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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

21
Ago23

TJ-SP extingue multa aplicada a condenada em situação de pobreza

Talis Andrade

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Consultor Jurídico

Embora seja justo cobrar as devidas respostas daqueles que cometem crimes, na maioria dos casos o não pagamento da pena de multa ocorre devido à total falta de condições financeiras de condenados que são paupérrimos e acabam presos por delitos contra o patrimônio ou tráfico de drogas.

Com base nessa premissa, a 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) deu provimento a um agravo de execução penal para extinguir a punibilidade de uma ex-detenta independentemente do pagamento de uma pena de multa imposta a ela.

De acordo com os autos, o juízo de primeira instância extinguiu a pena privativa de liberdade e a punibilidade criminal da mulher — que ficou presa por 15 anos com base na Lei de Drogas —, mas não anulou a multa de cerca de R$ 28 mil. A mulher, porém, é idosa e vive em condição de insuficiência econômica, já que possui renda mensal de apenas R$ 1,2 mil. Por isso, concluiu a defesa, ela não teria condições de arcar com aquele valor.

Ao analisar o caso, o desembargador relator Marcelo Semer discorreu sobre a ideia de função social da pena de multa adotada pelo Superior Tribunal de Justiça. Ele explicou que, embora seja justo exigir respostas daqueles que cometem crime, muitas vezes o não pagamento da multa se deve à absoluta hipossuficiência dos condenados, que possuem perfil "muito distinto dos autores de crimes do colarinho branco".

Assim, prosseguiu Semer, excetuados casos raríssimos, o apenado que chega em situação de pobreza ao presídio sai de lá com a situação idêntica ou piorada. "E, na hipótese, está suficientemente demonstrada a

hipossuficiência da parte agravante. Como dito, a situação de pobreza generalizada entre os apenados em nosso sistema carcerário não pode ser apenas um dado abstrato, mas deve ser parte integrante na análise dos pedidos de extinção da pena de multa", sustentou o relator.

Semer lembrou também que delitos dispostos na Lei de Drogas, a exemplo do caso relatado nos autos, geram multas desproporcionais, que excedem "em muito a capacidade financeira da média da população brasileira e, em especial, da população encarcerada".

"A manutenção de execuções da pena de multa sem

critérios desperdiça dinheiro público em contrariedade ao princípio da

eficiência (art. 37, caput, CF), mobilizando a máquina estatal em

cobranças com menos de 1% de sucesso por simples ausência de

recursos da população egressa", completou Semer.

Além disso, segundo o desembargador, se houver elementos mínimos

nos autos que comprovem a hipossuficiência do apenado, "não

há de se falar em ausência de provas para a extinção da pena de multa".

"Assim, qualquer análise realista da situação financeira da parte agravante não encontra indício de que ela possua condições de pagar o valor cobrado. Pelos elementos constantes nos autos, evidente que a parte executada não possui quaisquer bens ou valores, situação de mais pura e simples hipossuficiência", concluiu Semer ao acolher o pedido.

Também participaram do julgamento os desembargadores Xisto Albarelli Rangel Neto e Augusto de Siqueira.

Clique aqui para ler a decisão

"É um absurdo o traficante André do Rap estar, neste momento, curtindo uma guarânia do outro lado da fronteira. Mas também é um absurdo sem tamanho que uma lei criada para evitar que pobres permaneçam presos indefinidamente e sem julgamento seja atacada por conta do ocorrido", analisa Leonardo Sakamoto

20
Fev23

A autonomia do Banco Central é compatível com a Constituição?

Talis Andrade
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Resumo: resta saber se o presidente do Banco Central é o superego da nação

 

 

Por Lenio Luiz Streck /ConJur

= = =

O tema "independência ou autonomia do Banco Central" está na ordem do dia. O novo governo faz fortes críticas à atuação do BC. Afinal, a taxa de juros no Brasil é o dobro da inflação, desbordando do que ocorre com as demais taxas do mundo (vide EUA e União Europeia).

Para além da economia, o que o Direito pode dizer? Gilberto Bercovici foi quem melhor tratou do assunto no artigo Sobre o Banco Central Independente [1]. O artigo tem de ser lido. Por juristas, economistas, jornalistas e jornaleiros.

Bercovici reconstrói a história institucional do fenômeno. Mostra o fator "privatização dos bancos estaduais" ocorrida na década de 90 como elemento primordial da centralização da autoridade monetária no Banco Central. Diz também que o problema desse processo de reestruturação da política monetária foi o fato de que a recomposição da capacidade de intervenção pública se esgotou na tentativa de controle sobre os gastos públicos. Fala também da bizarrice que foi a equiparação da função de presidente do Banco Central do Brasil à de ministro de Estado em 2004. Isso gerou uma certa confusão institucional: um presidente de autarquia federal vinculada ao Ministério da Fazenda (artigo 8º da Lei 4.595/1964) se torna equiparável a ministro de Estado, ou seja, com as mesmas prerrogativas de função daquele que supostamente é seu superior hierárquico na administração pública, o ministro da Fazenda.

Mas vinha coisa mais complexa pela frente: a tão falada autonomia do Banco Central (Lei Complementar 179, de 24 de fevereiro de 2021). Pela nova legislação, o presidente e a diretoria do Banco Central passam a ter mandatos fixos e não coincidentes com o mandato do presidente da República, que perde o poder de nomear e demitir os ocupantes dessas funções quando bem entender.

Bercovici chama a essa entidade um "Frankenstein" na estrutura administrativa brasileira: uma autarquia não subordinada ao presidente ou a nenhum ministro, um órgão que paira no ar, sem vínculos, sem controles.

Esse é o busílis.

O Supremo Tribunal teve a chance de dar um fim nesse Frankenstein. Porém, na Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI 6.696, decidiu pela constitucionalidade.

Passa um pequeno período de tempo e surgem fatos novos. Taxa de juros estratosférica que coloca em polos opostos o novo presidente eleito e o presidente do Banco Central.

O ponto que se põe é: qual seria o dispositivo constitucional que daria suporte à lei que concede autonomia ao Banco Central? Ao argumento de que ele deve ser autônomo para estabilizar a economia, cabe perguntar: a golpe de caneta monetária o presidente do BC tem mais capacidade do que toda a equipe econômica de um presidente da República? A Constituição estabelece quem deve cuidar da economia. E nisso está inserida a estabilidade e a responsabilidade social para com a população.

Examinando o texto constitucional, temos que ali estão determinadas as normas para a consecução de políticas públicas que devem visar a erradicar a pobreza e fazer justiça social (por exemplo, artigo 3º). Isso sem considerar o próprio cerne daquilo que chamamos de "Constituição Econômica".

Parece que esquecemos que a nossa Constituição tem o claro perfil dirigente. A CF/88 é compromissória e dirigente, filha das Constituições dirigentes do segundo pós-guerra, mormente se pensarmos em países periféricos como o Brasil.

Lembro que nos anos 90 cunhei a tese de uma CDAPP — Constituição Dirigente Adequada para Países Periféricos, na esteira da já então criticada Constituição Dirigente tratada pelo constitucionalista J J Gomes Canotilho.

Dizia eu, então, no que fui acompanhado por Gilberto Bercovici, Martonio Barreto Lima e Marcelo Cattoni, que a nossa Constituição, a par das críticas ao dirigismo original feito pelo próprio Canotilho, continuava dirigente [2]. Mais: de minha parte, a tese do dirigismo constitucional continua válida enquanto não resolvermos o triângulo dialético propugnado pelo próprio Canotilho, inspirado em Johan Galtung (falta de segurança, pobreza e falta de igualdade política). A Constituição ainda vale. E nela nada consta sobre Banco Central independente ou autônomo. Banco Central aparece oito vezes no texto da Constituição. Nenhuma vez sequer se insinua a sua autonomia ou independência para além do poder do presidente da República — basta ver que o regime continua sendo o presidencialista.

