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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

10
Jul23

Inelegibilidade de Bolsonaro: necessária e urgente releitura do abuso de poder

Talis Andrade

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Por André Garcia Xerez Silva

Na ação de investigação judicial eleitoral movida pelo Partido Democrático Trabalhista contra Jair Messias Bolsonaro, o Tribunal Superior Eleitoral, em 30 de junho de 2023, concluiu o julgamento que decidiu, por maioria, condenar o ex-presidente "pela prática de abuso de poder político e pelo uso indevido de meios de comunicação nas Eleições 2022 e declarar sua inelegibilidade por 8 (oito) anos seguintes ao pleito de 2022" [1]. A síntese da causa de pedir foi a realização de reunião no Palácio da Alvorada com embaixadores estrangeiros no dia 18 de julho de 2022, oportunidade na qual o investigado proferiu discurso que, na ótica do TSE, pretendia deslegitimar o processo eleitoral por meio da veiculação de desinformações.

Esses fatos e seu respectivo enquadramento jurídico precisam ficar muito claros para que se compreenda a dimensão do que foi considerado abuso de poder pela maior instituição da Justiça Eleitoral do país e que resultou na inédita decretação de inelegibilidade do antigo ocupante do mais importante cargo da República. Embora sejam corriqueiras as acusações de utilização da máquina pública em benefício de candidatos no âmbito municipal, estadual e mesmo federal, há um elemento na condenação de Bolsonaro que ultrapassa o patrimonialismo típico do desvio de finalidade que apropria indevidamente a estrutura estatal em prol de campanhas políticas.

Tradicionalmente, as espécies de abuso de poder imputadas a Bolsonaro se fundamentam na premissa da garantia à paridade de armas, segundo a qual deve ser assegurada a todos os candidatos uma disputa eleitoral com igualdade de oportunidades por meio da conquista legítima da preferência do eleitorado, a fim de mitigar as assimetrias decorrentes do uso indevido do poder econômico, político e dos meios de comunicação. Esse paradigma, que se preocupava antes em fiscalizar a instrumentalidade do processo eleitoral com o adequado uso dos recursos materiais e financeiros pelos candidatos, não parece ser mais o horizonte interpretativo suficiente para conferir a legitimidade da disputa política hodierna.

O elemento inovador que o julgamento de Bolsonaro suscita é o olhar da Justiça Eleitoral dirigido para a substância, para o conteúdo da plataforma eleitoral sustentada pelo candidato, que sobeja como fundamento decisivo para a caracterização do ato ilícito. Os rótulos das categorias de abuso de poder empregados pelo Tribunal Superior Eleitoral, na realidade, apenas expressam a exteriorização no mundo empírico quanto à utilização da estrutura do Palácio da Alvorada (abuso de poder político), da TV Brasil e da divulgação em redes sociais (uso indevido dos meios de comunicação social), mas cujo verdadeiro abuso se assenta mais em função do conteúdo de seu pronunciamento e menos no modo pelo qual ele foi transmitido.

Não que antes não se examinasse o teor das mensagens propagadas pelos candidatos para aferir a desvirtuação da máquina administrativa ou dos meios de comunicação social, sob a ótica da promoção pessoal, visando a auferir dividendos eleitorais, que, de maneira mais ou menos implícita, dissimulava a condição de candidato no exercício da função de gestor. Essa deformação passou a adquirir outra conotação quando o TSE decidiu, em 7 de dezembro de 2021, que "ataques ao sistema eletrônico de votação e à democracia, disseminando fatos inverídicos e gerando incertezas acerca da lisura do pleito, em benefício de candidato, podem configurar abuso de poder político ou de autoridade — quando utilizada essa prerrogativa para tal propósito — e/ou uso indevido dos meios de comunicação quando redes sociais são usadas para esse fim" [2], no caso que levou à cassação do deputado paranaense Fernando Francischini.

A teleologia dessa perspectiva do abuso de poder não se explica pela ruptura do princípio da impessoalidade na administração pública mediante o aparelhamento de sua estrutura para confundir o eleitorado entre o que seriam as ações do candidato e as ações do agente estatal. Aqui, não há elementos próprios da propaganda eleitoral no sentido de enaltecer as qualidades pessoais do candidato para incutir no eleitorado a ideia de que ele é o mais apto a exercer a função pública, tampouco pedido de voto ou apoio em seu favor. O benefício eleitoral, nesse contexto, advém da adesão angariada entre os cidadãos adeptos de teorias conspiracionistas, em princípio, contra o sistema eletrônico de votação, mas também da canalização de ideais contrárias à democracia. Não se alude à quebra de paridade de armas na acepção de que um candidato ostenta uma posição privilegiada no pleito decorrente da utilização abusiva de recursos públicos ou privados em detrimento de outras candidaturas, mas consiste, sobretudo, na ilegitimidade da preferência eleitoral inspirada por impulsos antidemocráticos.

Essa tênue distinção entre os dois paradigmas de abuso de poder acima expostos, inclusive, não escapou à sagacidade da defesa do investigado, Jair Messias Bolsonaro, que logo se ocupou de arguir a incompetência da Justiça Eleitoral, uma vez que a reunião com os embaixadores, em que foi questionada a confiabilidade das urnas eletrônicas, estaria despida de caráter eleitoral, por se tratar de típico ato de governo; tese que foi, contudo, refutada pelo Plenário da Corte. O precedente do final de 2021, que pavimentou o caminho para o julgamento de Bolsonaro, gerou desdobramentos que atestam a existência concreta de uma nova dimensão do abuso sobre o qual a Justiça Eleitoral agora é instada a enfrentar.

