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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

12
Jun22

Generais defendem abertamente status de partido político para as Forças Armadas

Talis Andrade

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"Com a partidarização promovida por suas cúpulas partidarizadas e golpistas, as Forças Armadas foram transformadas em facções partidárias", diz Jeferson Miola

 

por Jeferson Miola /Brasil 247

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No ofício ao presidente do TSE Edson Fachin, no qual coloca em risco a própria realização da eleição, o general-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira equiparou as Forças Armadas a um partido político com o intuito de reforçar a indevida interferência militar no processo eleitoral.

Terá sido um ato falho, ou é uma sinalização deliberada de atrevimento político e institucional deste bando fardado que atua de modo camuflado, indireto, e ameaça cada vez mais gravemente a democracia, sem reação das instituições políticas e do poder civil?

No documento, o ministro bolsonarista da Defesa argumentou “que alguns conceitos jurídicos corroboram o direito de fiscalização de todas as fases do processo eleitoral”.

E, para justificar a tentativa absurda de controlar o processo eleitoral, o general delirantemente reivindicou para as Forças Armadas “o previsto na Lei nº 9.504/1997, em seu art. 66, onde é estabelecido que os partidos e coligações poderão fiscalizar todas as fases do processo de votação e apuração das eleições e o processamento eletrônico da totalização dos resultados”.

Ora, como o próprio general conspirador escreveu, a citada lei estabelece a atribuição de partidos e coligações na fiscalização de todo processo eleitoral, não das Forças Armadas!

Aliás, em nenhum dos 105 artigos desta Lei que “estabelece normas para as eleições”, promulgada no ano de 1997, há 25 anos atrás, portanto, não se encontra nenhuma menção à atuação das Forças Armadas em qualquer aspecto substantivo da eleição.

No máximo, nos dias de votação os militares são chamados pelo poder civil a exercerem funções acessórias e rotineiras, meramente logísticas, de transporte de urnas e de segurança complementar.

Coerente com o espírito de um regime civil, e não militar, a Lei 9.504/1997 assegura aos partidos e coligações, como organismos constituintes do poder político e do poder civil, amplo direito a “fiscalizar todas as fases do processo de votação e apuração das eleições e o processamento eletrônico da totalização dos resultados”.

A Lei ainda especifica com clareza as condições de participação dos partidos e coligações mas nunca dos militares – na preparação das urnas eletrônicas [§ 5º do art. 66], na auditoria de funcionamento das urnas [§ 6º] e na criação de sistema próprio de fiscalização, apuração e totalização dos resultados [§ 7º].

Assim como distorce cinicamente o artigo 142 da Constituição para justificar a inaceitável interferência política e a tutela da democracia, o partido militar também alimenta uma interpretação mistificadora e canalha das Forças Armadas “como entidades fiscalizadoras, ao lado de outras instituições”, do processo eleitoral.

Com a partidarização promovida por suas cúpulas partidarizadas e golpistas, as Forças Armadas foram transformadas em facções partidárias.

E, sendo um bando armado, atuam na política como verdadeiras milícias fardadas ilegais e conspirativas, que atentam contra a democracia e o Estado de Direito e colocam em risco a própria realização da eleição de outubro próximo.

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28
Nov21

Rindo para não chorar

Talis Andrade

A semana em charges
 
31
Out21

A máquina de moer esperança

Talis Andrade

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Parece começou 2022, a tortura do governo militar de Bolsonaro apressou a máquina de moer esperança, apressou o tempo dos nababos proprietários de partidos políticos faturarem grana para uma vida fácil, que se renova a cada dois anos, que temos bilionárias campanhas eleitorais nos anos pares. 

Temos empresários candidatos para sonegar impostos, esquentando notas frias, e coronéis que alugam legendas e vendem partidos inteiros nos pregões das pesquisas falsas.

2022, mais um ano de colheita, de meter a mão nos fundos partidários e eleitorais de mais de trinta partidos, que a justiça eleitoral é tarda e sempre falha na mais valia das conveniências. 

Revela o Correio Braziliense: 

Tal como fazem os ursos, depois de uma longa hibernação no inverno, os proprietários das legendas políticas, aqui no país, vão despertando lentamente, um a um, depois de quase quatro anos em estado de cataplexia profunda, que geralmente ocorre entre uma eleição e outra. Agora partem famintos em busca da manutenção do mecanismo que, mais uma vez, possibilitará a interlocução entre os eleitores e o Estado, de modo a dar continuidade a nossa peculiar engrenagem democrática.

Somente os partidos são autorizados a estabelecer essa ponte entre o cidadão e o Estado, de modo que a eles é conferido todo o protagonismo político que resulta nas eleições. É esse o poder que dá às siglas e aos seus dirigentes um aspecto questionável que extrapola todo e qualquer sentido de cidadania. Os mais de trinta partidos que hoje parasitam o Estado, num autêntico papel de despachantes, utilizam dessa faculdade legal, para, em nome da democracia, auferirem lucros fáceis que depois são rateados entre a cúpula tal como fazem outras empresas privadas.

Eis aqui, em linhas gerais, como funciona a nossa máquina de fazer democracia. O eleitor entra no sistema como matéria-prima bruta a ser processada e refinada pela engrenagem partidária, resultando, adiante, num produto que é a imagem e semelhança da legenda. Muito distante daquilo que desejava o eleitor.