Trata-se de analisar o papel do Estado na economia. E o do governo. Enquanto não resolvermos esses problemas (pobreza, segurança e igualdade política), ainda precisamos de forte atuação estatal para a consecução desses objetivos constitucionais. Isto é, aqui no Brasil a Constituição que dirige não morreu. E por isso precisamos de uma Constituição que diga o que fazer. Que resgate compromissos. Que resgate as promessas modernas até hoje incumpridas. E a nossa diz claramente como fazer isso. Quer queiramos, quer não queiramos. A Constituição é um fato. Ou ela vale apenas quando se fala em imunidades e isenções?

Não parece adequado à Constituição um organismo como o Banco Central autônomo, cujo presidente, sem mandato popular, sem legitimidade, estabeleça as diretrizes do desenvolvimento econômico. Porque, no fundo, é isso que acontece. O Banco Central manda mais que o presidente.

O Brasil é uma República representativa. Presidencialista. Elege-se o presidente para elaborar políticas públicas. Que devem ser compatíveis e obedecer a Constituição. Ora, se o presidente do Banco Central resolver triplicar a taxa de juros em relação ao índice inflacionário (duplicada já está) e isso gerar mais pobreza, quer dizer que a atuação do presidente do Banco Central é inconstitucional, porque a Constituição diz o contrário. Pior: a culpa e responsabilidade serão debitadas na conta de quem foi eleito presidente. Da República. E não do Banco Central. Sei que parece uma platitude dizer isso. Mas por aqui há que se dizer o óbvio — que se esconde no anonimato.

Tem-se a impressão de que estamos no mundo de paroxismos. Ocorre uma disputa quase fratricida nas eleições. Quase ocorreu um golpe. Elege-se o presidente. E quando ele quer fazer cumprir, para o bem e para o mal, sua plataforma de governo, o presidente do Banco Central atua como superego da nação.

Resta saber se o Banco Central pode tanto a ponto de ser esse superego, espécie de grilo falante do sistema político-econômico.

Numa palavra final, retomo Bercovici, para dizer que, para além de toda a questão constitucional, o problema da "independência" do Banco Central é menos jurídico e essencialmente político. A pergunta que deve ser feita é: Banco Central independente de quem?

Ao que parece, o BC é independente do sistema político e de todo e qualquer controle democrático — com o que se volta à questão constitucional.

Por último, alguém dirá que essa questão já está decidida pelo STF. Respondo, dizendo: mas o STF não disse que o modelo anterior era inconstitucional. Consequentemente, então, na pior das hipóteses, a Constituição admitiria mais de uma possibilidade de configuração. Além disso, o fato de o STF dizer por último não significa que esteja sempre certo. E decisões não são eternas.

Isto é, o presidente da República pode entender, e o Congresso também, que esse modelo de "independência" do Banco Central criou um problema do ponto de vista político e econômico.

Ou, ironicamente, a possibilidade de rever decisões que afetam estruturalmente a vida das pessoas seria inconstitucional?

Por isso, diante do problema criado, cabe alterar o modelo de Banco Central. Isso porque a alteração do modelo não é inconstitucional. Ao contrário, tornar-se-ia adequado ao modelo constitucional compromissório e dirigente inscrito na Constituição do Brasil.

= = =

[1] In Revista Fórum de Direito Financeiro e Econômico. ano 11 – nº 21 | mar./ago. 2022

[2] Recomendo a leitura deste artigo que trata da Constituição Dirigente Invertida, em que cito os três autores: https://www.conjur.com.br/2016-out-27/senso-incumom-rumo-norundi-bordo-cdi-constituicao-dirigente-invertida 

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30
Dez22

Acampamentos patriotários

Talis Andrade

Imagem: Marcelo Jaboo

 

A mise-en-scène pseudopatriótica com o pavilhão verde-amarelo disfarça a vileza, para enganar os bobos

por Luiz Marques /A Terra É Redonda

A democracia nasceu cinco séculos antes da era cristã, em Atenas. À mesma época, tinha início a transição romana do reinado à república aristocrática, democratizada por pressão dos plebeus e seus líderes que se julgaram qualificados o suficiente para integrar o círculo político de poder, apoiados no forte princípio da igualdade. Depois, a democracia hibernou durante mais de um milhar de anos, para redespertar aos poucos nas pólis de Veneza e Florença, já na Itália medieval e renascentista.

Robert A. Dahl, em A democracia e seus críticos, compara as experiências igualitaristas e isonômicas de dois mil e quinhentos anos atrás “à invenção da roda ou à descoberta do Novo Mundo”. Etimologicamente o termo “democracia” deriva do grego, combina demos (povo) com kratia (governo, autoridade). Portanto, é o “governo do povo”. Um achado revolucionário que trouxe possibilidades inusitadas para a administração da sociedade, jamais imaginadas noutras modalidades de governo. As cidades-Estado deram lugar aos Estados-nação.

A democracia viveu problemas de identidade, no percurso. Há distintos modos ditos democráticos de governar. Na Antiguidade, prevaleceu a participação direta; na Modernidade, a representação. Ao se pronunciar no Ateneu Real de Paris, em 1819, Benjamin Constant avaliou que o deslocamento da participação para a representação esteve vinculado à metamorfose da concepção de liberdade dos antigos (dedicada à vida pública) para a concepção de liberdade dos modernos (dedicada à vida privada), dadas as circunstâncias históricas. Tudo sob os controversos avatares da democracia.

Em uma obra instigante sobre o tema, Democracia e representação, Luís Felipe Miguel considera que esses são territórios em disputa. “A expressão ‘democracia representativa’ guarda uma tensão interna que não deve ser escamoteada, mas mantida como um desafio permanente. A representação estabelece, por sua lógica, um movimento de diferenciação oposto ao requisito da igualdade, que é próprio da democracia. Lutar contra essa tendência, buscando a redução do diferencial de poder entre os representantes e os representados, é uma tarefa sempre renovada”. (Veremos em 2023).

Hoje, a passagem da participação para a representação possui um caráter geopolítico. Textos de ciência política escritos por sul-americanos evocam a participação; escritos por autores europeus destacam principalmente a representação. Onde o Estado se deixa permear por demandas sociais, a representação é bem acatada. Onde o Estado é mera correia de transmissão das classes dominantes, a participação é uma exigência das classes trabalhadoras para compensar o handicap. Não à toa, as edições inaugurais do Fórum Social Mundial (FSM) ocorreram na América Latina, em Porto Alegre, a capital do Orçamento Participativo (OP) para aprimorar a gestão das finanças públicas.

 

Democracia e república

Demos é uma noção polissêmica, às vezes exclusiva de segmentos (nobres, proprietários, homens, brancos); às vezes inclusiva da população (mulheres, imigrantes, negros, analfabetos). No fundo, a dificuldade está em que a democracia designa um ideal de governança e, em simultâneo, descrições empíricas da institucionalidade em países que aparentam incongruência ao utilizar a terminologia. A polissemia também atinge a tradição republicana: ora aristocrático-conservadora com uma solução de equilíbrio entre os ricos e os pobres; ora democrático-progressista com a recusa à coexistência de instituições com pontos de vista classistas. A contraposição do interesse geral ao dos particulares simplificou o dilema; em tese, sem a divisão de classe incrustada no aparato de représentation.

