Deputadas denunciam tentativa deliberada de intimidar o trabalho das mulheres na Câmara - Pablo Valadares / Câmara dos Deputados
(Videos) Violência de gênero dos presidentes da Câmara e do PL Homem Valdemar da Costa Neto afasta mulheres da política partidária no Brasil
por Valmir Araújo
Brasil de Fato
As mulheres ocupam apenas 18% das cadeiras na Câmara dos Deputados, porém representam 63% dos parlamentares que enfrentam processos de cassação de mandato no Conselho de Ética. Apenas na última semana seis deputadas progressistas foram parar no Conselho de Ética depois que o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), aceitou o pedido do PL protocolado dias antes, mesmo havendo pedidos mais antigos contra parlamentares homens, que estão parados na Mesa Diretora.
A representação do PL tem como base os discursos das deputadas com críticas aos colegas durante a votação do PL 490, que trata sobre marco temporal para demarcação de terras indígenas. Foram incluídas as deputas Célia Xakriabá (PSOL-MG), Érika Kokay (PT-DF), Fernanda Melchionna (PSOL-RS); Juliana Cardoso (PT-SP), Sâmia Bonfim (PSOL-SP) e Talíria Petrone (PSOL-RJ). Juliana e Tarília já respondiam a processos no Conselho por críticas que tinham feito aos deputados do PL.
As deputadas alegam que há uma tentativa deliberada de intimidar o trabalho das mulheres na Câmara dos Deputados.
“A representação do PL é uma nítida e ineficaz tentativa de nos intimidar e tem um forte componente sexista. Nós não vamos recuar e seguiremos ainda mais fortes na defesa dos direitos dos povos indígenas e de todo o povo brasileiro”, destacou Érika Kokay.
A parlamentar do Distrito Federal lembrou que o PL, autor da representação que pede cassação dos mandatos, é o partido do ex-presidente Jair Bolsonaro que foi denunciado na Organização das Nações Unidas (ONU) por crimes contra os povos indígenas.
“Foi com indignação que reagi à representação do PL pedindo a cassação do meu mandato por denunciar o genocídio indígena que representa o projeto do novo Marco Temporal”, acrescentou a deputada.
Além das seis deputadas do campo progressista outra parlamentar com processo no Conselho de Ética é Carla Zambelli (PL-SP). Por outro lado, quatro homens enfrentam pedidos para cassação de mandato: Eduardo Bolsonaro (PL-SP), e José Medeiros (PL-MT), Márcio Jerry (PCdoB-MA) e Nikolas Ferreira (PL-MG).
OBrasil de Fato DFentrou em contato, por e-mail, com a Assessoria de Imprensa da Câmara dos Deputados para saber sobre a tramitação e motivos da celeridade na aceitação dos pedidos, mas até o fechamento desta matéria não obteve resposta. O espaço está aberto para futuras manifestações.
Cassação coletiva
Esta é a primeira vez nos últimos vinte anos que foi apresentado no Conselho de Ética da Câmara um pedido de cassação coletiva. No entanto, na segunda-feira (12), o PL solicitou a retirada da tramitação do pedido de cassação coletiva e apresentou seis pedidos de perda de mandato individuais contra as parlamentares. A solicitação também foi atendida pelo presidente da Casa, Arthur Lira.
“Agora, querem entrar individualmente contra cada uma de nós. A coletividade os assusta. Seja individual ou coletivo, seguiremos juntas, nos apoiando e ecoando nossas vozes”, afirmou a deputada Célia Xakriabá após a mudança, em suas redes sociais.
"O que é inusitado é que a Câmara acaba dando uma celeridade maior a esses processos do que a outros que estão lá há muito tempo de pessoas que nitidamente cometeram crimes. A peça, se você espremer, essa representação que eles fizeram, só sai dali misoginia, só sai dali violência política de gênero e violência contra os povos indígenas", destacou Érika Kokay.
Violência de gênero
Para a professora e pesquisadora do Instituto de Ciências Políticas da Universidade de Brasília (Ipol/UnB), Michelle Fernandez, o episódio pode ser classificado como violência de gênero. “Me parece um caso de violência de gênero sim, com o claro intuito de desestimular a participação de mulheres nas esferas de poder”, analisou a cientista política.
A pesquisadora lembrou que o parlamento brasileiro tem uma das menores taxas de representação feminina da América Latina e classificou a política partidária do Brasil como “hostil para as mulheres”.
“Não é nenhuma novidade que nós temos um legislativo que desestimula a participação de mulheres e que oferece esse tratamento machista”, afirmou Michelle Fernandez. Segundo ela essa tentativa de cassação se caracteriza por um ímpeto silenciar as mulheres que é muito comum nos espaços de poder do Brasil.
“É mais um episódio de perseguição às mulheres legitimamente eleitas e que ocupam espaços de poder e decisão”
Os ministérios da Igualdade Racial, das Mulheres, dos Povos Indígenas, dos Direitos Humanos e da Cidadania, e da Justiça e Segurança Pública emitiram nesta sexta-feira (9) uma nota em defesa das seis congressistas que enfrentam a possibilidade de cassação pela Câmara dos Deputados, presidida por Arthur Lira acusado pela ex-esposa.
O partido de Valdemar da Costa Neto e Michelle Bolsonaro, presidenta do PL Mulher, pediu a perda de mandato de Sâmia Bomfim (Psol-SP), Célia Xakriabá (Psol-MG), Talíria Petrone (Psol-RJ), Fernanda Melchionna (Psol-RS), Érika Kokay (PT-DF) e Juliana Cardoso (PT-SP). Elas teriam chamado os deputados bolsonaristas de “assassinos” durante a votação da urgência do Projeto de Lei do Marco Temporal, ocorrida em 24 de maio.
Em nota assinada pelos cinco ministérios, o Grupo de Trabalho Interministerial de Enfrentamento à Violência Política contra as Mulheres afirma que o pedido de cassação “é mais um episódio de perseguição às mulheres legitimamente eleitas e que ocupam espaços de poder e decisão”.
Leia a íntegra da nota:
O Grupo de Trabalho Interministerial de Enfrentamento à Violência Política contra as Mulheres, coordenado pelo Ministério das Mulheres e composto por representantes dos Ministérios dos Povos Indígenas, da Igualdade Racial, da Justiça e Segurança Pública e dos Direitos Humanos e da Cidadania, vem a público manifestar apoio e solidariedade às deputadas federais Sâmia Bomfim (SP), Célia Xakriabá (MG), Talíria Petrone (RJ), Fernanda Melchionna (RS), Érika Kokay (DF) e Juliana Cardoso (SP), que foram alvo de um pedido de cassação de seus mandatos na Câmara dos Deputados, quando se manifestaram contrárias à aprovação do Marco Temporal.
