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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

15
Jan24

Os militares legalistas que, sob riscos, resistiram aos intentos políticos de Jair Bolsonaro

Talis Andrade

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Apartado de bajulações de outros militares, o ex-comandante do Exército, Edson Pujol, não acatou à politização bolsonarista – Foto: Marcos Corrêa/PR/Flickr

 

A única coisa positiva do governo Bolsonaro foi a política de que não existe a farsa das forças armadas constituírem um poder moderador da República, notadamente o Exército. O capitão Jair Bolsonaro dobrou os ímpetos de rebeldia, de insurreição, por acaso existentes dos generais, brigadeiros e ministros, e o natural comando do Presidente da República Federativa do Brasil ficou mais forte no dia 8 de janeiro de 2023 com a derrota do golpe intentado por Bolsonaro e militares corruptos e anarquistas e terroristas da extrema direita.

  1. Os Comandantes das Forças Armadas que pediram demissão
Os comandantes das Forças Armadas Edson Pujol do Exército, Ilques Barbosa da Marinha e Antônio Carlos Moretti Bermudez da Aeronáutica – Foto: Agência Brasil

 

Em março de 2021, em meio à pandemia e na véspera dos 57 anos do golpe da ditadura militar, os três comandantes das Forças Armadas pediram a renúncia conjunta por discordar de Jair Bolsonaro, que cobrava deles manifestações políticas favoráveis e apoio para decretar “estado de Defesa” no país para impedir lockdowns.

À época, Bolsonaro falou que “meu Exército” não permitiria as restrições de circulação, determinadas pelos governadores com aval do Supremo Tribunal Federal (STF), que havia permitido a autonomia para os entedes federativos determinarem medidas de segurança contra a disseminação do Covid-19.

A medida ocorreu, ainda, um dia após a demissão do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, que era visto pelos comandantes das Forças Armadas como um bom interlocutor discreto dos militares com o governo.

Azevedo e Silva colocou o cargo à disposição de Bolsonaro, a pedido do próprio ex-presidente, anunciando em nota que havia “preservado” as Forças Armadas “como instituições de Estado”. Durante os dois anos em que esteve na pasta, tentava equilibrar e minimizar falas de Bolsonaro sobre rupturas institucionais e politização e radicalização das tropas.

No lugar de Fernando Azevedo e Silva, Bolsonaro escolheu o general Braga Netto para assumir a Defesa, um dos militares mais linhas-dura do governo Bolsonaro e seu principal aliado.

Foi a primeira vez desde a ditadura militar que os três comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica deixavam o cargo, ao mesmo tempo, sem ser em troca de governo.

Um dos que pediram demissão, o comandante do Exército, Edson Pujol, afirmou, em novembro de 2020, que os militares não queriam “fazer parte da política”, “muito menos deixar a política entrar nos quartéis”.

Dias antes, Bolsonaro afirmava em tom de ameaça e uso de força autoritária para aplicar medidas de seu interesse, que “quando acaba a saliva, tem que ter pólvora”, sobre “defender a Amazônia” de pressão internacional contra o desmatamento.

Dois dias depois, os comandantes Ilques Barbosa da Marinha e Antônio Carlos Moretti Bermudez da Aeronáutica também emitiam nota, juntamente com Pujol, afirmando a separação entre as Forças Armadas e a política.

“A característica fundamental das Forças Armadas como instituições de Estado, permanentes e necessariamente apartadas da política partidária, conforme ressaltado recentemente por chefes militares, durante seminários programados, é prevista em texto constitucional”, afirmava.

  • Onde estão

Fernando Azevedo e Silva (ex-ministro da Defesa):

Após deixar o Ministério da Defesa, Azevedo foi convidado por diversos ministros do STF e do TSE a assumir a Diretoria-Geral do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ao final de dezembro de 2021.

Ele chegou a participar de uma reunião de transição do Tribunal, com o então presidente da Corte, Luis Roberto Barroso, o futuro presidente do TSE, Edson Fachin, e o futuro presidente do STF, Alexandre de Moraes.

Já preparados para o flerte golpista e o questionamento incisivo de Bolsonaro sobre as urnas eletrônicas, o objetivo dos ministros era neutralizar contestações aos resultados das urnas, ao ter como chefe do TSE um militar e ex-ministro da Defesa de Bolsonaro.