Em 16 de março de 2023, o Tribunal Regional Eleitoral do Ceará, por maioria, condenou à inelegibilidade o deputado estadual, Delegado Cavalcante, então candidato a deputado federal, em virtude de discurso proferido em comício realizado em 7 de setembro de 2022 com o seguinte teor: "O presidente Bolsonaro é o mais querido, é o que a população está querendo. E não vamos aceitar que as urnas dê a vitória para quem não presta. E digo mais: se a gente não ganhar... se a gente não ganhar — eu vou repetir — se a gente não ganhar nas urnas, se eles roubarem nas urnas, nós vamos ganhar na bala. Na bala. Nós vamos ganhar na bala. Não tem nem por onde. Nós vamos ganhar na bala" [3]. O voto divergente que prevaleceu demonstrou a similaridade com o "Caso Francischini" e reputou presente o abuso de poder político, em função do suporte da estrutura político-partidária para o comício, além da condição de deputado estadual, e o uso indevido dos meios de comunicação, pois o candidato publicou sua fala em perfil de rede social.

Os julgamentos de Francischini e Cavalcante expõem como desinformação, incitação à violência e ameaça às instituições democráticas estão entrelaçadas enquanto formas de discurso destinadas à captura da preferência eleitoral e que, por isso, deslegitimam os mandatos eventualmente conquistados sob essa plataforma política, além de impor a decretação à inelegibilidade como medida de proteção do Estado Democrático de Direito em face daqueles que contra ele atentaram. A evolução da divulgação de informações inverídicas sobre urnas eletrônicas e o sistema eletrônico de votação até a pregação do recurso à insurreição armada contra o Estado de Direito não é uma mera contingência dessa expressão do abuso.

Trata-se de realidade presente a ascensão do populismo de caráter antidemocrático, que, segundo explica Jan Werner Müller [4], não representa uma face legítima da moderna política democrática, tampouco uma patologia decorrente de cidadãos irracionais. Esse fenômeno é a sombra permanente da política representativa, tendo em vista que os populistas não se opõem aos princípios dessa representatividade, mas apregoam a narrativa de que somente eles podem ser considerados os representantes legítimos do povo, isto é, são antipluralistas. Apenas eles representam o povo e todos os outros competidores políticos são ilegítimos. O povo, para eles, é uma entidade moral homogênea cuja vontade não erra. Por isso, argumenta Müller que populistas devem ser criticados não apenas como antiliberais, mas, sobretudo, como um real perigo para a democracia, de modo que sua participação no debate político seria condicionada a que se mantenham na legalidade e não incitem a violência.

Esse viés autoritário do populismo aposta em uma razão binária beligerante que reproduz uma lógica de ódios e afetos para legitimar todos aqueles que integrem a comunidade moral que detém o monopólio da condição de "povo" e, por conseguinte, deslegitimar os excluídos. Essa plataforma política que aposta na divisão no lugar do consenso e explora o preconceito em vez de combatê-lo, agrava a intolerância, que é crescente no Brasil e no mundo. No campo político, a intolerância consiste na tentativa de apagar ou não admitir pontos de vista diferentes daqueles do próprio indivíduo, enquanto a intolerância na esfera social se caracteriza pela falta de habilidade ou disposição em respeitar as diferenças de toda ordem entre as pessoas, que, conforme Lilia Schwarcz, se expressa na forma de "racismo, misoginia, antissemitismo, homofobia, pragmatismo religioso ou político, horror aos estrangeiros (...)" [5].

Contra essa ameaça à democracia ainda não há resposta institucional pronta e acabada. Muito se mencionou no debate público recente o paradoxo da tolerância de Karl Popper, abordado em sua obra A Sociedade Aberta e seus Inimigos, para propor uma explicação sobre limites da convivência com a intolerância no regime democrático. Não se atentou, contudo, que antecede o paradoxo da tolerância a referência de Popper ao paradoxo da liberdade formulado por Platão, que critica uma versão demasiadamente ingênua do liberalismo, da democracia, e do princípio majoritário, que propõe implicitamente a indagação: "E se for vontade do povo, não que ele próprio governe, e sim um tirano em seu lugar?" [6]. Nesse caso, o homem livre, no exercício de sua liberdade, desafia a própria liberdade e clama por um tirano.

Para se evadir dessa contradição, Karl Popper oferece uma compreensão do problema que não se baseia nas qualidades intrínsecas das virtudes do princípio majoritário, mas nos vícios da tirania e na adoção de mecanismos que lhe evitem e resistam. Segundo o filósofo, deve ser classificado como democracia o governo do qual se livra sem derramamento de sangue, por meio de eleições gerais e instituições sociais que assegurem a retirada pacífica dos governantes e que não sejam facilmente destruídas pelos detentores do poder, ao passo que tirania, ou ditadura, representam o contrário, isto é, os governados não conseguem expurgar os governantes a não ser por meio de revoluções vitoriosas. Daí por que Popper afirma que o princípio de uma política democrática deve ser agora uma proposta de criar, desenvolver e proteger as instituições políticas, para evitar a tirania, pois o princípio democrático significa aceitar que uma política má na democracia, desde que persista a possibilidade de mudança pacífica do governo, é preferível à subjugação por uma tirania, por mais sábia ou benévola que seja. A teoria da democracia não se baseia, assim, no princípio absoluto do governo da maioria, mas na existência de métodos igualitários para o controle democrático. O sufrágio e o governo representativo, mais do que fins em si mesmos, devem ser considerados, na realidade, eficazes instrumentos de salvaguarda institucional contra a tirania, passíveis de constante aperfeiçoamento.

Essa é a perspectiva que o conceito guarda-chuva do "abuso de poder" no Direito Eleitoral necessita incorporar. Até então, a ênfase no aspecto político, econômico ou no uso de meios de comunicação social restringe as ferramentas de proteção do regime democrático e nem sempre se mostra suficiente a coibir adequadamente discursos antidemocráticos patrocinados pelos candidatos. Na esteira dos precedentes que vem se formando sobre a matéria, o abuso de poder consistente em ataques ao sistema eletrônico de votação e à democracia depende da utilização da prerrogativa do poder político e/ou de sua veiculação nos meios de comunicação social, incluída a internet. Nos casos Francischini e Cavalcante, o exercício da função parlamentar foi considerado como elemento para caracterizar o abuso de poder como político ou de autoridade e a divulgação em suas redes sociais de suas falas foi enquadrada como uso indevido dos meios de comunicação.