O pedido de cassação das deputadas apresentado ao Conselho de Ética é mais um episódio de perseguição às mulheres legitimamente eleitas e que ocupam espaços de poder e decisão, estando, naquele momento, alertando a sociedade sobre a gravidade que a aprovação do Marco Temporal representa para os povos indígenas. Configura-se, portanto, como uma violência política de gênero, principalmente, pela celeridade com que foi encaminhado ao Conselho de Ética, em menos de 24 horas. Já as ações contra quatro deputados homens, acusados de estimular os atos terroristas de 8 de Janeiro, até hoje não foram encaminhadas ao mesmo colegiado. Na última sexta-feira (02/06), fez quatro meses que elas estão paralisadas na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados.
Destaca-se que as mesmas tentativas de punir as deputadas não ocorreram contra aqueles parlamentares que tentaram silenciar e até mesmo impedir a fala delas, quando participavam de debates em comissões temáticas daquela Casa Política, uma vez que as mesmas são reconhecidamente atuantes na defesa dos Direitos Humanos, tornando-se alvos permanentes de uma política misógina.
O fenômeno da violência política contra as mulheres no Brasil é histórico e estrutura as bases de formação do País. Agravado pela misoginia, pelo racismo e pela LBTfobia, tem como objetivo limitar ou até impedir a participação das mulheres na vida política e partidária. Essa estratégia de invisibilização das mulheres é uma das principais causas da sub-representação dessa importante parcela da população do país, no Parlamento e nos espaços de poder e decisão. As mulheres são 53% do eleitorado, mas ocupam apenas 17,7% da Câmara dos Deputados, 18% do Senado, 17% das Câmara Municipais, 12% das Prefeituras e 7,5% dos Governos Estaduais. Quando se observa a intersecção racial, há uma sub-representação em que apenas 1,7% das deputadas são negras, e 2,6% representam as ocupantes das câmaras estaduais e distrital.
Segundo o Mapa das Mulheres na Política 2020, feito pela Organização das Nações Unidas (ONU) e pela União Interparlamentar (UIP), o Brasil ocupa o 145º lugar no ranking em número de mulheres no Parlamento, de um total de 187 países.
O episódio contra as seis parlamentares federais representa o ápice de uma violência sistemática que já vem ocorrendo de norte a sul do Brasil contra vereadoras e prefeitas, colocando em risco, inclusive, não apenas seus mandatos, mas, sobretudo, a possibilidade de suas reeleições no pleito de 2024. Afinal, a sub-representação configura um cenário de grave déficit democrático que impede o desenvolvimento de políticas públicas mais eficientes para as mulheres em sua diversidade e, consequentemente, atrasa o desenvolvimento do país.
Desde 2021, a Lei 14.192/21 estabelece regras para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher, entendida como “toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos da mulher” (art. 3º). Esta legislação contempla tanto mulheres candidatas a cargo eletivo como também aquelas que já são detentoras de mandato eletivo.
Ante o exposto, solicitamos à Mesa Diretora da Câmara dos Deputados que considere violência política de gênero os ataques desferidos contra as deputadas federais, e que não acate o pedido de instalação de Comissão de Ética contra elas.
Pedimos, também, que a Câmara dos Deputados se comprometa com a garantia de ampliação do acesso de mais mulheres em todas as esferas de poder e decisão, assim como que assegure a elas que possam exercer seu mandato e permanecer na política, por meio da criação de novos mecanismos de coíbam a criminalizem os atos de violência política contra as mulheres.
Grupo de Trabalho Interministerial de Enfrentamento à Violência Política contra as Mulheres
Estreou (25/09/2019) em vários cinemas do Brasil o documentário Torre das Donzelas de Susanna Lira. O filme debate e denuncia as experiências cruéis e brutais a que as mulheres prisioneiras foram sujeitas durante o período da Ditadura Militar brasileira, através dos relatos de diversas mulheres perseguidas e presas, dentre elas a ex-presidente brasileira Dilma Rousseff.
No filme, as mulheres, presas pelo regime militar, relatam o seu dia a dia na prisão, as torturas de que foram vítimas e de como foram capturadas pela sua luta pela democracia, bem como a rotina das celas e a importância da leitura na manutenção da esperança.
O filme Torre das Donzelas recriou, a partir das memórias das ex-reclusas, um cenário semelhante ao Presídio Tiradentes, onde se encontrava a Torre das Donzelas, parte do presídio feminino que foi demolido em 1973.
A diretora Susanna Lira se interessou por esta prisão específica porque dela tinham saído mulheres potentes, importantes para a história do Brasil.
A partir de desenhos feitos por cada uma das entrevistadas com giz em um quadro, o título cria um campo de subjetividade ao reerguer uma torre cenográfica, inspirada em Dogville (2003), de Lars Von Trier. Outras referências cinematográficas para a construção audiovisual foram em"César deve morrer"(2012), dos Irmãos Taviani, e"A imagem que falta"(2013), documentário histórico de Rithy Panh sobre a ditadura no Camboja.
A cineasta pediu às entrevistadas que desenhassem, de acordo com a própria memória, como eram os corredores e celas que as abrigaram na década de 1970. A partir das lembranças, o filme recriou um cenário similar ao presídio, com grades, camas, banheiros e corredores inspirados nos traços de quem ali viveu. As ex-presidiárias comentam as torturas sofridas, contam como foram capturadas por sua militância democrática, detalham o dia a dia, desde a limpeza das celas até a importância da leitura na manutenção da esperança e o breve respiro a cada visita de um familiar.
A instalação cenográfica onde foram feitas as filmagens, que reconstitui o espaço carcerário ficou sob a responsabilidade do premiado diretor de arte Glauce Queiroz.
O documentário centra-se na solidariedade e a integração entre as presas, que se juntam numa espécie de família, características evidentes nos depoimentos das participantes.
Participam de Torre das Donzelas: Ana Maria Aratangy, Ana Mércia, Darci Miyaki, Dilma Rousseff, Dulce Maia, Elza Lobo, Eva Teresa Skazufka, Guida Amaral, Iara Glória Areias Prado, Ieda Akselrud Seixas, Ilda Martins da Silva, Janice Theodoro da Silva, Leane Ferreira de Almeida, Lenira Machado, Leslie Beloque, Lucia Salvia Coelho, Maria Aparecida dos Santos, Maria Luiza Belloque, Marlene Soccas, Nadja Leite, Nair Benedicto, Nair Yumiko Kobashi, Robêni Baptista da Costa, Rose Nogueira, Sirlene Bendazzoli, Telinha Pimenta e Vilma Barban.
