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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

10
Ago22

Bolsonarismo e fascismo

Talis Andrade
Blanca Alaníz, serie Cuadrados, fotografía digital y fotomontaje a partir de la obra Planos em Superficie Modulada de Lygia Clark (1957), Brasilia, 2016

 

 

por Luiz Marques /A Terra É Redonda

O fujão quer evitar debates que mostrem como ele é repelente, para focar no ressentimento da malta de seguidores desinformados

O historiador italiano Renzo de Felice, no livro Entrevista sobre o fascismo (Civilização Brasileira), discorre sobre o fascismo histórico (1919-1945) que teve de protagonista “uma classe média emergente, que tende a realizar uma política na própria primeira pessoa”. Operação que partiu da “desclassificação das classes médias que se proletarizaram e que, para fugir deste destino, se rebelam em busca de participação e poder político”. O alvo em vista não é o establishment, mas os partidos progressistas (socialistas, em especial) que lutam contra as férreas estruturas de exclusão do sistema. Sistema que aquelas têm urgência em reestabelecer para recuperar a posição e os privilégios de que desfrutavam outrora: “ainda que não reconheçam mais na classe dirigente tradicional nem capacidade, nem legitimidade para governar”.

Se o fascismo abriu-se a todas as classes sociais, “quanto aos quadros e aos elementos ativos política e militarmente, se caracterizou em sentido pequeno-burguês, dando ao movimento um caráter de classe”. As classes médias não são uma página virada na história. Não devem ser subestimadas, tampouco entendidas no singular. Ao invés de perder relevância, tornaram-se uma das forças sociais mais salientes da sociedade contemporânea, pluralista e (pós-) industrial. “De certo modo, nos demos conta de que a batalha contra o fascismo se vence ou se perde no terreno das classes médias, não no das outras classes” (idem). Eleitoralmente, é plausível vencer um pleito nas urnas sem as camadas intermediárias, mas não derrotar o fascismo.

O bolsonarismo mescla o fascismo italiano, donde provém o termo fascio (feixe), e o alemão. Nenhum visava a criação ex nihilo de valores inexistentes. A Itália, de Mussolini, ecoava o longínquo Império Romano. A Alemanha, de Hitler, valores das guerras napoleônicas em diante para reencontrar a pureza ariana. O Brasil, de Bolsonaro, reporta-se às figuras simbólicas da tortura e da ditadura militar: o coronel Brilhante Ustra e o general Newton Cruz. Referências que funcionam qual modelos a imitar, “tipos ideais” no linguajar da sociologia. Ignorar as Constituições e a Declaração Universal dos Direitos Humanos serve de predicados às tribos ideológicas de ressentidos. Não para voltar atrás, como pretendem os regimes conservadores / tradicionalistas. Mas para prospectar o futuro, com uma “nova sociedade” e uma “nova política”.

Em comum, além de alinhavarem uma nova concepção política de direita e o apoio de setores agrários, as experiências acima arroladas tiveram sempre a ascensão pavimentada pela vergonhosa conivência das forças convencionais do liberalismo, as quais acreditaram ser possível domesticar e constitucionalizar les bêtes humaines com as lides burocrático-palacianas. Isso ficou patente, entre nós, no alinhamento de tucanos à via fascista na campanha eleitoral de 2018: João Doria em São Paulo, Aécio Neves em Minas Gerais e Eduardo Leite no Rio Grande do Sul; bem como dos meios de comunicação.

Um endosso à tese de que o fascismo nasce de uma crise existencial da sociedade liberal em face do roto espantalho do comunismo “que come crianças”. O que explica: (a) a retórica bolsonariana que, com frequência, acena com o surrado espectro comunista para arregimentar as elites proprietárias e seduzir segmentos temerosos do descenso e; (b) a demagogia do apelo ao nacionalismo de fachada, enquanto entrega empresas públicas ao capital globalizado, permite a espoliação do país e se rende aos interesses imperialistas.

A foto em que o presidente “messiânico” – sem decoro – bate continência à bandeira dos Estados Unidos e o comentário subserviente (I love you) à passagem de Donald Trump, no corredor de uma reunião da Organização das Nações Unidas (ONU), falam por si. Apesar das evidências políticas e econômicas de uma governança lesa-pátria, o discurso nacionalista embala o arranjo neofascista fardado com a camiseta amarela da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Trata-se de um nacionalismo cheesy, pura breguice, que se junta a um cristianismo vazio de conteúdo, ausente do pulsar real nas ruas; embora presente nas articulações pelo alto com a antirrepublicana bancada evangélica, na Câmara Federal. Tudo é falso na ritualística do bolsonarismo – a defesa da nação e, igualmente, a profissão de fé em Deus. A esperteza engana bobo.

Cada um dos projetos (Itália e Alemanha ontem, Brasil hoje) tinham e tem preocupação em se prolongar no poder através da educação (uma ideia iluminista), investindo na juventude. A destruição do Ensino Superior teve contrapartida na aplicação do Programa Nacional de Escolas Cívico-Militares, pelo governo. Foram mais de cinquenta unidades fundadas, com o único objetivo pedagógico de formar jovens ideólogos para “crer, obedecer, combater”. Governos fascistas investem, antes, em sentimentos e comportamentos do que em esferas públicas de sociabilidade. Apostam na comunidade de fanáticos, não na entidade-povo.

Sobre classificar ou não o fascismo de “revolucionário”, isso depende do sentido que se dá ao termo. Na acepção leninista de revolução, que moralmente possui conotação positiva, não. Na acepção de um movimento que tende à mobilização, em lugar da desmobilização das massas, sim. A participação de rebanho combina-se com a escolha criteriosa de “judeus” em que atirar, como o Supremo Tribunal Federal (STF), para desconversar sobre o entreguismo, o negacionismo, o genocídio, a dolarização dos combustíveis, a inflação, a precarização do labor, a retirada de direitos trabalhistas, a corrupção e as milícias. Fake news são estratégicas para manter a adrenalina nos corpos.

Psicologicamente, cidadãos fascistas devem ser diferentes dos cidadãos desenvolvidos com base em valores da modernidade. Metrópoles urbanas são encaradas como uma ameaça à espiritualidade, de raiz, da população. As cidades levam ao convívio estreito com uma diversidade étnico-racial e a uma maior tolerância e aceitação da igualdade de gênero e do respeito às múltiplas diferenças. Não à toa, o guru Olavo de Carvalho considerava os habitantes rurais uma reserva moral. Sobre o tema, vale a pena ler a excelente obra Guerra da eternidade: o retorno do tradicionalismo e a ascensão da direita populista (Unicamp), de Benjamin Teitelbaum.

