigados em várias fases da operação, ele analisa as relações familiares por trás da Lava Jato e aspectos religiosos inerentes à atuação de figuras como o procurador Deltan Dallagnol e o ex-juiz Sergio Moro.

Nesta edição do Brasil de Fato Entrevista, o autor da obra relembra sua participação em tentativas de frear ou reverter a perseguição política a réus na Lava Jato, como o ex-presidente Lula (PT).

Sobre a saída de Moro do governo Bolsonaro e o enfraquecimento da operação, o advogado alerta: “A Lava Jato não está morta.”  

 

01
Jul20

Diálogos vazados mostram traiçoeira proximidade entre PF, procuradores e o FBI no caso da Lava-Jato

Talis Andrade

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Leslie R. Backschies, a segunda à esquerda, e mais quatro agentes do FBI visitaram o Grupamento de Radiopatrulha Aérea (GRPAe) da Polícia Militar do Estado de São Paulo (PMESP)

 

por Natalia Viana, Rafael Neves/ Agência Pública/The Intercept Brasil


* Agente que atuou em investigações da Lava-Jato no Brasil virou chefe da Unidade de Corrupção Internacional do FBI
* Polícia americana tem foco crescente em combater corrupção na América do Sul e abriu escritório para isso em Miami
* Deltan e PF preferiram tratar de extradição diretamente com americanos: “entendemos que não vale o risco de passar pelo executivo”, escreveu o procurador


Nos seus pouco mais de 20 anos no FBI, a agente especial Leslie R. Backschies esteve diversas vezes no Brasil. Backschies, cujo nome do meio é Rodrigues, com a grafia portuguesa, é fluente na língua nacional e vem ao país desde pelo menos 2012, ano em que há um primeiro registro de uma visita sua à Polícia Militar de São Paulo. É, também, a única foto que se encontra na internet dessa notável agente do FBI – embora esteja longe da câmera e de óculos escuros. O objetivo daquela visita era firmar parcerias para capacitação de policiais para responder a ameaças terroristas antes da Copa de 2014.

Ao longo de sua carreira, Leslie trabalhou na divisão de Segurança Nacional do FBI, atuando nas áreas de contraterrorismo e resposta a armas de destruição em massa – ela foi co-autora de um guia sobre armas biológicas para o site Jane’s Defense.

Trabalhando para a Divisão de Operações internacionais do FBI, em 2012 Leslie mudou-se para a América do Sul, passando a viver em local não revelado, de onde supervisionava os escritórios do FBI nas capitais do México, Colômbia, Venezuela, El Salvador e Chile, além dos agentes do FBI lotados na embaixada em Brasília. No mesmo posto, comandou operações da polícia federal americana em Barbados, República Dominicana, Argentina, Panamá e no Canadá.

Mas nos últimos anos, a carreira de Leslie deu uma guinada. De especialista em armamentos e terrorismo, ela passou a se dedicar a investigar casos de corrupção e lavagem de dinheiro na América Latina – com destaque para o Brasil.

Em 2014, Leslie foi designada pelo FBI para ajudar nas investigações da Lava Jato. A informação consta de reportagem do site Conjur sobre evento promovido pelo escritório de advocacia CKR Law em São Paulo, em fevereiro de 2018, que contou com presença dela. A atuação de Leslie foi considerada “um trabalho tremendo” e “crítico para o FBI” pelos seus supervisores, segundo seu ex-chefe afirmou em um evento sobre o combate à corrupção em Nova York no ano passado acompanhado por uma colaboradora da Pública.

Leslie se tornou especialista na legislação FCPA, Foreign Corrupt Practices Act, uma lei americana que permite que o Departamento de Justiça (DOJ) investigue e puna nos Estados Unidos atos de corrupção praticados por empresas estrangeiras mesmo que não tenham acontecido em solo americano. Foi com base nessa lei que o governo americano investigou e puniu com multas bilionárias empresas brasileiras alvos da Lava Jato, dentre elas a Petrobras e a Odebrecht, que se comprometeram a desembolsar mais de US$ 4 bilhões em multas para os EUA, Brasil e Suíça.

