“É mais um episódio de perseguição às mulheres legitimamente eleitas e que ocupam espaços de poder e decisão”
Os ministérios da Igualdade Racial, das Mulheres, dos Povos Indígenas, dos Direitos Humanos e da Cidadania, e da Justiça e Segurança Pública emitiram nesta sexta-feira (9) uma nota em defesa das seis congressistas que enfrentam a possibilidade de cassação pela Câmara dos Deputados, presidida por Arthur Lira acusado pela ex-esposa.
O partido de Valdemar da Costa Neto e Michelle Bolsonaro, presidenta do PL Mulher, pediu a perda de mandato de Sâmia Bomfim (Psol-SP), Célia Xakriabá (Psol-MG), Talíria Petrone (Psol-RJ), Fernanda Melchionna (Psol-RS), Érika Kokay (PT-DF) e Juliana Cardoso (PT-SP). Elas teriam chamado os deputados bolsonaristas de “assassinos” durante a votação da urgência do Projeto de Lei do Marco Temporal, ocorrida em 24 de maio.
Em nota assinada pelos cinco ministérios, o Grupo de Trabalho Interministerial de Enfrentamento à Violência Política contra as Mulheres afirma que o pedido de cassação “é mais um episódio de perseguição às mulheres legitimamente eleitas e que ocupam espaços de poder e decisão”.
Leia a íntegra da nota:
O Grupo de Trabalho Interministerial de Enfrentamento à Violência Política contra as Mulheres, coordenado pelo Ministério das Mulheres e composto por representantes dos Ministérios dos Povos Indígenas, da Igualdade Racial, da Justiça e Segurança Pública e dos Direitos Humanos e da Cidadania, vem a público manifestar apoio e solidariedade às deputadas federais Sâmia Bomfim (SP), Célia Xakriabá (MG), Talíria Petrone (RJ), Fernanda Melchionna (RS), Érika Kokay (DF) e Juliana Cardoso (SP), que foram alvo de um pedido de cassação de seus mandatos na Câmara dos Deputados, quando se manifestaram contrárias à aprovação do Marco Temporal.
O pedido de cassação das deputadas apresentado ao Conselho de Ética é mais um episódio de perseguição às mulheres legitimamente eleitas e que ocupam espaços de poder e decisão, estando, naquele momento, alertando a sociedade sobre a gravidade que a aprovação do Marco Temporal representa para os povos indígenas. Configura-se, portanto, como uma violência política de gênero, principalmente, pela celeridade com que foi encaminhado ao Conselho de Ética, em menos de 24 horas. Já as ações contra quatro deputados homens, acusados de estimular os atos terroristas de 8 de Janeiro, até hoje não foram encaminhadas ao mesmo colegiado. Na última sexta-feira (02/06), fez quatro meses que elas estão paralisadas na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados.
Destaca-se que as mesmas tentativas de punir as deputadas não ocorreram contra aqueles parlamentares que tentaram silenciar e até mesmo impedir a fala delas, quando participavam de debates em comissões temáticas daquela Casa Política, uma vez que as mesmas são reconhecidamente atuantes na defesa dos Direitos Humanos, tornando-se alvos permanentes de uma política misógina.
O fenômeno da violência política contra as mulheres no Brasil é histórico e estrutura as bases de formação do País. Agravado pela misoginia, pelo racismo e pela LBTfobia, tem como objetivo limitar ou até impedir a participação das mulheres na vida política e partidária. Essa estratégia de invisibilização das mulheres é uma das principais causas da sub-representação dessa importante parcela da população do país, no Parlamento e nos espaços de poder e decisão. As mulheres são 53% do eleitorado, mas ocupam apenas 17,7% da Câmara dos Deputados, 18% do Senado, 17% das Câmara Municipais, 12% das Prefeituras e 7,5% dos Governos Estaduais. Quando se observa a intersecção racial, há uma sub-representação em que apenas 1,7% das deputadas são negras, e 2,6% representam as ocupantes das câmaras estaduais e distrital.
Segundo o Mapa das Mulheres na Política 2020, feito pela Organização das Nações Unidas (ONU) e pela União Interparlamentar (UIP), o Brasil ocupa o 145º lugar no ranking em número de mulheres no Parlamento, de um total de 187 países.
O episódio contra as seis parlamentares federais representa o ápice de uma violência sistemática que já vem ocorrendo de norte a sul do Brasil contra vereadoras e prefeitas, colocando em risco, inclusive, não apenas seus mandatos, mas, sobretudo, a possibilidade de suas reeleições no pleito de 2024. Afinal, a sub-representação configura um cenário de grave déficit democrático que impede o desenvolvimento de políticas públicas mais eficientes para as mulheres em sua diversidade e, consequentemente, atrasa o desenvolvimento do país.
Desde 2021, a Lei 14.192/21 estabelece regras para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher, entendida como “toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos da mulher” (art. 3º). Esta legislação contempla tanto mulheres candidatas a cargo eletivo como também aquelas que já são detentoras de mandato eletivo.
Ante o exposto, solicitamos à Mesa Diretora da Câmara dos Deputados que considere violência política de gênero os ataques desferidos contra as deputadas federais, e que não acate o pedido de instalação de Comissão de Ética contra elas.
Pedimos, também, que a Câmara dos Deputados se comprometa com a garantia de ampliação do acesso de mais mulheres em todas as esferas de poder e decisão, assim como que assegure a elas que possam exercer seu mandato e permanecer na política, por meio da criação de novos mecanismos de coíbam a criminalizem os atos de violência política contra as mulheres.
Grupo de Trabalho Interministerial de Enfrentamento à Violência Política contra as Mulheres
Idiotas sem consciência de fazer mal a si mesmo e aos outros, não conseguem aceitar pontos de vista, ideias ou culturas divergentes de sua doutrina
por Fernando Nogueira da Costa /A Terra é Redonda
- - -
Ao optar por viver apartado da vida em comunidade com formação acadêmica, em vez de estudar mais, o idiota se julga superior a esse coletivo desprezado por ele. Transmite essa intolerância ou negacionismo científico para seus descendentes e a compartilha com os amigos de sua “câmara de eco”.
Idiotas sem consciência de fazer mal a si mesmo e, pior, aos outros, não conseguem aceitar pontos de vista, ideias ou culturas divergentes de sua doutrina, imposta pela família, tradição religiosa e pela ideia deturpada de pátria como submissa às Forças Armadas. Estas receberam a missão constitucional exclusiva de defesa do território nacional, mas isso não é compreendido por gente inculta sem esforço educacional.
Os reacionários reagem contra, pois têm muita dificuldade de compreensão da diversidade pela qual é formado o mundo. Quem pensa diferentemente seria um doutrinado, seja pela “esquerda ateia e personificação do diabo”, seja pela Ciência, pesquisada em Universidades públicas, todas dominadas por essa “gente cumunista”.
Anacrônicos, imaginam pensar por si só ao compartilhar os memes de maneira robótica. O idiota acha estar bem defendido de questionamentos se ficar fechado na sua “bolha”.
Típicos velhos reacionários, moradores de Copacabana, todos vestidos de verde-e-amarelo, disseram o seguinte. “Eu me considero bolsonarista porque não vejo outro político. O Brasil não tem outro”. “Eu não sou bolsonarista, mas sim um patriota”. “Eu não sou bolsonarista, sou sim contra a corrupção!” “Eu sou bolsonarista, sou pela família, por tudo normal, isto é, é a gente ter moral, ter princípios”.