Essas condicionantes excluem da incidência do campo do abuso de poder o candidato que não exerce mandato ou é agente público, em sentido estrito ou amplo, como também não alcança pronunciamentos que não sejam veiculados nos meios de comunicação social, como falas em reuniões particulares, visitas a eleitores e comunidades, entrevistas concedidas a rádios e televisões sobre os quais não detém gerência, discursos em comícios e espaços públicos ou qualquer modalidade de propagação de ideias antidemocráticas que se opere na clandestinidade. Se um candidato, nessa simples condição, atenta contra a democracia por meio da realização de discursos políticos incompatíveis com o Estado Democrático de Direito sem que isso seja veiculado em suas redes sociais ou algum veículo oficial de comunicação da campanha, uma visão estreita do abuso de poder o eximiria de vir a ser responsabilizado com a perda do mandato ou com a decretação de inelegibilidade.

Essa lacuna da doutrina do abuso de poder há de ser preenchida com a devida extensão que as ameaças à democracia exigem para que o ato ilícito contemple toda e qualquer manifestação de candidatos que pretendam captar a preferência eleitoral com base em plataformas políticas autoritárias, que incitem o ódio e a intolerância, com manifesto conteúdo desinformativo [7]. O julgamento de Bolsonaro é o convite urgente para que as instituições se aperfeiçoem e incrementem a sua grade de proteção e defesa da democracia pela Justiça Eleitoral.

- - - 

[1] TSE. Aije n. 0600814-85.2022.6.06.0000. Rel. min. Benedito Gonçalves. Julgado em 30/06/2023.

[2] TSE. Recurso Ordinário Eleitoral nº 0603975-98.2018.6.16.0000. Rel. min. Luís Felipe Salomão. Julgado em 07/12/2021.

[3] TRE/CE. AIJE n. 0602936-06.2022.6.06.0000. Rel. Designado juiz George Marlmeinstein Lima. Julgado em 16/03/2023.

[4] MÜLLER, Jan-Werner. What is populism? Philadelphia, PA: University of Pennsylvania Press, 2016, p. 101.

[5] SCHWARCZ, Lilia Moritz. Sobre o autoritarismo brasileiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2019, p. 214.

[6] POPPER, Karl Raimund. A sociedade aberta e seus inimigos. Tradução de Milton Amado. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Universidade de São Paulo, 1987, p. 138.

[7] Essa proposta é defendida na obra A tolerância no processo eleitoral: contornos jurídicos e perspectivas, resultado da tese de doutorado defendida por este autor no Programa de Pós Graduação da Universidade de São Paulo, publicada pela editora Lumen Juris.

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30
Out22

Na reta final, bolsonarismo age como milícia

Talis Andrade

 

por Fernando Brito

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O que vai acontecer, de hoje até domingo, é intimidação, crime e tentativa de coagir eleitores, não se engane.

Terrorismo de Roberto Jefferson, acobertamento e destruição de provas no tiroteio de Paraisópolis, áudio do organizador das motociatas de Jair Bolsonaro ameaçando espancar pessoas e dar “um tiro na cabeça do Xandão”, grades do pátio de uma igreja arrancadas na Zona Oeste do Rio de Janeiro, o filho do presidente falando em adiamento das eleições, a lista é interminável e cada um destes eventos daria um post, se eu não me recusasse a ajudar o clima de medo que pretendem.

Embora não seja incoerente que milicianos façam campanha eleitoral como milicianos, é inacreditável que isso consiga arrastar, pelo fanatismo, uma parcela de brasileiros que, em condições normais, nada têm a ver com este tipo de banditismo.

Agora, na reta final, pressionados pela desvantagem aparentemente intransponível que tem Lula, estes atos desesperados são prenúncio da derrota e, além disso, preparação para as contestações do resultado.

O comportamento de Jair Bolsonaro, no debate de hoje, refletirá este clima. Agressões, desaforos e tentativa de intimidação física não faltarão.

Há, portanto, de não faltar a Lula a tranquilidade para suportar e, na hora certa, a firmeza para reagir.

A nossa parte é dar a cara na rua, combater com a exposição de nossa vontade decidida a vontade da população e rechaçar o medo que procuram impor.

É focar no objetivo: o que queremos para a vida dos brasileiros e que Bolsonaro negligenciou: comida, saúde, salário, escola, SUS…

Contra a loucura, lucidez. Não há outro caminho.

Porque o bolsonarismo é nazista

 
 
27
Jul22

Ex-ministros do STF, artistas, acadêmicos, banqueiros e outros assinam carta em defesa da democracia e das urnas eletrônicas

Talis Andrade
Faculdade de Direito da USP divulga carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito! — Foto: Reprodução

Faculdade de Direito da USP divulga carta às Brasileiras e aos Brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito! 

 

Por Roberta Giacomoni, g1 SP e TV Globo

Ex-ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), empresários, banqueiros e artistas assinaram uma carta em defesa da democracia e do processo eleitoral após seguidos ataques do presidente Jair Bolsonaro (PL) contra as urnas eletrônicas. A carta e a lista com os nomes foram divulgadas nesta terça-feira (26) no site da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). 

Carlos Ayres Britto, Carlos Velloso, Celso de Mello, Cezar Peluso, Ellen Gracie, Eros Grau, Marco Aurélio Mello, Sepúlveda Pertence e Sydney Sanches são os ex-ministros do STF que assinam o documento.

A carta diz que recentes "ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado Democrático de Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira".

"Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos."

 

"Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições", diz trecho 

Dentre os empresários estão Walter Schalka, presidente da Suzano; Roberto Setúbal, ex-presidente do Banco Itaú; Natália Dias, CEO da Standard Bank; Pedro Moreira Salles, presidente do conselho de administração do Itaú Unibanco; Pérsio Arida, ex-presidente do BNDES e do Banco Central; Tarcila Ursini, conselheira de administração da EB Capital, entre outros.

Também aparecem entre as assinaturas os artistas Chico Buarque, Arnaldo Antunes, as atrizes Debora Bloch e Alessandra Negrini, os ex-jogadores de futebol Walter Casagrande e Raí, o cineasta João Moreira Salles e padre Júlio Lancellotti, que atua na defesa da população de rua em São Paulo.