“Como ministro da Defesa, eu representava as três Forças, que são instituições de Estado. As eleições e a Justiça das eleições, o TSE, também representam o Estado brasileiro. Não tem partido político representando. Não tem uma maioria, uma minoria”, disse o próprio militar, durante um encontro com representantes do IREE (Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa).

Em dezembro, Azevedo falava ter aceitado o cargo, que assumiria em fevereiro de 2022. Naquele mês, contudo, disseminava-se publicamente o relatório das Forças Armadas questionando a segurança das urnas. Com receio, o militar recolheu-se, negou o convite alegando “questões pessoais de saúde e familiares” e decidiu manter discrição como militar da reserva, desde então.

Edson Pujol (ex-comandante do Exército):

General do Exército, Pujol manteve a discrição após deixar o comando da Força. Em novembro de 2022, a equipe de transição do governo Lula convidou o militar a integrar o grupo de trabalho da Defesa, em um aceno do presidente eleito a se aproximar e estabelecer pontes com as Forças Armadas. Pujol não integrou a transição do governo Lula.

Ilques Barbosa (ex-comandante da Marinha):

Sem nenhuma aparição pública desde a sua demissão, o Almirante de Esquadra é, desde agosto de 2023, coordenador de Relações Institucionais e de Desenvolvimento de Novos Negócios do Cluster Tecnológico Naval do Rio de Janeiro, uma associação sem fins lucrativos com atuação em tecnologia e engenharia naval.

Antônio Carlos Moretti Bermudez (ex-comandante da Aeronáutica):

Assim como Pujol, Bermudez manteve a discrição e o Tenente-Brigadeiro não teve aparições públicas após a sua demissão.

 

  1. O general demitido do setor de controle de armas
Eugênio Pacelli – Foto: Divulgação Exército

 

Final de março de 2020, no segundo ano do governo de Jair Bolsonaro, o general responsável pelo controle de armas, diretor de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército, Eugênio Pacelli Vieira Mota, foi demitido após publicar uma importante portaria que ajudava a rastrear munições.

Reportagem de O Globo, da época, mostrava uma carta em que Pacelli pedia “desculpas” se “por vezes não atendi interesses pontuais”. “Não podia e não podemos: nosso maior compromisso será sempre com a tranquilidade da segurança social e capacidade de mobilização da indústria nacional”, escrevia o general.

As portarias de restrição de armas publicadas pelo militar foram revogadas por Jair Bolsonaro, ao mesmo tempo que o então presidente editava dezenas de outras flexibilizando a fiscalização e o porte de armas no país.

Onde está

À época, o Exército negava que a demissão tinha relação com a revogação da portaria. Em 2020, Pacelli estava no quarto ano como general da brigada, visando a promoção a general da divisão. Como foi demitido e não foi promovido, ele automaticamente entrou para a reserva do Exército.

Pouco tempo após ser demitido, Pacelli ainda passou pela chefia da Comunicação Social do vice-presidente Hamilton Mourão. Desde então, não ocupou outro cargo da administração pública e se mantém na reserva.

 

  1. O Almirante da Anvisa
Antonio Barra Torres – Foto: Agência Senado

 

Contra-almirante da reserva da Marinha, Antonio Barra Torres foi escolhido em 2020 por Jair Bolsonaro para assumir o comando da Anvisa porque ele já ocupava um cargo de diretor no órgão desde agosto de 2019, naquele ano já indicado pelo ex-presidente, e porque além de militar, é médico de perfil conservador.

Vestindo a camisa do órgão durante todo o ano, começou a confrontar o seu superior hierárquico, Jair Bolsonaro, por seus conhecimentos na área, com as disseminações anti-vacina e a favor de medicamentos contra a Covid-19 do mandatário.

O confronto do chefe da Anvisa veio, de maneira mais explícita, com uma nota, em tom pessoal, divulgada em janeiro de 2022, cobrando a retratação do então presidente por insinuações contra a Agência em liberar a vacinação infantil contra a Covid.

