Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

O CORRESPONDENTE

30
Out22

O que é pânico institucional? Perguntemos a Freud. Ele explica!

Talis Andrade

democracia nazismo_demolish__vasco_gargalo.jpg

 

 

Por Lenio Luiz Streck

 

Constitucionalismo quer dizer "fazer democracia no direito e pelo direito". O ponto central é a institucionalidade.

Democracias consolidadas funcionam assim. Ou alguém viu, na Espanha ou Portugal, pessoas dizendo "essa Constituição atrapalha o país" ou "queremos Franco ou Salazar de volta"? Ou o chanceler da Alemanha dizer "me dá náusea cumprir a Constituição"?

Ou alguém viu um ex-deputado na Espanha ou Alemanha tecendo hediondas ofensas a uma juíza do Tribunal Constitucional, quebrar as condições de sua prisão domiciliar, receber a polícia à bala e com granadas praticando quatro tentativas de homicídio e, depois, tomar cafezinho (ou algo desse quilate) com o policial, tudo "assistido" por um padre de festa junina?

Não? Então me sigam.

O constitucionalismo — essa invenção democrática — criou mecanismos para evitar que maiorias eventuais destruam a democracia. Autopreservação, eis a chave. Se eu habito com outras pessoas e tenho um contrato pelo qual as decisões são tomadas por votação, isso não garante que alterem o contrato e me joguem pela janela.

Como me salvo? Colocando uma cláusula pela qual podem alterar o contrato por votação, menos a cláusula que diz que minha vida e dignidade devem ser preservadas acima de tudo. Essa é a metáfora ulisseana de todos conhecida. As correntes que me amarram... e me salvam das sereias, dos jeffersons, dos kelmons e quejandos.

As cláusulas pétreas e as garantias institucionais (por exemplo, a divisão de Poderes) representam uma espécie de "quarto de pânico da democracia".

Para que serve esse "quarto do pânico"? Simples. Quando os bárbaros — e existem muitos — ameaçam as instituições, protegemo-nos. Simbolicamente, é ali que nos abrigamos.

Porém, não se trata, simplesmente, de possuirmos um "quarto do pânico". O ponto é possuirmos instituições robustas.

A institucionalidade é algo tão complexo que, por vezes, nem o "quarto do pânico" resolve. Voltando à metáfora de Ulisses, de nada adianta ser amarrado ao mastro e dar as ordens aos marinheiros, se estes retirarem a cera dos ouvidos e ouvirem o canto das sereias...!

Explico melhor.

Instituições tem uma função. Metaforicamente, são como limpadores de para-brisas. São inúteis se não estiverem do lado de fora do carro, se me permitem essa plus platitude. Todavia, essa aparente obviedade é necessária porque estamos em um país em que... bem, aconteceu e acontece tudo isso-que-está-aí, d'onde o "fator jefferson" completa a ópera trágica e ao mesmo tempo bufônica. Não preciso elencar as vezes em que o presidente da República ofendeu ministros do Supremo, ameaçou — implícita e muito explicitamente — rupturas institucionais, além da retomada da segunda edição do famoso livro Coronelismo, Enxada e Voto (isso é uma metáfora; ou alegoria!).

Cabe a pergunta: dizer que as "instituições funcionam" pode apenas ser uma ficção da realidade ou, quem sabe, o nosso pânico diante do perigo da realidade da ficção?

Daí minha outra indagação — fulcral: o direito pode salvar a democracia?

No Brasil, o STF já deu mostras de que, até aqui, com muito custo político-institucional — veja-se as correntes de ódio contra a Suprema Corte —, isso não foi apenas possível como foi necessário, se pensarmos nas decisões sobre a pandemia, o inquérito em autodefesa contra os ataques à corte (episódio que mais lhe gera críticas) e o quase-golpe de 7 de setembro de 2021 (em que ministro foi chamado de canalha).

Isso não é motivo para um "pânico institucional"? Bom, se você estiver em dúvida, ligue na Jovem Pan por cinco minutos e o coeficiente de pânico sobe para o grau máximo.