Uma jovem com aparência de classe média alienada afirmou ter votado no dito cujo, “apesar de seu jeito agressivo contra as mulheres, para o Partido dos Trabalhadores não voltar ao Poder”. Outra idosa reconheceu: “ele é temperamental, ele fala tudo aquilo vindo à sua mente, e a gente estranha gente autêntica. Assusta um pouco, mas ele é maravilhoso!”
Disse uma agressiva: “Ele é franco, como eu…” Disse um macho: “Sempre foi assim mal-educado, não vejo por qual razão ele mudar no cargo de presidente”.
Uma adepta fervorosa clama: “Ele fez o possível dele fazer. Houve a pandemia… Mas ele acertou mais em relação a errar”. Um jovem não vê alternativa: “Ele hoje é o cavalo encilhado para a gente montar”. Outro condescendente justifica sua escolha: “Ele reduziu o preço da gasolina e concedeu o auxílio para melhorar muito a vida no dia a dia”.
Outra senhora reconhece: “eu não entendo nem acompanho política, mas sou contra qualquer tipo de corrupção, se for provado a da sua família, tem de punir”. Um senhor mais popular acha “a família dele está envolvido em ‘rachadinhas’, assim como todos os políticos. O mal dele é passar a mão na cabeça dos filhos. Quanto a ele, não vejo nada!”.
Uma jovem fantasiada também de bandeira brasileira é perguntada sobre corrupção nos ministérios e na família do presidente desqualificado – e não consegue responder: “Hum… [ri]” Você vai votar nele?! “Lógico, aquele cara… como chama mesmo?” Alexandre Moraes. “Ah, é um homem super-corrupto! Tudo feito pelo presidente ele derrubou, soltou culpados, prendeu inocentes”.
Outra idosa afirma: “Quando a gente sai em passeata, pedindo liberdade, não diz respeito ao presidente, mas sim à ditadura da Suprema Corte”. Sem resposta para o argumento contraditório da repórter, ela só pergunta: “Você é comunista?!”.
Esta é uma amostra do comportamento político desse nicho da classe média. É base de apoio para emergência do fascismo tupiniquim sobre a ordem armada na base de ameaças de violência e assassinatos. Para o compreender vale reler o livro de Wilhelm ReichPsicologia de massas do fascismo(Martins Fontes, original de 1933).
Acusar o comportamento conservador das massas de “irracional”, de constituir uma “psicose de massas” ou uma “histeria coletiva” em nada contribui para jogar luz sobre a raiz do problema e compreender a razão pela qual essa fração de classe social respalda o discurso fascista. Afinal, o neofascista ataca os interesses coletivos e reserva, para seu clã, uma riqueza imobiliária, adquirida com dinheiro vivo/sujo.
Wilhelm Reich localiza a expressão da psicologia de massas do fascismo em uma certa forma de família, tendo no centro a repressão à sexualidade, e no caráter da “classe média baixa”. Para ele, a repressão à satisfação das necessidades materiais difere da repressão aos impulsos sexuais. A primeira leva à revolta, enquanto a segunda impede a rebelião. Isto porque a retira do domínio consciente, “fixando-a como a defesa da moralidade”.
O próprio recalque do impulso é inconsciente, não visto pela pessoa como uma característica de seu caráter. O resultado, segundo Wilhelm Reich, “é o conservadorismo, o medo a liberdade, em resumo, a mentalidade reacionária”.
Essa amostra de classe média (carioca/paulistana/brasiliense) não é composta dos únicos a viver esse processo conservador, mas ela vive de maneira singular. Imagina-se estar acima dos outros (adversários a serem extirpados) e representarem a nação. Praticam a defesa das barreiras sociais, impostas como garantia da sobrevivência da autoestima. Temem a quebra da ordem na qual se equilibram, precariamente, e, por isso, pedem controle e repressão dos pobres e negros desejosos de emergência social.
Alinhados à defesa militar da “nação” (pátria armada), adotam o “moralismo” quanto aos costumes, ligado a preconceitos, à misoginia, à homofobia, ao racismo etc. Arrematam esse discurso com a defesa da “família” e o clamor pela “ordem”. O comportamento fascista não pode ser reduzido à manipulação e à cilada, mas encontra-se sim na consciência imediata e nas relações afetivas quanto ao reconhecimento ou acolhimento por gente inculta também vestida de verde-e-amarelo.
O ato de acolher expressa uma ação de aproximação, um “estar com” e um “estar perto de”, ou seja, uma atitude de inclusão social, ocorrida também em templos evangélicos, mesmo sob a cobrança de dízimos para obter essa sensação de reconhecimento individual. Essa atitude implica na busca de estar em relação presencial com muita gente parecida consigo, seja em aparência, seja em posse de poucas ideias inteligentes.
Daí a leviana substituição do Datafolha, pesquisa feita com método científico de amostragem, pelo Datapovo, visualização impressionista de manifestações de rua. Tanto à direita, quanto à esquerda, muitos imaginam essas serem decisivas para o resultado eleitoral, como a minoria ruidosa em espaços delimitados em algumas poucas metrópoles expressasse uma vontade reprimida de a maioria silenciosa gritar em praça pública. Aquela não representa esta, pelo contrário, a maioria quer paz e não violência!
Uma amostra visual é uma pequena porção de alguma coisa dada para ver, mas não é suficiente para provar ou analisar determinada qualidade do todo. A visão holista necessita de uma amostra representativa para o comportamento coletivo de todo o eleitorado ser avaliado ou julgado a priori.
Em metodologia da pesquisa quantitativa, uma amostra é um conjunto de dados coletados e/ou selecionados de uma população estatística por um procedimento definido. Como a população é muito grande, fazer um censo ou uma enumeração completa de todos os valores existentes é impossível rapidamente com poucos recursos.
A amostra geralmente representa um subconjunto de tamanho manejável. Há método científico para se fazer inferências ou extrapolações da amostra à população. No entanto, a massa ignara não o (re)conhece.
A melhor forma de evitar viés ou não representatividade, presente em manifestações de rua, é selecionar uma amostra aleatória, também conhecida como amostra probabilística. Nela, cada membro individual da população tem uma chance conhecida e diferente de zero de ser selecionado como parte dela.
A amostragem estratificada, como é a sociedade, consiste em dividir ou estratificar a população em um certo número de subpopulações. Elas deveriam não se sobreporem, de modo a extrair uma amostra de cada estrato. Mas este tipo de amostragem nem sempre é usado, quando métodos diferentes de coleta de dados são aplicados em diferentes partes da população.
Na amostra da Datafolha, a faixa até dois salários mínimos é 51%, enquanto a preferência pelo PT é 27%. Isso representa 42,2 milhões de votos. Minha “tese”, hipótese defendida com dados, é a esperada vitória de Lula, apesar da melhora do rival, se dar basicamente por causa dos pobres simpatizantes do PT. Nem todas as pesquisas eleitorais fazem amostra por partido de preferência. Um fator eleitoral decisivo é o PT ser o único partido com massa popular simpatizante. Esta é a verdadeira razão do “antipetismo”. Ressentimento.