Terminado o pleito, os eleitores, pela falta de um recall, que poderia corrigir falhas desse produto, e que é tão comum hoje nas montadoras de automóveis, é descartado como resíduo ou sucata. Diante de uma situação tão surreal como essa que experienciamos calados, e em que os donos das legendas, mais do que mestres de cerimônia da festa da democracia, se tornam os verdadeiros senhores de todo esse processo, pouco ou nada se pode esperar em termos de evolução e amadurecimento do nosso distorcido modelo de representação.

A questão é saber até quando esse processo enviesado, que coloca a nossa jovem democracia no colo desses velhos magnatas políticos, prosseguirá. O pior é que a nossa jabuticaba, representada pela disléxica Justiça Eleitoral, nada vê de anormal em todo esse processo. E pensar que todo esse degenerado processo eleitoral poderia ser dissipado movendo-se apenas algumas pequenas peças nessa engrenagem perversa. A começar pela possibilidade de eleição com candidatura avulsa, sem vínculos e amarras partidárias. Ou, quem sabe, pela extração de um pequeno parafuso que hoje impede a máquina de cumprir a cláusula de barreira.

Pequenos ajustes nessa máquina de moer esperanças poderiam fazer toda a diferença, como é o caso da introdução da ficha limpa. Melhor ainda seria obrigar todo esse robô gigante a caminhar com seus próprios pés, retirando-lhe as muletas representadas pelo fundo eleitoral e partidário públicos. Talvez, quem sabe, por meio de uma profunda reforma eleitoral, fossem criados apenas quatro partidos com assento no Congresso, distribuídos entre esquerda, direita, centro-esquerda e centro-direita.

São ajustes que o eleitor consciente gostaria de ver implementados, dando um basta definitivo nessa pantomima, que faz das nossas eleições uma festa apenas para os dirigentes partidários e seus grupos.

Humor Político – Rir pra não chorar | Página: 467
24
Jul20

Reinaldo Azevedo: 'É preciso pôr fim à farsa publicitária da Lava Jato'

Talis Andrade

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247 - "Ou o lavajatismo dá um golpe de vez nas instituições, com o consequente fim do devido processo legal e do Estado de Direito, ou, então, os valentes terão de responder por sua obra. Ainda dispõem de poder de retaliação e têm guardadas bombas de fragmentação. Vamos ver", escreve o jornalista Reinaldo Azevedo.

O jornalista parabeniza os "respectivos presidentes do Senado e do Supremo, Davi Alcolumbre (DEM-AP) e Dias Toffoli, por terem impedido não a busca e apreensão no gabinete do tucano José Serra, mas a invasão do Senado pela polícia". 

"Até a ditadura foi mais contida", afirma. 

"Minha opinião a respeito não é nova: até onde sei, fui o único na imprensa a criticar duramente, em setembro do ano passado, a decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo, que autorizou a PF a invadir —sim, escolho esse verbo!— os respectivos gabinetes do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) e do deputado Fernando Bezerra Coelho Filho (DEM-PE) sob o pretexto de colher provas de desvios de recursos públicos supostamente ocorridos entre 2012 e 2014".

"Nos marcos atuais, o que impede um juiz de primeira instância de determinar busca e apreensão no gabinete de um ministro do STF ou do presidente da República? Este, por exemplo, não pode ser responsabilizado por crimes anteriores ao mandato, mas investigado pode. É jurisprudência do tribunal. Já aconteceu com Michel Temer".

[...] "É preciso pôr fim à farsa publicitária da Lava Jato para que o combate à corrupção seja eficaz e se dê nos marcos da legalidade".

"A Segunda Turma do STF tem de decidir em breve se anula ou não a condenação de Lula. Têm pululado na imprensa nestes dias notinhas sobre a candidatura de Sérgio Moro a presidente ou a vice. A simples leitura provoca sentimento de vergonha —em quem tem vergonha".

"A luz chegará aos porões da Lava Jato. Resta a cada ministro do STF escolher se associa seu nome ao Estado de Direito ou ao terror policial-judicial que erigiu falsos profetas que nos legaram como herança o abismo da cloroquina moral".

Leia a íntegra

05
Jul20

Desmandos da Lava Jato atestam que modelo atual é falho e manipulado

Talis Andrade

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por Janio de Freitas

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As novas, mas não últimas, transcrições de mensagens da Lava Jato curitibana dão um salto temático no poço, tenebroso e sem fundo, das intromissões americanas na soberania brasileira.

Não foi por obra do acaso que esse capítulo a mais da amizade inconfiável se configurou no âmbito da Lava Jato, empreendimento político em área judicial e com bolsonaras consequências também nas relações externas.

As mensagens transcritas e seus aditivos dedicam-se à ação e aos agentes do FBI na América Latina, a título de investigar empresas americanas na corrupção local.

Se provada, a participação sujeita a punições, sobretudo financeiras, nos Estados Unidos. Um tratado Brasil-EUA autoriza tais investigações aqui e estende o acordo à colaboração mútua em investigações, com normas intermediadas pelo Ministério da Justiça. No mesmo gênero, há acordos sobre tráfico de drogas.