Hoje morando de novo nos Estados Unidos, Leslie comanda a Unidade de Corrupção Internacional do FBI, cuja grande novidade no ano passado foi um escritório aberto em março em Miami apenas para investigar casos de corrupção na América do Sul, o Miami International Corruption Squad.

A unidade conta com seis agentes especiais, um supervisor e um contador forense que atuam na cidade conhecida por receber exilados cubanos, venezuelanos e, mais recentemente, uma enxurrada de ricos brasileiros. “Você não pode apenas ter um agente ou dois em um escritório em campo trabalhando com isso…. Não dá para trabalhar com isso apenas duas ou três horas por semana. Assim não vai funcionar. Você precisa de recursos dedicados em período integral”, afirmou Leslie à à Agência de Notícias Associated Press.

O esquadrão para América do Sul é o quarto esquadrão do FBI especializado em corrupção internacional. Todos foram abertos nos últimos cinco anos – ao mesmo tempo que a maior investigação de corrupção da história brasileira varria o continente.

A reportagem pediu uma entrevista a Leslie Backschies, mas não obteve resposta até a publicação.

Cinco anos depois, Leslie parece bastante satisfeita com os resultados. “Nós vimos muita atividade na América do Sul — Odebrecht, Petrobras. A América do Sul é um lugar onde… Nós vimos corrupção. Temos tido muito trabalho ali”, disse ela à Agência de Notícias Associated Press no começo de 2019.

“Não dá pra ser melhor do que isso”, ela afirmou no evento da CKR Law em São Paulo. “Nossa relação com o Brasil é o modelo de colaboração para países lutando contra crimes financeiros”.

“Isso é apenas o começo. Temos o enquadramento correto, a vontade e os fundos para continuar trabalhando juntos” [Continua]

 

 

04
Jun20

Até na Justiça dos Estados Unidos Tacla Duran derrota Sergio Moro

Talis Andrade

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A jornalista Mônica Bergamo com o título

"PGR vê credibilidade em relato de

acusador de Moro

por vitórias judiciais no exterior",

publica hoje na Folha de S. Paulo, que "Augusto Aras já recebeu documentos e perícias". Diante dos fatos, não tem como lavar as mãos como fizeram, por corporativismo e lavajatismo, os seus antecessores Rodrigo Janot e Raquel Dodge.

O portal 247 publica: Em 2017, o advogado Tacla Duran, hoje exilado na Espanha, disse à Folha que fez pagamentos a um advogado amigo de Moro que prometeu suavizar sua situação na Lava Jato.

Os procuradores estão impressionados com o fato de Duran ter conseguido vitórias importantes nos EUA e na Espanha em relação à Lava Jato, informa a jornalista Mônica Bergamo em sua coluna na Folha de S.Paulo.

O fato de os dois países terem sistemas jurídicos sólidos reforça a credibilidade de Duran. Preocupado com a reabertura do caso, Moro reage dizendo que Duran é um criminoso sem credibilidade. 

O mesmo Moro como juiz aceitou como verdadeiros os depoimentos de Alberto Youssef, chefe da Máfia Libanesa dos tráficos internacionais de moedas, drogas, pedras preciosas, que denunciou Leo Pinheiro, que denunciou o ex-presidente Lula, que preso, impedido de ser candidato, garantiu a eleição de Jair Bolsonaro, candidato a presidente da Polícia Federal, do MPF, dos juízes e desembargadores da lava jato. Idem a delação de Antonio Palocci, como peça de propaganda política.  