Crueldade, humilhação, fúria assassina, PM pisa no pescoço de mulher negra, comerciante em SP
Dupla de capitães votou por absolvição de soldado carrasco em caso de comerciante negra que teve fratura exposta por chute de policial e depois foi pisoteada. Agente chega a ficar em pé e jogar todo o peso do corpo no pescoço da vítima
Dois capitães da Polícia Militar de São Paulo que compõem um Tribunal da Justiça Militar, e que votaram pela absolvição do soldado João Paulo Servato, filmado pisando no pescoço de uma comerciante negra deitada no chão e que momentos antes sofreu uma fratura exposta na perna em decorrência de um chute dado por um dos agentes, numa ocorrência de maio de 2020, disseram nas suas decisões que livraram o colega pelo ato selvagem por ele estar sofrendo com “desgaste físico e emocional”.
O caso, ocorrido no início da pandemia, diz respeito a um chamado feito ao 190 informando sobre o funcionamento de um bar na Zona Sul da capital paulista, o que estava proibido por conta das restrições sanitárias para conter a Covid-19. A vítima, Elizabete Teixeira da Silva, 53 anos, era proprietária do estabelecimento e saiu em testemunho de defesa de um amigo que estava sendo agredido pelos PMs. Ela recebe um chute brutal na altura da canela, que se fraturou na hora, cai no chão e então Servato passa a pisar em seu pescoço, com a mulher aparentemente desmaiada. Ele chega a jogar todo o peso do corpo na perna que pisoteava, esgoelava, asfixiava.
Os votos pela absolvição do réu foram obtidos pela reportagem da Folha de S.Paulo e neles, Alisson Bordwell da Silva e Marcelo Medina, os capitães do Tribunal Militar, embora classifiquem a cena como “fortes, impactantes e lamentáveis”, dizem que “apenas” 1 minuto e 30 segundos de gravação “pode induzir ao erro quem assiste às cenas”, já que ali estaria sendo mostrado “apenas 10% ou 15%” do que aconteceu na ocorrência.
Para piorar o absurdo da decisão tomada pelos dois oficiais, eles argumentam que aquela “foi a forma que, em virtude de um desgaste físico e emocional, apresentou-se para o policial cumprir a sua missão” de levar Elizabete à delegacia.
O advogado da vítima, Felipe Morandi, considerou a desculpa usada no julgamento com estapafúrdia e anunciou que recorrerá do veredito.
“O policial é, ou deveria ser, treinado física e psicologicamente para lidar com situações de enfrentamento que envolvam qualquer que seja. Não podem usar um suposto desgaste físico para praticar uma brutalidade como aquela, sem qualquer necessidade ou razão aparente”, disse Morandi à Folha.
Já o advogado de defesa dos policiais, João Carlos Campanini, alegou que Servato não pisou sobre o pescoço de Elizabeth, mas “no final das costas. Próximo ao início do pescoço”, e que a ação se deu em legítima defesa.
Enquanto as taxas de homicídios entre as brancas diminuem, as de mulheres e meninas negras tiveram uma alta de 19,5% em dez anos; Djamila Ribeiro explica por que
O “Mapa da Violência 2015 – Homicídios de mulheres no Brasil” mostra um assustador incremento nas taxas de homicídios de mulheres negras. Nas periferias, a desconfiança da rede de proteção e da polícia é grande e muitas vezes dificulta o atendimento das mulheres em situação de violência, como mostra a reportagem “A fogueira está armada pra nós”. Para refletir sobre isso, a Pública entrevistou a feminista Djamila Ribeiro, mestre em Filosofia Política.
O Mapa da Violência de 2015 mostra que entre 2003 e 2013 as taxas de homicídio de brancas caíram de 3,6 para 3,2 por 100 mil – queda de 11,9% –, enquanto as taxas entre as mulheres e meninas negras cresceram de 4,5 para 5,4 por 100 mil, aumento de 19,5%. Com isso, a porcentagem de vítimas negras, que era de 22,9% em 2003, cresce para 66,7% em 2013. O que esses dados estão nos dizendo?
Os dados evidenciam que as políticas públicas de combate à violência contra a mulher não estão atingindo as mulheres negras, ou seja, não se está pensando na realidade dessas mulheres, que são maioria no Brasil, na hora de criar [essas políticas]. Isso aponta para o que as feministas negras vem dizendo há décadas: não se pode universalizar a categoria mulher, mulheres são diversas, e as mulheres negras, por conta do machismo e racismo, acabam ficando num lugar de maior vulnerabilidade social. Um outro problema é que o próprio movimento feminista parece ainda não ter entendido que as questões das mulheres negras não podem mais ser tratadas como apêndices, precisam ser centrais. É preciso romper com essa tentação de universalidade que exclui.
A rede de proteção está falhando mais com as mulheres negras?
É necessário racializar as políticas de gênero. A mulher negra vem sendo violentada desde o período colonial, estupros foram cometidos sob a égide da miscigenação. Criaram-se os estereótipos da mulher negra como a “boa de cama”, “quente”. Essas violências, que também são confinadores sociais, desumanizam essa mulher.
Você acha que as mulheres moradoras de periferias confiam na polícia e no Estado para fazer essa proteção? Pergunto isso porque essa é uma fala recorrente das meninas e mulheres com quem conversamos nos bairros pobres de São Paulo: de que o Estado e a polícia estão na periferia não para proteger, mas para incriminar. Como você enxerga esse cenário?
Sim, muitas mulheres negras periféricas não confiam na polícia e no sistema judiciário, até porque esse braço do Estado vem exterminando seus filhos, companheiros. Dos jovens de 15 a 29 anos que são assassinados no Brasil, 77% são negros. Mulheres periféricas convivem diariamente com essa realidade violenta. E o sistema judiciário, do modo como está posto, não é uma questão de justiça, e sim de poder. Muitas sequer tem condições de acessá-lo. Isso não quer dizer que as leis criadas, como a Maria da Penha e a do feminicídio, não são importantes. Isso quer dizer que esse sistema tem limites, acaba atingindo as mulheres que possuem privilégios sociais, haja vista que diminuiu em 10% o número de assassinatos de mulheres brancas.
E sobre a prevenção da violência contra a mulher? Acredita que a gente tem hoje políticas públicas de prevenção ou elas são mais voltadas à punição?
É preciso pensar em políticas de prevenção, a gente continuar lutando por uma educação não sexista nas escolas, o que pode, a longo prazo, promover uma transformação de mentalidade. Em alguns estados, há programas voltados para homens agressores, o que considero positivo.
Por que as mulheres continuam morrendo no Brasil?
As mulheres continuam morrendo no Brasil porque as violências muitas vezes são naturalizadas; muitas realidades, como a das mulheres negras, por exemplo, sequer foram nomeadas ou foram tardiamente. E não se resolve um problema que sequer é nomeado. E eram nomeados pelas mulheres negras, mas essas mulheres demoraram a ser vistas como sujeitos políticos. O machismo e o racismo estruturam todas as relações sociais, e é preciso existir um debate maduro em relação a isso. Tanto machismo como racismo são institucionais, e por isso ainda encontramos muita dificuldade para combatê-los. In Pública,15 de março de 2016
Regredimos 3 décadas: Apenas 4 em cada 10 famílias conseguem garantir alimento na mesa. Os outros 6 lares enfrentam alguma dificuldade para colocar comida na mesa
por Thiago Borges
- - -
Você sabe o que vai comer na noite de hoje? E no café de amanhã? No Brasil de 2022, apenas 4 em cada 10 famílias têm essa certeza. Na contramão, a fome acelera e chega a33,1 milhões de pessoas, que não têm o que comer no País. Em apenas 1 ano, esse contingente aumentou em 14 milhões de pessoas – no final de 2020, eram 19 milhões nessa situação.