As mensagens transcritas expõem a falta de adequação, controle e limite na interação de Lava Jato e pessoal do FBI no Brasil. No muito extenso e um tanto caótico material publicado, sobressaem Deltan Dallagnol e sua tentativa de burlar as regras do acordo para obter, por desvio clandestino, a localização e prisão nos EUA de um alvo da Lava Jato, seguidas de extração para o Brasil.

Dallagnol, de maneira bem característica, prefere não obter o pretendido a se sujeitar às leis e a um acordo internacional do Brasil.

Coordenadora dos agentes secretos da alegada caça à corrupção, na América do Sul, Leslie Rodrigues Backschies não aparece bastante no material transcrito. Mas não pelo melhor.

Trata-se de sua explicação para o empenho do FBI na caça a corruptos aqui e alhures: é a segurança dos Estados Unidos e de seus cidadãos. A corrupção pode financiar o terrorismo. Mas não só. Nas sociedades onde as pessoas se sentem governadas por corruptos, “irão buscar outros elementos […] que veem como limpos. E isso se torna uma ameaça para a segurança”. A deles lá.

Curioso: combatem a corrupção da velha política, mas o novo é “uma ameaça”. A explicação da agente principal nem precisou explicitar a solução: combater a corrupção, que pode financiar o terrorismo, e impedir o novo, porque “se torna uma ameaça” de recusar a subserviência da velha política.

É assim e por isso que o FBI, a CIA, a NSA (a dos grampos em Dilma) se transfiguram em poderes eleitorais. Como sabem, muito bem, Sergio Moro, tão homenageado pelos agradecidos dos Estados Unidos, e Deltan Dallagnol, que, agradecido ele, reconhece nas mensagens o seu aprendizado com os agentes americanos.

Crítico da Lava Jato sem expor os motivos, ainda assim o procurador-geral da República, Augusto Aras, tem razão. As ilegalidades, os desmandos e desvios de finalidade da Lava Jato atestam que o modelo atual de força-tarefa é falho e manipulado com má-fé, pernicioso.

Mas seu projeto de uma central das forças-tarefas levaria as deficiências de hoje ao extremo. É um projeto de poder pessoal, não a solução. Que precisa ser buscada, assim como é necessária uma força-tarefa para investigar a força-tarefa da Lava Jato, em nome do país.

 

07
Jun20

Frente Antifascista contra novas e mais perversas formas de dominação

Talis Andrade

 

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III - É nóis por nóis!

por Silvio Caccia Bava

Le Monde

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Não é de hoje – pode-se dizer mesmo que tem mais de dez anos – que está sendo orquestrada uma campanha de enfraquecimento e mesmo de destruição das formas de organização e representação da sociedade civil. Tudo isso pelo medo de que a esquerda ganhe outra vez as eleições e para manter os privilégios e os interesses das elites econômicas e financeiras, que veem como ameaça ao seu controle da sociedade as pressões por direitos e pela redistribuição da riqueza feitas pelos que estão privados de seus direitos.

A situação dos sindicatos, com suas fontes de recursos cortadas por decisões do governo; o corte do financiamento das ONGs por fundos públicos; o corte do orçamento das universidades públicas; a perseguição aos setores sociais de resistência democrática e à imprensa opositora; o ataque e criminalização dos partidos de esquerda; a destruição das reputações de lideranças da oposição; a perseguição física e o assassinato de lideranças de movimentos sociais – tudo isso tem como propósito o enfraquecimento e a destruição da sociedade civil e das representações coletivas. O indivíduo, sozinho, isolado, se vê impotente diante do poder autoritário.

Mesmo com toda essa onda de destruição, vemos uma sociedade civil vibrante, que não se rendeu a esse poder autoritário. Ainda não temos condições de avaliar em nível nacional a extensão dessas redes de solidariedade que se constroem na crise, mas é um grande movimento. A questão que se coloca é se elas podem ir além dessa dimensão do auxílio humanitário. Em alguns casos é possível dizer que sim, quando elas pressionam o poder público para que este atenda a suas necessidades. Podem até promover panelaços, mas têm seus limites. Elas formulam demandas, não disputam políticas públicas.

As ruas, que são o espaço público por excelência para as grandes manifestações, estão interditadas pela pandemia. Mesmo as grandes manifestações, como as de junho de 2013, mudam muito pouco o comportamento das instituições democráticas, desde sempre controladas pelos poderes econômicos. A situação atual é de agravamento da crise, com a fome, o desemprego e o desespero tomando conta da cena. O aumento da tensão social prenuncia momentos de ruptura. O sofrimento é geral e crescente.

São poucos os espaços de decisão de que o cidadão participa. Muito do que foi construído no passado, como os conselhos e conferências de políticas, já foi destruído. Por onde então vai se expressar toda essa energia de inconformismo e revolta? Na negação das instituições políticas que sustentam esse estado de coisas. Os partidos políticos e o Parlamento estão entre as instituições mais depreciadas pela opinião pública. Mas é bom frisar que essa avaliação é sobre nossa democracia e os atuais partidos políticos. A ampla maioria dos brasileiros prefere a democracia como forma de governo e reconhece a importância dos partidos políticos, sem os quais a democracia não existe.

Segundo pesquisa Datafolha divulgada em janeiro deste ano, a defesa da democracia conta com a maioria (62%). Mas é importante observar a tendência. O apoio à democracia caiu sete pontos percentuais de 2018 para 2019, e o número de indiferentes aumentou de 13% para 22%. Os que defendem a ditadura permaneceram com os 12%.2 O que se apresenta como demanda é uma nova forma de democracia e novos partidos políticos; os pesquisados não querem mais do mesmo.