Mussolini se ufanava da truculência de seu movimento e incentivava os ímpetos violentos: “a violência é imoral quando é fria e calculada, mas não quando é instintiva e impulsiva”, dizia. À medida que a movimentação fascista crescia e tomava grandes proporções, não hesitou em canalizar a brutalidade para atingir determinadas metas. Então, rápido, mudou o lado do velho disco de vinil: “a violência fascista deve ser pensante, racional, cirúrgica”. A violência cirúrgica permitiria manobras mais precisas do que as instintivas. “Criamos o nosso mito. O mito é uma fé, uma paixão. Não é preciso que seja uma realidade. O nosso mito é a nação, é a grandeza da nação”, revelou o Duce com a franqueza habitual. Fascismo rima com manipulação.

Aqui, é importante listar um ingrediente para a reflexão ético-política, que não costuma despertar a atenção. “O fascismo causou infinitos danos. Um dos maiores foi o de deixar como herança uma mentalidade fascista aos não-fascistas, inclusive aos antifascistas por convicção. Uma mentalidade de intolerância, de prepotência ideológica, de desqualificação do adversário para destruí-lo”, conforme Felice. A anotação se aplica à prática dos “escrachos” (torta no rosto, tinta na roupa, bloqueios, etc), utilizados pelos adeptos da “ação direta”, na Europa. O exagero nos meios compromete os fins. Na dúvida, please, não ultrapasse o sinal.

O pré-candidato do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU) ao governo de São Paulo declarou, recentemente, ser favorável ao armamento da classe trabalhadora paulista e nacional. “A população tem que ter o direito de se armar para se contrapor às milícias e ao crime organizado”. Paulo Altino Jr. não se apercebeu que, num grau tamanho de erosão institucional, o fascismo teria penetrado os poros do aparelho estatal e, as esquerdas, derrotadas e perseguidas, já teriam sido empurradas para uma espessa clandestinidade. Só o fortalecimento das instituições democráticas pode conter a barbárie. Bravatas não são a solução.

O desabafo do esquerdista contém um alerta sobre a amplificação totalitária do fascismo no tecido social e, em consequência, sobre a gravidade dos obstáculos a serem superados pelo conjunto dos progressistas, em outubro. Contudo, não dá para subscrever a transposição de uma proposta da lavra da extrema-direita ao mundo do trabalho, tout court. Há que interpor filtros para delimitar as fronteiras. Refletir é dispor a realidade em categorias distintas.

Compreender o fascismo não significa imitar os métodos espúrios dos fascistas. Como alerta o filósofo hispano-americano George Santayana: “Quem não conhece a sua história, está condenado a revivê-la”. Traduzindo: o conhecimento ajuda a construir o arcabouço teórico de uma cosmovisão que interpele a cidadania, na direção de uma democratização radical da democracia. Ao contrário de obliterar corações e mentes, caindo na tentação dos atalhos panfletários. Melhor não se afastar da estrada e manter-se fiel ao programa ideopolítico antifascista.

As pesquisas de intenção de voto, favoráveis à troca de inquilino no Palácio do Planalto, acirram o ânimo belicoso das hordas do bolsonarismo. Convidado a almoçar na casa do anfitrião, que organizara uma aula magna para alunos da Universidade de Campinas a cargo do ex-presidente Lula da Silva – o mesmo sofreu hostilidades de moradores em condomínio de luxo (rendimentos ao reverso da civilidade). Na saída, teve o carro cercado por broncos manifestantes, abestalhados pelo ódio. A conduta provocativa e agressiva teve a intenção de suscitar imagens de constrangimento, em resposta ao destaque dado ao petista na capa da prestigiosa Time. A revista alvoroçou bolsominions e a mídia lavajatista que escancara a parcialidade, com desfaçatez. A declaração de voto pró-Lula da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) serve de contrapeso.

Os novos fasci di combattimento não dispõem de plataforma política (il nostro programa è semplice: vogliamo governare / o nosso programa é simples: queremos governar). Seu imaginário é vulnerável frente a vida como ela é nas periferias e nas favelas. Pelo absoluto desgoverno, não têm realizações mínimas para apresentar na saúde, educação, infrestrutura, emprego, renda, ciência / tecnologia e meio ambiente. Resta-lhes “vomitar impropérios pretensamente patrióticos contra os inimigos e, passando à ação, expor a dialética dos punhos e dos revólveres”, salienta o saudoso Leandro Konder no clássico Introdução ao fascismo (Graal).

O desafio perante as táticas empunhadas pelo “cão dos infernos”, na expressão do diretor da telenovela Pantanal, Walter Carvalho, para provar que “Lula não pode andar nas ruas” (sic), está em logísticas que impeçam contingências fora de controle. A prevenção não é só obrigação da segurança privada dos candidatos e dos partidos, senão que dever do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e da Polícia Federal. A questão implica a lisura do processo em curso, a integridade física e a liberdade de ir e vir dos competidores atuais. Acuado está o Ustrinha.

Ao fascismo interessa naturalizar a violência e, se possível, fabricar mártires. Esse é o palco por excelência para os medíocres espetáculos de autoritarismo e desprezo pelo Estado de Direito. O fujão quer evitar debates que mostrem como ele é repelente, para focar no ressentimento da malta de seguidores desinformados. No caos, goza. Puxar para a arena civilizacional a disputa vai atrair setores das classes médias e grupos sob sua influência, ao campo democrático-popular. É a lição de Campinas. Não atravessamos tempos normais. Mas atravessamos.

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xico sá
@xicosa
A vida dos folgados quando a população morria sem oxigênio! Braga Netto e militares do governo receberam supersalários de até R$ 1 milhão no auge da pandemia







17
Jul22

Coronel Ustra, torturador da ditadura, também entrou depois de morto na farra dos marechais de Bolsonaro que criou a mamata do centrão militar 

Talis Andrade

Arquivos militares – Blog do Servidor

 

Condenado em 2008 por torturas no DOI-CODI e homenageado por Bolsonaro no impeachment de Dilma, ele deixou pensão de R$ 30.615 para as filhas. Newton Cruz, ex-SNI, também foi agraciado com a patente

 

Carlos Alberto Brilhante Ustra, coronel do Exército condenado em 2008 pela Justiça brasileira como torturador durante a Ditadura Militar (1964-1985), foi elevado ao posto de marechal. É o que mostram os dados do Portal da Transparência, acessados na noite desta quinta-feira (5). Ontem (4), a reportagem da Fórum já havia mostrado que 100 generais do Exército e outros 115 da Marinha e da Aeronáutica tinham sido elevados ao posto normalmente atribuído a heróis nacionais que participaram de guerras, inexistente atualmente.