Esses dados foram apresentados nesta quarta-feira (8/6), pelo 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil. A edição recente da pesquisa mostra que mais da metade (58,7%) da população brasileira convive com a insegurança alimentar em algum grau – leve, moderado ou grave (fome). O País regrediu para um patamar equivalente ao da década de 1990.
A pesquisa foi realizada pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede PENSSAN). O estudo completo pode ser acessado na páginaOlhe para a Fome.
As estatísticas foram coletadas entre novembro de 2021 e abril de 2022, a partir da realização de entrevistas em 12.745 domicílios, em áreas urbanas e rurais de 577 municípios, distribuídos nos 26 estados e no Distrito Federal. A Segurança Alimentar e a Insegurança Alimentar foram medidas, mais uma vez, pela Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (Ebia), que também é utilizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A pesquisa anterior, de 2020, mostrava que a fome no Brasil tinha voltado para patamares equivalentes aos de 2004. A continuidade do desmonte de políticas públicas, a piora no cenário econômico, o acirramento das desigualdades sociais e o segundo ano da pandemia da Covid-19 tornaram o quadro desta segunda pesquisa ainda mais perverso.
“A pandemia surge neste contexto de aumento da pobreza e da miséria, e traz ainda mais desamparo e sofrimento. Os caminhos escolhidos para a política econômica e a gestão inconsequente da pandemia só poderiam levar ao aumento ainda mais escandaloso da desigualdade social e da fome no nosso país”, aponta Ana Maria Segall, médica epidemiologista e pesquisadora da Rede PENSSAN.
Segurança alimentar cai ainda mais
No Brasil de 2022, apenas 4 em cada 10 domicílios conseguem manter acesso pleno à alimentação – ou seja, estão em condição de segurança alimentar. Os outros 6 lares se dividem numa escala, que vai dos que permanecem preocupados com a possibilidade de não ter alimentos no futuro até os que já passam fome.
De acordo com o 2º Inquérito, em números absolutos, são 125,2 milhões de brasileiros que passaram por algum grau de insegurança alimentar. É um aumento de 7,2% desde 2020, e de 60% em comparação com 2018.
“Já não fazem mais parte da realidade brasileira aquelas políticas públicas de combate à pobreza e à miséria que, entre 2004 e 2013, reduziram a fome a apenas 4,2% dos lares brasileiros. As medidas tomadas pelo governo para contenção da fome hoje são isoladas e insuficientes, diante de um cenário de alta da inflação, sobretudo dos alimentos, do desemprego e da queda de renda da população, com maior intensidade nos segmentos mais vulnerabilizados”, avalia Renato Maluf, Coordenador da Rede PENSSAN.
Os destaques da pesquisa
Norte e Nordeste mais impactados novamente
A insegurança alimentar segue como uma questão que atinge as regiões do Brasil de forma desigual. No Norte e no Nordeste, os números chegam, respectivamente, a 71,6% e 68% – são índices expressivamente maiores do que a média nacional de 58,7%. A fome fez parte do dia a dia de 25,7% das famílias na região Norte e de 21% no Nordeste. A média nacional é de aproximadamente 15%, e, do Sul, de 10%.
O campo passa mais fome
O mesmo agravamento é percebido quando se compara o campo e a cidade. Nas áreas rurais, a insegurança alimentar (em todos os níveis) esteve presente em mais de 60% dos domicílios. Destes, 18,6% das famílias convivem com a insegurança alimentar grave (fome), valor maior do que a média nacional. E até quem produz alimento está pagando um preço alto: a fome atingiu 21,8% dos lares de famílias agricultoras. A pobreza das populações rurais associada ao desmonte das políticas de apoio às populações do campo, da floresta e das águas, seguem impondo escassez.
A fome tem cor
Neste segundo inquérito, fica evidente, mais uma vez, que a fome tem cor. Enquanto a segurança alimentar está presente em 53,2% dos domicílios onde a pessoa de referência se autodeclara branca, nos lares com responsáveis de raça/cor preta ou parda ela cai para 35%. Em outras palavras, 65% dos lares comandados por pessoas pretas ou pardas convivem com restrição de alimentos em qualquer nível. Comparando com o 1º Inquérito Nacional da Rede PENSSAN, de 2020, em 2021/2022, a fome saltou de 10,4% para 18,1% entre os lares comandados por pretos e pardos.
A fome tem gênero
As diferenças são expressivas na comparação entre os lares chefiados por homens e os lares chefiados por mulheres no período dos dois Inquéritos da Rede PENSSAN. Nas casas em que a mulher é a pessoa de referência, a fome passou de 11,2% para 19,3%. Nos lares que têm homens como responsáveis, a fome passou de 7,0% para 11,9%. Isso ocorre, entre outros fatores, pela desigualdade salarial entre os gêneros.
Fome dobrada nos lares com crianças
Em pouco mais de um ano, a fome dobrou nas famílias com crianças menores de 10 anos – de 9,4% em 2020 para 18,1% em 2022. Na presença de três ou mais pessoas com até 18 anos de idade no grupo familiar, a fome atingiu 25,7% dos lares. Já nos domicílios apenas com moradores adultos a segurança alimentar chegou a 47,4%, número maior do que a média nacional.
Para a fome sumir, é preciso ter renda
A fome quase desaparece nos lares com renda superior a um salário mínimo por pessoa. Em 67% dos domicílios com renda maior que um salário mínimo por pessoa, o acesso a alimentos (segurança alimentar) é pleno e garantido. Porém, se em 2020 não havia domicílios com renda maior que um salário mínimo por pessoa em situação de fome, no início de 2022 essa deixou de ser uma garantia contra a privação do consumo de alimentos – consequência da crise econômica e dos reajustes do salário mínimo abaixo da inflação.
Agora, 3% dos lares nesta faixa de renda tem seus moradores em situação de fome, e 6% convivem com algum grau de restrição quantitativa de alimentos (insegurança alimentar moderada) e 24% não conseguem manter a qualidade adequada de sua alimentação (insegurança alimentar leve).
Sem lenço, sem documento e sem comida na mesa
A fome é maior nos domicílios em que a pessoa responsável está desempregada (36,1%), trabalha na agricultura familiar (22,4%) ou tem emprego informal (21,1%). Já a segurança alimentar é maior nos lares onde chefe da família trabalha com carteira assinada, chegando a 53,8% dos domicílios.
A fome atinge quem não consegue chegar às escolas
Há fome em 22,3% dos domicílios com responsáveis com baixa escolaridade — 4 anos
ou menos de estudo. Em 2020 esse percentual era de 14,9%. O maior percentual de segurança alimentar é em domicílios cujos responsáveis têm mais de 8 anos de estudo: 50,6%.
Falta água para beber e para cozinhar
A falta de acesso regular e permanente à água — também conhecida como insegurança hídrica — é uma realidade para 12% da população geral brasileira. A insegurança alimentar moderada esteve presente em 22,8% desses lares, e a fome, em 42,0%. A insegurança alimentar se manifesta em 48,3% dos lares com restrição de acesso à água na região Norte, em 43,0% no Sudeste, em 41,8% do Centro-Oeste e em 41,2% no Nordeste. Onde falta água, também falta alimento.