O desafio é politizar essas redes de solidariedade e construir as pontes dessas organizações que operam nos territórios e articulam o protesto social com o mundo da política. A Frente Brasil Popular e a Frente Povo Sem Medo são expressão desse esforço. Elas agregam diferentes movimentos sociais, toda uma ampla rede de entidades, e se mobilizam em defesa dos interesses comuns, das demandas sociais e da democracia. A criação das frentes carrega o sentido da politização do social, isto é, da explicitação do conflito e do debate de que há alternativas para enfrentar a crise sem que todo seu peso recaia unicamente sobre os trabalhadores.

No entanto, a politização do social feita por essas frentes, pela imprensa contra-hegemônica e pela intelectualidade que se alinha à defesa da democracia não é suficiente para enfrentar o poder instituído. Na democracia que temos, as eleições e os partidos políticos continuam essenciais. Por essa razão, esse movimento de solidariedade entre os mais pobres, e que convoca amplos setores da sociedade a apoiá-lo, precisa se encontrar com a coalizão de partidos que pede o impeachment de Bolsonaro. E isso é uma responsabilidade dos partidos. O primeiro passo é o afastamento do presidente. O segundo é disputar com essa coalizão as eleições municipais. O terceiro é instaurar um novo processo constituinte para recuperar direitos e criar um novo sistema político.

Essa é a proposta de criação de uma frente antifascista para enfrentar o surgimento de um novo capitalismo bárbaro, com novas formas autoritárias de governança, centrada na sociedade do controle, na censura, no fim das liberdades.

“Toda proposta política é sempre uma fórmula para tentar articular de um modo específico vontades diversas. São as práticas que apontam no sentido do questionamento da dominação capitalista que alimentam a formulação de uma alternativa política. Nós lutamos por uma transformação social pela qual a população se assenhore dos seus meios de vida. E é pela constituição de um novo sujeito político capaz de ser portador de uma vontade coletiva de transformação social que esse processo pode se dar”.3

A proposta da Frente Antifascista é importantíssima, mas não pode dar conta das mudanças profundas que nossa sociedade requer. Nenhum dos partidos da Frente Antifascista se engaja em lutas por mudanças estruturais. As lições deste momento de crise em que todo o custo recai sobre os trabalhadores ensinam, mais uma vez, que ninguém vai defender todos aqueles que vivem do próprio trabalho. Ou eles se organizam, se articulam e se constituem como sujeitos políticos, ou serão submetidos a novas e mais perversas formas de dominação. A autonomia nunca foi tão importante para constituir um poder capaz de pressionar por mudanças.

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1 Pesquisa realizada pela USP, articulada com a Rede de Pesquisa Solidária, com 72 lideranças comunitárias nas cidades mencionadas. Publicada pela Folha de S.Paulo (25 maio 2020).

2 Datafolha divulgada em 1º de janeiro de 2020 e publicada por El País em 12 de janeiro de 2020.

3 Eder Sader, “Autonomia popular e vontade política”, Desvios, n.2, 1983.

20
Set19

As motivações políticas da Lava Jato

Talis Andrade

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Ana Paula Lemes de Souza

Para falar com Kelsen, mas, igualmente, contra Kelsen, não existe um “Direito Puro”. A construção teórica do direito puro, completamente despido de outros interesses, tais como os políticos e os econômicos, deve ser fruto do ópio dos modernos, esse discurso esterilizante ao mesmo tempo em que hipnótico e analgésico, por meio do qual se tentou construir o ideal do direito purificado de todas as paixões, junto com a estruturação da imparcialidade, que, ao longo do aprofundamento da lógica da racionalidade moderna do Estado burocrático, gerou a supremacia do direito sobre a política. Aliás, esse argumento da suposta autonomia positivista do direito serviu, ao longo da história ocidental, menos como frenagem e mais como o motor legitimador das mais diversas arbitrariedades.


Interesses políticos se colocam em tela, seja através da luta epistêmica pelo “dizer o direito” entre os tribunais, com suas relações de forças, conflitos e jogos de poder, seja através da produção de sentido entre forças nitidamente sociais, como entre as doutrinas dominantes e outras formas de produção de saberes, nos conflitos entre centros e periferias, diferenças de escalas e escolas, perspectivas e visões de direito – para não falar em choques de mundos! – ou, ainda, através de alianças momentâneas com os interesses ditos impuros, como os industriais, os econômicos e os estatais. Não se discute se existe ou não política no direito – pois o direito está mesmo repleto de política! – ainda mais se considerarmos, assim como na perspectiva proposta por Viveiros de Castro e Danowski, que a política dita dos ocidentais é apenas um departamento da cosmopolítica.

 

O que se coloca em jogo na Lava Jato não é a mera existência de política e, sim, o papel que essa dita “política” exerceu sobre as atuações das organizações jurídicas, as motivações da operação, as alianças indisfarçáveis que vão se tornando cada vez mais nítidas entre as forças que geraram, primeiramente, algumas escoriações no Estado democrático de direito e que, agora, deixam-no cada vez mais capenga. É esse o esforço ao longo desse texto, mostrar que, em que pese a existência de política no direito, tal reconhecimento não pode entravar a sua busca e reivindicação por autonomia, a constante restrição de sua discursividade, exigindo alianças cada vez mais consistentes. Embora o direito seja também política, sabe-se que ele não é somente isso.