Leia também: “Para qual guerra preparam-se as Forças Armadas?”, indaga Padilha sobre farra dos marechais

O fato mais conflitante fica por conta de Brilhante Ustra ter ido para a reserva como coronel, o que no máximo, se passasse a um posto acima, poderia conduzi-lo ao grau de general de brigada, três níveis abaixo da extinta patente de marechal, legalmente possível apenas em tempos de guerra.

Falecido em 2015, o oficial que usava o codinome Dr. Tibiriçá durante as sessões de tortura na sede do DOI-CODI, em SP, transmitiu sua pensão de marechal às filhas Patrícia Silva Brilhante Ustra e Renata Silva Brilhante Ustra, que recebem cada uma 15.307,90, totalizando R$ 30.615,80, valor correspondente aos vencimentos de outros “marechais” do Exército.

Outra figura emblemática de um dos períodos mais sinistros da História do Brasil que foi elevado a marechal no banco de dados do Executivo federal é o general Newton Cruz, ex-chefe do SNI dos governos Geisel e Figueiredo. Notório integrante da chamada “linha dura” do Regime Militar, Cruz ficou conhecido pelo estilo agressivo e pelas frases intimidatórias que utilizava na frente de todos, inclusive contra jornalistas. Há vídeos da época, disponíveis na internet, que mostram a truculência do antigo n° 1 dos serviços de inteligência da Ditadura.

Num outro caso sem explicação, Newton Cruz, que foi para reserva como general de divisão, só poderia ascender ao posto de general de exército, que é o subsequente. O oficial precisaria alavancar dois postos, desde de que deixou o serviço ativo, para subir à patente de marechal, o que ainda seria ilegal, uma vez que a lei só permite esse tipo de promoção em caso de participação em conflitos bélicos. A aposentadoria paga ao “marechal” Cruz é de R$ 34.565,71.

 

Bolsonaro, o fã do torturador Ustra

 

O presidente Jair Bolsonaro nunca escondeu sua admiração pelo coronel Brilhante Ustra, a quem se refere como um “herói nacional”, em que pese todas as acusações de violações aos direitos humanos praticadas pelo torturador condenado, inclusive na presença de crianças filhas de suas vítimas. Durante a sessão que votou o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff, em 2016, o então deputado federal dedicou sua decisão favorável ao afastamento da petista com a seguinte frase: “Pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor da Dilma”.

A fala repercutiu entre autoridades e entidades da sociedade civil, no Brasil e no mundo, e foi classificada, entre outras coisas, como “execrável”, “estarrecedora” e “deprimente”. Os filhos de Bolsonaro, todos parlamentares, também costumam prestar homenagens ao torturador usando camisetas com a foto do militar já morto.

 

Repercussão sobre a “farra dos marechais”

 

Parlamentares ouvidos pela reportagem da Fórum na quarta-feira (4) se comprometeram a encaminhar ofícios, via Câmara dos Deputados, exigindo respostas ao Ministério da Defesa sobre as nomeações em massa de generais para a patente de marechal, que foi extinta no regramento jurídico brasileiro, exceto em tempos de guerra.

Os deputados Paulo Teixeira (PT-SP) e Marcelo Freixo (PSB-RJ) reuniram-se com lideranças de oposição nesta quinta-feira (5) para tratar do que passou a ser chamado de “farra dos marechais”.

 

Imagens do banco de dados do Portal da Transparência

 

Coronel Ustra, torturador da Ditadura, é um dos “marechais” | PolíticaCoronel Ustra, torturador da Ditadura, é um dos “marechais” | Política

Escândalo! Coronel Ustra, torturador da Ditadura, é um dos marechais do  Exército | Solda Cáustico

Filhas do torturador Ustra recebem pensão de mais de R$ 10 mil sem fazer nada

 

Com Ustra na lista, Generais de Exército são nomeados Marechais fora de  tempos de guerra, norma prevista após reforma | CGN

 

Dados inéditos revelados mostram que o governo brasileiro gasta cerca de 19 bilhões ao ano para sustentar as parasitas filhas de militares, por pagamento de pensão. Várias dessas são filhas de torturadores da Ditadura Militar, como Brilhante Ustra, famoso por torturar pais em frente aos filhos

 

por Redação Esquerda Diário

O Estado brasileiro gasta cerca de 19 bilhões de reais com pensão de filhas solteiras de militares, é o que revelam os dados da Agência Pública, exibidos hoje. Enquanto milhares de brasileiros padecem na fome tendo seus direitos mínimos e mais elementares sendo cortados, algumas dondocas passam o resto da vida no bem-bom com o nosso dinheiro.

Cerca de 226 mil filhas de militares recebem essa mamata e 137 mil dessas, cerca de 60%, são filhas de militares já mortos. Algumas destas pensões já chegam a quase 90 anos de pagamento, com algumas delas com pagamentos sendo iniciados em 1930.

Dentre as parasitas que recebem esta mamata do Estado brasileiro estão as duas filhas do lixo torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra, que tem em seu currículo desprezível a fama de levar crianças e bebês a tortura dos pais.Coronel Ustra, torturador da Ditadura, é um dos “marechais” | Política

Estas inúteis desfrutam do privilégio dado pelo Estado sem nunca ter precisado trabalhar, com um “salário” de mais de 10 mil mensais, cada uma. Ambas nunca casaram para poder continuar sustentando sua mamata. Publicado in 2/Julho/2021

Coronel Ustra, torturador da Ditadura, é um dos “marechais” | Política

Elairton Gehlen escreve: 'Os pobres devem economizar' - Folha de Dourados -  Notícias de Dourados-MS e região
10
Jul22

Não vamos falar sobre assédio dos generais?

Talis Andrade

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por Ayrton Centeno

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Pedro Maluco ou, conforme o cartório, Pedro Duarte Guimarães, então presidente da Caixa, foi o personagem da semana passada mas continua sendo protagonista nesta, mesmo após seu encontro com a guilhotina. Maluco virou ex mas a destruição que produziu nos princípios mais elementares de convivência em um ambiente de trabalho prossegue trazendo vítimas à tona.

Revirando-se as entranhas do banco, descobre-se que o vírus do bolsonarismo transformou o constrangimento em política corporativa com direito ao acobertamento militante por parte de diretores e à omissão de órgãos que deveriam zelar pela instituição. Ao ponto de uma das vítimas falar em “dezenas de Pedro Guimarães” e na naturalização da cultura do assédio.