Por lutarem por um Brasil democrático, milhares foram encarceradas pela ditadura militar. Em livro da Fundação Rosa Luxemburgo, ex-ALN rememora vida na ala feminina do Presídio Tiradentes. Sortearemos 1 exemplar
A partir do fatídico 1º de abril de 1964, o arbítrio se tornou regra no Brasil. A ditadura imposta pelos generais não se furtou de torturar, matar e desaparecer com corpos para garantir os privilégios do andar de cima da sociedade. A corajosa decisão de resistir ao regime militar levou milhares às cadeias oficiais e clandestinas da repressão. A professora de Serviço Social da UnifespAna Maria Ramos Estevão, ex-militante da Ação Libertadora Nacional (ALN), rememorou sua experiência no cárcere em livro recentemente lançado.
Torre das guerreiras e outras memórias foi publicado no ano passado, com apoio de nossos parceiros daFundação Rosa Luxemburgo. Seu título remete a uma renomeação da ala feminina do Presídio Tiradentes feita por Estevão na obra: conhecida como “torre das donzelas” pelos carcereiros, a ala abrigou dezenas de presas políticas até sua desativação em 1973. Ali se encontraram mulheres de diversas origens e convicções, que praticaram a solidariedade coletiva apoiando-se naquela situação de poucas perspectivas.
Não foram poucas as mulheres que se envolveram com a luta revolucionária no Brasil dos anos 60 e 70, a exemplo daRússia de 1917e muitos outros movimentos históricos. E no rol de encarceradas do Tiradentes há várias figuras que fizeram seu nome na democracia brasileira. Entre elas, a presidenta Dilma Rousseff, cujo prefácio para a obra foipublicado com exclusividade emOutras Palavras. Na época, a jovem Dilma, estudante de economia, participava da Vanguarda Armada Revolucionária – Palmares (VAR-PALMARES), organização guerrilheira que combatia a ditadura.
Ramos Estevão esteve no Presídio Tiradentes durante longos nove meses. Antes disso, havia sido torturada pela Operação Bandeirantes – ação das forças de segurança organizada com recursos do empresariado paulista para combater a esquerda – e, depois de libertada, ainda seria presa mais duas vezes e levada ao exílio.
Seu relato deixa explícito o contraste entre captores e capturadas. Os primeiros têm como principal característica o sadismo. Torturavam nem sempre para captar informações, mas também por divertimento. Em especial os civis, chamados pela autora de “fascistas voluntários”, que colaboravam com a repressão não por disciplina do quartel, mas por convicção política (ou crueldade). As últimas, a despeito das dificuldades, das condições sub-humanas de sobrevivência, da pressão psicológica causada pelo medo de dizer algo sob tortura, buscavam de alguma maneira trazer acalento umas às outras. Estevão relembra um episódio em que tentou aliviar o sofrimento de uma companheira de cela massageando apenas seus pés, já que todo o resto do corpo estava em carne viva devido às agressões.
Outras PalavraseFundação Rosa Luxemburgosortearãoum exemplardeTorre das guerreiras e outras memórias, de Ana Maria Ramos Estevão, entre os apoiadores do nosso jornalismo. O formulário de participação será enviado pore-maile as inscrições serão aceitas até a próxima quinta-feira, 6/4, às 14h.
Como livro de memórias,Torre das guerreirasé mais amplo que um diário de prisão. Engloba um período mais longo da vida da autora (em síntese, a ditadura), e ela registra ali seus pensamentos da época mas também as reflexões que faz hoje em dia sobre aquele tempo, que reencontra hoje ao rever companheiros e lugares para escrever o livro. Também liga sua biografia militante iniciada naALN de Marighellacom sua vida pregressa de imigrante nordestina em São Paulo, participante fiel das atividades sociais de sua Igreja Metodista e jovem estudiosa na Faculdade Paulista de Serviço Social.
Íntimo e sensível, o livro da professora da Unifesp nos permite acessar uma perspectiva pessoal sobre o que aconteceu na ditadura, algo que muitas vezes a narrativa historiográfica não consegue transmitir com a força necessária. Ao mesmo tempo, a obra mantém aceso nas consciências o alerta sobre as desumanidades praticadas naquele período obscuro da história do país, que precisamos evitar a todo custo que retorne, como querem alguns militares.
Amanhã será o primeiro 1º de abril após a saída da presidência do principal representante das viúvas da ditadura na política nacional. Ocorrerão manifestações em todo o país pela punição dos golpistas de ontem e hoje – os pontos de encontro estão nas imagens abaixo –, e será uma importante oportunidade de mostrar a força do grito “ditadura nunca mais!”.
Nos somando às ações que todos os anos rememoram (e repudiam) o golpe militar de 1964 e seus crimes, ofereceremos entre nossos leitores1 exemplardeTorre das guerreiras e outras memórias, deAna Maria Ramos Estevão, em parceria com aFundação Rosa Luxemburgo.
O formulário de participação será enviado pore-mailpara os leitores que colaboram comOutras Palavras, e ficará aberto até apróxima quinta-feira, 6/4, às 14h. Se você ainda não faz parte do Outros Quinhentos, nossa rede de financiamento coletivo, acesseapoia.se/outraspalavras/e escolha um plano de contribuição!
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Idiotas sem consciência de fazer mal a si mesmo e aos outros, não conseguem aceitar pontos de vista, ideias ou culturas divergentes de sua doutrina
por Fernando Nogueira da Costa /A Terra é Redonda
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Ao optar por viver apartado da vida em comunidade com formação acadêmica, em vez de estudar mais, o idiota se julga superior a esse coletivo desprezado por ele. Transmite essa intolerância ou negacionismo científico para seus descendentes e a compartilha com os amigos de sua “câmara de eco”.
Idiotas sem consciência de fazer mal a si mesmo e, pior, aos outros, não conseguem aceitar pontos de vista, ideias ou culturas divergentes de sua doutrina, imposta pela família, tradição religiosa e pela ideia deturpada de pátria como submissa às Forças Armadas. Estas receberam a missão constitucional exclusiva de defesa do território nacional, mas isso não é compreendido por gente inculta sem esforço educacional.
Os reacionários reagem contra, pois têm muita dificuldade de compreensão da diversidade pela qual é formado o mundo. Quem pensa diferentemente seria um doutrinado, seja pela “esquerda ateia e personificação do diabo”, seja pela Ciência, pesquisada em Universidades públicas, todas dominadas por essa “gente cumunista”.
Anacrônicos, imaginam pensar por si só ao compartilhar os memes de maneira robótica. O idiota acha estar bem defendido de questionamentos se ficar fechado na sua “bolha”.
Típicos velhos reacionários, moradores de Copacabana, todos vestidos de verde-e-amarelo, disseram o seguinte. “Eu me considero bolsonarista porque não vejo outro político. O Brasil não tem outro”. “Eu não sou bolsonarista, mas sim um patriota”. “Eu não sou bolsonarista, sou sim contra a corrupção!” “Eu sou bolsonarista, sou pela família, por tudo normal, isto é, é a gente ter moral, ter princípios”.