 

O grande problema da Lava Jato, para falar com Deltan Dallagnol, é que a questão jurídica é filigrana dentro do contexto maior, que é o político.

 

O problema da Lava Jato não é somente quando existe alguma política norteando as decisões, mas quando esse Estado fica tão moribundo que a questão jurídica se torna filigrana dentro do contexto “maior”, que é o político, em sentido oposto do qual deveria ser pensada a discursividade do mundo do direito, em que o contexto político é que deveria ser a filigrana.

 

A Lava Jato se torna um absoluto quando adquire o poder do rei, quando passa a ser incontestada, dona da verdade e da bondade; quando não se envergonha de utilizar métodos neofascistas de tortura para atingir os seus objetivos, tal como quando cinicamente autorizou devassa na vida da filha de um acusado da operação, com o claro objetivo de amedrontar e martirizar o seu pai; ou quando demonstra desdém e absoluto desrespeito perante a morte dos familiares dos investigados, “esses que não são gente como a gente”, tal como no falecimento da esposa e neto de Lula, chegando ao absurdo higienista e separatista da procuradora Thaméa Danelon afirmar que a presença e humanidade de um membro do MP no funeral era mesmo uma traição, demonstrando “partidarismo”; claro, os partidários são sempre os outros!

A Lava Jato vira soberana quando, passando a ocupar o lugar de Deus, Onisciente e Onipotente, a posição do Neutro, ignora seus próprios problemas, inclusive, a sua própria corrupção e política, e passa a perseguir a corrupção e a política dos outros, esses sim, essa “gentalha política corrupta e atrasada”, que é menos “gente” que eles, tal como os nazistas, em outros tempos, contextos e proporções, mas que também construíram os judeus como outros que não humanos, demarcando o fim da humanidade ao menos como pensada pelo humanismo iluminista.

Isso se torna claramente um problema quando, não podendo atuar sobre os poderes nas urnas, investe-se pesadamente no messianismo jurídico que, enquanto projeto de poder, tem por objetivo utilizar as estruturas do direito e a “supremacia moderna” de suas organizações, para atingir os fins que somente seriam possíveis de serem atingidos através da política, agora, no sentido “moderno” do termo, quando este se torna, para falar como Isabelle Stengers, uma restrição leibniziana, um modo de construção de sentido possuidor de suas próprias regras de ingresso e disputa.

 

Não importa que exista política na Lava Jato, o que interessa é quando a Lava Jato se torna propriamente a política, só que disfarçada de direito; quando existe tal discursividade norteante, bailando e maculando cada ato da operação e seus atores.

 

É quando roboticamente e obsessivamente o coordenador da Lava Jato, Deltan Dallagnol, fala em um membro do MP concorrendo ao Senado por Estado, o que, nos termos de Dallagnol, equivaleria a um partido da Lava Jato, o que não é difícil de se imaginar, ainda mais em tempos de conflitos entre Sergio Moro e Bolsonaro, quando o messianismo de Moro, o faxineiro moralizante da política, sobrepõe-se ao “Messias” de Jair Messias Bolsonaro, tal como apontado pela Datafolha recentemente, que aponta o índice de aprovação do “superministro” de 52% (cinquenta e dois por cento), enquanto, em período coincidente, sobe a reprovação de Bolsonaro para 38% (trinta e oito por cento).

Esses propósitos de Dallagnol seriam ainda mais perniciosos se não fosse a morte prematura da tal “organização” ou, melhor falar, “partido” da Lava Jato, formado com os fundos de R$ 2,5 bilhões da Petrobras, quando alguns agentes da operação viram nesta algo como a “galinha dos ovos de ouro”, um passo adiante da notável lucratividade da “luta” contra a corrupção, anteriormente colocada apenas a título de remuneração de palestras, livros e eventos. Naquela ocasião, a promessa era de que o fundo iria incentivar projetos “apartidários” anticorrupção, aquilo que, após ação de Raquel Dodge, foi suspenso pelo STF.

Instaura-se o paradoxo: a luta anticorrupção é boa, desde que não se fale em corrupção da própria “luta anticorrupção”: afinal, após o conflito interno no MPF, entre Raquel Dodge e Lava Jato, os membros ministeriais da operação informaram ter “desistido” da atuação – como se fosse possível desistir após o fracasso, como se restasse alternativa ao que já estava decidido, um modo de demonstração de poder, coerente ao projeto lavajatista, que Gilmar Mendes tão bem definiu como “projeto de poder”.

Agora, após o início da Vaza Jato, sabe-se bem quais são essas organizações “apartidárias” de Deltan Dallagnol, que seriam beneficiadas pelo fundo bilionário administrado pela Lava Jato, que, inclusive, foram utilizadas para forçar o impeachment de Dilma Rousseff. Outra influência direta da Lava Jato nos modos de operação da política foi a divulgação seletiva das conversas grampeadas de Lula que, ao longo das temporalidades da Lava Jato, desencadeou uma série de ações: nomeação de Lula para a Casa Civil -> que gerou cancelamento via decisão de Gilmar Mendes -> que aprofundou a crise do governo de Dilma -> que desencadeou, ao longo da série sucessiva de episódios, o golpe de Temer e a prisão de Lula. Talvez agora Gilmar Mendes se arrependa de ter alimentado o monstro, mas, ao que tudo indica, na cadeia de eventos no tempo, a sua atuação foi no mínimo fundamental para chegar onde chegamos.

