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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

25
Jul22

Quer saber o que pode acontecer se Bolsonaro for reeleito? Olhe para a Índia

Talis Andrade

O primeiro ministro da Índia, Narendra Modi, e Jair Bolsonaro durante cerimônia do Dia da República da Índia.

O primeiro ministro da Índia, Narendra Modi, e Jair Bolsonaro durante cerimônia do Dia da República da Índia. Foto: Alan Santos/PR

 

 

Em 20 anos, a Índia foi de promessa democrática ao um regime autoritário que proíbe dissidentes e trata minorias religiosas como cidadãos de segunda classe

15
Jul21

Intenção nunca foi vender as vacinas, mas ser um facilitador do negócio, diz dono da Davati

Talis Andrade

Empresário Herman Cardenas

Herman Cardenas

O lobista Herman Cardenas reconheceu que não tinha à mão nenhuma das 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca. Nem da Covaxin. Representantes da empresa negociaram a venda dos imunizantes com o governo Jair Bolsonaro em fevereiro e março deste ano. A entrevista foi concedida ao jornal Folha de S.Paulo.

De acordo com o presidente da Davati Medical Supply, empresa com sede no Texas (EUA), a empresa seria apenas uma facilitadora do negócio entre a fabricante da vacina contra Covid-19 e o governo brasileiro, mediante uma comissão que ele não informou o valor. A AstraZeneca nega que negocie venda para empresas privadas.

Facilitador tem os seguintes sinônimos: 

“A Davati não vende vacina da Covid-19 e não tem relacionamento direto com os produtores. A razão do oferecimento da vacina para o Brasil foi porque, através de parceiros, ficamos sabendo que teria uma outra maneira de conseguir a venda", disse ele.

Facilitador é a melhor profissão que existe, ou negócio, principalmente para indivíduos espertos, e empresas anônimas ou fantasmas de um ou três funcionários. 

Facilitar tem os seguintes sinônimos, que possibilitam diferentes transas:

Ajudar, favorecendo:

1 ajudarfavorecercontribuirpropiciarpossibilitarproporcionarpromoveroportunizarbeneficiarauxiliarcolaborarapoiarassistirocasionar.

Pôr ao alcance, disponível:

2 facultardisponibilizarfranquearviabilizardaroferecercederconcederpermitirassegurargarantirprovidenciardesimpedir.

Agir de forma imprudente:

3 descuidar-sedesprevenir-se, desprecaver-se, desacautelar-se, desmazelar-sedesleixar-seexpor-sedescurar-sevacilarbobear.

Tornar mais fácil:

4 simplificardescomplicardescomplexificar, desintrincar, desenredardesembaraçar.

Prontificar-se para a realização de algo:

5 prontificar-se, oferecer-sepredispor-sedispor-seprestar-seapresentar-se, voluntariar-se.

Herman Cardenas esclarece que a Datavi Medical Supply facilitava e facilita:

- para a quadrilha do Ministério da Saúde

- para o chanceler do Brasil (na época das tenebrosas transações) Ernesto Araújo

- para o embaixador brasileiro na Índia André Aranha Corrêa do Lago

- para o presidente Jair Bolsonaro telefonar para o presidente Ram Nath Kovind

- idem para o primeiro-ministro Narendra Modi 

- para uma empresa fantasma em Singapura, Madison Biotech, receber a grana bilionária das vacinas antes da entrega

- para Precisa Medicamentos

- para a Global Saúde, especialista em venda e entrega de medicamentos para doenças raras a preço de ouro, e produtos íntimos femininos

- para o deputado Ricardo Barros redigir, apresentar e aprovar lei de exportação da pior e mais cara vacina

- para o laboratório indiano Bharat Biotech no Brasil

- para a Associação Brasileira das Clínicas de Vacinas (ABCVAC) 

- para a cabo da PM de Minas Gerais Dominguetti negociar, se necessário, com general da ativa Eduardo Pazuello e o coronel Elcio Franco Filho 

Segundo o facilitador Herman Cardenas, havia grupos interessados na alocação da vacina, especificamente da Astrazeneca. "Nós nunca dissemos que tínhamos uma relação direta com a Astrazeneca e nunca foi passada essa informação para ninguém".