Uma jovem com aparência de classe média alienada afirmou ter votado no dito cujo, “apesar de seu jeito agressivo contra as mulheres, para o Partido dos Trabalhadores não voltar ao Poder”. Outra idosa reconheceu: “ele é temperamental, ele fala tudo aquilo vindo à sua mente, e a gente estranha gente autêntica. Assusta um pouco, mas ele é maravilhoso!”
Disse uma agressiva: “Ele é franco, como eu…” Disse um macho: “Sempre foi assim mal-educado, não vejo por qual razão ele mudar no cargo de presidente”.
Uma adepta fervorosa clama: “Ele fez o possível dele fazer. Houve a pandemia… Mas ele acertou mais em relação a errar”. Um jovem não vê alternativa: “Ele hoje é o cavalo encilhado para a gente montar”. Outro condescendente justifica sua escolha: “Ele reduziu o preço da gasolina e concedeu o auxílio para melhorar muito a vida no dia a dia”.
Outra senhora reconhece: “eu não entendo nem acompanho política, mas sou contra qualquer tipo de corrupção, se for provado a da sua família, tem de punir”. Um senhor mais popular acha “a família dele está envolvido em ‘rachadinhas’, assim como todos os políticos. O mal dele é passar a mão na cabeça dos filhos. Quanto a ele, não vejo nada!”.
Uma jovem fantasiada também de bandeira brasileira é perguntada sobre corrupção nos ministérios e na família do presidente desqualificado – e não consegue responder: “Hum… [ri]” Você vai votar nele?! “Lógico, aquele cara… como chama mesmo?” Alexandre Moraes. “Ah, é um homem super-corrupto! Tudo feito pelo presidente ele derrubou, soltou culpados, prendeu inocentes”.
Outra idosa afirma: “Quando a gente sai em passeata, pedindo liberdade, não diz respeito ao presidente, mas sim à ditadura da Suprema Corte”. Sem resposta para o argumento contraditório da repórter, ela só pergunta: “Você é comunista?!”.
Esta é uma amostra do comportamento político desse nicho da classe média. É base de apoio para emergência do fascismo tupiniquim sobre a ordem armada na base de ameaças de violência e assassinatos. Para o compreender vale reler o livro de Wilhelm ReichPsicologia de massas do fascismo(Martins Fontes, original de 1933).
Acusar o comportamento conservador das massas de “irracional”, de constituir uma “psicose de massas” ou uma “histeria coletiva” em nada contribui para jogar luz sobre a raiz do problema e compreender a razão pela qual essa fração de classe social respalda o discurso fascista. Afinal, o neofascista ataca os interesses coletivos e reserva, para seu clã, uma riqueza imobiliária, adquirida com dinheiro vivo/sujo.
Wilhelm Reich localiza a expressão da psicologia de massas do fascismo em uma certa forma de família, tendo no centro a repressão à sexualidade, e no caráter da “classe média baixa”. Para ele, a repressão à satisfação das necessidades materiais difere da repressão aos impulsos sexuais. A primeira leva à revolta, enquanto a segunda impede a rebelião. Isto porque a retira do domínio consciente, “fixando-a como a defesa da moralidade”.
O próprio recalque do impulso é inconsciente, não visto pela pessoa como uma característica de seu caráter. O resultado, segundo Wilhelm Reich, “é o conservadorismo, o medo a liberdade, em resumo, a mentalidade reacionária”.
Essa amostra de classe média (carioca/paulistana/brasiliense) não é composta dos únicos a viver esse processo conservador, mas ela vive de maneira singular. Imagina-se estar acima dos outros (adversários a serem extirpados) e representarem a nação. Praticam a defesa das barreiras sociais, impostas como garantia da sobrevivência da autoestima. Temem a quebra da ordem na qual se equilibram, precariamente, e, por isso, pedem controle e repressão dos pobres e negros desejosos de emergência social.
Alinhados à defesa militar da “nação” (pátria armada), adotam o “moralismo” quanto aos costumes, ligado a preconceitos, à misoginia, à homofobia, ao racismo etc. Arrematam esse discurso com a defesa da “família” e o clamor pela “ordem”. O comportamento fascista não pode ser reduzido à manipulação e à cilada, mas encontra-se sim na consciência imediata e nas relações afetivas quanto ao reconhecimento ou acolhimento por gente inculta também vestida de verde-e-amarelo.
O ato de acolher expressa uma ação de aproximação, um “estar com” e um “estar perto de”, ou seja, uma atitude de inclusão social, ocorrida também em templos evangélicos, mesmo sob a cobrança de dízimos para obter essa sensação de reconhecimento individual. Essa atitude implica na busca de estar em relação presencial com muita gente parecida consigo, seja em aparência, seja em posse de poucas ideias inteligentes.
Daí a leviana substituição do Datafolha, pesquisa feita com método científico de amostragem, pelo Datapovo, visualização impressionista de manifestações de rua. Tanto à direita, quanto à esquerda, muitos imaginam essas serem decisivas para o resultado eleitoral, como a minoria ruidosa em espaços delimitados em algumas poucas metrópoles expressasse uma vontade reprimida de a maioria silenciosa gritar em praça pública. Aquela não representa esta, pelo contrário, a maioria quer paz e não violência!
Uma amostra visual é uma pequena porção de alguma coisa dada para ver, mas não é suficiente para provar ou analisar determinada qualidade do todo. A visão holista necessita de uma amostra representativa para o comportamento coletivo de todo o eleitorado ser avaliado ou julgado a priori.
Em metodologia da pesquisa quantitativa, uma amostra é um conjunto de dados coletados e/ou selecionados de uma população estatística por um procedimento definido. Como a população é muito grande, fazer um censo ou uma enumeração completa de todos os valores existentes é impossível rapidamente com poucos recursos.
A amostra geralmente representa um subconjunto de tamanho manejável. Há método científico para se fazer inferências ou extrapolações da amostra à população. No entanto, a massa ignara não o (re)conhece.
A melhor forma de evitar viés ou não representatividade, presente em manifestações de rua, é selecionar uma amostra aleatória, também conhecida como amostra probabilística. Nela, cada membro individual da população tem uma chance conhecida e diferente de zero de ser selecionado como parte dela.
A amostragem estratificada, como é a sociedade, consiste em dividir ou estratificar a população em um certo número de subpopulações. Elas deveriam não se sobreporem, de modo a extrair uma amostra de cada estrato. Mas este tipo de amostragem nem sempre é usado, quando métodos diferentes de coleta de dados são aplicados em diferentes partes da população.
Na amostra da Datafolha, a faixa até dois salários mínimos é 51%, enquanto a preferência pelo PT é 27%. Isso representa 42,2 milhões de votos. Minha “tese”, hipótese defendida com dados, é a esperada vitória de Lula, apesar da melhora do rival, se dar basicamente por causa dos pobres simpatizantes do PT. Nem todas as pesquisas eleitorais fazem amostra por partido de preferência. Um fator eleitoral decisivo é o PT ser o único partido com massa popular simpatizante. Esta é a verdadeira razão do “antipetismo”. Ressentimento.