O caminho para a democracia e a república é sinuoso e contraditório. Vide a Venezuela, que polariza emoções no espectro político ocidental. Uns classificam o Estado venezuelano de ditatorial, comandado pela mão de um tirano, e propõem romper relações diplomáticas. Outros reputam-no democrático, a cargo de um legítimo exponencial da vontade majoritária, ungido pelo voto em eleições livres. Os contorcionismos sobre os significantes esvaziam a sua (a nossa) inteligibilidade.

O passo das cidades-Estado aos Estados-nação levou às associações políticas transnacionais. ONU, UE, Nafta, Otan, Brics e COPs são articulações mais complexas do que as registradas no alvorecer da democracia. Entre a Grécia clássica e o século XVIII, se postulou que os Estados democráticos e republicanos deveriam ser minúsculos, em território e população, pelos padrões atuais. Das cidades-Estado, restaram San Marino e Liechtenstein como legados pitorescos de um passado desaparecido. As reuniões em assembleias com a totalidade dos cidadãos, de logística complicada nas ágoras, tornaram-se quimeras. O aumento populacional fez John Stuart Mill descartar o assembleísmo.

A representação procura aplicar o vetor da igualdade aos sistemas políticos de magnitude. Corpos legislativos, que na Idade Média garantiam os predicados de donos das terras e dos comerciantes, se transmutaram em órgãos para atender o conjunto da população (válida). A democratização dos Estados nacionais não partiu de uma tábua rasa. Seu desdobramento discursivo, em instituições imprescindíveis nas sociedades de porte volumoso, foi esmiuçado pelo conceito de “poliarquia” formulado por Robert A. Dahl. A poliarquia (“governo de muitos”) não é mais do que a democracia liberta de incumbências pelos democratas insatisfeitos, com ela. Corresponde a uma “democracia formal”, sem um poder demiúrgico e disruptivo para reordenar o mundo à revelia da política.

Países com governos poliárquicos caracterizam-se pela universalização dos direitos individuais, funcionários concursados, sufrágio direto e inclusivo, direito de concorrer aos cargos eletivos, liberdade de expressão, informação alternativa e autonomia associativa. Essa taxonomia contém o mínimo para uma nação merecer o selo de autenticidade democrática – e dirimir dúvidas a respeito.

Se comunidades pequenas acarretam a opressividade dos indivíduos não-conformistas (Atenas foi intolerante com Sócrates), comunidades populosas tendem a ser tolerantes em face das dissidências. Para tanto, é essencial lideranças que prezem o pluralismo político e ideológico, os conflitos se atenham em limites suportáveis e não se esgrimam coerções violentas (polícia, militares) para conquistar e manter o domínio em “hegemonias fechadas”, pelo autoritarismo ou o totalitarismo.

 

O processo democrático

O processo democrático permitiu à humanidade alcançar: (a) a liberdade política sob o crivo da autodeterminação individual e coletiva; (b) o desenvolvimento humano com autonomia moral e responsabilidade pelas próprias escolhas e; (c) a proteção e a promoção dos interesses e dos bens que as pessoas compartilham entre si. Esse processo, que está longe da perfeição, está ligado aos valores da igualdade. Fato que o converte em “um meio necessário para a justiça distributiva”.

A visão democrática vai além do edifício do real ao focar na perspectiva de mudança do status quo, por via pacífica. Caso contrário, a democracia não teria superado as instituições e as crenças que sustentavam o feudalismo, ou o fascismo e o nazismo na Europa, ou as ditaduras civis-militares sangrentas em nosso continente. A democracia se reinventa nas lutas por direitos, na direção do igualitarismo possível para construir uma sociedade sem discriminação, acolhedora e plural.

O ataque à democracia foi revigorado na década de 1980, com a crescente dominação desde então do neoliberalismo em nível internacional. O receituário neoliberal não é só um modelo econômico, mas “la nouvelle raison du monde” como mostram Pierre Dardot e Christian Laval, em um livro de mesmo título. A nova razão do mundo separa as aspirações democráticas do princípio de igualdade. Defende a desigualdade como meta prioritária dos governantes, fiel ao Consenso de Washington. O retrocesso civilizacional destruiu os imperativos éticos vindos da Revolução Francesa, através da tríade liberté, égalité et solidarité para a sedimentação de um Estado de direito democrático.

“Liberdade”, no sentido que se possa viver sem estar submetido às arbitrariedades de ninguém. “Igualdade”, no sentido positivo da equanimidade para que cada um tenha acesso aos expedientes de uma vida com autonomia. “Igualdade”, no sentido negativo contra a exclusão social e política, bem como contra a pobreza, a humilhação e a invisibilidade. “Solidariedade”, no sentido da dupla realização da liberdade e da igualdade para transcender os particularismos, acessar as oportunidades justas de autodesenvolvimento e comungar o bem comum com direito a um tratamento digno para todas, todos e todes. As estruturas sociais e a consciência andam juntas com a cidadania plena.

Alguns citam Alexis de Tocqueville, em A democracia na América, ao argumentar sobre a suposta dinâmica que ao unir a democracia e a igualdade dispararia uma propensão autodestrutiva, a longo prazo. O colapso das instituições democráticas na Itália, na Alemanha e na Espanha, entre 1923 e 1936, confirmaria a conjectura do pensador. Contudo, a tempestade teve uma curta duração.

Não é a expansão do igualitarismo nos hábitos, costumes e ideias, senão a introjeção inconclusa dos valores da igualdade que acirra os conflitos, em defesa dos privilégios de classe. As políticas igualitárias necessitam de um tempo para formar um novo senso comum, na sociedade. Nos países em que as instituições democráticas existem há mais de uma geração, e houve um acerto de contas transparente com o passado, a substituição da democracia por um regime de exceção é algo raro.

 

Os acampamentos patriotários

“O patriotismo é o último refúgio dos canalhas”, a frase do crítico literário inglês Samuel Johnson data de 1775. Referia-se aos que por detrás das juras de amor à pátria e à liberdade, hipocritamente, escondem as ambições pessoais. A pantomima não é uma invenção da extrema-direita bolsonarista. Mas foi aperfeiçoada pela massa de manobra que aterrizou defronte os quartéis e, inclusive, na frente de uma loja da Havan, em Santa Catarina. Como se enviassem uma mensagem criptografada ao “pato manco” que ainda chora a derrota nas urnas, apesar dos estupros eleitorais cometidos na campanha com dinheiro público e privado. Ou como se cobrassem, do Véio, um cachê atrasado.

Estados antidemocráticos funcionam como moedas aos que vendem seu apoio e voto, em troca de proventos espúrios com a hiperexploração dos trabalhadores e a retirada de direitos trabalhistas e previdenciários dos mais vulneráveis. É o que mobilizou frações da burguesia financeira, industrial e comercial em favor da reeleição do genocida que carrega no currículo 400 mil óbitos evitáveis, na pandemia do coronavírus. A mise-en-scènepseudopatriótica com o pavilhão verde-amarelo disfarça a vileza, para enganar os bobos com uma estética que recende as manifestações nazifascistas.

Ações externas após os eventos de 2013 e 2015 ressignificaram, com o mote da corrupção, o período em que o presidente Lula e o Partido dos Trabalhadores (PT) governaram o Brasil (2003-2016). O questionamento sobre o resultado das eleições de 2014, vencidas por Dilma Rousseff, e a guinada programática que fez a presidenta eleita pressionada pela crise econômica “largar a mão da esperança”, de um lado; de outro, as pautas de lesa-pátria introduzidas pelo inominável pulha que mandava na Câmara dos Deputados redundaram no impeachment, capitalizado pelo extremismo da direita populista que eclipsou a centro-direita tradicional. Com as peças em movimento no tabuleiro de xadrez, um palhaço sociopata subiu a rampa da presidência e municiou organizações criminosas.