Quanto à (i)legalidade da decisão de Moro, que autorizou a divulgação e anexou conversa entre Dilma e Lula ocorrida após o fim dos grampos, somada à problemática da incompetência quanto à divulgação da conversa da presidenta, que gozava de foro privilegiado, bastaram as “respeitosas escusas” à corte, nesta e em outras ocasiões, coisa que deveria ser o problema essencial a ser enfrentado pelo modo de operação jurídica.

Contudo, para falar como o procurador Andrey Borges de Mendonça, os filigranas jurídicos não iriam “convencer ninguém”, apesar de Dallagnol ter confessado que tal grampo ilegal era de “notável relevância no mundo jurídico”, que, diga-se, deveria ser a legítima preocupação dos membros do Ministério Público Federal.

Isso sem contar a confissão do ex-procurador lavajatista Carlos Fernando dos Santos Lima de que a Lava Jato teve lado nas eleições, que era o de Bolsonaro e não o “daquele outro” candidato, o do PT, “decisão óbvia”, mostrando o alinhamento partidário eleitoreiro dos agentes jurídicos e maculando mais uma vez a constituição e o Estado democrático de direito.

 

Quando o MPF cava a própria cova

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O mesmo se diz quanto ao Ministério Público, com a indicação de Augusto Aras para a Procuradoria Geral da República pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), fora da lista tríplice, contrariando a autonomia do órgão que, desde 2003, é chefiado por pessoas que minimamente representam a investida democrática, já que a indicação presidencial se dá entre os três mais votados por processo de escrutínio interno da organização.

Ignorando completamente a lista e indicando Augusto Aras para o cargo de procurador-geral, trata-se de mais uma investida contra a autonomia do Ministério Público, mais uma queda para a Constituição da República, mais um ataque ao Estado democrático de direito. Isso sem contar o “duplipensar” inerente ao ato, já que, em que pese a defesa institucional do Ministério Público do meio ambiente e dos direitos das minorias, o escolhido eleito para representar essas defesas institucionais deve ser justamente aquele que não defende o meio ambiente e nem as minorias. O flerte de Augusto Aras com o cargo já tinha se tornado evidente há algum tempo, quando passou a declarar abertamente ser contra “ideologia de gênero” e assinou carta de compromissos com a Anajure – Associação Nacional de Juristas Evangélicos, em que se compromete a lutar por uma série de questões inclusive já pacificadas pelo STF – tal como atuar pela família monogâmica e heterossexual, contrariamente à posição do STF que aceita a relação homoafetiva, apoiar a “cura gay”, fora outras pautas igualmente bizarras, como o apoio às ideias de base da “Escola Sem Partido” e ao ensino religioso confessional nas escolas.

Ainda, deve ser lembrada a questão ambiental, que era fundamental para a escolha de Bolsonaro, pois o chefe da Procuradoria da República não deve ser “xiita ambiental” e deve tratar as “minorias como minorias”, coisa que Aras está bem “alinhado”, pois afirmou em abril desse ano que não se pode “radicalizar” a defesa do meio ambiente e da proteção aos povos indígenas, afirmações que, sendo missão institucional primordial do MP a defesa do meio ambiente e das minorias, deve ser radicalizado no sentido mais genuíno do termo. Ainda, afirmou que existem “minerais estratégicos” em reservas indígenas, discursivamente se relacionando aos desmontes ambientais que constituem o grande marco do governo de Bolsonaro. Esse “duplipensar” indica o pathos de desmonte generalizado, já que o mesmo ocorre em outros meios, inclusive com a nomeação de Marcelo Augusto Xavier da Silva, que assessorou a bancada ruralista e é declaradamente contra os indígenas e suas reservas, para chefiar o Funai – Fundação Nacional do Índio.

Cumpre observar que Augusto Aras é alinhado também da Lava Jato, indicando os membros higienistas da operação para compor sua equipe, tal como Thaméa Danelon, cujo o cinismo e mau caratismo vêm sendo dissecados pela “Vaza Jato”. Mais uma vez, é Dallagnol quem assume a postura neutral do Sirius e advoga apenas em causa própria, ignorando o desrespeito à lista tríplice do Ministério Público e defendendo “ação conjunta” com Aras, convocando seus pares zumbificados e mortificados para levantar do túmulo, afinal, tudo vale pela sua pseudo-luta “contra” a corrupção; é questão de fé, mesmo que isso signifique, no dizer popular, “vender a alma para o diabo”, pois, ao que tudo indica, os portões infernais já foram abertos.

Por fim, cumpre observar que, em que pese a própria cova que o Ministério Público tem cavado para si próprio, ainda leva junto consigo a Constituição. É claro que a definição do que o direito é nunca é neutra. Ela é historicizada e confere direitos e deveres aos seus autores. Ela ao mesmo tempo exclui e inclui, proíbe e cria um modelo. Mas alimentar politicamente as organizações do direito é dotar a política de novas formas de ingresso na disputa, o que – deveria ser desnecessário dizer! – é uma relação duplamente perigosa, tanto para a legitimidade do direito, quanto para a política. E salve-se quem puder: as fumaças escuras parecem nunca nos abandonar, enquanto as covas são incansavelmente abertas.