As eleições estão às portas. A corda está esticada. Torcemos pela institucionalidade. Pelo Direito. Pelo Estado Democrático de Direito. Pela democracia.

Como o Rubicão foi atravessado tantas vezes, a tarefa, no futuro, é evitar tais travessias. Bem antes. É a institucionalidade democrática que funciona como superego dos "rubicanheiros" e das vivandeiras.

Ou seja, para evitar a tentação da travessia do Rubicão os nossos limpadores de para-brisas devem estar up to date. Do lado de fora do carro, é claro. E, também, sempre bom ter um estoque de cera, suficiente para tapar os ouvidos dos marinheiros de Ulisses.

Continuo em "pânico institucional". Difícil expressar isso em palavras. É algo que aperta o peito. Temos o quarto para nos abrigarmos. Mas com quem está a chave?

Numa palavra final: como diz Jon Elster (quem criou a metáfora "constitucionalismo-correntes de Ulisses"), o problema não é explicar por que tantas constituições fracassam em impor obediência a seus criadores e nunca passam de meros pedaços de papel escrito. A questão está em compreender de que maneira muitas constituições conseguem adquirir essa misteriosa capacidade de serem obedecidas.

Qual será o nosso caso? Só Freud explica.

Bom, se o Direito nada pode dizer, porque só faz furo n'água, então talvez Freud, tão referido na cultura popular ("isso só Freud explica"!), possa ajudar. Está tudo ali, no livro Psicologia das Massas e Análise do Eu.

A formação do discurso foi tomada por agrupamentos de egos vivendo em pequenos rebanhos. Juntando esses grupos (redes sociais, hoje) e pela velocidade pós-moderna, temos o efeito rebanho. Manada.

Já não há opinião pública. Há apenas a opinião narrada. A liquidez dos fatos.

Ainda dá tempo para procurar na internet as freudianas explicações para entender comportamentos "tipo" jeffersonianas. Como já contei há algum tempo, tenho uma tia que... Bom, deixa pra lá. Vocês entenderam.

Numa palavra final: Freud explica que, se a psicologia do sujeito depende do contexto no qual ele se encontra, é preciso admitir que um outro ambiente pode permitir-lhe mudar de conduta.

Pronto. Mudemos o ambiente, pois.

constituicao.jpg

 

29
Out22

Policiais federais atingidos por Roberto Jefferson têm estilhaços no quadril e no crânio

Talis Andrade

Agente da Polícia Federal ferida durante ataque de Roberto Jefferson: pontos no rosto e na coxa — Foto: Reprodução

Agente da Polícia Federal ferida durante ataque de Roberto Jefferson: pontos no rosto e na coxa 

 

 

 

Por Arthur Stabile e Eliane Santos, g1

No depoimento prestado à Polícia Federal, o ex-deputado Roberto Jefferson afirmou que não teve em nenhum momento intenção de matar os policiais federais. Mas os laudos e os depoimentos dos agentes feridos por ele mostram outro cenário. Uma agente ficou com estilhaço de granada no quadril, e um delegado disse ter ficado com dois fragmentos, possivelmente de estilhaço, no crânio.

Jefferson disparou com um fuzil 5.56 mm e atirou três granadas contra os policiais federais que foram até sua casa em Comendador Levy Gasparian, no domingo (23), para cumprir ordem de prisão do ministro Alexandre de Moraes.

A agente Karina Oliveira e o delegado Marcelo Villela foram feridos e precisaram de atendimento médico.

 

Policial desmaiou em meio aos tiros

 

Karina foi ferida primeiro. Teve ferimentos no rosto e na coxa, onde levou pontos, e tem estilhaços de granada no quadril, como mostra o laudo a que o g1 teve acesso. Por causa dos ferimentos, a policial precisará ficar cinco dias afastada do trabalho.

 

Em seu depoimento, ela contou que chegou a perder os sentidos. No entanto, antes ela havia passado sua pistola para o policial Daniel, já que a dele deu pane durante o confronto com o ex-deputado.