Em Brasília, o acampamento patriotário teve dez mil membros; agora contabiliza menos de 800 zumbis. Arsenais de armas pesadas (fuzis, submetralhadoras) foram apreendidos. O incêndio de carros, ônibus, agressões e intimidações extrapolaram a legalidade. Implodiram a sociabilidade do demos, com a conivência de autoridades corrompidas pelo bolsonarismo. No apagar das luzes do sinistro espetáculo, que foi o desgoverno, decretos oficiais liberam a devastação de terras indígenas e indicam um militar para ocupar a Secretaria de Cultura nas últimas semanas, com o propósito de atiçar as pulsões de morte. Os terroristas, com a bomba armada no caminhão de combustível para aviões, no aeroporto do Distrito Federal, pretendiam suscitar o caos – para variar. Eles merecem ser punidos com exemplaridade, “dentro das quatro linhas da Constituição”. Não é o circo, é o terror.

O novo governo precisa mostrar que sabe cuidar do povo e, o povo organizado, do governo de reconstrução. Vai para o lixo da história o golpe malogrado. Os financiadores do mal e os fanáticos negam ao eleitorado a isonomia participativa e representativa, e o igualitarismo político para eleger o presidente do Brasil. Creem-se superiores à soberania popular, em uma realidade paralela. Mas a força da ideologia democrática é tal que até o déspota do Qatar rendeu-se: “Esta foi a Copa da igualdade”. Descontado o cinismo, importa o reconhecimento sub-reptício da democracia. Ouçam o rufar dos tambores: O patigiano portami via / O bella ciao, bella ciao, bella ciao, ciao, ciao

06
Dez22

Pobreza bate recorde com Bolsonaro

Talis Andrade

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Por Altamiro Borges

Na sexta-feira (2), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou dados alarmantes sobre o avanço da tragédia social no reinado das trevas de Jair Bolsonaro. Segundo o estudo, cerca de 62,5 milhões de pessoas (29,4% da população do país) estavam vivendo em situação de pobreza em 2021. Deste total, 17,9 milhões (8,4% da população) encontravam-se em extrema pobreza. 

Esses foram os maiores índices registrados desde o início da série medida pelo IBGE, em 2012, com base nos parâmetros fixados pelo Banco Mundial. Entre 2020 e 2021, houve um aumento recorde nestes dois grupos: o contingente abaixo da linha de pobreza cresceu 22,7% (ou mais 11,6 milhões de pessoas); o das pessoas na extrema pobreza subiu 48,2% (ou mais 5,8 milhões). Uma regressão social sem precedentes! 

O Banco Mundial fixa como linha de pobreza os rendimentos per capita de US$ 5,50, equivalentes a R$ 486 mensais per capita. Já a linha de extrema pobreza é de US$ 1,90 – ou R$ 168 mensais por pessoa. Ainda de acordo com o levantamento do IBGE, a proporção de pretos e pardos abaixo da linha de pobreza (37,7%) é praticamente o dobro que a proporção de brancos (18,6%) nessa situação. As regiões Nordeste (48,7%) e Norte (44,9%) tinham, no ano passado, as maiores proporções de pessoas pobres na sua população. 

 

A tragédia entre os menores de 14 anos

Como registra o site Metrópoles, as trevas bolsonarianas produziram retrocessos em todos os indicadores. “Em 2021, o rendimento domiciliar per capita caiu para R$ 1.353, o menor nível desde 2012. Já o Índice de Gini, que mede a desigualdade, voltou a crescer e chegou a 0,544, o segundo maior patamar da série histórica. Além do mais, também em 2021, a proporção de crianças menores de 14 anos de idade abaixo da linha de pobreza chegou a 46,2%, o maior percentual da série, iniciada em 2012”. 

Já a Folha, ao analisar os dados do IBGE, enfatiza que “o grupo abaixo da linha de pobreza (62,5 milhões) disparou 22,7% em 2021, um acréscimo de 11,6 milhões de pessoas ante 2020 (51 milhões). É como se a população inteira do Paraná (11,6 milhões) tivesse migrado para essa condição. Já o contingente em extrema pobreza (17,9 milhões) saltou 48,2% em 2021, com 5,8 milhões a mais frente a 2020 (12 milhões). Esse aumento é comparável à metade da população do Paraná (11,6 milhões)”.

 

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Pobreza bate recorde com Bolsonaro

 
 
25
Out22

Manifestantes se reúnem em Paris em defesa da democracia brasileira

Talis Andrade
Centenas de manifestantes se reuniram neste sábado (22) em Paris em defesa da democracia no Brasil.
Centenas de manifestantes se reuniram neste sábado (22) em Paris em defesa da democracia no Brasil. © RFI

 

Apreensivos com os resultados do primeiro turno das eleições no Brasil e de olho na votação do próximo dia 30, manifestantes se reuniram neste sábado (22) na Place de la Nation, a leste de Paris, em defesa da democracia.

 

Por Andréia Gomes Durão /RFI

Ídolo dentro e fora dos gramados, o eterno craque Raí subiu ao palanque compartilhando com o público seu entusiasmo pelo exercício cívico de ir às urnas no segundo turno, convidando os eleitores a votarem “contra as desigualdades sociais, à agressão ao meio ambiente, contra o desrespeito ao direito das minorias e contra o ódio, mas principalmente a votarem a favor do amor”.

Sob gritos de “Fora Neymar”, que declarou publicamente seu apoio a Jair Bolsonaro, Raí afirmou que “o Brasil se encontra em um momento terrível, depois de tudo que se passou nos ‘últimos quatro anos’”, se recusando a pronunciar o nome do atual presidente brasileiro.

 

O ex-jogador Raí convida os eleitores brasileiros a votarem contra o agravamento das injustiças sociais.
O ex-jogador Raí convida os eleitores brasileiros a votarem contra o agravamento das injustiças sociais. © RFI

 

Representantes e líderes de entidades francesas e brasileiras comprometidas com a defesa da democracia se revezavam no palco. A presidente do grupo Amitié France-Brésil no Senado, Laurence Cohen, destacou a importância de mostrar que, “na França, há uma solidariedade em relação ao Brasil, em relação à democracia”.

“Já dei meu apoio a Lula quando ele estava na prisão, assim como me solidarizei a Dilma Rousseff, quando ela foi ameaçada de impeachment e, infelizmente, conseguiram tirá-la do poder. [...] É preciso mostrar que os democratas franceses estão mobilizados pelo mundo inteiro, e não apenas pelo Brasil, onde a democracia está ameaçada por um governo que tem ódio da população negra e dos povos autóctones, que é contra o direito das mulheres”, enfatiza a senadora em declaração à RFI.

 

“Sociedade francesa atenta”

 

Glauber Sezerino, co-presidente da associação Autres Brésils, uma das entidades organizadoras da manifestação, faz coro ao discurso de Laurence Cohen, uma vez que o ato evidencia que “a sociedade francesa está atenta ao que está em jogo hoje no Brasil, que é a continuidade de um projeto mortífero”.

“Vimos um aumento considerável de assassinatos no Brasil, um aumento da pobreza, da fome. E nós conseguimos reunir uma série de organizações francesas, que desenvolvem trabalhos na França, mas com um olhar em relação ao Brasil, para mostrar que o Brasil não aguenta mais quatro anos de governo Bolsonaro. Estamos mostrando que vamos continuar mobilizados, solidários a todos os movimentos no Brasil”, sublinha Sezerino.