19
Dez18

O Médium, a Pastora e o Capitão Messias

Talis Andrade
 
Por Céli Pinto
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Os três personagens do título podem ser analisados partir de várias entradas: caráter; saúde mental; charlatanismo político. Mas vou deixar a tentação de falar deles de lado, porque estou convencida de que o mais importante é entender as razões do sucesso e da popularidade desses personagens no Brasil do século XXI.

Por que grande quantidade de pessoas, de diferentes origens sociais, culturais ou ideológicas, iam até Abadiânia em busca de solução para seus problemas? Por que imensos templos estão lotados, ouvindo pessoas descontroladas que ameaçam as congregações com o demônio, se dizendo ungidas por Deus para com ele ter interlocução direta? Por que 56 milhões de brasileiros e brasileiras votaram um em candidato para a presidência da República que nunca disse a que veio e, nas raras vezes em que se manifestou, falou de violência e de cortes de direitos que atingem os mais pobres, os menos protegidos, as mulheres, os negros, os sem terra, os indígenas, a população LGBT, todos e todas que dependem de políticas sociais para sobreviver?

Alguma razão explica a facilidade com que o médium, a pastora e o capitão messias interpelam grandes massas com tanta facilidade? Explicar por que as pessoas buscam e acreditam no médium talvez possa ser um modelo para entender a congregação que ouve a pastora e os que elegeram o capitão messias. As pessoas que chegam ao médium podem, em sua imensa maioria, ser divididas em dois grandes grupos: ou estão em grande sofrimento psíquico ou com uma grave enfermidade que as deixam muito próximas da morte. Nas duas situações há uma desorganização importante nos discursos que lhes organizavam a vida. Antes de chegarem ao médium, foram sujeitos de discursos amorosos, de discursos da meritocracia, da vida saudável. Mas, em um certo momento, pode haver um radical desencaixe discursivo: as pessoas não se sentem acolhidas como sujeitos e como agentes de nenhum desses discursos. O mesmo acontece com os que são acometidos de graves enfermidades, quando enfrentam a finitude, e a ciência médica não mais lhes garante a vida. Como todos vamos morrer, parece óbvio que, em um certo momento, a ciência não nos garantirá a vida, mas isto fica muito longe do razoável,quando atinge a subjetividade de cada um.

Este sujeito desencaixado, que não encontra lugar para sua sobrevivência psíquica ou da própria vida nos discursos que fizeram sentido ao longo de sua existência, identifica no discurso místico, do milagre, do transcendental, a possibilidade de reordenar a vida e reconstruir o seu lugar de sujeito. E isto é conseguido pelas mãos do médium. É tão forte este tipo de discurso que até os mais céticos, frente a um tipo desclassificado como João de Deus, às vezes não têm coragem de apontar a fraude.
 
O mesmo desencaixe discursivo parece explicar as grandes congregações pentecostais, este evangelismo de resultados que prolifera nas cidades brasileiras. Nesta circunstância, às crises desestruturantes do eu psíquico soma-se a crise dos discursos que relacionam o pertencimento de cada um à sua comunidade de sentido. Os fiéis são migrantes de zonas pobres ou rurais que estão desenraizados nas grandes cidades; são pais, mães e filhos sem ferramentas para enfrentar novos arranjos familiares e novas formas de vida; são trabalhadores e trabalhadoras para os quais o mundo do trabalho fecha as portas. Os discursos pentecostais do bem contra o mal, a possibilidade da redenção no encontro com o divino em um árvore frutífera livra os crentes da ameaça de topar com o poderoso satanás a cada esquina e reorganizada assim a vida, dando uma certeza para cada ato da vida, nas relações afetivas, na família, no trabalho. O mundo complexo e discursivamente anárquico é trazido à transparência através de certezas expressas em mantras repetidos em transe em grandes templos, sob o comando de algum iluminado que diz ter íntima relação com o divino.

Estes momentos místicos, representados pelo médium e pela pastora, são recorrentes na história da humanidade e dizem muito da relação dos humanos com sua própria condição de seres conscientes de sua finitude e insignificância frente ao tempo do universo. A novidade é o comércio da miséria humana sob a forma capitalista. Médiuns, pastores e outros quaisquer, capazes de articular o discurso da esperança, facilmente se tornam parte da classe dos novos milionários do capitalismo financeiro global, pessoas com imensas fortunas que não têm qualquer relação com o sistema produtivo, mas são parasitas que podem ser agrupados sob o rótulo de celebridades.

Mas o fenômeno da implosão discursiva não para no surgimento do médium e da pastora, ele também dá pistas para explicar fenômenos como o capitão messias, eleito presidente do Brasil.

Antes de avançar no argumento, uma rápida digressão. Seria cômodo atribuir a vitória do capitão ao crescimento mundial de uma ideologia política de extrema-direita. Mas, mesmo sem desconsiderar o cenário internacional, as questões internas apontam para muitas possibilidades explicativas, entre elas a que se relaciona, por décadas, ao êxito do médium ou à ascensão da pastora.