No momento em que se abrigava e tentava socorrer a policial, o delegado Marcelo Villela foi ferido na cabeça.

 

Estilhaços na cabeça

 

Em seu depoimento, ele contou que Roberto Jefferson dizia que “não iria se entregar de jeito nenhum” ou que só “sairia de sua casa morto”, e que na “sequência sentiu o sangue descer de sua cabeça; que em determinado momento a quantidade de sangue era muito grande, atrapalhando a visão do olho direito”.

 

Marcelo disse ainda que após raio-X, teve dois fragmentos, possivelmente de estilhaços, constatados em seu crânio.

 

Cunhado socorreu

 

O delegado destacou, ainda, em seu depoimento que Jefferson aguardava a Polícia Federal e agiu de forma premeditada.

Os policiais contaram também que foram socorridos por alguém que apareceu se apresentando como cunhado de Roberto Jefferson.

 

'Vai dar m...'

 

O policial federal Heron Peixoto, que pulou o muro da casa do ex-deputado, para tentar abrir o portão para os outros agentes, contou ainda que tocou a campainha da casa de Jefferson, e que foi advertido por uma mulher que era para ir embora: “vai embora”, “vai embora que vai dar merda”.

O policial que intermediou as negociações com Roberto Jefferson contou que o ex-deputado federal oscilava muito de humor. Que em um primeiro momento dizia que só sairia do local morto, que era para “preparar o cemitério, pois ele iria para lá”, e em outros se acalmava e topava conversar.

25
Out22

Bandido bom é bandido Jefferson?

Talis Andrade

Image

por Fernando Brito

- - -

São estarrecedoras as cenas publicadas nas redes sociais (veja ao final) da conversa entre Roberto Jefferson, depois de ter atirado 30 vezes sobre a equipe da Polícia e atirado duas granadas que feriram uma agente e um delegado, e um dos agentes que finalmente efetuou sua prisão.

Um clima de descontração, risadas, e até de crítica do policial aos seus colegas feridos (“são burocráticos”), deixando claro que ali se estaria tratando com pessoa digna de especialíssima consideração, alguém de um mundo absolutamente oposto ao de qualquer bandido que se dispõe a disparar tiros de fuzil contra a polícia.

Ninguém, é claro (ou talvez só Jefferson) queria que saísse dali um cadáver ou mesmo alguém baleado, mas olhar o convescote risonho que se passou, ainda mais quando estava evidente que se poderia ter imobilizado e algemado o atirador senil, que não tinha condições de oferecer resistência, ainda mais com pelo menos dois outros agentes policiais na sala, é demais.

Espera-se, aliás, que os delegados de Polícia, que emitiram nota óbvia, repudiando os ataques de Jefferson a policiais, ajam no sentido de saber se a delicada simpatia do policial que “passava pano” para o agressor de seus colegas agiu assim por orientação superior ou simples simpatia política.

Quando se defende que as ações da polícia sejam dentro da lei e não atirando para matar, quando se trata de pessoas pobres e de comunidades faveladas, ninguém está dizendo que tudo deve ser no papo amigável, no qual só faltaram salgadinhos e bebidas para parecer uma confraternização. Ou será que não faltou nada?

Jair Bolsonaro, agora, chama Jefferson de “bandido”. Agora só falta dizer que “bandido bom é bandido Jefferson”.

@tiagobarbosa_
Essa reverência a um bandido que tentou assassinar policiais federais e confessou ter atirado granadas é uma das mais sórdidas humilhações contra o país e a polícia imposta pelo bolsonarismo. O sujeito rebaixa os colegas alvejados diante de um crápula.

Image

Sérgio A J Barretto
@SergioAJBarrett
O boné do Lula era uma homenagem às favelas do Brasil. Mas esse aí, do filho do Onix, é a bandeira Gadsden, símbolo usado pelos neonazistas que invadiram o Capitólio nos Estados Unidos. Essa gente não é a escória humana?Image
25
Out22

Com Aristóteles, clamamos: deuses e bestas, fiquem fora da política!