As pessoas interessadas em assinar o documento poderão fazê-lo online pelos sites da Faculdade de Direito da USP, da Associação de Juízes Federais, Associação do Ministério Público e do Grupo Prerrogativas.

O conteúdo será apresentado na sede da Faculdade de Direito da USP, no Centro de São Paulo, em 11 de agosto, com Roberta Estrela D'Alva como cerimonialista. A data comemora o aniversário da criação dos cursos de direito no país e coincide com a leitura de manifesto no mesmo local em 1977 para denunciar a ditadura militar, que subtraiu direitos e matou opositores do regime.

 

Clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições

Íntegra da carta

 

"Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos Cursos Jurídicos no País, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o estado democrático de direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.

Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.

Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.

A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.

Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.

Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.

Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.

Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.

Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.

Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.

Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.

No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.

Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:

Estado Democrático de Direito Sempre!!!!"

TSE on Twitter: "O Estado Democrático de Direito possui fundamentos que  sustentam o funcionamento e desenvolvimento do Estado e da sociedade. Eles  são importantes para a construção de uma sociedade livre, justa,
27
Jan22

A verdadeira cremação de Olavo

Talis Andrade

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por Eric Nepomuceno

Leio o anúncio do sepultamento do jornalista e astrólogo Olavo de Carvalho no cemitério St. Joseph na cidadezinha de Petersburg, estado de Virgínia, onde ele vivia refugiado há uns dezesseis anos. 

Leio e sinto que há no anúncio um grande equívoco.

 Aprendi com meu avô paterno, o velho patriarca José Augusto Nepomuceno, que não se deve celebrar morte de ninguém – exceto as de Adolf Hitler e Benito Mussolini.

Cada vez que, ao longo da minha já um tanto longa vida, senti vontade de festejar alguma das tantas mortes, lembrei do meu avô José Augusto. Assim que não vou festejar, para nada, o sumiço dessa figura dantesca e abominável chamada Olavo de Carvalho, que se autodenominou filósofo.
 

Tropecei com ele lá por 1967 ou 68, quando me juntei à equipe do então revolucionário, no sentido de formato e conteúdo, “Jornal da Tarde”. Foram contatos ocasionais, rapidíssimos, e mal e mal lembro dele. 

Tornei a tropeçar com essa figura quando ele desandou a publicar nos principais jornais e revistas deste pobre país, e foi demitido de um em um não só porque escrevia muito mal, mas porque era de um reacionarismo sem pé nem cabeça. E aí ele virou um fenômeno nas tenebrosas redes sociais.

Virou “o professor”, o “filósofo”, virou qualquer coisa que teve um espaço enorme dentro desta catástrofe que vivermos a cada segundo de cada minuto de cada dia das nossas vidas.

 É bem verdade que essa influência veio perdendo espaço no governo, mas entre os seus seguidores, não. E esses seguidores continuam absolutamente leais a Jair Messias, apesar do distanciamento.

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 O que Olavo de Carvalho fez depois que descobriu e utilizou de maneira intensa as redes sociais foi espalhar mentiras, absurdos, pura escatologia, cinismo soberano. E trouxe para a superfície um poderoso contingente de extremistas não apenas da direita, mas da elevadíssima ignorância que estava abrigada em armários e nos últimos anos saiu não para a luz do dia, mas as trevas do absurdo. 

Não, eu seguirei a lição de meu avô e não celebrarei a morte dessa figura abjeta e perigosa que deixa como herança um imenso bando de seguidores tão fanáticos quanto imbecis. 

Apenas corrijo o anúncio de seu funeral: depois de enterrado, Olavo de Carvalho será de imediato cremado no fogo do inferno. Que o Diabo o tenha para sempre.

 

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10
Jan22

Os Imperdoáveis do Direito ou "podemos parar o sol e matar mais gente"

Talis Andrade

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Por Lenio Luiz Streck

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1. 2021: Desconstruindo mitos

É o penúltimo texto de 2021. E tem mais de dez linhas. Quem conseguirá chegar até o final?

Começo falando de um filme. Falo de "Os Imperdoáveis", com Clint Eastwood — um faroeste ruptural. De fundamental, o filme desconstrói mitos. Nada é o que parece. No Brasil de hoje, há que desconstruir mitos. Temos de ter sangue frio, como diz o personagem Willian Munny.

No faroeste não dá utilizar raciocínios teleológicos. Por que? Simples. Não dá para atirar primeiro e depois colocar o alvo. É o que alvo não espera...!

Também no faroeste não dá para usar o Target Effect (Efeito Alvo): primeiro atira a flecha (ou dispara o projétil) e depois, sorrateiramente, pinta o alvo ao redor. Ou seja, decisões jurídicas com viés de confirmação não dariam certo no faroeste. O contraditório é verdadeiro no faroeste, se é que me entendem.

 

2. Resistindo desde há muito: cumprir a CF é um gesto revolucionário

Fiz meu primeiro controle de constitucionalidade pós-1988 no dia seguinte ao do nascimento da Constituição. Continuo na resistência.

E desde 2015 afirmo que cumprir a Constituição é, em um país periférico, uma atitude revolucionária. De que modo resistiremos?

Talvez devamos buscar o que denomino de "Paciente Zero da Epidemia que Assola o Direito": descobrir por que, quem e como, de dentro do Direito, nega-se o próprio Direito. Isso para quem considera o Direito importante na democracia. Para quem acha desimportante, pule esta parte.

 

3. O desdenhamento do Direito e o perdoável

É até compreensível (e, quiçá, perdoável para quem não conhece história) que, no campo político, gente da esquerda e da direita desdenhem do Direito — claro que o fazem por razões distintas. Assim, no campo da política, é até perdoável que pessoas justifiquem o agir estratégico1 de um ex-juiz medíocre (no generoso sentido de Montesquieu) como Moro, cuja obra, fora do exercício já declarado parcial/suspeito pelo STF, nada, mas nada mesmo acrescenta ao mundo jurídico-político. Qual é a tese, o argumento, a teoria...? Qual é a contribuição concreta — além do legado fantástico de desprezo ao devido processo? Qual é o legado, a não ser o péssimo exemplo de como não deve ser ou agir um juiz?