 

 

24
Mai20

A PF não mudou. Apenas dirige o “show’ da direita

Talis Andrade

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por Fernando Brito

Manchete da Folha de S. Paulo, Italo Nogueira e Camila Mattoso contam que a defesa de Fabrício Queiroz soube, antecipadamente, de um inquérito da Polícia Federal que o tinha como investigado, em agosto de 2019.

Leia-se, portanto, que Bolsonaro e sua família foram, direta ou indiretamente, inteirados do “pepino” que havia no inquérito sigiloso.

O “pequeno detalhe” é que a direção da Polícia Federal deste vazamento é a mesma da Polícia Federal de outubro de 2018, quando o clã bolsonarista foi avisado para demitir Queiroz e a filha.

Em tese, portanto, da confiança do diretor geral Maurício Valeixo e, portanto, de Sérgio Moro.

Não há provas de quem seja o “vazador”, sob as ordens de quem agia e qual o grau de confiança que tinha dos seus chefes, na PF e no Ministério da Justiça.

Mas há elementos para ser compreendido – para quem não havia ainda entendido até agora – que é mais do mesmo uso político da Polícia Federal, servindo a Bolsonaro como servia a Sergio Moro, para promover ou destruir reputações políticas.

A Polícia Federal, até com filme heroico, santificou Moro, mas seu Deus é a direita e Bolsonaro seu mensageiro.

É o castigo dado a um país – como fez a Itália com os promotores da Manu Politi – que entregou ao policialismo os seus destinos políticos.

Informação, poder e a fantasia moralista são a estrada pela qual, seja polícia ou milícia, em nome da lei e da ordem, chega ao poder e à tirania.

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21
Mai20

A impressão de que Polícia Federal e Ministério Público são incontroláveis, sem hierarquia

Talis Andrade

 

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II - Operadores do ordenamento jurídico falharam com a "lava jato"

 

por Emerson Voltare

 

ConJur — Na entrevista em que anunciou que deixava o governo, o então ministro Sergio Moro [Justiça] citou vocês [governos Lula e Dilma]. Disse que a Polícia Federal não sofreu interferência direta como viria a sofrer neste atual governo. Não deixa de ser um elogio, mas também não foi temerário deixar o consórcio formado a partir da 13ª Vara Federal de Curitiba operar com tamanha liberdade?
José Eduardo Cardozo — É uma crítica que tenho ouvido muitas vezes. Lembro da época que até fui criticado por alguns companheiros. Por adversários também, quando uma investigação chegava aos deles.

Diziam que estava instrumentalizando a Polícia Federal contra eles. Fui até chamado no Congresso. Estava em curso uma investigação que falava do cartel do Metrô de São Paulo. Tinha mandado abrir uma investigação e me chamaram para dizer que eu estava intimidando o Congresso, instrumentalizando a Polícia Federal.

Falava: das duas, uma, ou eu não controlo ou eu instrumentalizo. Decidam. Na verdade, não era nem controlar nem instrumentalizar, é saber respeitar o Estado de Direito, só isso. Não se  pode interferir numa investigação, a não ser em casos de abusos, abrindo inquéritos. E isso foi feito em todos os casos por mim quanto pelo Leandro Daiello, que era o diretor-geral da Polícia Federal.

 

ConJur — Mas houve muito abuso, não? Fica a impressão de que Polícia Federal e Ministério Público são incontroláveis, sem hierarquia.
Cardozo — Estes órgão têm autonomia investigativa, mas não têm autonomia para cometer abusos. Várias inquéritos foram abertos quando se tinha vazamento. Aliás, vou ser bem sincero. Na "lava jato", parte daquilo que a imprensa falava em vazamento, era Moro quem já tinha levantado o sigilo de inquérito. Então não havia ilegalidade. Agora, se alguém da força-tarefa indicava aos jornalistas páginas do processo... Mas era público.

Muitas vezes a Polícia Federal é a parte visível das operações porque faz a busca, a prisão. A Polícia Federal apenas cumpre o que um juiz determina.