A vergonha de sentir fome
De todas as famílias entrevistadas pela pesquisa, 8,2% relataram sensação de vergonha, tristeza ou constrangimento pelo uso de meios que ferem a dignidade para conseguir colocar comida na mesa. Isso corresponde a 15,9 milhões de pessoas no Brasil, que foram obrigadas a usar de meios social e humanamente inaceitáveis, para obtenção de alimentos. Nessa faixa, 24,3% convivem com as manifestações mais severas de insegurança alimentar (moderada ou grave).
A fome para quem tem dívidas, ou precisa vender bens de trabalho e parar de estudar
Dos entrevistados que informaram endividamento, 49,1% passaram por insegurança alimentar moderada e grave. Já dos que relataram venda de bens ou equipamentos de trabalho, 48,7% também estavam nessa mesma situação. E entre os que contaram que precisaram parar de estudar para contribuir com a renda familiar, são 55,2% nesses recortes mais graves de insegurança alimentar.
O alimento sai da despensa, a fome entra pela porta
Cerca de metade das famílias que deixaram de comprar, nos últimos 3 meses, arroz, feijão, vegetais e frutas convivem com a insegurança alimentar moderada ou grave. Entre as famílias que deixaram de comprar carnes nos três meses anteriores à pesquisa, 70,4% passavam fome. Dados semelhantes foram encontrados nos lares onde os moradores não haviam comprado frutas (64%) e vegetais (63,6%).
A Câmara de Curitiba negou nesta segunda (14) uma homenagem à vereadora Marielle Franco, assassinada no Rio de Janeiro quatro anos atrás. A votação terminou com 17 votos contra, 11 a favor e oito abstenções.
A proposta fio apresentada pela vereadora Carol Dartora (PT) e a ideia era dar o nome da vereadora carioca a um Centro Municipal de Educação Infantil. Marielle já recebeu homenagens em todo o mundo desde que foi morta a tiros junto com seu motorista, Anderson Gomes, em 2018.
Defensora dos direitos humanos,a vereadora era filiada ao PSol. Quatro anos depois de sua morte a tiros, o crime continua sem solução definitiva. Dois supostos assassinos foram presos, mas negam a autoria. E ninguém sabe dizer ao certo quem foi o mandante ou qual a motivação do crime.
Marielle, defensora de vítimas da brutalidade policial no Rio de Janeiro, se tornou objeto da fúria de certa parte da direita. Uma placa com seu nome foi quebrada no Rio numa cena célebre. Na discussão do projeto na Câmara, sua carreira foi alvo de calúnias e distorções.
Alguns vereadores disseram que não votariam a favor porque a vereadora “não fez nada por Curitiba”. Outros, mais radicais, disseram que jamais homenageariam uma “abortista”.
No fim, o que podia ser uma homenagem bonita a uma defensora de comunidades pobres e um desagravo às mulheres, à comunidade LGBTQIA+ e aos negros acabou se transformando mais uma vez numa demonstração de ódio e ignorância como a Câmara de Curitiba dá tantas vezes.
Beto Moraes (PSD) Denian Couto (Pode) Eder Borges (PSC) Ezequias Barros (PMB) Flávia Francischini (PSL) João da 5 Irmãos (PSL) Jornalista Márcio Barros (PSD) Marcelo Fachinello (PSC) Mauro Bobato (Pode) Mauro Ignácio (DEM) Noêmia Rocha (MDB) Oscalino do Povo (PP) Osias Moraes (Rep) Pastor Marciano Alves (Rep) Sargento Tânia Guerreiro (PSL) Sidnei Toaldo (Patr) Zezinho do Sabará (DEM)
Abstenções
Alexandre Leprevost (SD) Amalia Tortato (Novo) Indiara Barbosa (Novo) Leônidas Dias (SD) Pier Petruzziello (PTB) Professor Euler(PSD) Salles da Fazendinha (DC) Serginho do Posto (DEM)
Dois fatos densos de reminiscência e que se articulam de modo a nos trazer à situação em que hoje atravessamos no Brasil
Por RONALDO TADEU DE SOUZA /A Terra É Redonda
“grande parte do que fez a grandeza dessa obra [Em Busca do Tempo Perdido] permanecerá oculta ou inexplorada até que essa classe [a burguesia aristocratizada] na luta final, revele seus traços fisionômicos mais fortes.” (Walter Benjamin, A Imagem de Proust).
“Justiça por Assata” (Ato 19/03 Goiânia informações: instagram: ayah_akili e pensar.africanamente).
Muito já se disse sobre a memória na formação de nossas existências. São inúmeros os teóricos sociais, filósofos, críticos da cultura e psicanalistas que afirmam ser a lembrança de uma vida de então o aspecto fundamental não só de indivíduos, mas da sociedade ao qual estão inseridos. Seja no soerguimento da identidade de cada um, seja nas disposições de organização das relações sociais, seja nos modos em que lidamos com eventos políticos significativos – o passado é parte constitutiva do ser em sentido amplo.
Não foi sem razão que Marx disse no início deO 18 Brumário de Luís Bonaparteque o espírito do passado e as tradições de outros tempos influenciam as ações do presente – mesmo que do ponto de vista da linguagem. E que Benjamin nasTeses sobre o Conceito de História, ter reivindicado que fossemos ao pretérito como um salto de tigre naquele mesmo. Tanto Marx como Benjamin estavam a escrever seus respectivos textos para aqueles e aquelas em condições de serem explorados, oprimidos pelas classes dominantes, humilhados no cotidiano por circunstâncias impostas pelo capital e suas figuras representativas e sacrificados cruelmente pela violência estatal.
Um e outro pretenderam chamar a atenção da importância para os subalternos de toda ordem da força da recordação; não da recordação que se faz patíbulo e extirpa o impulso da transformação ao prender, astutamente por vezes, as paixões políticas no passado e sim daquela que vislumbra a fusão com o contingente (essa foi a mensagem de Frantz Fanon no fim doPeles Negras Máscaras Brancas) e transfigura-se em subjetividade insubmissa, radical, revolucionária por assim dizer, e torna o futuro presente. Faz do horizonte de expectativas princípio dialético-objetivo. Ainda assim, por vezes se esquece daquilo que ocorreu no decurso da vivência.
É por isso que devemos ter em nossas mentes dois fatos que ocorreram nos últimos dias, mas que são densos de reminiscência, e que se articulam, de modo a nos trazer à situação em que hoje atravessamos no Brasil. Essa semana completaram-se quatro anos do assassinato a mando de Marielle Franco, e dias atrás presenciamos um dos acontecimentos mais terríveis da vida pública brasileira – a ida à Ucrânia de Arthur do Val, e os áudios vazados com suas declarações sobre as mulheres ucranianas em meio ao sofrimento humano de uma guerra. (Guerra essa que é promovida por aqueles que de maneira geral personagens como esse cidadão é porta voz, as classes dominantes das potências mundiais – as burguesias e elites imperialistas, Vladimir Putin e a Rússia inclusive, que já disse para quem tem ouvidos para ouvir, escutar e atentar que a região da Ucrânia foi uma equivocada invenção do Lênin e dos bolcheviques após 1917.)