Explicando melhor: Moro passou seus anos na magistratura fazendo aquilo que Charles Peirce chamou de "raciocínio fingido" — não é o argumento que determina a conclusão, mas a conclusão é que determina o argumento. E isso não é Direito e nem direito: é mero exercício de poder. Fundamentação ad hoc não é fundamentação.

Nesse mesmo contexto é até compreensível que pessoas — como jornalistas e jornaleiros — achem "normal" (sic) o comportamento de um (ex)procurador que entrou pela porta do lado do MPF e saiu pela porta dos fundos, deixando para trás uma frustrada fundação de bilhões abortada pela rápida ação de sua Chefe Raquel Dodge, além de um processo disciplinar prescrito graças a dezenas de adiamentos espertos — sendo agora um próspero candidato a cargo eletivo, embora oficialmente desempregado, deixando para trás um invejável emprego que, com diárias e penduricalhos, andava sempre em torno de 50 mil pratas. Não é pouca coisa, pois não?

No mais, os diálogos revelados pela operação spoofing bem demonstram a "expertise" dos procuradores (um deles demitido) que, entre outras coisas, pela ânsia de ter poder, perderam — e essa é a parte triste — até mesmo a capacidade de se enternecer com a morte de pessoas. Mais: desdenharam das garantias — chamadas de "filigranas" pelo chefe Dallagnol. Para quem quer saber o que é garantia (filigrana — sic), basta conhecer o teor das defesas de Dallagnol e do procurador demitido. O que tem de preliminar...

No mais, isso tudo não pode passar assim. É preciso, mesmo, que se faça uma espécie de iluminismo brasileiro, para esclarecer para a malta quem foram e o que fizeram nos verões passados essas pessoas. Para dizer que não pode ser assim.

 

4. O desdenhamento do Direito e o imperdoável

Todavia, o que é imperdoável — e chamemos o personagem Munny — é que professores, juízes, membros do MP, ministros, gente que deve(ria) cuidar do Direito, façam malabarismos retóricos com a estilística mervaliana — que faz inveja ao filólogo defensor do candidato Nebraska, da machadiana A Sereníssima Repúblicapara justificar justamente o descumprimento do Direito. Nem vou falar de jornalistas que fazem o jogo dos velhos acordos que fizeram com que o Brasil seja o que é: um país que, tendo sido o último a abolir a escravidão, tem um imenso, incomensurável passado como futuro.

O paradoxo é que, se os estrategistas do Direito vencerem, eles perdem e perdemos todos nós. Porque estratégia não é Direito. É... estratégia. É política. É moral. É economia. Só não é... Direito. Pode ser qualquer coisa, menos Direito, uma vez que contraria os fundamentos e os princípios que são condição de possibilidade para o Direito ser o que é.

Bacharéis, gente formada em direito, professores e quejandos que justificarem, compactuarem com ilegalidades e cumplicidades antijurídicas, não podem ser perdoados. Afinal, quem perdoaria médicos que proscrevessem os antibióticos, em vez de os prescreverem? Proscrever e prescrever: eis a diferença! E o juramento de Hipócrates se transformaria em uma rendição hipócrita?

São, pois, imperdoáveis os membros da dita comunidade jurídica quem, em vez de prescreverem (o) Direito, proscrevem-no. Predadores internos. E eis o problema: quanto mais medíocres, mais perigosos.

Há que se ter muito sangue frio para preservar direito o Direito a termos direitos. Sem isso, é a barbárie. Os gregos já sabiam disso.

 

5. Não dá para pedir para parar o sol (ups — na Bíblia a terra é plana)... e assim matar mais amorreus

Vamos falar sério. Muita gente tem defeitos. Não há virtuosos de origem. Não sou ingênuo. Sou dos que leram a (liberal) Fábula das Abelhas do Barão de Mandeville. Aliás, sou dos que leem muito.

Agora, cá para nós, não venham personagens como Moro e Dallagnol quererem, depois de amarrarem as mãos do goleiro e, depois do jogo, compor a direção do adversário, pedir a Deus para "parar o sol" e, assim, matar mais amorreus (Josué, 10, 1-28). Não contem essa história bíblica para as crianças (spoiler: os cinco reis foram pendurados em árvores ao sol — afinal, este ficou "esperando" o fim da batalha, não "permitindo que escurecesse" — e ficaram secando).

Aí não.

 

6. O sempre delicado Estado Democrático de Direito

Quando rompemos o casco do Direito, começa entrar água. E o buraco vai aumentando. Até que o barco afunde. Onde se puxa uma pena, sai uma galinha. Ou um marreco.

Há pouco, no inicinho de setembro, havia gente querendo matar o Direito. Por um dólar furado. Queriam duelar ao pôr do sol. Uma cavalgada de proscritos.

2021 não foi fácil. O passado do Direito brasileiro, hoje tomado por um reacionarismo proveniente de cursos jurídicos que se tornam um criatório dessa nova-velha espécie de negacionistas epistemológicos, é um emaranhado de teses superficiais, que, estranhamente, já não são "coisas do Direito".

São, quando muito, teses estratégicas de exercício de poder (hoje tem muita gente sedizente crítica que acha que o direito é só estratégia!), nas quais o Direito ocupa apenas o lugar de "argumento da flecha". "Vende-se tinta para pintar o alvo": eis o argumento coaching do Direito. Isto é: um não direito!

É preciso ter sangue frio, diz Munny. Sim, de fato, não se pode perdoar certos personagens. Ninguém é santo nesta República. Mas aí é que está o busílis. As abelhas virtuosas se estreparam. Leiam a fábula do barão.

Por isso, volto ao filme. Os Imperdoáveis desmitifica o velho oeste — ele é não é épico; é machista e cheio de velhacos. E a prostituta retalhada...? Bem, a reação começa aí. É que o xerife tinha lado. Era absolutamente suspeito. Usava a violência para impor a sua visão de justiça. Só que sua visão era parcial. E, como se diz na Europa, pena que é bem longe daqui,  "Justice must not only be done; it must also be seen to be done".