 

Glauber Sezerino, co-presidente da asssociação Autres Brésils, uma das entidades organizadoras da manifestação.
Glauber Sezerino, co-presidente da asssociação Autres Brésils, uma das entidades organizadoras da manifestação. © RFI
A antropóloga e ativista Kowawa Apurinã.
A antropóloga e ativista Kowawa Apurinã. © RFI

 

Em seu discurso, a ativista indígena e antropóloga Kowawa Apurinã falou da importância da luta de todos os povos “com esse sentimento de mudar o mundo”. “A democracia é uma utopia que nós estamos sempre correndo atrás dela, e no Brasil ela está se tornando algo quase inalcançável. A resistência se faz em ocupar todos os lugares de luta, não só pelo poder, mas uma luta de vida no Brasil. Nós estamos lidando com o mal, estamos lidando com coisas malignas. O Brasil está na escuridão. Nas eleições, esperamos que o fascismo seja finalmente derrotado. [...] Se Bolsonaro não cair, iremos fazer uma revolução.”

A condição dos povos originários também estava entre as principais motivações para a artista plástica Cláudia Camposs participar da manifestação, uma vez que as populações indígenas tangenciam de diversas formas seu trabalho. “Estou muito emocionada com esse movimento todo a favor da democracia aqui em Paris. E eu sempre fui muito motivada às alianças com os representantes indígenas dentro da minha arte. É inadmissível manter Bolsonaro no poder, porque os direitos [desses povos] não estão sendo respeitados. Ele é um genocida e não dá a essas pessoas o direito de viver em seus territórios ancestrais. Isso já acontecia, é histórico, mas piorou muito. A democracia tem que ser defendida, [...] não podemos privilegiar apenas os interesses do homem branco”.

 

A artista plástica Claudia Camposs vê na ameaça à democracia uma ameaça também aos povos originários.
A artista plástica Claudia Camposs vê na ameaça à democracia uma ameaça também aos povos originários. © RFI

 

Meio ambiente

 

Não somente os povos originários, mas uma pauta tão inerente quanto, o meio ambiente, é o que leva o animador gráfico Meton Joffily a participar desta manifestação com uma obra em punho: uma releitura do mapa do Brasil. “Não é só o Brasil que está em jogo. Meu cartaz vem aqui manifestar esta preocupação com a Amazônia, com o tip point, o ponto de não retorno, que está muito próximo. E ainda há brasileiros achando que Bolsonaro é aceitável, depois de quatro anos as pessoas ainda votam nele. Ou elas são inocentes e estão sendo manipuladas pelas mentiras e fake news ou são meio mal caráter e concordam com essa agenda que é realmente autoritária. Todo mundo sabe que um segundo mandato vai fechar o caixão do Brasil.”

 

O animador gráfico Meton Joffily e seu alerta sobre o desmatamento da Amazônia.
O animador gráfico Meton Joffily e seu alerta sobre o desmatamento da Amazônia. © RFI

 

O também artista plástico Julio Villani expressou sua preocupação em “recuperar tudo que o Brasil perdeu”. “Sobretudo essa destruição da palavra que a extrema direita tem feito no mundo e especialmente no Brasil é a coisa que mais me tira o sono. Porque quando a palavra perde o sentido, a educação perde o sentido, a cultura, tudo é destruído. E é o retrato do Brasil atual. Eu tento ao máximo ser otimista. Eu tento me agarrar a esse otimismo, porque a gente ainda vai ter que lutar muito.”

Para o performer, coreógrafo e escritor Wagner Schwartz, esse encontro de pessoas e ideias representa um exercício democrático. “O mais importante de estar aqui é de encontrar as pessoas que são constituintes, que compõem esse grupo que forma a democracia no Brasil. É importante que a gente se encontre nesse momento porque a democracia realmente está em crise. E quando a gente se vê, a gente se sente menos desamparado”, acredita.

 

Wagner Schwartz e Julio Villani.
Wagner Schwartz e Julio Villani. © RFI
O escritor Julian Boal.
O escritor Julian Boal. © RFI

 

Já o escritor e crítico de teatro Julian Boal destaca que este “é um momento muito complicado, em que está havendo muitas mobilizações”. “A questão é saber como fazer para que essas mobilizações permaneçam depois das eleições. Porque o bolsonarismo não é só um fenômeno eleitoral. É também a presença nos palácios dos governadores, nas câmaras, nas assembleias legislativas. E a gente vê também a presença de Bolsonaro nas igrejas evangélicas, nas milícias, e nos corações e mentes de milhões de brasileiros. Então a questão é como a gente continua se mobilizando depois das eleições para tentar lutar contra isso. Porque o fascismo não é um fenômeno que começa e acaba nas urnas. Infelizmente”, diz Boal à RFI.

 

Democracia e autocrítica

 

Para o artista plástico Ivar Rocha, encontros como esse, em defesa da democracia, são também uma oportunidade de autocrítica. “É importante olhar para este momento como uma crítica para a esquerda, para nós todos, para entender a fragilidade do momento e entender que todos nós temos que dar um passo à frente. Porque meu medo, além do Bolsonaro, é constatar que a nossa geração talvez esteja longe de fato querer lutar pela emancipação do homem, e sim querer humanizar um capital, e isso seria uma tragédia muito maior do que qualquer Bolsonaro. Um momento como esse serve para a gente refletir e entender qual é nosso limite, quais são as nossas fronteiras na luta, na entrega, na organização.”

 

Para o artista plástico Ivar Rocha, o momento político no Brasil exige reflexão e autocrítica.
Para o artista plástico Ivar Rocha, o momento político no Brasil exige reflexão e autocrítica. © RFI
O psicólogo Jean-Pierre Guis.
O psicólogo Jean-Pierre Guis. © RFI

 

O psicólogo e fotógrafo Jean-Pierre Guis destaca que, independentemente no resultado nas urnas no próximo domingo, o Brasil seguirá fortemente dividido, o que torna a defesa da democracia ainda mais relevante para assegurar o diálogo e o equilíbrio entre lados tão opostos, que ele traduz como o contraste entre o paraíso – os avanços durante o governo Lula, a cultura brasileira, o calor humano de seu povo – e o inferno, representado pela gestão de Bolsonaro, pela manipulação dos evangélicos e pela agravamento das desigualdades sociais. “Sem um Brasil democrático, o planeta Terra terá se tornado um erro”, ele sintetiza.

 

31
Ago22

Vaticano: Novos cardeais brasileiros defendem democracia e falam sobre eleições

Talis Andrade
O recém-nomeado cardeal Leonardo Steiner, arcebispo de Manaus, representa a Amazônia nas mais altas instâncias da Igreja Católica.
O recém-nomeado cardeal Leonardo Steiner, arcebispo de Manaus, representa a Amazônia nas mais altas instâncias da Igreja Católica. © RFI/Gina Marques

Poucas horas antes de tomarem posse como cardeais neste sábado (27), durante o Consistório presidido pelo papa Francisco, no Vaticano, os arcebispos Paulo Cezar Costa, de Brasília, e Leonardo Ulrich Steiner, de Manaus, conversaram com a RFI sobre os rumos da Igreja Católica, a situação na Amazônia e as eleições de 2 de outubro no Brasil.

A Amazônia brasileira nunca teve um cardeal. O franciscano Leonardo Steiner, 71 anos, arcebispo de Manaus, sente a responsabilidade de ser o primeiro nesta missão. Ele espera poder realizar os desejos do papa Francisco, de superação dos problemas sociais e ambientais, que ameaçam a região.