O ministro da Justiça não tem como punir delegado, mesmo que ele ache que a ordem judicial é arbitrária. Você está cumprindo ordem judicial. Quem tem que fiscalizar abusos do Judiciário não é o ministro da Justiça. É o CNJ (conselho da Justiça), o CNMP (conselho do Ministério Público).

Essa má compreensão das instituições que funcionam num Estado de Direito tem uma mentalidade autoritária. Cobra agir com os amigos diferente do que se age com os adversários. E isso fazia com que nós sofrêssemos muitas críticas de descontrole. (Continua)

 

 

18
Mai20

A cara de pau de Moro com o ‘aviso’ da PF a Bolsonaro

Talis Andrade

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por Fernando Brito

Tijolaço

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É absolutamente cínico – e nisso não há novidade – a reação do Sr. Sergio Moro dizendo que pretende pedir que seja tomado o depoimento do suplente de Flávio Bolsonaro, Paulo Marinho, de que a Polícia Federal tenha “segurado” a investigação do caso Fabrício Queiroz para não prejudicar eleitoralmente Jair Bolsonaro e ainda mandado avisar o então candidato para que ele e o filho demitissem o ex-PM e sua filha, esta funcionária do seu gabinete na Câmara.

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Ora, Moro não apenas escolheu sozinho o diretor da PF como, no mínimo desde que começaram as pressões para trocar a direção do órgão no Rio de Janeiro para, supostamente, favorecer o já presidente da República. É inacreditável que, dentro da estrutura da corporação no Rio o “freio” na investigação – que envolvia muitos agentes, senão também outras autoridades policiais – e que não se soubesse do “segura aí” de um processo que envolvia seis deputados e o próprio presidente da Assembleia Legislativa.

Aliás, em movimento inverso, Moro não se acanhou em “acelerar” a liberação do desacreditado acordo de delação premiada de Antonio Palocci a poucos dias do pleito, numa evidente manobra para causar desgaste à candidatura do PT.

Maurício Valeixo e Ricardo Saadi – o primeiro superintendente afastado da PF do Rio – não sabiam desta história, ao menos de ouvir dizer? Admitir isso seria admitir que são dois péssimos policiais, que não sabem o que se passa debaixo de seus narizes.

O próprio ex-ministro da Justiça, antes mesmo de tomar posse, já tinha conhecimento do relatório do Coaf, então na sua pasta, implicava Fabrício Queiroz e o gabinete do “Filho 01”, como a Folha publicou em manchete no início de dezembro de 2018.

E vem Moro dizer que foi “corajoso” o depoimento de quem guardou por dois anos segredo sobre uma grave manipulação policial de um inquérito, com confessado objetivo eleitoral?

O senso de Justiça de Moro depende de suas conveniências?

A Lei é para todos, mas só quando interessa?

 

14
Mai20

O falso testemunho que libertou a doleira Nelma Kodama e enforcou os delegados dissidentes da lava jato

Talis Andrade

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Fanton começou a cair quando recusou-se a retirar dos autos um reconhecimento errado feito por Nelma. (Foto: Reprodução)

Crimes da Lava Jato (II): falsa delação “por um prato de comida”

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Assim como Nelma serviu para Fanton concordar em instaurar o IPL 737, ela também provocou o desentendimento dele com os delegados da “República de Curitiba”. Diante de um álbum de fotografia dos servidores da superintendência, a doleira apontou alguns policiais como tendo estado na custódia. Um deles foi o agente Fábio, lotado no Núcleo de Inteligência Policial (NIP), então chefiado pela delegada Daniele Gossenheimer Rodrigues, a esposa de Romário de Paula.
 