É preciso lembrar que Marielle Franco, mulher negra, lésbica, de esquerda, militante socialista do PSOL (partido ao qual era filiada e atuava em defesa dos pobres, negros e negras que passam todo tipo de violência policial no dia-a-dia), foi exterminada covardemente pelas forças policiais-políticas que de uma maneira ou de outra hoje governam o país, com um programa econômico-político que visa a devastação literal daqueles considerados descartáveis para a ordem do capital atualmente (e Arthur do Val é irrefutavelmente um dos mais importantes políticos e representantes desse bloco no poder). Marielle sem dúvida seria uma das vozes a gritar pelos seus e pelas suas. Mas isso não foi possível a ela.
Em 2018 o Brasil já estava completa e moralmente conquistado (faltava apenas a consolidação material do poder estatal, pois não nos esqueçamos, a presidência de Michel Temer iniciou em 2016 com o golpe institucional, e que 9 de 10 que não sejam de esquerda qualificam com a dicção da legitimidade política de Impeachment) pela direita de todos os matizes. Hoje ninguém quer se associar ao bolsonarismo, ao Arthur do Val e com alguma timidez cínica acreditam no MBL (nossos liberais, ou liberais mesmo). No arco da contrarrevolução brasileira de 2014-2021, nosso18 Brumáriopara lembrar o ensaio de Bruno Cava, rememoremos queliberal-conservative, conservadores, liberais, tradicionalistas, neoliberais e sociais-liberais, obviamente em nenhum momento se posicionarem contrários ao que vinha ocorrendo, está inserida a morte tramada de Marielle.
As descrições do assassinato planejado racionalmente estão disponíveis para quem quiser averiguar, não as farei aqui (já o fiz nos três anos da morte de Marielle no siteA Terra é Redonda); basta dizer que Ronnie Lessa e Élcio Queiroz a espreitaram por mais de três meses antes do dia do crime. E é esse arco, em fase de estabilização agora, uma vez que estamos às vésperas da eleição – eleição que por vezes, nem sempre e não consegue de fato, tem a função de (re)estabelecer o equilíbrio instável com a competição pelo voto (Schumpeter) –, que impossibilita as investigações e a revelação de quem efetivamente exigiu o extermínio na vereadora negra e carioca. Ora, de posse do poder de Estado e sem nenhuma das veleidades democráticas (Marx) bem pensantes da esquerda legalista, era e é natural que o grupo de direita que o detém fez, faz e fará de tudo para ocultar os responsáveis: dos 9 tiros disparados pelos sicários a soldo contra Marielle Franco.
Arthur do Val – que se diga era até bem pouco tempo aliado de Sérgio Moro – foi uma das figuras mais representativas do que alguns chamam de a nova direita brasileira. De certo modo, entendidas as coisas com ponderação aqui, ele é um dos “responsáveis”, responsável indireto e com um grau significativo de distanciamento desse indireto, pelo que ocorreu no dia 14 de março de 2014 no Rio de Janeiro. É preciso lembrar que naquele contexto a cidade do Rio estava ocupada pelas forças militares sob o comando de Braga Neto; a Lava Jato estava com o prestígio absolutamente incólume dado os vínculos com a mídia empresarial; as ideias de mercado organizam o debate sobre o futuro do país; a esquerda era sem trégua alguma qualificada de corrupta (que bela é a vingança da história); e os personagens da direita eram recebidos em todos os salões sociais e do poder como os jeovás da pátria: era na verdade oKatechonda vez. Arthur do Val era um deles.
Hoje a classe média, seja a conservadora, a de profissões liberais, a intelectualizada, a progressista, tem comportamentos de aversão à figura de do Val – mas no arco em questão se felicitavam e regozijavam de quando ele ia a manifestações de movimentos e grupos de esquerda os mais variados, que na maioria das vezes compunha-se de pessoas a lutar por uma vida minimamente mais digna, e fazia questões aos presentes, questões e perguntas para tentar humilhar os já humilhados, para tentar desprezar os já desprezados, às mais absurdas, como: “você sabe o que é mais-valia?”, “o que você acha do Che-Guevara?”, “você sabe o que é déficit fiscal?” etc. (Sim caro Arthur do Val! Todos e todas sabem o que é “mais-valia”, sabem quem “foi Che”, e “entendem” das implicações do não-déficit fiscal.).
Entretanto, eis que o (ex)aliado de Moro, e que é preciso e necessário divulgar, ainda falava e fala pelas forças de direita, pelos agentes de mercado, o capital e/ou a burguesia na boa teoria socialista clássica, (ele foi um contundente defensor das reformas previdenciárias contra funcionários públicos em São Paulo), e pelos conservadores do momento parte em uma viagem para a Ucrânia, junto com Renan dos Santos (e seu rosto menino de baladeiro das boas casas noturnas de São Paulo). Lá, no país com sua população, a maioria de trabalhadores e setores médios sofrendo a realidade de uma guerra não planejado por eles, muito pelo contrário, ele “revela” a que tipo de grupo e setor político e social estamos a enfrentar. Misoginia será pouco para qualificarmos as palavras de Arthur do Val (que diga-se alguns setores fingem que não é com eles de que se trata, é vergonhoso como meios de comunicação e outros setores do espectro político trataram o caso, se fosse alguém de esquerda que no Brasil se quer pode cometer o menor deslize, mesmo que de avaliação sincera e de tomada de posição as exigências seriam bem outras).
O chefe do MBL (Movimento Brasil Livre), que tramou junto aos seus – a saber, o próprio Sérgio Moro, Aécio Neves, o Vem pra Rua, Kim Kataguiri, Brasil Paralelo, o Instituto Mises, o Instituto Millenium, Eduardo Cunha, Pondé e outros colunistas de livre pensamento e democratas (são tantos), os economistas das muitas XP’s espalhadas pelas Farias Limas a fora (André Esteves do BTG à frente), Olavo de Carvalho, PSDB, DEM, Jair Bolsonaro e o espírito-Ustra – a deposição de Dilma Rousseff, um golpe palaciano lapidado como quem lápida cuidadosamente uma pedra de diamante para a Vivara (e que agora, claro, exercita a diversidade racial), com a idêntica alma-santa que o fez mentir e criarFake Newssobre Marielle Franco, mas à época a santa aliança deu de ombros, foi à Ucrânia demonstrar de fato o que pretende como político brasileiro.
Quer, não nos esqueçamos disso, o esmagamento prático e simbólico de todos os subalternos: mulheres, negros, trabalhadores, LGBTQI+ e indígenas. Lembrar que há 1500 dias Marielle nos deixou pelas mãos e mentes de figuras-tipo como Arthur do Val e seus consortes, novamente entendidas as coisas ponderadamente, ou seja, cultivarmos a memória como irrupção do passado no presente-futuro, pode nos levar não só a redimir a vereadora negra de esquerda, como a de todas e todos que caíram e caem na luta de classes-raça árdua, às do cotidiano e às da emancipação radical.
Após quatro anos do brutal assassinato da vereadora carioca e seu motorista Anderson Gomes, parlamentares, familiares e ativistas de direitos humanos cobram respostas sobre mentores e as razões para o crime
A vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e o motorista Anderson Gomes foram homenageados nesta terça-feira (15) em sessão solene no plenário da Câmara dos Deputados. Eles foram assassinados a tiros no dia 14 de março de 2018, no centro do Rio de Janeiro.