Você conhece a música Mulheres de Atenas, de Chico Buarque? Descubra o que o autor queria realmente criticar por meio desta obra e como as cidadãs gregas, que inspiraram a composição, viviam no passado
Em primeiro lugar, precisamos nos lembrar que Chico Buarque compôs a músicaMulheres de Atenasno ano de 1976, durante o período doRegime Militar. Portanto, ele não tinha a liberdade de expressão que temos hoje.
Por isso, nem ele nem outros artistas daquela época expressavam suascríticasou opiniões abertamente, em público. Muitos deles usavam metáforas para falar do que não concordavam, fosse na sociedade ou no governo do país.
Portanto, embora em toda a música o autor conclame as pessoas a imitarem o exemplo das mulheres de Atenas, ele etá na verdade fazendo uma crítica. Ele está mostrando que, naquele momento, vivíamos em uma sociedade patriarcal em que a mulher não tinha voz nem direitos, onde seus desejos eram anulados.
Veja alguns trechos e as ideias que eles transmitem:
submissão:vivem para os seus maridos, se perfumam, se banham com leite e se arrumam; quando fustigadas não choram: se ajoelham, pedem e imploram; não têm gosto ou vontade, defeitos ou qualidades (despersonalização); têm medo, apenas; não têm sonhos, só tem presságios;
supremacia masculina:os maridos são chamados de “orgulho e raça”, “poder e força”, “bravos guerreiros”, “heróis e amantes” de Atenas;
atuação exclusivamente doméstica:quando eles embarcam, soldados, elas tecem longos bordados (inclui a noção de futilidade, já que bordado é um “enfeite”);
servidão sexual:guardam-se para seus maridos, ficam em quarentena quando eles embarcam, estão à disposição quando retornam, suportam traições;
procriam para alimentar a guerra:geram para seus maridos os novos filhos de Atenas;
sofrem perdas devido à guerra:temem por seus maridos, jovens viúvas marcadas, gestantes abandonadas, vivem o luto, se conformam e se recolhem às suas novenas;
Portanto, de forma até irônica, Chico Buarque se refere à sociedade patriarcal. Ele canta o exemplo das mulheres de Atenas mas, na verdade, está criticando um mundo em que não existe direitos iguais para pessoas de gêneros diferentes.
Porém, essa é a crítica feita no primeiro plano. Em segundo plano, temos uma ainda mais forte. Esse homem poderoso e autoritário representa também o Estado, a ditadura militar.
Veja que ele não fala para as mulheres se inspirarem nasmulheres de Atenas. O convite dele é para todos, não existe um único destinatário.
O que ele diz, com isso, é que a ditadura impunha a todos os brasileiros uma situação semelhante às das atenienses. Os cidadãos eram maltratados e não tinham o direito de chorar, não tinham gosto ou vontades. Seus sonhos haviam dado lugar aos presságios. Como canta na música, “tinham medo, apenas”.
E não é só isso: assim como a guerra, a ditadura levava maridos que lutavam pela liberdade, e que nunca mais retornavam. Quantas mulheres, nesse período, viram seus filhos serem torturados, mortos e desaparecidos depois de enfrentarem as forças de repressão? Portanto, a crítica social e política estão camufladas na letra.
Mulheres de Atenas: a História por trás da música
Vale lembrar que esse tipo de música nos faz criar paralelos entre o presente (no caso de Chico Buarque) e o passado (as verdadeiras atenienses). Então, nada melhor que descobrir como elas viviam.
Dificilmente, algumamulherda atualidade gostaria de ter vivido nasociedade grega. Existia uma distinção clara entre os gêneros, com papéis sociais e políticos muito bem definidos.
Enquanto os homens tinham acesso ao poder e à glória — eles eram os políticos, os guerreiros e comerciantes — as mulheres tinham uma vida totalmente submissa. Elas sempre ficavam sob a tutela de um membro da família do sexo masculino, fossem eles seus pais, maridos ou filhos, caso ficassem viúvas.
Mesmo dentro de casa, as meninas eram separadas de seus irmãos e permaneciam em uma área isolada da casa: ogynaikeion.Elas raramente saíam à rua e, para que isso acontecesse, deviam ser acompanhadas dos maridos ou pais, sempre vestidas da cabeça aos pés.
A mulher grega e o casamento
O único destino possível para a mulher era o casamento. Aliás, tratava-se de um dever religioso e cívico: ao formarem uma família, elas tinham o privilégio de procriar para gerar novos soldados para o país. Caso a esposa fosse infértil, o homem tinha o direito de se divorciar. Caso ela o traísse, ele poderia exigir a separação ou mesmo matar a infiel em público.
Do lado masculino, tudo era diferente. Eles não só tinham o direito de trair suas esposas, mas de manter relacionamentos extraconjugais tanto com mulheres quanto com outros homens. Aliás, o envolvimento entre um homem maduro e um jovem — uma prática chamada pederastia — era até incentivada pelasociedade.
A única outra alternativa para mulheres na Grécia era a prostituição.Sólon, um dos governantes do país, criou um dos primeiros bordéis públicos. A situação da mulher era realmente complicada. Um filósofo ateniense deixou registrado que os homens gregos tinham “cortesãs para dar prazer, concubinas para as necessidades diárias e esposas para dar filhos legítimos e guardar fielmente os lares”.
Sempre vale a pena lembrar que julgar antigas culturas e costumes a partir de nossos próprios valores não é o mais adequado. Embora algumas dessas situações sejam inadmissíveis hoje (embora algumas ainda aconteçam), é importante verificarmos que o momento histórico era outro.
Portanto, a cultura que temos hoje e a nossa compreensão desses fatos é resultado de um longo processo histórico. Os cidadãos daquele tempo não tinham os mesmos conceitos e valores que possuímos naatualidade. Portanto, suas ações refletem o que era comum, aceitável e até mesmo admirável em sua época.
Histórico de falas misóginas e sexistas começa muito antes de 2018, quando foi eleito presidente da República
por Inara Chagas /Brasil de Fato
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Mesmo antes de ser presidente da República, Jair Bolsonaro (PL) já possuía um extenso histórico de falas e ações que atacam diretamente algumas minorias, como é o caso das mulheres. A lista é composta por falas e ações envolvendo apologia ao estupro, agressão física e políticas públicas de dignidade menstrual.
Não à toa, em 2022, os atos do Dia Internacional da Mulher (8M) carregam como lema “Pela Vida das Mulheres, Bolsonaro nunca mais! Por um Brasil sem machismo, sem racismo e sem fome”, já que as falas de Bolsonaro trazidas nesta matéria também contribuíram para o cenário atual, em que mulheres ainda precisam lutar contra o machismo. Confira.