"Nossa intenção nunca foi vender as vacinas, mas apresentar as partes porque a Davati não tem as vacinas da Covid. Não tínhamos a garantia que conseguiríamos oferecer as 400 milhões de doses da vacina. O número apareceu em nossa proposta porque, quando perguntamos ao Cristiano quantas doses o Brasil precisava, ele disse que a população do Brasil é de cerca de 200 milhões de pessoas", continuou.

O empresário disse que calculou duas doses por pessoa, mas que esse número "nunca foi uma garantia". "Nunca dissemos que tínhamos as 400 milhões de vacinas na oferta", prossegue Cardenas. "Cristiano nos pediu para ajudar o governo a achar os 400 milhões".

Cardenas diz não ter ouvido relato de pedido de propina na negociação e criticou seu representante no Brasil para o negócio, Cristiano Carvalho, que, segundo o empresário, é um vendedor autônomo e representou a empresa apenas nesta tentativa de negociação. Cristiano depõe nesta quinta-feira (15) na CPI da Covid, no Senado.

 

29
Jun21

Anvisa recebe pedido de uso emergencial da Covaxin, alvo de denúncias

Talis Andrade

covaxin .jpg

 

Empresa representante do laboratório indiano protocolou o pedido nesta terça-feira. Contrato de compra tem suspeita de superfaturamento

 

 
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recebeu o pedido de uso emergencial em caráter experimental da vacina indiana Covaxin contra a Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus.
 

A autarquia confirmou o recebimento na manhã desta terça-feira (29/6). A compra da Covaxin centraliza uma série de denúncias, entre elas, a de que o contrato do Ministério da Saúde foi superfaturado.

A solicitação é da empresa Precisa Comercialização de Medicamentos LTDA — a mesma que intermediou as negociações com o laboratório indiano Barath Biontech.

Segundo a Anvisa, já foi iniciada a triagem dos documentos do pedido. No início do mês, a agência havia autorizado a importação excepcional de 4 milhões de doses do imunizante, mas não o uso emergencial.

“As primeiras 24 horas serão utilizadas para fazer uma triagem do processo e verificar se os documentos necessários para avaliação estão disponíveis. Se houver informações importantes faltando, a Anvisa pode solicitá-las ao laboratório”, destaca, em nota.

Análise e prazo

Para a avaliação, a Anvisa vai utilizar as informações apresentadas juntamente com o pedido e também os dados encaminhados anteriormente por meio da submissão contínua.

A análise do pedido de uso emergencial é feita por uma equipe multidisciplinar que envolve especialistas das áreas de registro, monitoramento e inspeção de medicamentos. O prazo de análise do pedido pode ser de sete ou 30 dias, a depender do caso específico.

A Anvisa já registrou as vacinas AstraZeneca e Pfizer. Além delas, autorizou o uso emergencial da Coronavac, Janssen e AstraZeneca produzida pelo laboratório indiano Serum Institute.

Denúncias

Documentos obtidos pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid indicam possível superfaturamento na aquisição do imunizante. O valor contratado pelo governo federal, de US$ 15 por vacina (R$ 80,70), ficou acima do preço inicialmente previsto pelo laboratório Bharat Biotech, de US$ 1,34 por dose.

O servidor Luis Ricardo Miranda, chefe da divisão de importação do Ministério da Saúde, disse ao Ministério Público Federal (MPF) ter sofrido “pressão incomum” de outra autoridade da pasta para assinar o contrato com a empresa Precisa Medicamentos, que intermediou o negócio com a Bharat Biotech.

Além dele, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), irmão do servidor, denunciou que alertou ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) do caso, que se tornou alvo de uma notícia-crime. O chefe do Palácio do Planalto nega.

A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber pediu que a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifeste sobre o caso. Para ela, existem “graves indícios” de irregularidades.

Título de reportagem The Intercept

EMBAIXADOR BRASILEIRO NA ÍNDIA AVISOU GOVERNO BOLSONARO QUE COVAXIN TEVE ‘PROCESSO OPACO’ DE AUTORIZAÇÃO

 

Escreveram Tatiana Dias e Leandro Demori: O EMBAIXADOR BRASILEIRO na Índia alertou oficialmente o governo Bolsonaro que a vacina Covaxin estava tendo um “processo alegadamente opaco de autorização para uso emergencial” naquele país. A Índia é o fabricante da vacina. O governo ignorou o alerta de André Aranha Corrêa do Lago e continuou com a negociação.