Depois do Sínodo da Amazônia, organizado por Francisco no Vaticano, em 2019, no ano seguinte o pontífice escreveu a exortação apostólica “Querida Amazônia”. No documento, o Papa afirma que gostaria de ver uma região com mais justiça social, em que a cristianismo não elimina, mas enriquece as culturas locais, onde a ecologia seja defendida e missionários não se envergonhem de Cristo.

“Eu espero poder ajudar a implementar os quatro sonhos que o papa Francisco colocou na carta", disse Steiner. Segundo o recém-nomeado cardeal, esses anseios são decisivos tanto para o futuro da região, quanto da Igreja que está presente na Amazônia. "É o sonho social, sonho ecológico, sonho cultural e o sonho eclesial", enfatizou Steiner.

"O papa Francisco faz uma hermenêutica da totalidade nessa carta, e eu espero poder ajudar as nossas igrejas que estão na Amazônia a realizar esses quatro sonhos. Manter uma presença cada vez mais missionária, uma presença cada vez mais consoladora, cada vez mais samaritana, cada vez mais esperançada”, disse à RFI.

Diante do crescimento do desmatamento, dos incêndios e das enormes dificuldades para os povos indígenas e ribeirinhos, o religioso franciscano destaca o papel da Igreja.

“A Igreja ajuda a tomar consciência da realidade na Amazônia. Além do desmatamento e dos incêndios, o garimpo tem envenenado as águas da nossa região através do mercúrio. Hoje, existem povos indígenas com alto índice de presença do mercúrio no organismo. O nosso organismo não consegue eliminar o mercúrio. Esses povos não têm futuro", advertiu.

Steiner critica a inércia do governo em frear esse avanço do garimpo e impedir a atividade ilegal de madeireiros. "A Igreja sempre tem denunciado a devastação da Amazônia, tem ajudado a criar uma consciência, a criar uma responsabilidade de todos em relação à região", explica, citando ações conjuntas com outros países amazônicos e ao redor do mundo. "Se nós continuarmos a desmatar como estamos fazendo, não teremos futuro no centro-oeste e no sudeste", teme o religioso brasileiro.

Steiner se preocupa com o destino de pequenas etnias indígenas que ainda não tiveram contato com a nossa civilização. "Não que não possam ter; não querem ter porque veem o desastre, o perigo de manter relação com uma civilização que é destrutiva", afirma. 

 

"Reencarnar a política"

 

Questionado sobre as eleições de outubro, o arcebispo de Manaus destaca o posicionamento da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, que apoia a educação política.

"Nós vivemos no Brasil uma situação muito difícil. A política foi muito atacada, denegrida. Há uma necessidade de se 'reencarnar a política'", afirma, ainda mais neste momento "em que a democracia está em jogo". "A Igreja tem se manifestado e graças a Deus a sociedade brasileira também tem se manifestado", observa Steiner.

"É muito importante que a sociedade se manifeste para que não pensem que a Igreja tem tomado partido, decidido apoiar um determinado candidato. A Igreja sempre se preocupou com a democracia e isso já antes do tempo da ditadura”, recorda.

Paulo Cezar da Costa, 55 anos, recém-nomeado cardeal, também destaca a importância da Igreja na política. Há dois anos ele é arcebispo de Brasília, centro nevrálgico do poder político brasileiro.

“Acho que o papel de um arcebispo da cidade de Brasília, de um cardeal, é propor o diálogo. O papa Francisco tem proposto muito diálogo para a vida em sociedade", pondera.

O arcebispo de Brasília, Paulo Cezar Costa, diz que a Igreja sempre defendeu a democracia no Brasil e não vê mal na polarização nas eleições.
O arcebispo de Brasília, Paulo Cezar Costa, diz que a Igreja sempre defendeu a democracia no Brasil e não vê mal na polarização nas eleições. © RFI/Gina Marques

 

Costa reconhece que o Brasil vive uma grande polarização, mas não considera esta circunstância um mal. "Se nós olharmos outras sociedades, elas também são polarizadas", ressalta. Para Costa, a polarização se torna negativa "quando as pessoas vão se enrijecendo nas suas posições". Assim, vai se perdendo a possibilidade do diálogo, estima. O religioso vê riscos quando a ideologia começa a pautar a vida e não as dificuldades reais.

"Os problemas reais da vida do nosso povo são a exclusão, a pobreza, a segurança alimentar, saúde, educação. Esses problemas têm que estar na pauta", conclui.

 

Novos cardeais

 

Vinte novos cardeais tomam posse durante o consistório realizado neste sábado no Vaticano. Destes, 16 são eleitores e poderão votar no conclave para eleger o sucessor de Francisco, por terem menos de 80 anos. 

Nesta nova lista de cardeais, Francisco aprofundou ainda mais o modelo que se tornou característico de seus nove anos de pontificado: nomes pouco conhecidos, vindos de regiões antes consideradas “periféricas”, como Paraguai, Timor-Leste, Cingapura e Mongólia.

Três nomeados já ocupam cargos na Cúria, o "governo central da Igreja": o britânico Arthur Roche, o coreano Lazzaro You Heung-sik e o espanhol Fernando Vérgez Alzaga, presidente do governo do Estado da Cidade do Vaticano.

Entre as nomeações de destaque está a do americano Robert McElroy, arcebispo de San Diego, na Califórnia, considerado um progressista por suas posições sobre os católicos homossexuais e o direito ao aborto.

Chama a atenção a ausência de arcebispos de grandes cidades da Europa, como Paris e Veneza, que antes eram quase automaticamente nomeados cardeais.

04
Ago22

Com fome, menino liga para polícia e pede comida. Ouça o áudio

Talis Andrade

www.brasil247.com - Miguel (com microfone), Célia Arquimino Barros (mãe) e outra irmã deleMiguel (com microfone), Célia Arquimino Barros (mãe) e outra irmã dele (Foto: Reprodução (Globo))

 

Um menino chamado Miguel, de 11 anos, telefonou para a PM e pediu ajuda porque não tinha comida em casa, em Santa Luzia (MG). "Minha mãe só tem farinha e fubá pra comer", disse. A fome uma exlusividade da população civil. 116 milhões de brasileiros sofrem insuficiência alimentar. A fome um caso de polícia

 

Este o Brasil real de Bolsonaro, o Brasil da inflação, do desemprego. O Brasil dos sem terra, dos sem teto, dos sem nada. O Brasil exportador de alimentos no mapa da fome. O Brasil do menino chamado Miguel, de apenas 11 anos. Que telefonou para a Polícia Militar (PM), pelo 190, e pediu ajuda porque não tinha comida em casa, na noite desta terça (2), no município de Santa Luzia, Região Metropolitana de Belo Horizonte (MG). 

"Senhor policial, é por causa que aqui em casa não tem nada pra gente comer e eu tô com fome. Minha mãe só tem farinha e fubá pra comer", disse.

A mãe de Miguel, Célia Arquimino Barros, de 46 anos, vive com seis filhos no bairro São Cosme. "Eu vivo de auxílio emergencial, e o pai manda R$ 250, mas não é todo mês que manda", disse ela à TV Globo

Mais de 60 milhões de brasileiros enfrentaram algum tipo de insegurança alimentar de 2019 a 2021, segundo um relatório da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) divulgado no mês passado.