Mas falamos em assédio – sexual e moral – do ex-presidente da Caixa, amigo do peito de Jair Bolsonaro, parceirão de lives e pescarias, mas deixamos encoberto outro tipo de assédio, constante e impune: o assédio sobre a democracia.

Encarapitados no Planalto, os generais palacianos não perdem oportunidade de importunar a débil e imperfeita democracia brasileira. Dá-se o assédio político e ideológico contra um dos instrumentos democráticos por excelência: as eleições. Tentam alvejá-las por uma presumida fragilidade nunca demonstrada nos últimos 90 anos.

Levantam dúvidas, dão pitacos e invocam o direito de arbitrar a lisura do pleito deste ano. Mas qual é mesmo a expertise da caserna no métier? Certamente não será maior do que a do Ministério da Agricultura e Pecuária. Ou da Saúde. Quem sabe a do Turismo?

O mais notável é que, se a gente der uma espiada na história destes tristes trópicos, a contribuição que as Forças Armadas podem oferecer às eleições rivaliza com aquela dada pelo general Pazuello no enfrentamento da covid-19.

Senão vejamos: em 1964, os generais assediaram a democracia, removendo um presidente eleito pelo voto popular. E acabaram com as eleições para presidente durante 21 anos. Quando a população saiu às ruas cantando “Um, dois, três, quatro, cinco mil, queremos eleger o presidente do Brasil”, a reação do regime foi mover os deputados que comiam nas mãos do generalato para derrotar a emenda Dante de Oliveira em 25 de abril de 1984.

Dois dias antes da votação das “Diretas Já”, o general João Figueiredo, então no poder, suspendeu o direito de reunião, decretou estado de emergência em Brasília e arredores e botou a tropa na rua.

Refulgia à frente de seis mil soldados e 116 tanques e carros de combate, o comandante militar do Planalto, general Newton Cruz, montado em um cavalo branco. Na Esplanada dos Ministérios, diante do buzinaço promovido por quem queria eleições sem demora, o general chicoteava os carros e desafiava: “Buzina agora, seu filho da puta!”

Sendo generosos, com a maior boa vontade, podemos dizer que os fardados sofrem de uma dificuldade bastante óbvia para lidar com eleições. Então, o assanhamento para instruir o TSE sobre como conduzir suas próprias atribuições pode não ser muito proveitoso. Alguns sinais estão nos ares.

A desconfiança do povo nas Forças Armadas subiu, segundo levantamento deste mês do Instituto da Democracia. O grupo de eleitores que diz não confiar nos militares chegou a 29,2%, enquanto aqueles que confiam muito somam 24,9%.

Compulsivo assediador da democracia, Bolsonaro já disse que as Forças Armadas “não farão papel de idiota” nas eleições.

Talvez o maior papel de idiota seja respaldar um energúmeno na elaboração do caos, desonrando-se ao lidar com uma tarefa com a qual não têm e nunca tiveram a menor afinidade.

General diz que Bolsonaro é refém de facção

 
 
09
Jul22

Monstros do Brasil

Talis Andrade

 

 

Toda ditadura cria monstros. 

A ditadura de Getúlio Vargas entregou a polícia política a Filinto Strubing Müller, militar, torturador e assassino. 

A ditadura militar de 1964, dos presidentes marechais e generais, pariu vários monstros: os serial killers coronéis Paulo Manhães, Brilhante Ustra, delegados Fleury e Pedro Seelig, capanga Cecil Borer. 

O homem mais perigoso do país: biografia de Filinto Müller - 9788520011126  - Livros na Amazon Brasil

05
Jul22

Bolsonarismo, vertente do fascismo

Talis Andrade

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Ao fascismo interessa naturalizar a violência e, se der jeito, fabricar mártires. Esse é o palco por excelência para os medíocres espetáculos de autoritarismo e desprezo pelo Estado de Direito

 

por Luiz Marques

O historiador italiano Renzo de Felice, em Entrevista sobre o Fascismo (Civilização Brasileira), discorre sobre o fascismo histórico (1919-1945) que teve de protagonista “uma classe média emergente, que tende a realizar uma política na própria primeira pessoa”. Operação que partiu da “desclassificação das classes médias que se proletarizaram e que, para fugir deste destino, se rebelam em busca de participação e poder político”. Seu alvo não é o establishment, mas os partidos progressistas (socialistas, em especial) que lutam contra as estruturas de exclusão do sistema. Sistema que aquelas querem reestabelecer para recuperar a posição e os privilégios de que desfrutavam outrora: “ainda que não reconheçam mais na classe dirigente tradicional nem capacidade, nem legitimidade para governar”.

Se o fascismo se abriu a todas as classes sociais, “quanto aos quadros e aos elementos ativos política e militarmente, se caracterizou em sentido pequeno-burguês, dando ao movimento um caráter de classe”. As classes médias não são página virada na história. Não devem ser subestimadas, tampouco entendidas no singular. Ao invés de perder relevância, tornaram-se uma das forças sociais mais salientes da sociedade contemporânea, pluralista e (pós-) industrial. “De certo modo, nos demos conta de que a batalha contra o fascismo se vence ou se perde no terreno das classes médias, não no das outras classes”. Eleitoralmente, é plausível vencer um pleito sem as camadas intermediárias, mas não derrotar o fascismo.

O bolsonarismo mescla o fascismo italiano, donde provém o termo fascio (feixe), e o alemão. Nenhum visava a criação ex nihilo de valores inexistentes. A Itália de Mussolini ecoava o longínquo Império Romano. A Alemanha de Hitler, valores das guerras napoleônicas em diante para reencontrar a pureza ariana. Não para voltar atrás, como os regimes conservadores, mas para prospectar a “nova sociedade” e a “nova política”. O Brasil de Bolsonaro reporta-se às figuras simbólicas da tortura e da ditadura militar: o cel. Brilhante Ustra e o gal. Newton Cruz. As satânicas referências funcionam como modelos a imitar, “tipos ideais” no linguajar da Sociologia. Ignorar as Constituições e a Declaração Universal dos Direitos Humanos serve de predicados à tribo ideológica de ressentidos.