Segundo a deputada Sâmia Bonfim (PSOL-SP), que apresentou o requerimento para a sessão solene, é “quase inacreditável” que, quatro anos depois, não se tenha ainda nenhuma pista, não se tenha chegado a uma conclusão sobre por que o assassinato foi cometido e quem mandou matar a vereadora.
“Aqueles que tiraram a vida de Marielle naquela noite tinham um objetivo. Sem dúvida, queriam tentar calar sua voz, suas ideias, os objetivos da sua atuação política. Quando a gente diz que Marielle vive, nós sabemos que, infelizmente, ela foi assassinada, mas vivem as suas ideias, a sua memória e sua história”, ressaltou.
A vice-líder da Minoria, deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), destacou que o assassinato de Marielle foi um crime político, “uma violência política de gênero”. Ela lembrou que até agora não há respostas nem a responsabilização pela autoria do crime.
“Muitas são as teses, muitas são as especulações, muitas são as interpretações. Mas é preciso que se esclareça! Não há resposta maior que o esclarecimento e a punição para a violência política de gênero. Esse crime precisa de respostas, e nós queremos essa resposta. Marielle vai nos iluminar para que a gente consiga avançar, para que mais nenhuma mulher perca a vida por ser protagonista da sua própria história”, afirmou.
Investigação
Pistoleiro de aluguel Ronnie Lessa
A elucidação do duplo assassinato está a cargo da Delegacia de Homicídios do Rio de Janeiro e o Ministério Público estadual. No entanto, ainda não há prazo para a conclusão da investigação.
Desde 2018, três grupos diferentes de promotores ficaram à frente do caso no MPRJ, enquanto na Polícia Civil o quinto delegado assumiu há pouco mais de um mês as investigações.
Motorista do Escritório do Crime
O Ministério Público denunciou os ex-policiais Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz como os assassinos de Marielle e de Anderson. Eles estão presos em penitenciárias federais fora do Rio de Janeiro e vão a júri popular, ainda não marcado. Mas a polícia e o MP ainda buscam outras respostas como: “Quem mandou matar Marielle?”; “Por que ela foi morta?”; “Teve motivação política?”; “Onde está a arma do crime?”.
Para a deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), vice-líder da Oposição, há um clamor internacional, “um pedido de justiça por Marielle e Anderson”. “O Brasil se cala, mas há uma pergunta que não pode calar nunca: quem mandou matar Marielle?”, questionou.
A parlamentar observou que as circunstâncias em que se desenrolam as investigações são muito estranhas. “Uma investigação que cinco delegados já passaram por ela, não pode chegar a lugar algum. Acreditem, dois atiradores de aluguel foram presos como os assassinos. Mas, e aí? Chegaram a dois atiradores de aluguel e não chegaram nos mandantes deste crime bárbaro?”, indagou.
Simbologia
A deputada Talíria Petrone (PSOL-RJ) chamou a atenção para a simbologia em torno do assassinato. “Marielle, mulher negra, num País do feminicídio, que é o quinto país com maior índice de feminicídios no mundo e em que o feminicídio é negro. Marielle, mulher favelada, em que a favela é alvo do braço armado do Estado, mas lá não chega o SUS, não chega creche”, citou. Ela acrescentou que Marielle era defensora dos direitos humanos e que o País é um dos que mais assassina ativistas dos direitos humanos no mundo. Para ela, a execução política de Marielle por pessoas ligadas à milícia significa retrocesso democrático.
Para a deputada Erika Kokay (PT-DF), as idas e vindas na investigação e o sigilo que se tenta impor a ela ocorrem porque “o crime mexe nos cernes de um poder que se associa com milícias e com jagunços”. Ela também destacou a simbologia do crime: “O extermínio de Marielle Franco representa o ataque frontal, a bala no corpo da democracia, balas no corpo de cada mulher negra deste País, balas no corpo de todas que ousam descer os morros e assumir os palanques e as tribunas que eles negam ao povo brasileiro.”
Em discurso lido pela líder do PSOL na Câmara, Sâmia Bonfim, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), também lamentou que não se tenha ainda chegado a respostas concretas e conclusivas “sobre as circunstâncias, as motivações e os responsáveis por aquela tragédia”.
“Além da inestimável perda de duas vidas humanas ceifadas covardemente, é preciso destacar também o duro golpe desferido naquela noite contra a democracia brasileira. Marielle era vereadora no Rio de Janeiro, uma legítima representante do povo daquela cidade e uma aguerrida defensora das pautas políticas a ela confiada por seus eleitores. Aquele assassinato não tentou silenciar apenas a mulher vítima dos tiros. Aquela foi, sem dúvida, uma tentativa de calar a vereadora”, disse.
Trajetória
Militante de direitos humanos, Marielle Franco começou sua militância quando entrou no cursinho pré-vestibular comunitário e perdeu uma amiga, vítima de bala perdida. Coordenou a atuação da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do RJ e foi eleita vereadora em 2016 com 46.052 votos, a quinta mais votada.
A vereadora presidiu a Comissão da Mulher da Câmara Municipal e propôs diversos projetos e iniciativas durante pouco mais de um ano de mandato.
Marielle apresentou, em 2014, sua dissertação de mestrado em Administração Pública na Universidade Federal Fluminense (UFF) com o título “UPP: a redução da favela a três letras”. No trabalho, Marielle estudou a implementação das UPPs no Rio de Janeiro, entre 2008 e 2013, e propõe em perspectiva teórica que o modelo de segurança pública adotado para as favelas reforça o Estado Penal.
Cairão um por um! Valter Nagelstein foi condenado a dois anos de reclusão e poderá ficar inelegível após áudio racista contra a bancada negra de Porto Alegre nas últimas eleições. Racistas não passarão!
Absurdo! Enquanto lotamos as ruas no #AtoPelaTerra contra o pacote da destruição, foi aprovada a urgência do projeto que quer liberar a mineração em terras indígenas. Não podemos recuar, cobre seu deputado para que esse PL seja derrotado na Câmara! #PL191Nao
A aprovação do projeto que quer liberar a mineração em terras indígenas é um grande retrocesso para o Brasil. Vamos pressionar nossos deputados! #PL191Nao
Não consigo contar o nº de vezes que fui agredida no mercado ou na rua por conta de mentiras e ameaças. Há 8 anos, eu sinto medo por mim e pelos meus.
Eu lembro a primeira vez em que fui agredida por causa de uma fakenews: era 2014. Eu estava tomando café com meu marido e um menino olhou para mim e passou a me agredir por conta de uma notícia mentirosa publicada num perfil de Twitter e num site que mentia ser de humor.
Mas eu ando nas ruas de cabeça erguida porque sei quem sou e o que defendo e sei quem são os mentirosos que me atacam. Já esse deputado tem medo de sair na rua porque descobriram exatamente quem ele é.
Ontem escrevi esse fio. Logo depois, o Presidente em pessoa, sem intermediários, passou a me atacar em suas redes. Tipo confissão de culpa. Ficou nervosinho, né? Vai trabalhar!
A atual política de preços da Petrobras é a responsável pela alta dos preços? Entendam nesse vídeo! O completo está no canal:
Quatro anos da morte de Marielle e nosso país ainda exige saber quem mandou matá-la!!!
Da mesma maneira, as sementes de Marielle florescendo são esperança de que podemos ser um país mais próximo daquilo que ela sonhou e lutou.