À época, Bolsonaro questionou “qual interesse da Anvisa por trás” da liberação da vacina. “Se o senhor dispõe de informações que levantem o menor indício de corrupção sobre este brasileiro, não perca tempo nem prevarique, senho presidente. Determine a imediata investigação policial sobre a minha pessoa. Agora, se o senhor não possui tais informações ou indícios, exerça a grandeza que o seu cargo demanda e, pelo Deus que o senhor tanto cita, se retrate. Estamos combatendo o mesmo inimigo e ainda há muita guerra pela frente”, escrevia Torres.

Onde está

Por ser um cargo de agência nacional, sabatinado pelo Congresso Nacional, o mandato de presidente da Anvisa dura 4 anos, iniciando-se ao final do governo anterior e terminando na metade do mandato do sucessor. Assim, a Presidência na Anvisa termina em dezembro deste ano e Torres ainda permanece no cargo.

 

  1. Militares fora dos holofotes
Gen Fernando José Sant’Ana Soares e Silva – Foto: Divulgação/Exército

 

Mais distantes dos holofotes por não protagonizarem embates maiores de manchetes de jornal, outros militares foram considerados decisivos por adotarem posturas legalistas durante os intentos de Jair Bolsonaro de politizar as Forças Armadas.

Durante a demissão dos comandantes gerais das Forças Armadas e do ex-ministro da Defesa, em 2021, não somente Pujol, mas uma parte do Alto Comando do Exército, formado por 16 generais de 4 estrelas que comandam diferentes frentes do Exército, não ficaram satisfeitos com a demissão do então ministro da Defesa e concordaram, junto aos comandantes das Forças Armadas, que a demissão deles seria a resposta dos militares de que não iriam aderir à politização ou a ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF) à época.

É o caso de alguns dos 15 generais do Alto Comando do Exército de 2020, como o Chefe do Estado-Maior do Exército, Fernando José Sant’Ana Soares e Silva, o Secretário de Economia e Finanças (SEF), Sérgio Da Costa Negraes, ambos que ainda se mantêm nos mesmos postos, e o então Comandante de Operações Terrestres (COTer), José Luiz Dias Freitas, assim como o então comandante da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), Paulo Roberto Rodrigues Pimentel.

O general Negraes foi Secretário de Segurança Presidencial da ex-presidente Dilma Rousseff e comandou diversas operações, como a Samaúma, de combate ao desmatamento ilegal na Amazônia, na atuação junto às forças de seguranças para a greve dos caminhoneiros em 2018, e nas ações do Exército para o enfrentamento da Covid-19. Manteve-se distante de posturas políticas e não cedeu a gestos de apoio golpista.

Também ainda no cargo, após a tentativa de golpe em 8 de janeiro de 2023, o Chefe do Estado-Maior do Exército, general Fernando José Sant’Ana Soares e Silva, narrou em entrevista que “não houve uma única unidade [do Exército] sublevada” a cometer golpe de Estado e afastou a acusação de que a Força teve essa intenção. Admitindo que os militares foram “totalmente capturados pelos assuntos políticos” e “tragados pela percepção do golpismo”, rechaçou possibilidades de envolvimento político.

Chefe do COTer, o general Freitas era reconhecido por ser ativo em suas redes sociais, já no governo de Jair Bolsonaro, sem nunca publicar manifestações políticas ou partidárias, apenas de assuntos relacionados ao Exército e ao Comando. De acordo com o colunista Marcelo Godoy, ele recebeu o convite direto do general Braga Netto, que assumiu a Defesa após a caída de Azevedo, para o cargo máximo de comando do Exército.

Ele negou, alegando que não se sujeitaria a caprichos de Bolsonaro. Um mês depois, Freitas foi afastado da atuação militar, passou para a reserva e foi viver no interior do Paraná com serviço voluntário.

Já Pimentel, o comandante das Agulhas Negras, em determinado episódio de motociata de Bolsonaro no Rio de Janeiro, em agosto de 2021, negou a entrada do ato do presidente na Academia. Outros militares sugeriram que a moticiata do mandatário fosse concentrada fora dos muros da Aman, o que foi aceito. A solução à negativa teria salvado a carreira de Pimentel, que foi promovido em 2022 a 3ª Divisão do Exército, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul.