Telegrama de 18 de janeiro de 2021, o embaixador relata os problemas que a vacina estava tendo na Índia:

Em julho de 2020, em outro telegrama, o diplomata já havia avisado Bolsonaro sobre a desconfiança na pesquisa da Covaxin. Em uma mensagem eletrônica vazada, o diretor do Indian Council of Medical Research, centro responsável por financiar e coordenar pesquisas na medicina indiana, pressionava administradores de hospitais para “concederem rapidamente as aprovações necessárias” para aplicação da vacina em profissionais de saúde.

Segundo o relato de Lago, comunidade científica indiana apontou o prazo como “irresponsável e irrealista”. O instituto de pesquisas se defendeu, afirmando que o intuito era apenas de remover burocracias. “Alguns analistas interpretaram o vazamento como uma manobra política do governo do primeiro ministro Narendra Modi de conter as críticas contra medidas sanitárias tomadas no país”, relatou o diplomata.

Em julho de 2020, embaixador Lago relatou como a Covaxin vinha passando por um processo apressado de aprovação:

 
No Brasil, antes da aprovação da Anvisa, o Ministério da Saúde ofereceu uma generosa dispensa de licitação para a vacina covaxin, representada pela Precisa Medicamentos:

 
 

queda.jpg

Reinaldo Azevedo que sabe, com maestria O É da Coisa, analisa Ricardo Barros e o ICI (índice de coincidências incríveis) no escândalo bilionário da Covaxin

 

29
Jun21

O CONTRATO RELÂMPAGO DA COVAXIN

Talis Andrade

vacina supertreta.jpg

 

 

CPI da Pandemia investiga qual o papel de Bolsonaro no contrato da vacina indiana – fechado em tempo recorde e com a dose mais cara

 

por THAIS BILENKY /Revista Piauí

Da primeira reunião no Ministério da Saúde até a revelação de pressões sobre um servidor para acelerar a viabilização da compra da vacina indiana Covaxin, a CPI da Pandemia segue as pegadas que podem levar o escândalo ao colo de Jair Bolsonaro. O único contrato de imunizante contra Covid-19 que teve o empenho do presidente foi fechado em tempo recorde e pelo maior custo – tomou oito meses a menos que a negociação com a Pfizer, fechada por dois terços do preço.

“Pessoal diz que eu tenho que ir atrás. Não, não. Quem quer vender, se eu sou vendedor, eu quero apresentar.” Foi assim que Bolsonaro, em 28 de dezembro, disse que os fabricantes de vacinas é que deveriam procurar o governo brasileiro. Duas semanas depois, resolveu se empenhar pela aquisição de imunizantes. Não aqueles com autorização sanitária mais avançada – a Covaxin até hoje não tem autorização definitiva da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Bolsonaro escreveu em 8 de janeiro ao primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, pedindo seu empenho no envio da vacina indiana, da empresa Bharat Biotech, além de doses da AstraZeneca produzidas naquele país.

Foi a primeira e única vez que se soube que Bolsonaro fez alguma gestão para aquisição de imunizantes para o Brasil – nos bastidores e em público, ele sempre agiu para boicotar a imunização. Funcionou.

Em 11 de fevereiro, os vendedores perguntaram que quantidade de doses o governo brasileiro compraria. No mesmo dia, o Ministério da Saúde respondeu que seriam 20 milhões. A Pfizer mandou o primeiro de 101 e-mails ao governo brasileiro em 14 de agosto de 2020 tratando da oferta de doses, mas só teve retorno dois meses e meio depois, em 26 de outubro, quando foi marcada uma reunião virtual. O contrato da Covaxin foi fechado em 25 de fevereiro, após 15 contatos em 97 dias de tratativas, iniciadas em novembro de 2020. O acerto com a Pfizer foi assinado em 19 de março, 330 dias e 184 contatos depois.

Assessores parlamentares esperam conseguir caracterizar no mínimo crime de prevaricação de Bolsonaro, uma vez que o presidente foi informado das anomalias do acordo, porém não tomou providências.

A assessoria do senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI, prepara materiais organizando o que os documentos já obtidos revelam e apontando os pontos nebulosos a serem esclarecidos nas próximas semanas, a começar pelo depoimento dos irmãos Luís Miranda, deputado pelo DEM do DF, e Luís Ricardo Miranda, servidor do Ministério da Saúde, que relatou pressões incomuns pela compra da Covaxin, marcado para esta sexta-feira, 25 de junho. 