Em comum, além de alinhavarem uma nova concepção política de direita e o apoio de setores agrários, as experiências acima arroladas tiveram a ascensão pavimentada pela conivência das forças convencionais do liberalismo, as quais acreditaram ser possível constitucionalizar e domesticar les bêtes humaines com as lides burocrático-palacianas. Tal ficou patente, entre nós, no alinhamento de tucanos à via fascista na campanha eleitoral de 2018: Doria em São Paulo, Aécio em Minas Gerais e Leite no Rio Grande do Sul; bem como dos meios de comunicação. Um endosso à tese de que o fascismo nasce da crise existencial da sociedade liberal em face do roto espantalho do comunismo. O que explica:

(a) a retórica bolsonariana que, com frequência, acena com o surrado espectro comunista para arregimentar as elites proprietárias e seduzir segmentos temerosos do descenso e;

(b) a demagogia do apelo ao nacionalismo de fachada, enquanto entrega empresas públicas ao capital globalizado, permite a espoliação do país e se rende a interesses imperialistas.

A foto em que o presidente “messiânico” – sem nenhum decoro – bate continência à bandeira dos Estados Unidos e o comentário subserviente (I love you) à passagem do presidente Trump, no corredor de uma reunião da Organização das Nações Unidas (ONU), falam por si. Apesar das evidências políticas e econômicas de uma governança lesa-pátria, o discurso nacionalista embala o arranjo neofascista fardado com a camiseta amarela da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Trata-se de um nacionalismo cheesy, pura breguice, que se junta a um cristianismo vazio de conteúdo, ausente do pulsar real nas ruas; embora presente nas articulações pelo alto com a antirrepublicana bancada evangélica, na Câmara Federal. Tudo é falso na ritualística do bolsonarismo – a defesa da nação e, igualmente, a de Deus.

Cada um dos projetos (Itália e Alemanha ontem, Brasil hoje) tinha e tem preocupação em se prolongar no poder, através da educação (uma ideia iluminista), investindo na juventude. A destruição do Ensino Superior tem contrapartida na aplicação do Programa Nacional de Escolas Cívico-Militares, pelo governo. Foram mais de cinquenta unidades fundadas, com o único objetivo pedagógico de formar jovens ideólogos para “crer, obedecer, combater”. Governos fascistas investem, antes, em sentimentos e comportamentos do que em esferas públicas de sociabilidade. Apostam na comunidade de fanáticos, não na entidade do povo.

Sobre classificar ou não o fascismo de “revolucionário”, depende. Na acepção leninista de revolução, que moralmente possui conotação positiva, não. Na acepção de um movimento que tende à mobilização, em lugar da desmobilização das massas, sim. A participação de rebanho combina-se com a escolha de “judeus” em que atirar, como o Supremo Tribunal Federal (STF), para desconversar sobre o entreguismo, o negacionismo, o genocídio, a dolarização dos combustíveis, a inflação, a precarização do labor, a retirada de direitos trabalhistas, a corrupção e as milícias. Fake news são estratégicas para manter a adrenalina.

Psicologicamente, cidadãos fascistas devem ser diferentes dos cidadãos desenvolvidos com base em valores da modernidade. Metrópoles urbanas são encaradas como uma ameaça à espiritualidade, de raiz, da população. As cidades levam ao convívio com a diversidade étnico-racial e a uma maior tolerância e aceitação da igualdade de gênero e do respeito às diferenças. Não à toa, Olavo de Carvalho considerava os habitantes rurais uma reserva moral. Sobre o tema, vale a pena ler a excelente obra Guerra da Eternidade: o Retorno do Tradicionalismo e a Ascensão da Direita Populista (Unicamp), de Benjamin Teitelbaum.

Mussolini se ufanava da truculência do movimento e incentivava os ímpetos violentos: “a violência é imoral quando é fria e calculada, mas não quando é instintiva e impulsiva”, dizia. À medida que a movimentação fascista crescia e tomava grandes proporções, não hesitou em canalizar a brutalidade para atingir determinadas metas. Então mudou: “a violência fascista deve ser pensante, racional, cirúrgica”. A violência cirúrgica permitiria manobras mais precisas que as instintivas. “Criamos o nosso mito. O mito é uma fé, uma paixão. Não é preciso que seja uma realidade. O nosso mito é a nação, é a grandeza da nação”, revelou o Duce com a franqueza habitual. O fascismo rima com a prestigitação.

Aqui, é importante listar um ingrediente para a reflexão ético-política, que não costuma despertar a atenção. “O fascismo causou infinitos danos. Um dos maiores foi o de deixar como herança uma mentalidade fascista aos não-fascistas, inclusive aos antifascistas por convicção. Uma mentalidade de intolerância, de prepotência ideológica, de desqualificação do adversário para destruí-lo”, conforme Felice (idem). A anotação se aplica à prática dos “escrachos” (torta no rosto, tinta na roupa, bloqueios, etc), utilizados pelos adeptos da “ação direta”, na Europa. Exagerar nos meios compromete os fins. Na dúvida, não ultrapasse.

O pré-candidato do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU) ao governo de São Paulo declarou, recentemente, ser favorável ao armamento da classe trabalhadora paulista e nacional. “A população tem que ter o direito de se armar para se contrapor às milícias e ao crime organizado”. Paulo Altino Jr. não se apercebeu que, num grau de tamanha degeneração institucional, o fascismo teria penetrado os poros do aparelho estatal e, as esquerdas, derrotadas e perseguidas, já teriam sido empurradas para uma espessa clandestinidade. Só o fortalecimento das instituições democráticas pode conter a barbárie.

É possível interpretar o desabafo do expoente esquerdista na condição de um alerta posto pela amplificação totalitária do fascismo no tecido social e, em consequência, pela gravidade dos obstáculos a serem superados pelo conjunto dos progressistas, em outubro. Contudo, não dá para subscrever a transposição de uma proposta da lavra da extrema-direita ao mundo do trabalho, tout court. Há que interpor filtros para delimitar as fronteiras.

Compreender o fascismo não significa imitar os métodos espúrios dos fascistas. Como alerta a máxima do filósofo norte-americano George Santayana: “Quem não conhece a sua história, está condenado a revivê-la”. Traduzindo, o conhecimento ajuda a construir o arcabouço teórico de uma cosmovisão alternativa, para interpelar a cidadania na direção de uma democratização radical da democracia. Ao contrário de obliterar corações e mentes, caindo na tentação dos atalhos panfletários. Melhor não se afastar da estrada – o programa.

As pesquisas de intenção de voto, favoráveis à troca de inquilino no Palácio do Planalto, acirram o ânimo belicoso das hordas do bolsonarismo. Convidado a almoçar na casa do anfitrião, que organizara uma aula magna para alunos da Universidade de Campinas a cargo do ex-presidente Lula da Silva – o mesmo sofreu hostilidades de moradores em condomínio de luxo (rendimentos ao reverso da civilidade). Na saída, teve o carro cercado por broncos manifestantes, abestalhados pelo ódio. A conduta provocativa e agressiva teve a intenção de sucitar imagens de constrangimento, em resposta ao destaque dado ao petista na capa da prestigiosa Time. A revista deixou em polvorosa os bolsominions e a mídia lavajatista que, por covardia, não declara o voto abjeto que a parcialidade à la Sérgio Moro escancara.