O menino fez certo. A fome no Brasil é um caso de polícia. Dos gorilas comendo. Dos cavalões comendo. O Brasil do cartão corporativo do Bolsonaro sob sigilo de cem anos. O Brasil do orçamento paralelo de Ciro Nogueira. Do orçamento secreto de Arthur Lira. Da ministra da Agricultura que quis solucionar o problema da fome, oferecendo alimentos fora da validade. Do ministro da Economia recomendo aos que comem que ofereçam os restos de comida aos sem nada, aos pobres. Que 40% da população civil pena na pobreza, para o governo pagar salários acima do teto, pagar para generais salários de marechais, salários que ficarão como herança para as filhas que não se casarão no civil, para permanecer solteiras até a virada deste século se as democracias intermitentes, as democracias interrompidas pelos golpes militares permitirem. 

“Grande humanista”, diz Reinaldo Azevedo sobre Guedes sugerir sobras de comida a mendigos

 

por Davi Nogueira

Em publicação nas redes, o jornalista Reinaldo Azevedo comentou a mais nova declaração absurda do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Durante anúncio de projeto de flexibilização da regra que trata da validade de alimentos no Brasil, Guedes sugeriu que sobras de alimentos de famílias de classe média e restaurantes sejam doadas a pessoas vulneráveis.

Comparando com a quantidade de comida consumida por uma pessoa da classe média na Europa, que ele diz serem “pratos relativamente pequenos”, o ministro afirmou que no Brasil exageramos e deixamos “uma sobra enorme”.

Reinaldo respondeu à fala do ministro e lembrou que o Brasil tem ”110 milhões vivendo em insegurança alimentar”.

Ele disse, em tom irônico, que Guedes e a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, que teve a ideia de distribuir alimentos vencidos aos pobres, são “grandes humanistas”.

O Brasil é o 3° maior produtor de alimentos do mundo e o maior exportador. Mas há 110 milhões vivendo em insegurança alimentar. Tereza Cristina teve uma ideia: alimentos vencidos pra pobres. Guedes teve outra: distribuir sobras de restaurantes pra mendigos. Grandes humanistas!

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Enquanto o povo come osso, JBS alcança lucro histórico com a exportação de  carne |Fila da fome em Cuiabá recebeu ossos de 'qualidade', diz governador de Mato  Grosso - CartaCapitalMoradores dormem na 'fila de ossinhos' para garantir cesta básica em Cuiabá  | Mato Grosso | G1Fila para conseguir doação de ossos é flagrante da luta de famílias  brasileiras contra a fome | Fantástico | G1

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14
Jul22

‘Chegamos nesse grau de pobreza e necessidade no país porque não houve política social’, diz Miriam Leitão sobre aprovação da PEC das Eleições

Talis Andrade

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O plenário da Câmara dos Deputados concluiu na noite desta quarta-feira (13) a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que contorna a legislação a fim de permitir ao governo conceder uma série de benefícios sociais às vésperas da eleição presidencial.

A comentarista Miriam Leitão falou ao Bom Dia Brasil sobre as consequências dessa decisão e o motivo dela acontecer neste momento.

"Por que a gente chegou até aqui? Por que a gente chega perto das eleições com tanta pobreza, uma situação tão dramática e que o Congresso passou por cima de todas as leis, de todos os regimentos, fazendo uma política que não pode ser feita, que é uma política eleitoreira? Chegamos nesse grau de pobreza e necessidade porque não houve uma política social no governo Bolsonaro", diz Miriam.
 

Miriam também falou que as crises acontecem para que os governos saibam contornar e achar uma solução com qualidade.

"Um erro, por exemplo, que o governo Bolsonaro cometeu foi desde o começo, quando ele foi empurrado para fazer o auxílio emergencial, que ele não queria fazer, ele concentrou na Caixa ao invés de fortalecer um sistema que já existe no Brasil, foi criado pela Constituição, e vários governos implantaram, que é o SUAS - Sistema Único de Assistência Social, que vai até o centro de assistência social dos municípios", explica.

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Deus está morto, então tudo é permitido a Lira, o onipotente, comprova Reinaldo Azevedo:

Reinaldo: Bolsonaro fez país de fome, raspas e restos.
 

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27
Fev22

Por que a guerra?

Talis Andrade

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por Gustavo Krause

- - -

Gelei quando o noticiário mostrou imagens do exercício militar de armas hipersônicas e nucleares do exército russo, em Belarus, fronteira com a Ucrânia. Dias depois, a insanidade do conflito começou. Como se não bastasse o estresse dos últimos dois anos de pandemia virótica e pandemônio político, veio-me à lembrança a trágica estética das guerras: o mortal cogumelo atômico em Hiroshima e Nagasaki.

O século XX deixou as marcas de dois conflitos mundiais e, segundo John Gray, “Desde 1950, ocorreram perto de vinte genocídios; pelo menos três deles tiveram um milhão de vítimas (Bangladesh, Camboja e Ruanda)” (Cachorros de palha, p. 108).

Autêntico baby boomer, vivi os tempos da Guerra Fria; senti na pele o ambiente ameaçador e os momentos de risco para a paz universal: os blocos pautavam as relações internacionais no pragmatismo econômico e no equilíbrio do medo da catástrofe universal.

Por sua vez, o século XXI é um vendaval de inovações: quebra paradigmas em todas as dimensões sociais: ultrapassa limites convencionais de tempo e espaço; coloca na agenda global enormes desafios; aterroriza a humanidade com o destino escatológico.

Foi precisamente a combinação tempo/imagem/comunicação instantânea que me assustou, bombardeado pela mídia, redes sociais, sobre várias questões: pandemia, pobreza, desastres ambientais, violência, racismo, homofobia, feminicídio, enfim, uma carga de informações rasas e duvidosas que inibem o debate consistente e permitem estridente cacofonia de opiniões.

Agora, testemunhar a monstruosidade da barbárie. Evitei o ansiolítico, quando recordei a leitura de uma preciosidade: “Por que a Guerra?” indagações entre Einstein e Freud (cartas, 1932) em que o gênio da física consulta o gênio da psicologia, cortês e humildemente: “Existe alguma forma de livrar a humanidade da ameaça da guerra?” “É possível controlar a evolução da mente do homem, de modo a torná-lo à prova das psicoses do ódio e da destrutividade?”

Por serem geniais, ambos têm mais dúvidas do que certezas. Freud caminha pelo conflito das pulsões de vida e da morte. Acredita na força civilizatória e, concordando com Einstein, afirma: “As guerras só serão evitadas se a humanidade se unir para estabelecer uma autoridade central a que será conferido o poder de arbitrar todos os conflitos de interesses”.

A Liga das Nações fracassou. Porém, não há outro caminho para paz, senão a Política na concepção de Hannah Arendt: “A Política se baseia na pluralidade de homens […] A Política trata da convivência entre diferentes […] O sentido da Política é a liberdade”. E adverte: “A guerra, quando posta em andamento, será necessariamente conduzida com as armas que estiverem à disposição das potências que a estão travando”.

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29
Dez21

Retrospectiva Brasil 2021: negacionismo, fome e CPI no segundo país do mundo mais afetado pela Covid

Talis Andrade
Cemitério de Nossa Senhora Aparecida em Manaus, Brasil, o país com a segunda maior taxa de mortalidade Covid-19 do mundo
Cemitério de Nossa Senhora Aparecida em Manaus, Brasil, o país com a segunda maior taxa de mortalidade Covid-19 do mundo Michael DANTAS AFP/File

O ano de 2021 começou de maneira trágica, com a falta oxigênio nos hospitais de Manaus. Médicos, enfermeiros e parentes desesperados vendo pacientes agonizando dias depois de integrantes do governo federal terem visitado a capital amazonense para divulgar o tratamento precoce sem eficácia contra a Covid. Enquanto nos hospitais a luta por atendimento definia a vida ou a morte.