De 2013 a 2018, o Brasil viveu um continuo esgarçamento do conteúdo do discurso que lhe deu sentindo desde a redemocratização na década de 1980. Das chamadas Jornadas de Junho, em 2013, às eleições de 2018, um conjunto de acontecimentos estraçalhou os discursos políticos que davam sentido à jovem democracia brasileira, transformando-os em centenas de fragmentos dispersos, sem articulação. Alguns acontecimentos se destacam do conjunto: a memória recente dos escândalos de corrupção que envolveram os governos Lula desde 2005 e minaram a capacidade de interpelação do discurso petista; a ruptura do PSDB com o pacto democrático, não aceitando o resultado das eleições das urnas em 2014 e liderando o movimento que provocou a queda da presidenta Dilma Rousseff em agosto de 2017; a criminalização da política através da operação Lava Jato, que combinou o estrelismo de um juiz e alguns procuradores e com a transformação de uma figura execrada na história brasileira em herói: o delator.
 
De um país com dois partidos muito bem estruturados, o PT e o PSDB, que se alternavam na presidência da república, com partidos de centro circulando ao redor dos grandes e pequenos partidos nos dois extremos que montavam o quadro, o discurso político brasileiro se reduziu a um amontado de ladrões disputando as melhores fatias das riquezas nacionais. O resultado mais pungente foi a desqualificação da política e a morte do sujeito político, o eleitor da democracia, que se forjara desde a década de 1980.

Nada é mais forte para descrever este sujeito perdido do que fotos das manifestações de rua, quando frequentemente se pode ver um cidadão sozinho, com um cartazete feito à mão em que está escrito: “eles não me representam”. Estas circunstâncias asseguram as condições de emergência ótimas para o discurso simplificador, que reorganiza o sujeito a partir de consignas violentas, interpelando os sentimentos mais emocionais possíveis, de vingança, de medo à diferença, trazendo para a linha de frente militares e pastores, revivendo medos atávicos da população brasileira (como o contra o comunismo, seja isto o que for na cabeça de cada um). Prometendo morte e cadeia para contraventores que provocam a violência urbana ou roubam os cofres públicos, o capitão messias interpela a população através do discurso da ordem, que parece colocar cada significado em seu lugar, sem deixar possibilidade para a dúvida, desejando convencer a todos de que estaremos longe do mal para sempre.

O médium, a pastora e o capitão messias são as respostas à desorganização discursiva frente à morte, a solidão, a descrença nas soluções políticas. Todos organizam sujeitos em crise, todos têm soluções mágicas e fáceis. Todos contam com a benevolência das instituições estabelecidas, com a boa vontade de muitos que nem creem no médium, na pastora, ou no capitão messias.
 
 
12
Ago18

Gebran e TRF-4 confessam fraudar a lei para manter Lula preso

Talis Andrade

Com Moro, vão todos para a cadeia, quando a canoa virar

 

facção da justiça.jpg

 

De Mauricio Lima, no detrito sólido de maré baixa:

 

Desembargador admite ignorar letra fria da lei para manter Lula preso

 

O desembargador Gebran Neto admitiu a amigos que ignorou a letra fria da lei ao dar decisão contrária à soltura de Lula, desconsiderando a competência do juiz de plantão. Gebran alegou que era a única saída para evitar um erro ainda mais danoso: libertar o petista.

26
Jul18

“Todo o poder emana do Moro e em seu nome será exercido”?

Talis Andrade

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por Fernando Brito

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Lá está, na manchete do Estadão:”Moro vê resultado da eleição como risco à Lava Jato“.

 

O resultado da eleição – quando ela é livre – é a consagração do que está dito na primeira lei a que o Doutor Todo-Poderoso acha que não vem ao caso: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

 

Do alto de sua arrogância autoritária, diz que o país precisa do ““do exemplo de lideranças honestas” . Honestas, claro, na visão dele.

 

Quem sabe, dá exemplo de “liderança honesta” o sujeito que compra vias públicas para anexar à sua mansão, como o furioso com que a toda hora Moro posa para fotos?

 

Será exemplo de “liderança honesta” um juiz, convertido que se acha em “herói nacional” receber “auxílio” de verbas públicas para morar num apartamento que é seu, próprio?

 

Ou sair do recolhimento de sua função para “badalar” pelos salões daqui e do mundo, em eventos que só raramente são jurídicos, “marquetando” sua própria figura?

 

Ou aqueles que dão a sorte de contar com a leniência da Justiça e assistem as denúncias contra eles perambularem de tribunal em tribunal, cada qual dizendo que “não é comigo”, como Geraldo Alckmin, Beto Richa, Aécio Neves?

 

Liderança honesta, Dr. Moro, é aquela que recusa usar seu poder discricionário para interferir no resultado das eleições.

 

E que, desejando nelas influir, despe a armadura da toga que o protege e desce ao campo da política sem ela, para enfrentar seus adversários com a espada do voto e não com o aviltamento de usar o poder legal como sua arma.

 

Do contrário, seu poder será sempre o de delegado “da roça”, que não pode ser confrontado e se acha no direito de que todos o obedeçam e ninguém questione seus atos.

 

Precisamos, sim, de leis que impeçam abusos e, em matéria de corrupção, estamos cheios delas, sem melhores efeitos.

 

Mas há outros tipos de abuso, como o de pessoas que, investidas do poder de Estado, querem escolher como e quem o povo pode escolher em eleições.

 

O dos que roubam um valor imenso, superior, aquele que nos dá o estágio de civilizados: a liberdade e a soberania do povo.

 

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