Era falso. Fábio, no período citado pela testemunha estava em missão fora de Curitiba. Fanton foi pressionado, inicialmente por Daniele, mas depois pelos demais, como o delegado Mauricio Moscardi Grillo, a retirar isso do inquérito. Não aceitou. Propôs que apresentassem as explicações necessárias para explicar os fatos, inocentando o indicado. Esse desentendimento demonstro aos delegados da Força Tarefa que a condução daquele inquérito fugiria ao controle dos mesmos. Foi o que bastou para selarem a decisão de afastá-lo da investigação.

O Agente Fábio, porém, não foi o único a sofrer uma falsa acusação da doleira. Ela também apontou o delegado Rivaldo Venâncio como contumaz visitante da custódia para conversar com os presos da Lava Jato. Venâncio, porém, comprovou que esteve ali uma única vez, na companhia de procuradores da República, acompanhando uma vistoria. Após isso, representou criminalmente contra a doleira junto ao Ministério Público Federal

A partir da sua representação, não houve alternativa ao MPF. A procuradora da República Yara Queiroz Ribeiro da Silva Sprada, que atuou em processos contra os chamados “Dissidentes da PF”, denunciou Nelma por falso testemunho. A primeira audiência do processo foi marcada para julho próximo.

03
Mai20

O futuro de Jair Bolsonaro e Sergio Moro

Talis Andrade

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Por Pierpaolo Cruz Bottini

ConJur

 - - -

Moro prestou depoimento neste sábado (2/5) na Polícia Federal para esclarecer o conteúdo de seu discurso, proferido em entrevista coletiva, na semana passada, quando anunciou sua saída do Ministério da Justiça. Segundo a PGR, os fatos narrados pelo ex-ministro podem caracterizar, da parte de Bolsonaro, falsidade ideológica, advocacia administrativa e obstrução da Justiça, em princípio. Por outro lado, Moro pode incorrer em denunciação caluniosa e prevaricação, entre outros.

Comecemos por Bolsonaro.

A falsidade ideológica existirá caso o presidente tenha expressamente determinado a publicação da exoneração do diretor-geral da Polícia Federalno Diário Oficial com a assinatura do ex-Ministro da Justiça. Caso a subscrição tenha sido inserida por ordem de terceiros, sem sua ciência, não haverá crime de sua parte. Tudo dependerá das provas colhidas no inquérito.

No que se refere a supostas tentativas de interferir em inquéritos policiais, há várias hipóteses possíveis. Caso se chegue à conclusão de que Bolsonaro pretendia alterar o comando da Polícia Federal para, futuramente, intervir em investigações, não há crime. Há diversas faltas na conduta, mas para que o direito penal atue é necessário mais do que simples intenções ou planos.

Por outro lado, se o Presidente tentou, concretamente, intervir em inquéritos, a situação é distinta, a depender do ocorrido. Se a ingerência se limitou a um pedido de informações sobre investigações em andamento, o fato é indiferente sob um prisma penal. Mesmo que sigiloso o expediente, ter notícias sobre seu conteúdo é diferente de atrapalhar seu desenvolvimento. Poderia haver delitos relacionados à quebra de sigilo, mas ao que consta sua execução sequer foi iniciada, e não há como punir a instigação de crime sequer tentado.

Caso a interferência tenha ido além do pedido de informações, a situação é mais grave. Se existiram atos concretos de intervenção em investigação sobre organização criminosa, haverá obstrução de Justiça, com pena de três a oito anos de prisão. Se houve apenas pedidos de tratamento mais brando ou investigações menos rigorosas, existirá advocacia administrativa, caracterizado como o ato de patrocinar interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário. A pena é de detenção de três meses a um ano.

Nesses casos, o presidente terá praticado, no mínimo, crime comum relacionado ao cargo, a ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal caso a Câmara dos Deputados admita seu processamento.

Quanto a Moro, sua conduta pode caracterizar denunciação caluniosa, se tiver dado causa à instauração de investigação policial ou similares contra Bolsonaro, imputando-lhe crime de que o sabe inocente.