Um ponto central é a atuação da Precisa Medicamentos, uma empresa que não faz parte da indústria de vacinas, mas intermediou a compra da Covaxin – e teria com o negócio lucro de 1,6 bilhão de reais. Foi o único contrato de vacina para Covid-19 viabilizado por terceiros. O sócio administrador da Precisa, Francisco Maximiano, investigado em outro contrato com o Ministério da Saúde, presidiu a comitiva de clínicas de vacinação que foi à Índia para conhecer as instalações da Bharat Biotech. Na comunicação feita pela embaixada de Nova Delhi ao Ministério da Saúde sobre a comitiva, a diplomacia relatou que Maximiano disse pretender acabar com o “oligopólio” das vacinas no Brasil – inclusive da Pfizer. O comunicado da embaixada chegou ao Itamaraty no dia 7 de janeiro, um dia antes de Bolsonaro mandar a carta a Modi.

A CPI quebrou os sigilos telefônicos e telemáticos de Maximiano, que já é investigado pelo contrato da Global Gestão em Saúde, da qual também é proprietário, em que não entregou medicamentos comprados pelo Ministério da Saúde durante a gestão de Ricardo Barros, hoje deputado federal pelo PP do Paraná. Nos bastidores do Senado, comenta-se sobre a proximidade de Maximiano com o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), filho do presidente e adversário de Renan Calheiros.

No dia 17 de fevereiro, uma semana antes da assinatura do contrato da Covaxin, o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello anunciou o cronograma de entregas da vacina indiana: 8 milhões de doses em março, 8 milhões em abril e 4 milhões em maio. No dia 25, o governo assinou o contrato de compra: 20 milhões de doses a 1,6 bilhão de reais. O montante corresponde a 80 reais por dose, ou 15 dólares – a unidade da Pfizer custa 10 dólares. Até agora não chegou nenhum lote de Covaxin ao Brasil. Em nota, o Ministério da Saúde disse que empenhou (reservou) o valor, mas não o repassou efetivamente.

Maximiano voltaria à Índia no dia 5 de março e, segundo os documentos da CPI, afirmou que a Precisa faz os contatos com o Ministério da Saúde, mas a fabricante é quem receberá os pagamentos. No dia seguinte, a pasta pede à Precisa para aumentar o lote para 50 milhões de doses. 

O descumprimento dos prazos de entrega e outras anomalias do contrato geraram suspeitas. Luís Francisco Miranda, servidor do Ministério da Saúde, contou ao irmão sobre as pressões que sofria para agilizar a transação envolvendo a vacina indiana, e o deputado Luiz Miranda foi com ele até Bolsonaro relatar o caso no dia 20 de março. O presidente disse que encaminharia tudo à Polícia Federal, mas não há informações sobre uma investigação ter sido aberta.

Anvisa barrou a importação da Covaxin

No dia 26 de março, o Itamaraty – então comandado por Ernesto Araújo – mandou um documento à embaixada em Nova Delhi pedindo pressão junto a autoridades indianas para que liberassem documentos requeridos pela Anvisa para iniciar a importação. No dia 29 de março, contudo, a agência negou a certificação de boas práticas da Bharat Biotech, alegando que a fábrica não garantia a esterilização do imunizante nem tinha controle adequado da pureza da vacina. No dia 31, a Anvisa barrou a importação da Covaxin.

No mesmo dia, o Ministério Público Federal colheu o depoimento de Luís Francisco Miranda sobre a condução atípica do processo até a compra da Covaxin – cujo teor foi compartilhado com a CPI. Os irmãos falarão à CPI na sexta – Maximiano deveria ter prestado depoimento à comissão do Senado na quarta-feira, 23 de junho, porém ele não compareceu por estar de quarentena após viagem à Índia, segundo seus advogados.