Talis Andrade

nova política por vaccari.jpeg

 

Por Lenio Luiz Streck

Na crise da democracia, devemos ir aos clássicos. Aristóteles dizia que o homem é um ser sociável por natureza. É um politikon zoom, animal político. Ou isso, ou somos deuses. Ou somos bestas.

Por isso, foi enfático: a política é uma ciência estritamente humana, não é assunto nem de bestas nem de deuses.

Também Aristóteles dizia que, por ser um animal político, o ser humano busca parceiro(a) para se unir e formar família, grupos e assim vai.

Talvez hoje em dia o homem (ou mulher) busca parceiros de WhatsApp para formar neocavernas. É o novo "homowhatszapiens".

Acima dos grupos humanos estão os grupos de WhatsApp. Viva. E o TikTok, é claro.

Platão, professor de Aristóteles, talvez tenha sido o primeiro a criticar as bestas, os néscios. Contra esses, formulou a Alegoria da Caverna.

As sombras são sombras, denunciava. Mas de nada adiantava. O rei filósofo foi apedrejado ao dizer que as sombras não eram a realidade.

Hoje em dia já não há fatos. Há apenas narrativas. Mas, como vimos, isso é coisa velha. E, pior, sempre cabe qualquer narrativa. Eis o novo mundo. Vasto mundo. Que, assim, pode, sim, ser chamado de Raimundo, para desdizer o poema de Drummond.

Hoje já é possível dar às palavras o sentido que se quer, dando razão ao personagem Humpty Dumpty, de Alice Através do Espelho, de Lewis Carroll.

Como exercitar a democracia nestes tempos em que já não há fatos? Eis a pergunta de 2.500 anos de filosofia. E de política.

Pergunta-se: do modo como se apresentam, hoje, as redes sociais são compatíveis com a democracia?

As redes, com seus algoritmos e quejandos, criam seus próprios critérios de verificação. É esse o ponto. Daí a incompatibilidade com a democracia.

A democracia moderna é uma questão de linguagem pública. Há critérios para se dizer as coisas — e esses critérios são públicos, construídos intersubjetivamente.

Por isso não surpreende os "outsiders". Outsider é quem vem de fora do jogo de linguagem da política. As redes facilitam isso. Por quê? Ora, exatamente porque criam seus próprios critérios de verdade.

O que é uma república? A resposta é polis. É res pública. Coisa pública. Política. Coisa essencialmente pública. Porém, quando o meio de se fazer política passa a ser as redes, privatiza-se os critérios de verificação. Desaparece a mediação.

Daí passam a valer todos os paradoxos e paroxismos: gente contra a corrupção que tem orgulho de sonegar. Médico a favor de cloroquina. Médicos que possuem autonomia absoluta para receitar cloroquina; mas canabidiol, não. Pastores e evangelizadores que apoiam tortura, misturam o que é de Deus e o que é de César para prosperar (anti)politicamente com base na fé alheia. Fracassamos? A pergunta é retórica.

As redes permitem isso, porque, assumindo o já paradoxal papel de meio — porque não há mediação —, substituem a política, pública e tradicional, por um simulacro em que os critérios são ad hoc.

A mentira como critério da verdade.

A política foi degenerada — pelos tais outsiders — e, fundamentalmente, "evangelizada": pastores da fé e da carteira alheia, "padres" de festa junina — os outsiders de um Estado que é laico.

A esperança? Recuperar o politikon zoom. O animal político. E não as bestas "políticas".

Afinal, fatos existem, por mais que as narrativas queiram se impor. E, sim, as sombras eram mesmo sombras.

Às vezes, o padre é mesmo só de festa junina. E o que é de Deus não é de César.

A política é pública. Como disse Aristóteles, a política não é assunto nem de bestas nem de deuses.

Logo, como os tais "outsiders" e os protagonistas — que misturam religião e sua (anti)política — à toda evidência não são deuses, resta-lhes a segunda hipótese, segundo o velho Aristóteles: bestas.

 

velha política bhaz bruno lanza.jpeg

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2022
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2021
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2020
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2019
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2018
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2017
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
Em destaque no SAPO Blogs
pub