Por outro lado, se Bolsonaro praticou crimes (advocacia administrativa ou obstrução de investigação), Moro pode ter prevaricado ou praticado contravenção penal. Para a primeira hipótese, deve ficar configurado que ele deixou de determinar investigação dos atos do presidente para satisfazer a interesses pessoais (CP, arigo. 319). Para a segunda, basta demonstrar que ele não comunicou a autoridade competente crime "de que teve conhecimento no exercício da função pública(LCP, artigo 66).

O futuro jurídico — e quiçá político — de ambos depende das investigações da Polícia Federal e da decisão do Procurador-Geral da República que, diante das provas colhidas, deverá propor o destino mais adequado ao caso. A sorte e o azar estão lançados.

28
Abr20

Não se viu em Moro firmeza ao tratar de casos embaraçosos para a família Bolsonaro

Talis Andrade

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II - SERGIO MORO FOI O MINISTRO DA JUSTIÇA QUE MAIS ABRIU INQUÉRITOS PARA PROTEGER UM PRESIDENTE NOS ÚLTIMOS 25 ANOS  (continuação)

 
Ou Moro entendeu mal a noção de lealdade que devia ao chefe, ou não é um democrata. Dilma Rousseff foi difamada em adesivos repugnantes colados sobre o tanque de gasolina de carros no auge de sua impopularidade. Temer foi chamado de vampiro durante toda a carreira política. Lula, acusado de ter amputado o próprio dedo de propósito para não mais precisar trabalhar e de beber demais. Fernando Henrique era xingado quase que diariamente de fascista em protestos de gente inflamada – e, hoje percebemos, também mal informada sobre o real significado do termo. Não consta que nenhuma dessas agressões tenha gerado inquéritos por “crime contra a honra”.

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Não se viu em Moro a mesma firmeza ao tratar de casos embaraçosos para a família presidencial. Ele deixou de fora da lista de criminosos mais procurados do país o miliciano Adriano da Nóbrega, amigo dos Bolsonaro, envolvido nas rachadinhas de Flavio, o filho 01, e possivelmente envolvido no assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes. Nóbrega foi executado em seguida pela polícia baiana, levando ao túmulo seus segredos sobre a família Bolsonaro. Moro nunca comentou o caso.

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Adriano Magalhães da Nóbrega

 

Moro também mandou que sua Polícia Federal investigasse o porteiro do condomínio em que vivem Jair e Carlos Bolsonaro por ter dito a autoridades cariocas que Élcio Queiroz, motorista do carro usado para matar Marielle e Anderson, foi a casa do presidente no dia do crime. A investigação determinada pelo então ministro teve como alvo exclusivo o porteiro, e não todo o caso, que permanece nebuloso até hoje. Moro agiu para preservar o chefe.

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Élcio Vieira de Queiroz

 

Hoje, em seu depoimento de despedida, Moro falou que Bolsonaro queria no comando da PF alguém a quem “pudesse ligar, colher informações, relatórios de inteligência”. “E realmente não é o papel da Polícia Federal prestar esse tipo de informações”, asseverou, com ares de Rui Barbosa.

Também não é papel dela perseguir críticos do presidente da República. Nem é papel de um juiz federal, como ele já foi, coordenar o trabalho dos  acusadores ou oferecer informalmente aos procuradores provas contra um réu. Moro fez e mandou fazer tudo isso.

É tentador celebrar Moro por seu desembarque do bolsonarismo, que enfraquece o mais ordinário e perigoso governo que o país já teve. Mas é um erro: ele ajudou a eleger e foi durante 16 meses o fiador de um presidente que flerta abertamente com um autogolpe.

A advogada Rosângela Wolff Moro, a quem o agora ex-ministro confiou o papel de porta-voz desde os tempos da magistratura, certa vez disse ver o marido e Bolsonaro como uma coisa só. A história dificilmente deixará de fazer o mesmo.