Eu olho sua imagem e penso em Dona Marinete, em Anielle, em sua filha Luyara. Penso nas mesas de domingo com a imensidão de sua ausência. Penso em Monica. Desejo que meu carinho e solidariedade chegue até cada uma delas.
As falas repulsivas do deputado estadual Arthur do Val (PODEMOS-SP) é apenas mais um capítulo revelador para a opinião pública sobre a imoralidade e a indecência de figuras e grupos políticos da extrema-direita que ascenderam ao poder durante os últimos anos no Brasil. Ele estava na Ucrânia, acompanhado de Renan dos Santos – fundador do MBL -, para prestar apoio ao governo neonazista implantado naquele país a partir do golpe de Estado ocorrido em 2014. Os áudios divulgados foram reconhecidos por Arthur como autênticos.
Um festival de obscenidades: “as cidades mais pobres são as melhores [para “pegar” mulheres]; “se ela cagar, você limpa o c* dela com a língua”; “assim que essa guerra passar, eu vou voltar pra cá”; “elas olham, são fáceis porque são pobres”; “essas minas, em São Paulo, você dá bom dia e elas cospem na sua cara. E aqui são super gente boa. É inacreditável! (Inacreditável é pensar que alguém gastaria saliva com um sujeito que merece mesmo é água de chuca na cara – o que poderia ser ineficaz enquanto ato de repulsa por, quiçá, contentar sua coprofilia confessa). Renan do Santos foi citado como praticante do “tour du blond” - turismo voltado à exploração sexual de mulheres loiras e pobres.
Depois de ser pego com a boca na botija em seu machismo, misoginia, violência, exploração sexual de mulheres, estimulo à prática de turismo sexual – o que anda de mãos dadas com o tráfico de mulheres e crianças para trabalho escravo e abuso sexual – e toda sorte de preconceito, Arthur do Val foi massacrado pela opinião pública da esquerda à direita.
O presidente Jair Bolsonaro oportunamente afirmou que a fala de Arthur “é tão asquerosa que nem merece comentário”. A ministra Damares – que incentivou a invasão de hospital para tentar impedir o aborto de uma menina de 10 anos estuprada pelo tio em gravidez que representava risco para a mãe e para o bebê – não deixou de condenar os áudios, seguindo a linha do filho 01, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Depois de apoiar e incentivar a ida de Arthur e Renan para a Ucrânia, Sérgio Moro (PODEMOS) também demonstrou repúdio.
Jogado ao mar por seus semelhantes, Arthur tentou justificar-se dizendo que errou e apenas disse o que sentiu num momento de empolgação. “Sou homem, sou jovem. Vi um monte de mulheres bonitas sendo simpáticas, talvez porque em São Paulo as mulheres sejam mais inacessíveis” para um otário machista desprovido de respeito e valores civilizatórios como ele – poderia ser um adequado complemento à sua frase. Renan dos Santos fingiu demência e disse não ter “a menor ideia disso aí”.
Apesar da inevitável repulsa que ouvir os áudios provoca em qualquer pessoa civilizada, é preciso dizer que as reações não passam de mais um episódio político de indignação seletiva. Em 2019, o mesmo Bolsonaro que hoje condenou Arthur ofereceu o Brasil para a prática de turismo com abuso sexual:“quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade”.À época, houve barulho e protestos resignadamente condensados em ineficazes notas de repúdio.
Outro caso de indignação seletiva semelhante, vale lembrar que Bolsonaro também fez declarações e flertou com o nazismo incontáveis vezes antes que toda a opinião pública se voltasse contra o moleque ignorante e inconsequente que apresenta podcast na internet. Refém do verme que ocupa o poder central, impotente diante de seu ímpeto genocida e violento, a sociedade brasileira se volta contra os ovos por ele depositados nos mais diversos espaços públicos e institucionais. É como diz o ditado: “em pau caído, todo mundo faz graveto”.
A prática de exploração sexual de vulneráveis é comum em nosso país.Samuel Klein, fundador das Casas Bahia, é o mais recente exemplo que tornou público a prática abjeta de estuprar meninas pobres menores de idade em troca de dinheiro e condições de vida digna para elas e suas famílias. Apesar dessa monstruosidade ser conhecida por funcionários e frequentadores de suas lojas, a mídia corporativa jamais ofereceu espaço para as denúncias. As Casas Bahia sempre foram as principais anunciantes dos grandes jornais.
Todavia, essa história violenta é mais antiga. O Brasil é uma nação construída a partir da violação e exploração de povos vulneráveis. Como mostrou oprojeto “DNA Brasil”, 70% das mães que deram origem à população brasileira são africanas e indígenas enquanto 75% dos pais têm origem europeia. O estupro de mulheres, assim como assassinato de homens pretos e indígenas – que deixaram poucos descendentes – são as marcas da violência que carregamos em nosso DNA. É impossível fugir da própria história.
Cabe ressaltar que o teor repulsivo das falas divulgadas compõe o cotidiano de diversos homens que se colocam à esquerda do espectro político. Qualquer pessoa que frequenta espaços masculinos já presenciou um sem número de ocasiões em que homens brancos, heterossexuais, cisgêneros - alguns gostam de aparecer nas redes sociais como defensores dos pretos e das mulheres, entre arco-íris da luta LGBTQIA+ - se referirem às mulheres como objetos que devem estar à sua disposição para satisfação pessoal e prazer sexual. Trata-se do ordinário em conversas entre amigos da irmandade conivente com a violência simbólica cotidiana. Em outras palavras: é a violência nossa de cada dia.
Esses sujeitos são os mais perigosos e costumam passar despercebidos por dominarem o código de conduta social que lhes permite reafirmar e desfrutar de seu lugar de privilégio, na vida pessoal, enquanto na esfera pública aparentemente combatem a desigualdade e a violência que sustenta esse mesmo privilégio. Mencionar isso pode significar colocar o dedo na ferida de alguns, mas não haverá como superar aquilo que não for combatido em sua realidade mais incômoda.
O deputado Arthur do Val desistiu de sua pré-candidatura ao governo de São Paulo e aparece em todas as mídias que lhe dão espaço como um garoto errático que, acostumado a viver sem responder pelas consequência dos seus atos, foi finalmente chamado à responsabilidade do lugar social que ocupa como político e cidadão. Sabe que corre o risco de ser expulso do PODEMOS, perder o mandato parlamentar e já anuncia que poderá deixar a carreira política. Tomara.
O que essa situação traz à tona é a noção de uma masculinidade anacrônica e decadente, ainda muito presente e aceita em nossa sociedade, que representa o que de pior acontece no mundo: guerras, violência, estupro, tortura e todo tipo de violação física, psíquica, emocional, política, cultural, econômica e social.
É difícil olhar para tudo isso, principalmente quando notamos essas práticas tão próximas em nossa vida, inclusive em nossos atos inconscientes do cotidano. Se queremos avançar no processo civilizatório, como nação, precisamos enfrentar a questão do machismo e da exploração sexual em suas formas mais dissimuladas. Foi tolerando o intolerável que Jair Bolsonaro tornou-se Presidente da República trazendo consigo Monark, Renan dos Santos, Arthur do Val, Sérgio Moro e outros. Que aprendamos a lição para interromper esse ciclo de violência e garantir que essa Era macabra do Brasil jamais se repita.