1. Histórico de violência física
Em 1998, já como deputado federal e em campanha para reeleição, Jair Bolsonaro agrediu fisicamente Conceição Aparecida Aguiar, na época gerente da Planajur, empresa de consultoria jurídica e que atendia ao Exército. Segundo o Jornal do Brasil, que apurou a agressão, Conceição foi agredida pelas costas durante uma discussão com “uma das correligionárias” de Bolsonaro.
Em 2018, durante sua campanha para a presidência da República, a matéria que relatou o caso foi encontrada no acervo digital da Biblioteca Nacional e repercutiu nas redes sociais.Questionada pela revista Piauí, Conceição afirmou que, mesmo sendo vítima de violência por Bolsonaro, ainda votaria nele, pois, segundo ela, o candidato seria o único a ter caráter.
2. Boa educação
No extinto programa da Band TV “Custe o que Custar” (CQC), Bolsonaro foi sexista e misógino. O ano era 2011, e o alvo da vez foi a cantora Preta Gil, que entrevistava o político. Na ocasião, a cantora perguntou como o então deputado reagiria se algum de seus filhos se envolvesse com uma mulher negra. “Eu não vou discutir promiscuidade com quem quer que seja. Eu não corro esse risco. Meus filhos foram muito bem educados e não viveram em um ambiente como, lamentavelmente, é o seu”, afirmou Bolsonaro.
Tempos depois, o político se pronunciou, alegando que não tinha entendido corretamente a pergunta.
A frase proferida por Jair Bolsonaro (PL) em 2014 lhe rendeu uma condenação por danos morais. Na época, em entrevista ao portal Zero Hora, Bolsonaro disse que não estupraria a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) porque ela não merecia.
“Ela não merece porque ela é muito ruim, porque ela é muito feia, não faz meu gênero, jamais a estupraria. Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não iria estuprar, porque não merece”, disse Bolsonaro.
Bolsonaro foi condenado em 2017 pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF). O então ministro do STF, Marco Aurélio Mello, manteve a condenação por danos morais, com indenização de R$ 10 mil para Maria do Rosário.
Ainda em entrevista ao portal Zero Hora, Bolsonaro afirmou que é difícil ser patrão no Brasil, com “tantos direitos trabalhistas”. “Quando o cara vai empregar, entre um homem e uma mulher jovem, o que que o empregador pensa? "Poxa, essa mulher aqui tá com aliança no dedo, não sei o quê, ela vai casar, é casada, daqui a pouco engravida, seis meses de licença-maternidade, bonito para c*, para c*, ". Quem que vai pagar a conta? É o empregador”.
Ao ser questionado sobre a situação das mulheres trabalhadoras que decidem ser mães, Bolsonaro insinuou que elas deveriam ganhar menos e, caso não estejam contentes, que busquem outro emprego.
Em 2017, durante uma palestra feita na sede do Clube Hebraica no Rio de Janeiro, Bolsonaro aumentou sua lista de frases misóginas. Ao se referir sobre o gênero de seus filhos, o chefe do Executivo proferiu: “Eu tenho cinco filhos. Foram quatro homens, aí no quinto eu dei uma fraquejada e veio uma mulher”.
Carlos Bolsonaro (Republicanos) e Eduardo Bolsonaro (PSL), políticos e filhos de Bolsonaro, afirmaram em suas redes sociais que a fala do pai não passou de uma brincadeira. Segundo o deputado federal de São Paulo, "Quando ele [Jair Bolsonaro] brinca, o pessoal do politicamente cai nele”.
6. Um novo conceito de "equilíbrio"
Em discurso feito no Dia Internacional da Mulher de 2019, já na condição de presidente, Bolsonaro afirmou que, "pela primeira vez na vida, o número de ministros e ministras está equilibrado". De 22 ministros do Executivo, Bolsonaro nomeou apenas duas mulheres: Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos) e Tereza Cristina (Agricultura, Pecuária e Abastecimento). A justificativa para considerar o número de ministras equilibrado foi a "energia” das ministras.
"Pela primeira vez na vida, o número de ministros e ministras está equilibrado em nosso governo. Temos 22 ministérios, 20 homens e duas mulheres. Somente um pequeno detalhe: cada uma dessas mulheres que está aqui equivale a dez homens. A garra dessas duas transmite energia para os demais", disse o chefe do Executivo.
7. Turismo sexual? Temos por aqui
Em mais uma fala sexista e, dessa vez, homofóbica, Jair Bolsonaro afirmou que o Brasil não poderia ser um país de turismo gay, mas que “quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher fique à vontade”.
Em resposta, várias entidades, organizações e estados brasileiros se manifestaram repudiando a fala do presidente. Cleone dos Santos, da Marcha Mundial de Mulheres e coordenadora do grupo Mulheres da Luz, na época,afirmou que a fala foi um retrocesso. “Temos uma luta histórica contra o turismo sexual e hoje temos um presidente da República desconstruindo isso. É o maior retrocesso que já vivemos”.
Em fevereiro de 2020, Bolsonaro se pronunciou sobre o depoimento de Hans River do Rio Nascimento para a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das fake news. Hans, ex-funcionário da empresa Yacows, afirmou que a jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de São Paulo, teria oferecido relações sexuais em troca de informações.
Ao se pronunciar sobre o caso, Bolsonaro disse: “Ela [Patrícia] queria um furo. Ela queria dar um furo a qualquer preço contra mim", utilizando a expressão “dar o furo” com duplo sentido. O chefe do Executivo foi responsabilizado pelo ato, sendo condenado a pagar R$ 20 mil para a jornalista, por danos morais.
Além de falas machistas por parte de Bolsonaro, temos a sua atuação política, que também ataca pessoas que menstruam. Em 2021, o presidentevetou trecho de uma lei que distribuiria absorventes de forma gratuita para pessoas em vulnerabilidade social. Segundo o chefe do Executivo, não havia previsão orçamentária no Projeto de Lei para custear a medida. Meses depois, no Dia Internacional da Mulher de 2022, Bolsonaro sancionou um decreto viabilizando a ação.
Embora o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual (lei 14.214) tenha sido aprovado, houve repúdio por parte da sociedade civil pelo veto ao artigo. Isso porque a proposta (PL 4.968/2019), da deputada federal Marília Arraes (PT-PE), era de combater a precariedade menstrual, ofertando gratuitamente absorventes higiênicos para estudantes de baixa renda em escolas públicas, além de mulheres em situação de rua ou vulnerabilidade social extrema e privadas de liberdade.