Os novos fasci di combattimento não dispõem de plataforma política (il nostro programa è semplice: vogliamo governare / o nosso programa é simples: queremos governar). Seu imaginário é vulnerável frente a vida como ela é. Pelo absoluto desgoverno, não têm realizações mínimas para apresentar, na saúde, educação, infrestrutura, emprego, renda, ciência / tecnologia e meio ambiente. Resta-lhes “vomitar impropérios pretensamente patrióticos contra os inimigos e, passando à ação, expor a dialética dos punhos e dos revólveres”, salienta Leandro Konder em um clássico, Introdução ao Fascismo (Graal).

O desafio perante as táticas que começam a ser empunhadas, para provar que “Lula não pode andar nas ruas; Bolsonaro desfila ovacionado onde vai”, está em mecanismos que impeçam as aproximações perigosas. A prevenção não é mera obrigação da segurança privada dos candidatos e dos partidos, senão que dever do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e da Polícia Federal, que necessitam ser acionados sem demora. A questão implica a lisura do processo em curso, a integridade física e a liberdade de ir e vir dos competidores atuais.

Ao fascismo interessa naturalizar a violência e, se der jeito, fabricar mártires. Esse é o palco por excelência para os medíocres espetáculos de autoritarismo e desprezo pelo Estado de Direito. Fugirá do debate político, como o diabo da cruz, para focar no ressentimento da malta de seguidores desinformados. No caos alcança o gozo. Puxar a disputa para a arena civilizacional vai atrair setores das classes médias, e grupos sob sua influência, ao campo democrático-popular. É a lição aprendida em Campinas. Não atravessamos tempos normais.

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19
Mai22

Bolsonarismo e fascismo

Talis Andrade

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O fujão quer evitar debates que mostrem como ele é repelente, para focar no ressentimento da malta de seguidores desinformados

 

por Luiz Marques /A Terra É Redonda

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O historiador italiano Renzo de Felice, no livro Entrevista sobre o fascismo (Civilização Brasileira), discorre sobre o fascismo histórico (1919-1945) que teve de protagonista “uma classe média emergente, que tende a realizar uma política na própria primeira pessoa”. Operação que partiu da “desclassificação das classes médias que se proletarizaram e que, para fugir deste destino, se rebelam em busca de participação e poder político”. O alvo em vista não é o establishment, mas os partidos progressistas (socialistas, em especial) que lutam contra as férreas estruturas de exclusão do sistema. Sistema que aquelas têm urgência em reestabelecer para recuperar a posição e os privilégios de que desfrutavam outrora: “ainda que não reconheçam mais na classe dirigente tradicional nem capacidade, nem legitimidade para governar”.

Se o fascismo abriu-se a todas as classes sociais, “quanto aos quadros e aos elementos ativos política e militarmente, se caracterizou em sentido pequeno-burguês, dando ao movimento um caráter de classe”. As classes médias não são uma página virada na história. Não devem ser subestimadas, tampouco entendidas no singular. Ao invés de perder relevância, tornaram-se uma das forças sociais mais salientes da sociedade contemporânea, pluralista e (pós-) industrial. “De certo modo, nos demos conta de que a batalha contra o fascismo se vence ou se perde no terreno das classes médias, não no das outras classes” (idem). Eleitoralmente, é plausível vencer um pleito nas urnas sem as camadas intermediárias, mas não derrotar o fascismo.

O bolsonarismo mescla o fascismo italiano, donde provém o termo fascio (feixe), e o alemão. Nenhum visava a criação ex nihilo de valores inexistentes. A Itália, de Mussolini, ecoava o longínquo Império Romano. A Alemanha, de Hitler, valores das guerras napoleônicas em diante para reencontrar a pureza ariana. O Brasil, de Bolsonaro, reporta-se às figuras simbólicas da tortura e da ditadura militar: o coronel Brilhante Ustra e o general Newton Cruz. Referências que funcionam qual modelos a imitar, “tipos ideais” no linguajar da sociologia. Ignorar as Constituições e a Declaração Universal dos Direitos Humanos serve de predicados às tribos ideológicas de ressentidos. Não para voltar atrás, como pretendem os regimes conservadores / tradicionalistas. Mas para prospectar o futuro, com uma “nova sociedade” e uma “nova política”.

Em comum, além de alinhavarem uma nova concepção política de direita e o apoio de setores agrários, as experiências acima arroladas tiveram sempre a ascensão pavimentada pela vergonhosa conivência das forças convencionais do liberalismo, as quais acreditaram ser possível domesticar e constitucionalizar les bêtes humaines com as lides burocrático-palacianas. Isso ficou patente, entre nós, no alinhamento de tucanos à via fascista na campanha eleitoral de 2018: João Doria em São Paulo, Aécio Neves em Minas Gerais e Eduardo Leite no Rio Grande do Sul; bem como dos meios de comunicação.

Um endosso à tese de que o fascismo nasce de uma crise existencial da sociedade liberal em face do roto espantalho do comunismo “que come crianças”. O que explica: (a) a retórica bolsonariana que, com frequência, acena com o surrado espectro comunista para arregimentar as elites proprietárias e seduzir segmentos temerosos do descenso e; (b) a demagogia do apelo ao nacionalismo de fachada, enquanto entrega empresas públicas ao capital globalizado, permite a espoliação do país e se rende aos interesses imperialistas.

A foto em que o presidente “messiânico” – sem decoro – bate continência à bandeira dos Estados Unidos e o comentário subserviente (I love you) à passagem de Donald Trump, no corredor de uma reunião da Organização das Nações Unidas (ONU), falam por si. Apesar das evidências políticas e econômicas de uma governança lesa-pátria, o discurso nacionalista embala o arranjo neofascista fardado com a camiseta amarela da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Trata-se de um nacionalismo cheesy, pura breguice, que se junta a um cristianismo vazio de conteúdo, ausente do pulsar real nas ruas; embora presente nas articulações pelo alto com a antirrepublicana bancada evangélica, na Câmara Federal. Tudo é falso na ritualística do bolsonarismo – a defesa da nação e, igualmente, a profissão de fé em Deus. A esperteza engana bobo.