Pelo menos no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (e no velho Oeste), ser parcial é imperdoável.

 

1 Observe-se que, na esquerda ou campo progressista, também há lavajatistas ou ex-lavajatistas.

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06
Nov21

“Moro é mais perigoso do que Bolsonaro, porque é dissimulado”, diz Maura Montella

Talis Andrade

 

A economista Maura Montella afirmou, em entrevista à TV 247, que, entre as candidaturas de Sergio Moro e Jair Bolsonaro, a primeira representa um maior perigo ao Brasil. Para ela, o ex-juiz, declarado parcial pelo STF por conta da perseguição contra o ex-presidente Lula, é uma figura dissimulada e se utiliza de uma capa que lhe dá um ar mais amigável.

Apesar das aparências, Moro é justamente o oposto: “o Moro, porque ele é dissimulado. O Bolsonaro nunca negou quem ele é, agressivo, homofóbico, racista. Ele nunca negou. O Moro não. O Moro posa de bom moço, de educado, de fino, mas ele é todo o contrário. Então, ele é mais perigoso, porque ele tem essa capa, que o Bolsonaro não tem”. 

A economista ressaltou que o estrago gerado pelo governo Bolsonaro não pode ser ignorado. No entanto, sua ameaça já é, até certo ponto, contida pelas instituições. 

“O Bolsonaro pelo menos a gente já conhece, e o Moro a gente conhece só o seu pior lado como juiz. Mas ele como político, e tendo uma assessoria macabra por trás dele, eu acredito que o estrago seria ainda maior, se é que isso é possível. O Bolsonaro a gente já conhece e, de certa forma, consegue traçar alguns caminhos para lidar com toda a loucura e o estrago que ele está fazendo”, completou. 

Nesta sexta-feira (5), internautas acusaram o ex-ministro de Bolsonaro de roubar o slogan usado por Lula. Com agenda esvaziada, ele começou mal sua pré-campanha em passagem por Brasília.

 

11
Set21

Celso de Mello: o quanto se pode confiar no que diz Bolsonaro?

Talis Andrade

aroeira bolsonaro personalidade.jpg

 

 

 

por José Celso de Mello Filho /ConJur

- - -

A “Declaração à Nação” constante da Nota Oficial assinada por Bolsonaro em 09/09/2021 constituiria, no presente momento histórico que vive o nosso País, preocupante (e perigosa) (re)constituição da farsa do Pacto (ou Acordo) de Munich proposto, em 29/09/1938, por Hitler às principais potências europeias, em um instante de extrema, delicada e intensa tensão político-militar?

Quem ocuparia, nesse contexto, a posição ingênua de Neville Chamberlain, primeiro-ministro do Reino Unido, que, induzido a erro pelo Führer (cujo projeto totalitário de poder e ambição de expansionismo imperial eram inescondíveis), julgou, pateticamente, que o conflito seria evitado e a paz finalmente alcançada? Qual o coeficiente de credibilidade desse compromisso formalmente assumido por Bolsonaro?

O teor de sua “Declaração à Nação” mostra-se incompatível com a sua personalidade autocrática e inconciliável com a sua comprovada disposição de ultrajar a Constituição e de ignorar os limites que a Carta Política impõe aos seus poderes!

Como corretamente advertiu o Professor Sérgio Abranches, “Nota de recuo não vai mudar caminho de Bolsonaro rumo ao golpe”! Para resistir e frustrar qualquer subversão da ordem democrática (que traduz infame e desprezível ofensa à supremacia da Constituição), impõe-se — como assinala esse eminente Professor — a “formação de amplo consenso democrático”, que representará, neste momento, “o único meio [legítimo e pacífico] para interromper a escalada autoritária” daqueles que nutrem visceral desapreço pelo regime das liberdades fundamentais e pelo texto da Constituição!

A História, nesse episódio bolsonaresco, parece repetir- se!!! MARX, em seu “O 18 de Brumario de Luis Bonaparte”, inicia a sua obra, proferindo, logo no primeiro parágrafo, a sua célebre frase:

“Hegel observa (...) que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes.

E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa (...)”! A notória e irresponsável aversão de Bolsonaro ao cumprimento dos compromissos por ele próprio assumidos justifica que se ponha em séria dúvida o valor (e a sinceridade) de suas palavras... Se Bolsonaro revelar infidelidade ao que pactuou, terá dado plena razão à advertência segundo a qual a História, quando se repete pela segunda vez, ocorre como farsa!!!!

O fato é um só: A “Declaração à Nação” seria digna de fé ou constituiria mero recurso estratégico de Bolsonaro para iludir, mediante conduta desqualificada e tisnada pela eiva da farsa, aqueles que, fiéis à Constituição (como os Juízes do Supremo Tribunal Federal), buscam implementar o necessário convívio harmonioso entre os Poderes da República?

11
Set21

O mundo paralelo do revolucionário bolsonarista e o golpe que flopou

Talis Andrade

bolsonaro rei do gado.jpg

 

 

por Wilson Gomes

- - -

Meus amigos, aconteceu tanta coisa na política nacional esta semana que seria preciso um seminário para que pudéssemos minimamente entender o sentido e o alcance de tudo o que esteve em jogo nesses dias. Mas vou tentar fazer caber em 5 minutinhos de leitura algumas ideias essenciais sobre esta louca semana brasileira.

É fundamental que vocês entendam que no Brasil estão funcionando, há um par de anos, alguns universos em paralelo. Tem esse mundo aí no qual estamos, vocês e eu, que soma as preocupações com a carestia, com o crescimento da miséria, com a pandemia que não acaba e o desemprego às aflições diante da iminência da perda da democracia: nunca estivemos tão perto de perdê-la para o governo populista autoritário e armado de Jair Bolsonaro como nesta semana.

E tem o outro mundo, o dos 12% de bolsonaristas talibãs, cada vez mais radicais, compactos e fanatizados, que foram convencidos de que é sua missão histórica atacar os principais inimigos do presidente, que são, pela ordem, o STF, a esquerda e a imprensa.