08
Out23

Reinaldo Azevedo contra "o golpismo de gravata"

Talis Andrade
 
Reinaldo Azevedo no Reconversa com @WalfridoWarde
 
 
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8 DE JANEIRO: "Eu adverti o governo do DF no dia 7 que aquela gente era criminosa e iria invadir os Poderes; isso está documentado". 
 

O setor lixo da imprensa fez parceria informal c/ o esgoto bolsonarista p/ tentar vincular gov. Lula a Hamas. VAMOS À MEMÓRIA??? 1) Bolsonaro recebeu Beatrix von Storch, chefe de partido neonazista e neta do mais longevo ministro de Hitler. Mesmo depois do suicídio do ...
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Reinaldo Azevedo
... genocida, ele tentou criar enclave nazista no norte da Alemanha. 2) Bolsonaro recebeu apoio de “ex-líder” da KKK, chefe real da seita; 3) um dos governantes mais próximos de Bolsonaro é o húngaro Viktor Orbán, antissemita fanático. Querem continuar? A memória instrui.
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Reinaldo Azevedo no UOL

Enfraquecimento do STF só serve aos fascistoides 

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Imagem: Gustavo Maia

Depois do 8 de janeiro, quando assistimos ao ataque da horda vestindo camiseta amarela, é chegada a hora de considerar outras formas de ser do golpismo. Pode, por exemplo, se apresentar de gravata. Dois eventos nesta quarta merecem ser vistos mais de perto.

O primeiro: David Alcolumbre (União-AP), que preside a CCJ do Senado e é a verdadeira mão que balança o berço de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que o sucedeu no comando da Casa, quer voltar ao posto em fevereiro de 2025 — ainda está longe, mas essa gente é precavida. E transformar o Supremo em alvo é uma de suas ferramentas para atingir tal intento.

O segundo evento: o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), participou de uma homenagem aos 35 anos da Constituição e defendeu que cada Poder se mantenha nos seus limites constitucionais. Parte da imprensa sustentou — já com a boca torta de tanto usar o cachimbo da porrada — que se tratava de um "recado" ao tribunal. Não me parece. Fato: uma cadeia de porra-louquices fez o deputado parecer um moderado. E isso nos relata um tanto do atual estado de coisas.

 

ALCOLUMBRE
Falemos de Alcolumbre. Presidiu o Senado em 2019 e 2020 e não pôde se recandidatar para a função porque a Constituição veda a recondução de um parlamentar ao mesmo cargo da Mesa por dois biênios seguidos numa só legislatura. Pacheco e Lira completarão dois mandatos seguidos porque os exerceram nos dois anos finais de uma legislatura e nos dois iniciais de outra. Aí pode.

O político do Amapá, que sempre foi a sombra mais do que consentida de seu sucessor, quer voltar a ser o titular do cargo também de direito, não só de fato. E resolveu fazer mais do que política de boa vizinhança com o bolsonarismo. Está mesmo decidido a ganhar o seu podre coração. E tem conseguido. É um mestre do jogo ambíguo: caso se arranje com a "reacionarada", tentará transformar a candidatura em fato consumado, buscando impor-se também à base governista. Um verdadeiro pacificador, não é mesmo? Inclusive quando indica ministros...

E eis, então, que o homem resolveu voltar suas armas contra o STF. Nesta quarta, numa votação-relâmpago, de espantosos 42 segundos, a CCJ aprovou uma PEC do senador morista-bolsonarista Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), que impõe limites a decisões monocráticas dos magistrados e uma disciplina para a devolução de votos-vista. A estrovenga passou pela CCJ, embora seja inconstitucional. Afinal, um Poder não pode regular a rotina de funcionamento de outro. Trata-se de matéria prevista no Regimento Interno daquela Casa de Leis, que foi recepcionado pela Constituição de 1988.

De resto, ainda que o troço fosse aprovado e que não tivesse a inconstitucionalidade declarada, versaria sobre matéria já arbitrada pela própria Corte, que impõe mais celeridade do que a porcaria aprovada na comissão. Não tem grande importância nem acho que prospere. O que se quis mesmo foi um pretexto para arreganhar os dentes para o tribunal, além de dar piscadelas à extrema-direita.