Cada um dos projetos (Itália e Alemanha ontem, Brasil hoje) tinham e tem preocupação em se prolongar no poder através da educação (uma ideia iluminista), investindo na juventude. A destruição do Ensino Superior teve contrapartida na aplicação do Programa Nacional de Escolas Cívico-Militares, pelo governo. Foram mais de cinquenta unidades fundadas, com o único objetivo pedagógico de formar jovens ideólogos para “crer, obedecer, combater”. Governos fascistas investem, antes, em sentimentos e comportamentos do que em esferas públicas de sociabilidade. Apostam na comunidade de fanáticos, não na entidade-povo.

Sobre classificar ou não o fascismo de “revolucionário”, isso depende do sentido que se dá ao termo. Na acepção leninista de revolução, que moralmente possui conotação positiva, não. Na acepção de um movimento que tende à mobilização, em lugar da desmobilização das massas, sim. A participação de rebanho combina-se com a escolha criteriosa de “judeus” em que atirar, como o Supremo Tribunal Federal (STF), para desconversar sobre o entreguismo, o negacionismo, o genocídio, a dolarização dos combustíveis, a inflação, a precarização do labor, a retirada de direitos trabalhistas, a corrupção e as milícias. Fake news são estratégicas para manter a adrenalina nos corpos.

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Psicologicamente, cidadãos fascistas devem ser diferentes dos cidadãos desenvolvidos com base em valores da modernidade. Metrópoles urbanas são encaradas como uma ameaça à espiritualidade, de raiz, da população. As cidades levam ao convívio estreito com uma diversidade étnico-racial e a uma maior tolerância e aceitação da igualdade de gênero e do respeito às múltiplas diferenças. Não à toa, o guru Olavo de Carvalho considerava os habitantes rurais uma reserva moral. Sobre o tema, vale a pena ler a excelente obra Guerra da eternidade: o retorno do tradicionalismo e a ascensão da direita populista (Unicamp), de Benjamin Teitelbaum.

Mussolini se ufanava da truculência de seu movimento e incentivava os ímpetos violentos: “a violência é imoral quando é fria e calculada, mas não quando é instintiva e impulsiva”, dizia. À medida que a movimentação fascista crescia e tomava grandes proporções, não hesitou em canalizar a brutalidade para atingir determinadas metas. Então, rápido, mudou o lado do velho disco de vinil: “a violência fascista deve ser pensante, racional, cirúrgica”. A violência cirúrgica permitiria manobras mais precisas do que as instintivas. “Criamos o nosso mito. O mito é uma fé, uma paixão. Não é preciso que seja uma realidade. O nosso mito é a nação, é a grandeza da nação”, revelou o Duce com a franqueza habitual. Fascismo rima com manipulação.

Aqui, é importante listar um ingrediente para a reflexão ético-política, que não costuma despertar a atenção. “O fascismo causou infinitos danos. Um dos maiores foi o de deixar como herança uma mentalidade fascista aos não-fascistas, inclusive aos antifascistas por convicção. Uma mentalidade de intolerância, de prepotência ideológica, de desqualificação do adversário para destruí-lo”, conforme Felice. A anotação se aplica à prática dos “escrachos” (torta no rosto, tinta na roupa, bloqueios, etc), utilizados pelos adeptos da “ação direta”, na Europa. O exagero nos meios compromete os fins. Na dúvida, please, não ultrapasse o sinal.

O pré-candidato do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU) ao governo de São Paulo declarou, recentemente, ser favorável ao armamento da classe trabalhadora paulista e nacional. “A população tem que ter o direito de se armar para se contrapor às milícias e ao crime organizado”. Paulo Altino Jr. não se apercebeu que, num grau tamanho de erosão institucional, o fascismo teria penetrado os poros do aparelho estatal e, as esquerdas, derrotadas e perseguidas, já teriam sido empurradas para uma espessa clandestinidade. Só o fortalecimento das instituições democráticas pode conter a barbárie. Bravatas não são a solução.Regimes Totalitários na Europa - Toda Matéria

 

O desabafo do esquerdista contém um alerta sobre a amplificação totalitária do fascismo no tecido social e, em consequência, sobre a gravidade dos obstáculos a serem superados pelo conjunto dos progressistas, em outubro. Contudo, não dá para subscrever a transposição de uma proposta da lavra da extrema-direita ao mundo do trabalho, tout court. Há que interpor filtros para delimitar as fronteiras. Refletir é dispor a realidade em categorias distintas.

Compreender o fascismo não significa imitar os métodos espúrios dos fascistas. Como alerta o filósofo hispano-americano George Santayana: “Quem não conhece a sua história, está condenado a revivê-la”. Traduzindo: o conhecimento ajuda a construir o arcabouço teórico de uma cosmovisão que interpele a cidadania, na direção de uma democratização radical da democracia. Ao contrário de obliterar corações e mentes, caindo na tentação dos atalhos panfletários. Melhor não se afastar da estrada e manter-se fiel ao programa ideopolítico antifascista.

As pesquisas de intenção de voto, favoráveis à troca de inquilino no Palácio do Planalto, acirram o ânimo belicoso das hordas do bolsonarismo. Convidado a almoçar na casa do anfitrião, que organizara uma aula magna para alunos da Universidade de Campinas a cargo do ex-presidente Lula da Silva – o mesmo sofreu hostilidades de moradores em condomínio de luxo (rendimentos ao reverso da civilidade). Na saída, teve o carro cercado por broncos manifestantes, abestalhados pelo ódio. A conduta provocativa e agressiva teve a intenção de suscitar imagens de constrangimento, em resposta ao destaque dado ao petista na capa da prestigiosa Time. A revista alvoroçou bolsominions e a mídia lavajatista que escancara a parcialidade, com desfaçatez. A declaração de voto pró-Lula da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) serve de contrapeso.

Os novos fasci di combattimento não dispõem de plataforma política (il nostro programa è semplice: vogliamo governare / o nosso programa é simples: queremos governar). Seu imaginário é vulnerável frente a vida como ela é nas periferias e nas favelas. Pelo absoluto desgoverno, não têm realizações mínimas para apresentar na saúde, educação, infrestrutura, emprego, renda, ciência / tecnologia e meio ambiente. Resta-lhes “vomitar impropérios pretensamente patrióticos contra os inimigos e, passando à ação, expor a dialética dos punhos e dos revólveres”, salienta o saudoso Leandro Konder no clássico Introdução ao fascismo (Graal).

O desafio perante as táticas empunhadas pelo “cão dos infernos”, na expressão do diretor da telenovela Pantanal, Walter Carvalho, para provar que “Lula não pode andar nas ruas” (sic), está em logísticas que impeçam contingências fora de controle. A prevenção não é só obrigação da segurança privada dos candidatos e dos partidos, senão que dever do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e da Polícia Federal. A questão implica a lisura do processo em curso, a integridade física e a liberdade de ir e vir dos competidores atuais. Acuado está o Ustrinha.