Em defesa do governo Bolsonaro, o ministro Onyx Lorenzoni (Secretaria-Geral) afirmou que as acusações são falsas, que o deputado cometeu o crime de denunciação caluniosa, que o irmão do deputado prevaricou. Onyx acionou a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e a Controladoria-Geral da União para investigá-los e garantiu que ambos “pagarão por isso”. Ele não mencionou se os órgãos de controle foram acionados por Bolsonaro para apurar a suspeita de corrupção na compra da Covaxin. Renan Calheiros estuda pedir a prisão de Onyx por coação de testemunha.

vacina promina rima.jpg

 

 
26
Jun21

EMBAIXADOR BRASILEIRO NA ÍNDIA AVISOU GOVERNO BOLSONARO QUE COVAXIN TEVE ‘PROCESSO OPACO’ DE AUTORIZAÇÃO

Talis Andrade

(Agra - Índia, 27/01/2020) Presidente da República Jair Bolsonaro durante visita ao Taj Mahal.Foto: Alan Santos/PR

 

Telegrama diplomático foi enviado dois meses antes do governo brasileiro comprar 20 milhões de doses da vacina

 

05
Mai21

Componente político une catástrofes no Brasil e na Índia

Talis Andrade

O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, e o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, apertam as mãos em foto de 25 de janeiro de 2020

No Brasil de Bolsonaro e na Índia de Modi, a democracia está sendo testada

 

Nos dois países, grande parte da responsabilidade pelo desastre da covid-19 recai sobre seus líderes. Em diferentes medidas, Bolsonaro e Modi, ambos populistas de direita, minimizaram a crise

por Jan D. Walter /DW

Recentemente, a Índia assumiu o título de epicentro da covid-19 no mundo e roubou, assim, o destaque do Brasil no noticiário pandêmico internacional. Logo começaram a surgir paralelos entre os líderes dos dois países, ambos populistas de direita, e sua responsabilidade na tragédia em curso.

À frente de grandes economias emergentes e de enormes discrepâncias de renda, tanto o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, como o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, foram relutantes em adotar um lockdown para frear a atual avalanche de novos casos. 

No Brasil e na Índia, a pobreza e a miséria são generalizadas ao lado de uma pequena elite, extremamente rica, e de uma pequena classe média. E ambos são liderados por um governo nacionalista de direita que, em aliança com fanáticos religiosos, estão testando as instituições democráticas do Estado.

Os paralelos parecem óbvios, mas Amrita Narlikar, presidente do instituto alemão de estudos políticos Giga, adverte contra conexões precipitadas: "Há uma tendência no chamado Ocidente liberal de pôr no mesmo balaio os países do Sul global. Mas analistas e observadores precisam ser muito cuidadosos ao sugerir semelhanças."

Narlikar afirma que, com isso, não se refere às diferenças culturais óbvias entre Brasil e Índia. Mas às diferenças em relação ao enfrentamento da pandemia, que segundo ela são gritantes: enquanto Bolsonaro nunca abandonou totalmente sua posição de que a covid-19 é uma gripezinha e deveria ser tratada mais com um medicamento contra a malária do que uma vacina, Modi impôs um severo lockdown, de março a maio de 2020, e instalou uma unidade de produção de vacinas na Índia.

"Ao contrário de Bolsonaro, Modi reconheceu que o custo humano poderia ser alto", comenta a especialista. "Mas, acima de tudo, a situação atual mostra que ele não usou o tempo que tinha para preparar o país para esta segunda onda."

Pressão cresce junto com os números da covid

A situação em ambos os países é grave. No Brasil, o ritmo de contágio pelo coronavírus está praticamente há 15 meses nas alturas. A taxa de incidência de sete dias (novos casos na última semana por 100 mil habitantes) atingiu seu auge no final de março, ficando acima de 250, e agora perto de 190. Não há, porém, uma política nacional de controle de casos, e especialistas acreditam existir imensa subnotificação no Brasil. 

Já na Índia, após o fim do lockdown as taxas de infecção permaneceram baixas por um longo tempo. Talvez por isso, Modi não tenha feito nada quando os casos começaram a crescer pela segunda vez, em março deste ano. Desde então, a taxa de incidência de sete dias no país, que tem 1,4 bilhão de habitantes, aumentou de 12 para 193.

Ou seja: Brasil e Índia estão hoje, basicamente, no mesmo patamar. Vários países relatam taxas de infecção muito mais elevadas, incluindo Uruguai, Suécia e Holanda. Mas a maioria dos governos toma medidas contra a propagação da covid-19 o mais tardar quando a incidência atinge os três dígitos.

Modi mais firme que Bolsonaro no cargo

Oposição e sociedade civil na Índia estão agora exigindo um novo lockdown nacional. Mas críticas ao governo Modi são anteriores a esta segunda onda de covid-19: "Modi já está sob enorme pressão desde o final de 2020 por causa dos protestos contínuos dos agricultores. O curso da pandemia está desgastando ainda mais sua popularidade", diz o cientista político Joerg Nowak.