Gabriela Prioli on Twitter: "Eita atrás de eita!… "

27
Abr20

Sergio Moro: O paladino dos pés de barro

Talis Andrade

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A rede de televisão com maior popularidade no país, alcançada através de telenovelas que ocupam mais de 60% da grade de programação, tem completo know-how de como transformar atores medíocres em ídolos populares

por Marcio Tenenbaum

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A passagem bíblica da Torre de Babel comporta algumas interpretações acerca do comportamento humano. Após o Dilúvio, Deus determinou que as mulheres e os homens povoassem toda a terra, o que não foi cumprido pelos habitantes de Babel. Ao contrário da determinação divina, os sobreviventes do Dilúvio decidiram permanecer em uma mesma região de forma concentrada, falando uma mesma língua até que, tomados por grande força coletiva, resolveram construir uma torre que chegaria aos céus. A leitura tradicional desta passagem é que Deus, discordando da soberba humana que pretendia chegar tão alto, espalha diversos idiomas entre todos fazendo com que os habitantes daquele local não mais se entendessem e se dispersassem.  Outra interpretação aponta para a possibilidade de que os habitantes de Babel concentraram tanto poder que se aventuraram a construir algo grandioso, mas acima de suas reais capacidades, o que acabou por gerar os conflitos que resultaram na desunião e na dispersão.

A pitoresca passagem bíblica nos ajuda a compreender o processo da demissão de Sergio Moro do governo Bolsonaro, cujos fatos também podem ser interpretados a partir das famosas frases populares: “muito barulho por nada” ou ainda “uma tempestade em copo d’água”. Se Freud nos ensinou que somos muitos menores do que pensamos ser, ou, melhor, somos muito menos do ideal que fazemos de nós mesmos, o pé na realidade é fundamental para o caminho que desejamos trilhar. E, neste caminho, é saudável a aspiração de nos transformamos, de nos reinventarmos no processo de criação que fazemos desde o dia em que nascemos. No entanto, para que um processo da saudável criação ou recriação de nós mesmos seja levado a um bom destino, é fundamental conhecermos não só a estrada por onde caminhamos, mas qual tijolo dessa construção existencial é de fato genuinamente nosso, e qual tijolo é contrabandeado das forças que nos cercam e que nos dão uma sensação ilusória de que somos mais poderosos do que de fato somos. O erro de Moro foi não identificar que os tijolos que o sustentavam eram fruto de uma criação midiática da imprensa brasileira.

Juiz de uma vara Criminal de Curitiba, Moro é alçado a ídolo nacional do combate à corrupção, cuja origem remonta à investigação de esquema de lavagem de dinheiro em uma rede de postos de combustível. Surge, aí, o nome de um doleiro conhecido seu, também de Curitiba, Alberto Youssef, fazendo com que a investigação fosse levada àquela cidade. Por intermédio de escutas telefônicas, são reveladas ligações do doleiro com um diretor da Petrobrás e o fio da meada se desenrola. A maior rede de televisão do país, a Rede Globo, percebe a oportunidade de mais uma vez, à semelhança do mensalão alguns anos antes, vincular o Partido dos Trabalhadores, que estava no poder, a um esquema de corrupção. Ainda que nos desdobramentos das investigações tenham surgido fatos que poderiam levar o processo para outras comarcas, ficava cada vez mais claro que para a imprensa era fundamental a manutenção do processo nas mãos do juiz paladino. Fortalecendo esse objetivo,  a Rede Globo apresentava diariamente em horário nobre, durante o Jornal Nacional, matérias sensacionalistas das investigações determinadas pelo juiz que vinham associadas à imagens de dinheiro saindo de dutos de petróleo: prisões preventivas de empresários e políticos próximos ao governo – todas previamente comunicadas aos repórteres para serem filmadas e transmitidas no jornal da noite; áudios de escutas telefônicas feitas pela Polícia Federal, também vazados e ilegalmente encaminhados à televisão; áudios de conversas entre o ex-Presidente Lula e a Presidenta Dilma, também ilegalmente divulgados e obtidos em horário cuja autorização judicial já havia expirado; imagens de depoimentos na sala de audiência da Vara de Curitiba com a presença do juiz intimidando os depoentes. Tudo isso era o caldo de cultura necessário para colar a imagem de paladino e justiceiro em um juiz desconhecido da grande maioria do povo brasileiro.