Em entrevista à Imprensa SMetal, a socióloga e especialista em psicopedagogia, Carolina Canon, comenta sobre como o "ser mulher" foi decisivo para as violações dos direitos humanos na Ditadura Militar
Foi em um 31 de março que o Brasil dormiu em um regime democrático e acordou com uma ditadura que perseguiu, torturou e matou centenas de pessoas, entre de 1964 e 1985, incluindo jovens, mulheres e crianças. Há 57 anos, era instaurado o regime militar no país e, até os dias de hoje, há discussões sobre as violações gravíssimas aos Direitos Humanos registradas no período.
Nessa esteira, as mulheres fazem parte de um grupo que, além de suportar as violências à carne, precisaram se deparar com violações de gênero. O estupro e os abortos causados pelas inúmeras torturas, são a ponta de um iceberg muito maior do que isso. Para dar conta da questão, o Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (SMetal) conversou com a socióloga e especialista em psicopedagoria, Carolina Canon, para abordar ponto a ponto a questão.
Confira entrevista na íntegra:
SMetal: Durante o período do regime militar, a questão de gênero foi usada como uma das formas de tortura. Sociologicamente, como podemos entender esse “fenômeno”?
Carolina: Historicamente, os papeis de gênero nas sociedades ocidentais são pautados por estruturas patriarcais. Não é à toa que, somente a partir da década de 1960, com intensificação das lutas do movimento feminista em diversos lugares do mundo, a própria classificação “feminino” e “masculino” mudou de caráter e passou a ser conceitualizado, de fato, enquanto gênero, termo que evidencia a construção social acerca dos papeis desempenhados por homens e mulheres, e não mais como sexo, orientado por determinismos biológicos. Sob a ótica da Sociologia, essa distinção opressora entre papeis de gênero – e aqui me refiro a aspectos relacionados exclusivamente à binaridade – é constructo de séculos de exercício de funções sociais diferentes que, via de regra, colocavam e colocam a mulher em posição de subalternidade em relação ao homem, ou seja, as construções simbólicas, culturais, morais e políticas acerca do padrão comportamental dos sujeitos na vida social significaram o feminino como algo menor, quase irrelevante diante da vida pública e por isso mesmo de natureza exclusivamente privada, pertencente aos domínios domésticos e de propriedade – aspecto extremamente importante - do masculino.
Pierre Bourdieu, sociólogo francês, em sua obra A dominação masculina, conceitua muito bem a dimensão da violência simbólica que existe nas sociedades de estruturas patriarcais para com o gênero feminino: Espera-se do sujeito masculino, o homem cisgênero e heterossexual, que ele tenha o Capital (capital econômico, social, cultural e simbólico) maior que o do sujeito feminino, a mulher cisgênero e procriadora; graças à naturalização da dominação masculina na sociedade; em função disso, o status de propriedade privada do homem é atribuído à mulher, condição que demostra o porquê, até hoje, a violência sexual representa um significativo instrumento de violação da figura feminina como tentativa de restabelecer essa suposta ordem natural da vida social.
A ditadura civil-militar no Brasil, através das figuras algozes de seus torturadores, usou amplamente não só do estupro, mas também da brusca separação dos filhos e filhas de suas mães militantes, no intuito de, mais do que puni-las por seus comportamentos subversivos, faze-las exemplos para outras mulheres que pudessem insurgir contra o Estado, na tentativa de suprimir qualquer tipo de mudança, tanto ao que dizia respeito ao regime totalitário instaurado, quanto a esta pseudo-naturalização de papeis femininos e masculinos na vida social.
SMetal: Alguns especialistas acreditam que as violências sexuais são uma forma de “relação de poder”. Você acredita nisso? Se sim, por quê?
Carolina: Sim, acredito. Nesse aspecto eu sou absolutamente foucaultiana, a normatização da sexualidade é um dos alicerces da biopolítica ou do biopoder no sentido de domesticar e controlar os corpos dos indivíduos, torná-los dóceis e produtivos, de modo a perpetuar as estruturas sociais hegemônicas e vigentes. Sob esta ótica, as violências de ordem sexual cometidos contra os corpos e identidades femininas traduzem e materializam a biopolítica aplicada aos nossos corpos, porque não são motivadas por desejos e instintos de caráter sexual, mas sim intentam disciplinar através da força física e do ato de dominar e subjugar nossos corpos. Sendo assim, a prerrogativa de que as violências de natureza sexual são uma forma de expressar as relações de poder vigentes é válida, uma vez que o efetivo exercício deste poder sob os indivíduos vinculados ao gênero feminino em nossa sociedade se dá através dicotomia domesticação-punição, já que expressam a configuração das forças sociais, políticas, econômicas, simbólicas e culturais moralmente articulas e que se destinam a disciplinarização dos corpos e mentes femininos.
SMetal: Hoje em dia, as formas de cerceamento do corpo da mulher estão em um novo contexto. Como podemos associar os dias de hoje com o período do regime militar?
Carolina: Para que possamos fazer tal associação, é importante demarcarmos os limites entre os campos da vida social. Apesar de, no Brasil, os domínios daquilo que compete ao Público e ao Privado não serem claros em nosso imaginário coletivo, apesar do brasileiro ser o homem cordial, para citar o grande sociólogo e historiador brasileiro Sérgio Buarque de Holanda; é fundamental que separemos, como modalidades organizativas da vida social, o campo do Público, o campo do Privado e ao campo do Público-Privado, uma espécie de estagio intermediário, em razão de aspectos jurídico-normativos, de modo que tal associação seja o mais objetiva possível.
É inegável que nós mulheres rompemos muitos paradigmas sociais, às custas de muito sangue, suor e lágrimas, conquistamos espaços e direitos que, há pouco mais 50 anos atrás seriam impensáveis; no entanto, há muito ainda para se avançar. No que concerne ao campo Público, o Estatuto da Mulher Casada, restituiu à figura feminina certa autonomia quanto às garantias civis, no entanto foi apenas com a Constituição de 1988 que nós mulheres passamos a gozar plenamente de toda a gama da direitos e tivemos o reconhecimento do Estado de sua condição de igualdade em relação ao sexo masculino, ao menos no que concerne à lei.
Maria Auxiliadora Lara Barcelos, conhecida como Dora, foi presa em 1969 e estuprada no quartel da Polícia do Exército, na Vila Militar
Quanto ao exercício de nossa liberdade na vida social, pouca coisa efetivamente mudou. A revolução sexual, característica da luta feminista no mundo, alterou alguns aspectos do padrão comportamental feminino aqui no Brasil também, porém, percebo certo anacronismo social ao analisar a condição da mulher nos dias de hoje, ao mesmo tempo em que conquistamos do direito de trabalhar fora do ambiente doméstico sem necessitarmos da anuência de nossos pais, maridos e companheiros, o que temos hoje é a estatística de que nossas jornadas de trabalho semanais são, em média, de 8 horas a mais que os homens, porque além de trabalharmos fora de casa, notório espaço da vida Pública , continuamos a ser as principais responsáveis pelas tarefas do campo da vida privada (afazeres domésticos, educação e cuidados dos filhos), ainda enfrentamos em entrevistas de empregos perguntas relacionadas ao estigma da maternidade inerente, do tipo “você tem filhos? Pretende ter? Se adoecerem, quem cuidará?” e mesmo quando conquistamos a vaga de emprego, ganhamos, em média, 30% menos que um homem no mesmo posto. Ou seja, em termos de prática social, nós mulheres apenas acumulamos funções, conjuntura que destoa da condição de igualdade social, ao contrário, amplia ainda mais a desigualdade, quase abissal, entre gêneros no Brasil.