A crise sanitária aguda, com mais de 600 mil mortos, acabou numa CPI do Senado, instalada por determinação do Supremo Tribunal Federal. Depoimentos e documentos que escancaram a atuação errática do governo Bolsonaro, com gabinete paralelo pró-cloroquina, cartas da Pfizer ignoradas resultando na compra atrasada de vacinas e até papel fraudado para vendar imunizante da Índia superfaturado. Não àa toa que a temperatura subiu muitas vezes na CPI.

A pressão de todos os lados levou o governo a acelerar a compra de vacinas e, com a robustez da estrutura do SUS, a imunização finalmente, reduzindo sobremaneira o número de mortos. Mesmo diante de prova cabal de que a vacinação era o caminho, o presidente Jair Bolsonaro ainda insistia no negacionismo.

“Quando você estiver sentindo falta de ar” - disse Bolsonaro em uma transmissão ao vivo imitando alguém com dificuldade para respirar - “Você vai para o hospital. Para fazer o quê? Para tomar o quê, se não toma nenhum remédio comprovado? Para ser entubado. Esse é o protocolo do Mandetta. E canalha é aquele que critica a cloroquina, a ivermectina e não apresenta uma alternativa.”

Bolsonaro defendeu a divulgação do nome de funcionários da Anvisa que trabalharam na aprovação da vacina para crianças. Antes ele já havia provocado fúria ao divulgar dado mentiroso relacionando imunização contra a Covid ao HIV. 

 

Bolsonaro perde apoio popular

A postura do presidente fez despencar seu apoio popular e ele reforçou a tática de buscar inimigos, mirando a artilharia para o Supremo Tribunal Federal, que fechava o cerco a radicais, com a prisão de bolsonaristas como Daniel Silveira e Roberto Jefferson. O ápice da crise institucional veio no 7 de setembro

“Não mais aceitaremos qualquer medida, qualquer ação ou qualquer sentença que venha de fora das quatro linhas da Constituição. Nós também não podemos continuar aceitando que uma pessoa continue barbarizando a nossa população. Ou o chefe desse poder enquadra o seu, ou esse poder pode sofrer o que não queremos”, disse Bolsonaro numa referência ao ministro do STF Alexandre de Moraes.

Além dos ataques ao Judiciário, conforme sua popularidade caía, o presidente mais uma vez repetia, feito um mantra, que as urnas eletrônicas não eram confiáveis, e que qualquer resultado diferente da sua reeleição seria por ele contestado. Até dia e horário marcou para apresentar provas, mas não as apresentou.

O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, em uma foto de 7 de setembro de 2021.
O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, em uma foto de 7 de setembro de 2021. PAULO LOPES AFP/Archivos

 

Orçamento paralelo para o Legislativo

Bolsonaro foi orientado a baixar a bola e, se quisesse ter o centrão como apoio, a engolir o discurso golpista. Não foi só isso. O grupo que apoia o presidente engordou os bolsos com cargos, emendas e até orçamento paralelo, dinheiro público sem rastreio dos órgãos de controle. Com isso o Executivo conseguiu aprovar propostas polêmicas como as mudanças no pagamento dos precatórios, o que lhe assegura uma bolada em ano eleitoral. O que tema gerou debate no Congresso entre governo e oposição.

Se no Legislativo Bolsonaro conseguiu certo apoio a custas de muito dinheiro, na economia o ano foi um desastre: inflação nas alturas com a disparada do preço de produtos como a carne, desemprego, alta na conta de luz, e gasolina também com o preço a perder de vista, fazendo até motoristas de aplicativo a abandonarem a função.

 

Multidão faminta e medalhas inéditas

O lado mais perverso de tudo: a pobreza. Famílias indo morar na rua sem dinheiro para o aluguel. E uma cena cada vez mais comum nas cidades brasileiras: pessoas revirando lixo para achar o que comer. Uma multidão dependendo da solidariedade alheia para comer.

O país de uma multidão faminta, o crescimento do PIX como ferramenta nas transações comerciais, o leilão do 5G na telefonia.

No esporte, teve a volta do público aos estádios de futebol, a polêmica sobre comentários homofóbicos no vôlei e as medalhas inéditas no Japão, como no surfe de Ítalo Ferreira, no skate de Rayssa Leal e na ginástica olímpica de Rebeca Andrade. 

“Eu fiquei muito feliz por ter representado o Brasil, por ter ido tão bem, por levar o nome da ginástica, o nome do nosso país para o mundo inteiro. Espero que a gente tenha mais investimento, que as pessoas acreditem mais em todos os esportes, e não só na ginástica. O esporte salva vidas, o esporte educa”, disse Rebeca. 

Da esquerda para direita de cima para baixo:Mayra Aguiar, Rebeca Andrade, Daniel Cargnin, Kelvin Hoefler, Fernando Scheffer, Rayssa Leal e Italo Ferreira
Da esquerda para direita de cima para baixo: Mayra Aguiar, Rebeca Andrade, Daniel Cargnin, Kelvin Hoefler, Fernando Scheffer, Rayssa Leal e Italo Ferreira © Fotomontagem com fotos da AP

 

Fuga de cérebros, incêndio da Cinemateca

O país teve ainda debandada de pesquisadores de órgãos institucionais, incêndio na Cinemateca brasileira, prisão de cantor por agressão à mulher, vinte dias de perseguição a Lazaro Barbosa que assombrou moradores de Goiás, e ação de bandidos que usaram escudos humanos e levaram terror a Araçatuba, no interior paulista, chegando a instalar mais de cem explosivos.

No Rio Grande do Sul, quatro réus foram a júri popular este ano pelo incêndio da boate Kiss onde 242 pessoas morreram há oito anos.

No Rio de Janeiro, houve a prisão da mãe e do padastro vereador acusados pela morte do pequeno Henry Borel e a angústia das famílias de três meninos de Belford Roxo, que desapareceram há um ano e só agora confirmaram que eles foram brutalmente assassinados pelo tráfico.

 

Violência

A violência na floresta também chocou o país, com índios desnutridos, a pele e osso, avanço do garimpo ilegal, morte de animais nos incêndios e desmatamento recorde na Amazônia, reconhecido pelo ministério da Justiça.

Destaque no jornal Le Monde desta quinta-feira (02/07) para a volta das queimadas na Amazônia que registraram em junho o maior número de focos dos últimos treze anos.
Destaque no jornal Le Monde desta quinta-feira (02/07) para a volta das queimadas na Amazônia que registraram em junho o maior número de focos dos últimos treze anos. AP - Leo Correa

 

Políticos comemoraram a anulação de investigações, como o caso do triplex contra Lula, as provas das rachadinhas contra Flávio Bolsonaro, e algumas outras da Lava Jato contra Eduardo Cunha e Sérgio Cabral. De olho e 2022, o presidente Bolsonaro se filiou ao PL, Sérgio Moro foi para o Podemos e Lula tem cortejado o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin para vice.

“Não importa se no passado fomos adversários, se trocamos algumas botinadas, se no calor da hora dissemos o que não deveríamos ter dito. O tamanho do desafio que temos pela frente faz de cada um de nós um aliado de primeira hora”, disse Lula após jantar com Alckmin.

O país fecha 2021 com a chegada da variante ômicron, embate em torno da vacinação de crianças, cidades baianas inundadas com a chuva, surto de gripe e inúmero problemas a resolver, como a fome. Sentindo também saudade de tantos que se foram, como o ator Paulo Gustavo por Covid e a cantora Marília Mendonça, num desastre de avião.

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