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A rede de televisão com maior popularidade no país, alcançada através de telenovelas que ocupam mais de 60% da grade de programação, tem completo know-how de como transformar atores medíocres em ídolos populares. Afinal, esta é a sua atividade principal há mais de 50 anos. Um dos diretores da televisão Globo disse em uma entrevista que o meio de fazer com que o povo fixasse o enredo e os diversos personagens da novela era repetir diariamente os mesmos diálogos, mas em cenários diferentes. Se alguém deixar de ver a novela por alguns dias ou mesmo semanas, retornando posteriormente, pode, sem dificuldade, recuperar o desenrolar da história. A repetição, dia após dia, das operações da Lava Jato com os mesmos enredos de prisões previamente avisadas à televisão, áudios, delações, fixou nos corações e mentes do povo brasileiro a imagem de Sergio Moro como o herói solitário da luta contra a corrupção, travada exclusivamente por ele sem nenhum outro concorrente. E, o mais importante: apenas ele seria capaz de manter essa luta até o final. A imagem que se construía do juiz paladino é que não havia nenhum outro magistrado no país tão corajoso diante da corrupção. Mas, na realidade, o receio da Rede Globo, principal braço midiático da direita e da extrema-direita, era que a hipótese de divisão das investigações com outros juízes, que eventualmente pudessem ter uma visão mais garantista dos processos judiciais – respeitassem os trâmites legais, os direitos individuais dos presos, não aceitassem prisões preventivas ad infinitum ou até que o detido fizesse alguma delação com relatos que incriminassem seus opositores políticos –  acabasse por enfraquecer a grande luta que estava por trás deste roteiro de filme B: destruir o maior partido político de esquerda e sua maior liderança, Luiz Inácio Lula da Silva. Na realidade, nada muito diferente do que a emissora de televisão tenha feito nos últimos 70 anos da história brasileira, sempre se aliando aos setores nacionais e estrangeiros no intuito de destruir qualquer líder popular que tivesse um projeto de soberania nacional. Sergio Moro foi um instrumento dessa destruição, um instrumento consciente, lúcido, que sabia exatamente o que estava fazendo. Não tinha nenhuma dúvida, principalmente como juiz criminal por 22 anos, que quase todos os procedimentos que adotou na Lava jato eram ilegais. Sabia exatamente que a criminalização de Lula e sua prisão ilegal por absoluta falta de provas retirariam o maior líder das esquerdas das eleições presidenciais de 2018, abrindo caminho para a direita e para a extrema-direita. O erro de Moro foi acreditar que tinha voo próprio, que não era uma criação midiática, que o apoio popular não era fruto de uma construção televisiva, mas de um trabalho cujo mérito era exclusivamente seu. A onipotência do paladino o impediu de perceber a armadilha que Bolsonaro lhe armou ao propor a saída do diretor-geral da Polícia Federal. A real intenção do presidente era se livrar do seu Ministro da Justiça, enfraquecendo um possível concorrente nas eleições presidenciais de 2022. À semelhança dos habitantes de Babel, que decidiram dar passos maiores do que suas próprias pernas, Sergio Moro perceberá, bem mais cedo do que imaginávamos, que seus pés estão apoiados no barro e, como a Torre, ruirá e cairá no esquecimento. O papel de vítima que o ex-ministro tenta agora construir, esquecendo de todas as ilegalidades por ele perpetradas nos julgamentos da Lava-Jato, nos lembra um outro ditado popular: quem com porcos se mistura, farelos come.

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