Mas a evidência mais emblemática deste anacronismo social e exatamente o que associa os dias atuais com a ditadura civil-militar, é o posto que Brasil ocupa no ranking de feminicídios mundial: somos o quinto país que mais mata mulheres no mundo, apenas pelo fato de serem mulheres, e cerca de 70% destes crimes são cometidos em ambiente doméstico, isto é, no campo da vida Privada.
A atual figura, que ocupa o mais alto cargo executivo neste pais, sustenta através de seu discurso e de muitas ações também, quando nomeia para cargos ministeriais figuras alinhadas ideologicamente com seu modelo conservador e autoritário de gestão, a perpetuação desta lógica e violência sociais e de todas as estruturas que as mantém ativas até hoje, tal qual o regime militar operava naquela época, com a diferença de que hoje, em termos legais, esta prática é condenável e durante a ditadura civil-militar fazia parte do modus operandi do regime. A narrativa, o discurso do presidente legitimam ações dessa natureza no campo do Público-Privado, que configuram as relações entre indivíduos que não possuem vinculo parental, mas que expressam em suas práticas os valores morais vigentes na sociedade, é neste ponto que reside a inegável semelhança entre contexto social da ditadura e dos dias atuais: a violência contra a mulher, principalmente aquelas que envolvem a subjugação e objetificação de nossos corpos, mais do que atos físicos e materiais, tem uma dimensão simbólica, cuja efetivação independente de sujeitos femininos ou masculinos, mas se configura enquanto patologia estrutural da nossa sociedade, de modo a buscar o reestabelecimento de uma ordem moral opressora sobre o corpo feminino.
Inês Etienne Romeu foi a única sobrevivente da 'Casa da Morte', lá foi submetida as mais diversas formas de abuso físico e sexual
SMetal: Na sua visão, qual a importância da comissão nacional da verdade para os esclarecimentos?
Carolina: No meu ponto de vista, a importância da comissão nacional da verdade é de ordem histórico-social e de natureza jurídico-legal. Em relação ao aspecto histórico-social, é fundamental para que se preserve a memória da barbárie que foi a Ditadura Civil-Militar, no sentido de que não se repita e que as gerações futuras sejam formadas a partir de valores sociais opostos e divergentes aos que os regimes políticos totalitários e autoritários pregam. Do ponto de vista jurídico-legal, sua importância reside em investigar, esclarecer e responsabilizar os agentes do estado que torturaram, mataram e desapareceram com muitos militantes contrários ao regime, além de garantir as famílias dessas vítimas o direito de enterrarem seus mortos de verdade com todos os ritos e simbologia que esta ação carrega, a fim de encerrar a expiação que a dúvida carrega.
Falta de gov virou tragédia natural, chuva de santos juninos q erraram o mês. Quem constrói casa em local de risco simplesmente não quer ser morador de rua, sem teto e outras nefastas condições marginais, precárias, instáveis, de quem vive fora, à margem da sociedade
Andre Bernard
Como superar? De novo. Como não se angustiar? De novo. Como a gente recomeça? De novo. A sociedade civil faz o que pode, os governos farão?! Onde a gente tira forças? De novo. #chuvaspetropolis
Rosana fernandes
Bom dia!
Ednei Gomes
flaviahartmann
Bom dia, dia todas as vidas importam cuidem-se continuem usando máscaras Arte: Judith Ploberger
Martalene Nascimento
Natália Bonavides
Minha solidariedade às famílias das vítimas deste projeto genocida de governo.
Eles Poderiam Estar Vivos
Acabamos de tirar essa foto, em um viaduto na avenida Rebouças, em São Paulo. Mais uma vítima desse governo assassino. ELA PODERIA ESTAR VIVA!
Ela falou do movimento RPM, Raquel, Priscila e Marília, ou seja, especulações de como seria a chapa Raquel Lyra (Governadora), Priscila Krause (Vice) e Marília Arraes (Senadora). A deputada estadual disse que ainda não decidiu em que partido irá se filiar. Veja no Giro.
Harlen Carvalho
Lenio Luiz Streck
Manchete-bomba: AGU vai ao STF para defender Telegram! Pois! E ainda se diz que AGU é advocacia de Estado e não de governo! Tudo auto explicativo!
Neste mês em que celebramos conquistas das mulheres, tivemos aqui no Brasil demonstrações ultrajantes do quanto regredimos em respeito às nossas lutas e reivindicações. E aqui peço licença ao leitor para me incluir no texto como sujeito do coletivo maior: mulheres que lutam para ocupar espaços em sociedades ainda marcadamente patriarcais.
O tratamento degradante a nós dirigido vem do mesmo caldo onde fermentam Bolsonaro e outras figuras repulsivas, como o deputado paulista que escarneceu de refugiadas de guerra, na Ucrânia, e o Procurador-Geral da República. Augusto Aras disse o que entende por liberdade de escolha para as mulheres: nós podemos decidir a cor do esmalte e o sapato que queremos usar.
O discurso do PGR, recendendo a bolor e ranço machista, ignora o direito de escolha que realmente nos interessa: a autonomia sobre nossos corpos para decidir quando e como ser mãe. Nesse sentido, o Brasil está na contramão de importantes vizinhos. A chamada “maré verde” começou com a Argentina (2020) e expandiu-se com o México (2021) e a Colômbia (fevereiro/2022).
As instituições desses países deixaram de considerar o aborto crime, em diferentes fases da gestação, dando às mulheres condições de interromper a gravidez de forma segura, no sistema público de saúde, não sozinhas e desesperadas em clínicas clandestinas, onde muitas encontram a morte. No Brasil, o aborto só é permitido em caso de estupro, risco à vida da mãe e quando o feto não tem cérebro (anencéfalo). São condições que não dão conta da nossa realidade.
A mescla, proposital e nefasta, entre política e religião, estimulada por Bolsonaro e sua base fundamentalista e argentária, contamina o debate e trava qualquer avanço legislativo que nos permita escapar do risco de prisão, sequelas ou morte diante de uma gravidez indesejada. É por isso que temos que continuar a gritar alto e bom som: “Tirem os seus rosários dos nossos ovários!”.