Ao fascismo interessa naturalizar a violência e, se possível, fabricar mártires. Esse é o palco por excelência para os medíocres espetáculos de autoritarismo e desprezo pelo Estado de Direito. O fujão quer evitar debates que mostrem como ele é repelente, para focar no ressentimento da malta de seguidores desinformados. No caos, goza. Puxar para a arena civilizacional a disputa vai atrair setores das classes médias e grupos sob sua influência, ao campo democrático-popular. É a lição de Campinas. Não atravessamos tempos normais. Mas atravessamos.

Igual ao diabo foge da cruz | A Gazeta

Bolsonaro foge do debate da Band — Conversa Afiada

Gilberto Silva 
Um dos maiores advogados do país , o famoso Kakay, apontando o dedo para a elite econômica e mostrando o que realmente representam.
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21
Abr22

E o juiz descobriu a tortura. E agora? O que fazer quando se sabe?

Talis Andrade

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Por Lenio Luiz Streck

Os dias recentes mostram que a literatura sempre chega antes. A angústia dos torturados, o riso dos torturadores... De "Memórias do Cárcere" à "Colônia Penal", a literatura é implacável.

No romance "À Espera dos Bárbaros", do Prêmio Nobel J.M. Coetzee, o personagem-juiz descobre que havia tortura no forte e fica num dilema: o que fazer agora que sabe?

Diz o juiz, meditabundo:

"De forma que agora parece que meus anos de sossego estão chegando ao fim, quando eu poderia dormir com o coração tranquilo, sabendo que com um cutucão aqui e um toque ali o mundo continuaria firme em seu curso.
Só que, mas, ai! eu não fui embora: durante algum tempo tapei os ouvidos para os ruídos que vinham da cabana junto ao celeiro onde guardam as ferramentas, depois, à noite, peguei uma lanterna e fui ver por mim mesmo."

Torturavam. Fui ver por mim mesmo...! E agora, pensa o juiz-personagem, o que fazer? Durante anos tapei os ouvidos. Não, eu não queria ouvir.

Assim como fez a sociedade brasileira. Não, não, não me fale desse assunto, diria o general. "Não atrapalhou minha Santa Páscoa", diz o presidente do STM (interessante a ironia da história: o general-presidente-do-STM foi escolhido para integrar o Tribunal Militar, em 2011, por ninguém menos do que Dilma Rousseff). O general poderia, ao menos, ter treinado a sua fala. O assunto requeria, pois não? Não foi adequada ao seu cargo e a quem o indicou ao tribunal fazer desdém. Não somente pelas vítimas, mas também pelos seus colegas de Superior Tribunal Militar de então.

A posição do presidente do STM rima e compete, em desdém, com o riso do vice-presidente da República. Como se diz no popular, fez cascata com o sofrimento e com a morte.

Há uma pergunta no ar: como podemos nos comportar com dignidade ao nos depararmos com as recentes divulgações dos áudios do Superior Tribunal Militar brasileiro que atestam algo que todos sabíamos... a tortura?

Sabíamos que sabíamos, até porque vimos o presidente da República homenagear um torturador. Não podemos negar que sabíamos.

E fizemos ouvidos moucos?

Sabemos que sabemos! Não dá para tapar os ouvidos. Parabéns ao advogado Fernando Fernandes, por seu incansável trabalho para disponibilizar as milhares horas de gravações. O Brasil lhe deve, querido Amigo. Nada mais precisa ser dito. E cumprimentos ao professor Carlos Fico. Todos lhe devemos também.

Resta saber se quem deve saber já sabe que sabe.

Porque todos nós sabemos que sabemos. Sabemos que sabemos que sabemos.

Resta saber o que fazer quando se sabe que se sabe.

 

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Áudios sobre tortura desmascaram militares

 
 

 
11
Ago21

Presidente deu mais um tiro no pé – desta vez no dos militares

Talis Andrade

Orlando Brito

Parada bélica e inócua fora de hora vira motivo de chacota

 

- - -

O que foi mais vexaminoso em Brasília? Uma minúscula parada militar não prevista em nenhum calendário para a entrega de um convite ao presidente da República? Ou o estado deplorável de parte dos equipamentos bélicos exibidos com a intenção de meter medo nos deputados prestes a decidir sobre o voto impresso?

A exibição de 40 veículos da Marinha, entre blindados, caminhões e jipes, provocou riso e foi motivo de deboche nas redes sociais. Ali, segundo levantamento da Quaest Pesquisa, dos 2,3 milhões de posts publicados, 93% foram de chacota ou crítica ao governo federal. Mais um tiro no pé, e desta vez no das Forças Armadas.

Na época da ditadura militar, essas coisas eram feitas com mais cuidado. Foi montado em um cavalo branco, com a farda impecável e um chicote na mão, que o general Newton Cruz, notório pelos maus bofes, reprimiu manifestantes que esperavam defronte ao Congresso a aprovação da emenda das Diretas, já.

Verdade que não faltou um toque de ridículo. O Exército depois distribuiu fotos do saque a um supermercado onde aparecia um homem carregando um suposto explosivo que não chegou a ser detonado. O Jornal do Brasil descobriu que o explosivo não passava de uma lata de Nescau. O guerrilheiro Nescau.

Faltou gente na rua para observar a entrega pelo comandante da Marinha do convite ao presidente Jair Bolsonaro que ostentava seu sorriso de plástico ao lado do ministro Braga Neto, da Defesa, e dos chefes do Exército e da Força Aérea. Desperdiçou-se combustível com um ato que se revelou inócuo.

Uma militante do PT, vestida com uma blusa onde pedia o impeachment de Bolsonaro, ainda tentou salvar as aparências oferecendo flores ao piloto de um dos blindados. Quando nada, lembrava vagamente uma cena da Revolução dos Cravos, em Portugal, que inspirou uma música de Chico Buarque de Holanda.

O esforço valeu, mas as aparências não foram salvas. Vozes em off tentaram salvar a face do comandante do Exército ao soprar que ele estava ali visivelmente constrangido. Se Bolsonaro alcançar seu objetivo de dar um golpe caso não se reeleja, só faltará que digam que os militares o apoiaram por puro constrangimento.Charge mostra um sucateiro com sua carrocinha diante de uma tanque de guerra velho e sucateado. Ao fundo se vê o Palácio do Planalto. O sucateiro pergunta ao soldado que está no tanque de guerra velho: "Quer vender?"

 

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