Esses dois mundos que, como disse, rodam em paralelo, entraram em rota de colisão esta semana. No nosso universo, consideramos ter mais uma vez resistido ao sistema de ameaças e pressões do bolsonarismo e do seu líder. Entretanto, quando houve a invasão da Esplanada dos Ministérios, em Brasília, na madrugada do dia 7 de setembro, com a cumplicidade da polícia militar do Distrito Federal, muitos temeram pelo pior. Foi uma noite tensa para quem acompanha e participa da política como há muito não se via. Hoje sabe-se que o presidente do STF precisou agir sobre os comandantes militares e o próprio governo para evitar que o pior pudesse acontecer.

No dia sete, contudo, as tantas promessas de Bolsonaro não se cumpriram, principalmente porque se prometera tanto que nada menos que uma insurreição definitiva, com Alexandre de Moraes arrastado pelas ruas de Brasília atado ao Rolls-Royce presidencial pilotado por Nelson Piquet, poderia dar conta da expectativa criada. Houve muita gente? Sim, mas uma ínfima proporção do esperado pelos organizadores, ainda mais em manifestações nitidamente produzidas e fartamente financiadas pelos empresários bolsonaristas.

Como diriam os jovens, flopou. Flopou, sim.

E todo o auê criado não produziu mais do que oportunidades de fotografia para serem distribuídas em mídias digitais e confirmar que, sim, o Sete de Setembro foi gigante, e só a desonesta mídia comunista é que não quer que você o constate. No fundo, toda a presepada foi para Bolsonaro ter uma plateia estendida para dizer exatamente o que diz todo dia no seu pocket show no cercadinho. Dezenas de milhares de crentes deslocados pelo país, alguns milhões de reais despendidos para produzir um evento simultâneo em todas as grandes praças de um país continental, angústia geral, jornalismo aflito, polícia em desespero, tudo para Bolsonaro subir em um caminhão e dizer que a partir de agora ele não obedece qualquer decisão judicial que venha de Alexandre de Moraes? Foi exatamente uma reedição do grito “Acabou, porra!”, de 28 de maio 2021, só que com mais figurantes, muito mais despesas e muito mais tensão envolvida.

Isso no nosso mundo. No universo dos militantes do movimento bolsonarista, foi tudo muito diferente. Inclusive, até esta quinta-feira, 9/9,  continuavam esperando a tomada da sua própria Bastilha, quer dizer, o STF. Na madrugada de quinta-feira, circulou pelas redes de comunicação paralela do movimento, via WhatsApp, uma fake news de que Bolsonaro teria destituído o Supremo Tribunal Federal. Isso chegou aos caminhoneiros que estão fechando estradas e foi recebido com entusiasmo. Vídeos documentaram o estado de êxtase da multidão.

O anúncio foi acompanhado de buzinas de caminhões, caminhoneiros se abraçando em lágrimas, clima de conquista de Copa do Mundo. Um dos tipos, emocionado, sintetizou assim a razão para tanta felicidade: “Meus amigos, minhas amigas de todo o Brasil, desculpem pela emoção, mas a nossa luta e a nossa garra valeram à pena, ficamos sabendo agora que o presidente da República, Jair Bolsonaro, resolveu que a partir de agora o Brasil está em estado de sítio”. A multidão exultava. Tanto sacrifício, tanta luta, tanto sofrimento, enfim, foram recompensados. Outro caminhoneiro passa para a frente das câmaras, que a felicidade é generosa, e continua: “Conseguimos o estado de sítio. Vamos tirar os vagabundos de lá. Conseguimos tirar os onze. Nós fizemos a nossa parte. Participamos da História do Brasil”.

O que é um estado de sítio e por quê ele teria o condão de fazer imediatamente desaparecer o STF do caminho do presidente, é pouco provável que soubessem. O fato, contudo, é que aquele conjunto imenso de homens embrutecidos, de rosto castigado e português sofrível, não saiu de casa, atendendo às convocações feitas, apenas para oferecer figurantes para Bolsonaro fazer um discurso exatamente idêntico ao que ele faz todos os dias no cercadinho do Alvorada. Foi-lhes prometido que entrariam para a História como protagonistas, que estavam fazendo a Revolução, removendo os obstáculos institucionais e pavimentando a estrada para Bolsonaro conduzi-los a um Novo Mundo.

E assim, estamos. No nosso mundo, o bolsonarismo é cada vez mais agressivo e perigoso, mas está minguando em grande velocidade. Bolsonaro sempre dobra as apostas na sua fúria populista e fascista contra a instituições da democracia liberal. A cada vez luta, rosna e mostra os dentes como nunca, embora tenha perdido como sempre. E a única coluna que o mantém em pé e impede um impeachment líquido e certo é um partido político, o Progressistas. Já no mundo paralelo do bolsonarismo, estamos quase lá, só um pouco mais de sacrifício pessoal de cada patriota e o Brasil será purificado de vez do pecado do comunismo que atinge todas as instituições, a começar pelo Supremo Tribunal Federal.

corno.jpg

 

Post Scriptum

Esta coluna já estava pronta quando, ante um iminente escalada nas retaliações institucionais ao balão de ensaio insurrecional de Bolsonaro, o valentão assinou uma carta de capitulação, escrita por nada menos que Michel Temer. Nela, em dez pontos o homem que gritava na terça-feira que Alexandre de Moraes era um canalha minimiza, na quinta-feira, as arruaças feitas, dizendo que “decorreram do calor do momento”. Declara, então, que aceita, sim, o Poder Republicano do Judiciário e, praticamente, mete um “desculpa aê por qualquer coisa” como se fosse só um garoto levado apanhado em flagrante.

Como ficam agora os revolucionários e celerados do universo paralelo do bolsonarismo, prontos a pegar em armas pelo seu mito? Teremos que aguardar os próximos capítulos dessa tragicomédia política chamada Brasil, mas, a se replicar o que aconteceu na última reviravolta importante nesse roteiro, a ruptura entre Bolsonaro e Moro, o mais provável é uma solução dessas previstas em boleros.