No entanto, Nowak acredita que Modi desfruta de uma base de poder relativamente firme. Com o nacionalista hindu BJP, ele tem um partido estabelecido com uma ideologia rigorosa por trás dele. A base da legenda inclui o Rashtriya Swayamsevak Sangh (RSS), uma organização de quadros hindu-fascistas da qual o próprio Modi é membro. Quando reeleito em 2019, o BJP aumentou sua maioria no Parlamento nacional em comparação com 2014.

Bolsonaro também chegou ao poder com o apoio de fanáticos religiosos – das fileiras dos evangélicos. Entretanto, até então ele era um deputado relativamente desconhecido do grande público em um partido pequeno, com o qual ele rompeu um ano após tomar posse, em 2019. Sem partido, Bolsonaro tem que reunir uma nova maioria para cada lei que quiser passar. E isso está se tornando cada vez mais complicado à medida que ele entra em atrito com inúmeros aliados políticos – ele já trocou, por exemplo, 16 ministros desde que assumiu.

Agora o presidente enfrenta uma CPI sobre a gestão da pandemia, que custou mais de 400 mil mortes no país. "O poder de Bolsonaro está visivelmente em erosão", diz Nowak, que atualmente é pesquisador na Universidade de Brasília. "Ninguém mais sabe realmente o que é a linha governamental, e existem diferentes centros de poder como em torno dos presidentes da Câmara e do Senado, todos perseguindo diferentes agendas."

Estado de direito indiano em maior perigo

Para levar adiante suas políticas, avaliam analistas, tanto Bolsonaro como Modi parecem dispostos a minar o Estado de direito. Enquanto Bolsonaro – provavelmente por falta de poder – basicamente ameaçou fazê-lo, Modi já começou.

Pouco depois de sua reeleição em 2019, o governo tirou do estado de Jammu e Caxemira, o único com maioria muçulmana, os direitos constitucionais de ter um governo autônomo. Em 2020, a pressão do governo sobre os opositores políticos levou a organização de direitos humanos Anistia Internacional a suspender seu trabalho na Índia.

Em fevereiro passado, o Twitter apagou mais de 500 contas relacionadas com os protestos dos camponeses, sob pressão do governo indiano. "Tal processo seria impensável no Brasil – pelo menos por enquanto", diz o cientista político e especialista em Brics Oliver Stuenkel, da Fundação Getúlio Vargas. "A erosão da democracia na Índia é muito mais avançada do que no Brasil."

Populismo com custos econômicos e humanos

Stuenkel, por outro lado, vê semelhanças no estilo político dos dois líderes: "Populistas como Bolsonaro e Modi não podem usar notícias ruins." É por isso, afirma o cientista político, que Bolsonaro sempre minimiza a crise e que o partido de Modi, por exemplo, declarou em fevereiro que havia derrotado a pandemia na Índia.

O porquê de o governo indiano não reconhecer seu erro e virar a maré é intrigante para especialistas. Mesmo a decisão sobre o lockdown precoce e duro de 2020 foi pouco transparente, diz Stuenkel, e está sendo assim novamente.

Que Modi esteja preocupado em não comprometer os festivais religiosos e comícios eleitorais é uma conjectura. Outro é que, como Bolsonaro no Brasil, Modi agora está se esquivando das consequências econômicas de um lockdown.

No segundo trimestre de 2020, a produção econômica da Índia caiu em quase um quarto. "Em ambos os países, no máximo um quarto dos trabalhadores pode continuar seu trabalho a partir de casa. O custo econômico do distanciamento – pelo menos no curto prazo – é relativamente alto", comenta. "E muitas pessoas que não trabalham durante o dia não têm nada o que comer à noite."

Nesse ponto, a presidente do instituto Giga, Amrita Narlikar, também vê uma semelhança entre os dois países: "Tanto o Brasil quanto a Índia têm um problema quando o governo impõe um lockdown, porque apresentam à sua população uma escolha impossível entre viver e ganhar a vida", diz a cientista política. "Isso é diferente da Alemanha, onde a escolha é entre a vida e o estilo de vida". Mas não se precisaria ter chegado a isso, complementa a especialista, se ambos os governos tivessem tomado de forma consistente as medidas adequadas para lidar com a pandemia.

 

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