Primeiro, virá a mágoa: “pérfido, ingrato e falso, nunca foi amor, era cilada”. Mas logo depois, a saudade bate e aquela sensação de não ter para onde ir, porque só no mito há o amor que se deseja, começa a pesar no coração. Então, toca Gusttavo Lima: “Ainda não tive coragem de arrumar a cama em que a gente fez amor pela última vez. O seu cheiro está entre os nossos lençóis e, na memória, o calor do seu corpo debaixo do cobertor”. Para enfim, tudo se concluir com Roberto: “Não repare na desordem dessa casa quando entrar. Ela diz tudo o que eu sinto de tanto lhe esperar”.

Querem apostar? Entre o golpismo e o melodrama musical de traídos e reconciliados (música de corno), o bolsonarismo se explica.

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29
Ago21

Quem nega altos riscos na ação de bolsonaristas no 7 de Setembro está a serviço de Bolsonaro

Talis Andrade

 

por Janio de Freitas

 

Quem nega altos riscos na ação de bolsonaristas no 7 de Setembro — um coro que cresce a cada dia — está a serviço de Bolsonaro ou comete uma leviandade. Não há sinais, de descontrole ou de contenção, merecedores de confiança.

Em contrapartida, sabe-se que o bolsonarismo é perigoso em si mesmo, sempre potencialmente criminoso nos meios e nos fins. E Bolsonaro, ele sim, emite sinais claros de sentimentos opressivos, de cerco e medo: o ataque frontal ao Supremo, a incessante corrida a aglomerações excitáveis de Norte a Sul, o agravamento de suas falas — e a convocação às “manifestações do 7 de Setembro do povo”.

Nesse estado de país enlouquecido, as polícias militares passam de proteção social a fontes de medo coletivo. Os militares do Exército, que exigiram a referência à segurança interna, na Constituição, como domínio seu, reduzem-se a uma incógnita nos riscos das manifestações.

O Supremo sabe desses riscos. Não os esconde, e os quer contidos por uma barreira de proteção especial. O Congresso segue, sem outro jeito, o seu tergiversante presidente. Rodrigo Pacheco o juntou às providências do Supremo, mas à sua maneira.

Para negar fundamento ao impeachment de ministro do Supremo pedido por Bolsonaro, apressou-se à baixeza da compensação: “como também não antevejo para impeachment do presidente da República”. Contudo, a proteção buscada pelo Supremo e o Congresso são advertências para os riscos que Bolsonaro acionará em Brasília, pela manhã, e à tarde em São Paulo.

Muitos governadores estão com preocupação extrema. A situação é de tal maneira desarticulada, que aos governadores não bolsonaristas falta até a segurança de que devam mobilizar suas PMs. Em vários estados, como Ceará, pode ser melhor a polícia invalidada no quartel do que nas ruas com seu bolsonarismo. Uma síntese da situação: o baderneiro agressivo é menos ameaçador do que polícias.

***

PARA VALER

Não esqueça: “Tem que todo mundo comprar fuzil, pô”. Aquela história de direito de defesa era para começar. Fica às claras, arma de combate. E convocação à guerra civil não justifica impeachment.

***

LEIA OUTROS TRECHOS DA COLUNA DE JANIO DE FREITAS

 

29
Ago21

Janio de Freitas: quem nega altos riscos na ação de bolsonaristas no 7 de Setembro está a serviço de Bolsonaro

Talis Andrade

 

247 - "Quem nega altos riscos na ação de bolsonaristas no 7 de Setembro —um coro que cresce a cada dia— está a serviço de Bolsonaro ou comete uma leviandade", escreve Janio de Freitas em sua coluna publicada no jornal Folha de S.Paulo.

De acordo com o colunista, "sabe-se que o bolsonarismo é perigoso em si mesmo, sempre potencialmente criminoso nos meios e nos fins".

E Bolsonaro, ele sim, emite sinais claros de sentimentos opressivos, de cerco e medo: o ataque frontal ao Supremo, a incessante corrida a aglomerações excitáveis de Norte a Sul, o agravamento de suas falas — e a convocação às manifestações do 7 de Setembro do povo. Nesse estado de país enlouquecido, as polícias militares passam de proteção social a fontes de medo coletivo. Os militares do Exército, que exigiram a referência à segurança interna, na Constituição, como domínio seu, reduzem-se a uma incógnita nos riscos das manifestações", acrescenta.

Crimes de Maio de 2006: o massacre que o Brasil ignora - Ponte JornalismoOs Crimes de Maio de 2006 e a luta das mães contra a violência do Estado –  OASLCanal Reload على تويتر: "A #HQReload desta semana é baseada em matéria da  @pontejornalismo sobre os 15 anos do massacre dos Crimes de Maio. A chacina  deixou mais de 560 pessoas mortasSTJ mantém a condenação de PMs por massacre do Carandiru

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Charge: Brasil-avestruz não vê clima pra golpe. Por Aroeira

Nota deste correspondente: Golpe se faz com chacinas de opositores, prisões de adversários, tortura e exílio.

Golpe não é um simples desfile de civis com um fuzil novo. Ou de militares para comemorar a Independência do Brasil. 

Independência tem as seguintes características que a extrema direita abomina:

Característica de quem é livre e autônomo:

1 emancipaçãoautonomialiberdadelibertaçãosoberania.

Característica de quem não se deixa influenciar:

2 isençãoequanimidadeequidadeimparcialidadejustiçaneutralidade.

Boa condição material:

4 bem-estarfortunaprosperidade.

Significado de Golpista

Quem planeja ou realiza golpes, estratagemas ou tramas ilegais que buscam enganar: golpista que lesava seus clientes.adjetivo Que busca enganar por meio de tramas e estratagemas.Que tenta, através de estratagemas, retirar o poder de um governo: general golpista. Presidente que perdeu o apoio popular. Que não possui mais os votos que garantiram a eleição legítima, soberana, livre e democrática. 

Golpista é sinônimo de: ardilosoenganadorfraudulento

Golpista é o contrário de: honestojustoíntegrohonradoprobosério

 

 

 

 

 

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