 

OUTRAS INICIATIVAS
Outras iniciativas estão em curso, com o apoio de alguns bocós na imprensa que, não sendo extremistas de direita, são idiotas o suficiente para tratar os 11 magistrados o fator de desestabilização da democracia. O presidente do Senado resolveu apresentar uma PEC criminalizando o porte de droga, não importa qual, porque disse que os ministros estariam usurpando o papel dos parlamentares ao definir uma quantidade de maconha que caracterizaria tráfico. Para lembrar: a Lei 11.343 prevê cadeia apenas para o traficante, não para o consumidor. Ocorre que as evidências apontam que, na prática, o preto e pobre vai em cana porque quase sempre é considerado traficante, mesmo quando consumidor; o rico endinheirado se safa porque é quase sempre considerado consumidor, mesmo quando traficante. Será que juízes não devem se ocupar da questão?

Há mais: um certo Plínio Valério (PSDB-AM) não parece estar especialmente preocupado com a tragédia da seca e do desequilíbrio climático que castiga seu Estado. Tem outras ocupações. Quer uma emenda que defina um mandato de oito anos para os membros da Corte. Já escrevi aqui os sobre efeitos deletérios que teria um troço como esse. O atual presidente do Senado, que fala pelo ex, não pensa assim.

Roberto Barroso assumiu o comando do Supremo na quinta, 28 de setembro. Na segunda, 2 de outubro, lá estava o presidente do Senado a anunciar apoio à tese do mandato, como se o Brasil fosse uma dessas sólidas democracias parlamentares europeias. Numa entrevista, engrolou:

"Bom, essa é uma tese que eu já defendi publicamente. Continuo a defender. Acho que seria bom para o Poder Judiciário, para a Suprema Corte do nosso país. Seria bom para a sociedade brasileira termos uma limitação do mandato de ministro do Supremo. Agora que já resolverá a segunda vaga de responsabilidade do presidente Lula, eu acho que preenchida essa vaga, é o momento de nós iniciamos essa discussão no Senado Federal e buscarmos a elevação da idade mínima para ingresso no Supremo Tribunal Federal, a fixação de mandato na Suprema Corte, no tempo também que dê estabilidade jurídica até pra formação da jurisprudência do país. Essa é uma tese aplicada em outros países do mundo. É uma tese defendida por diversos segmentos, inclusive por ministros e ex-ministros do Supremo Tribunal Federal, e eu acho que é uma tese possível de ser debatida e discutida no Senado Federal"

No dia 27 do mês passado, em sessão garbosamente conduzida por ele, seus pares aprovaram o despudorado projeto de lei, que já havia passado pela Câmara, que define o marco temporal para a demarcação de terras indígenas, além de expor as áreas já demarcadas ao risco de exploração econômica mesmo sem a concordância dos ocupantes originários. O STF já havia decidido, por nove votos a dois, que o marco é inconstitucional. A aberração aprovada consegue ser ainda pior.

 

NO PAU DE ARARA
Há uma óbvia aliança de bolsonaristas e moristas -- estes especialmente espalhados na imprensa --, organizados e conjurados para atacar o Poder de toga. Afinal, as primeiras condenações pelos atos golpistas estão em curso; todos sabem que Bolsonaro está na fila e que os crimes da dita força-tarefa começam a vir à superfície. Assim, a canalha precisa testar se o ódio que os sectários do dito "Capitão" devotam a pelo menos nove ministros se expande além da bolha. É nessas horas que entram os oportunistas, com suas alianças episódicas.

Alcolumbre é poderoso, influente, mas está longe de ser o rei da popularidade entre os pares. Tenta se garantir com os bolsonaristas porque estes podem dar tração à sua candidatura; com eles, buscará se impor como fato consumado à base aliada. E, no melhor dos mundos, ainda posará de pacificador. Nem precisará de um Rogério Marinho (PL-RN) para vocalizar as pautas dos reaças. Estes, por sua vez, têm a esperança de que um tribunal eventualmente mais enfraquecido possa poupar Bolsonaro. O senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) sonha até com a anistia. Outro dos delírios em voga, que tem um deputado como porta-voz — Domingos Sávio (PL-MG) — é transformar o Congresso em instância revisora do Supremo...

 

AINDA FALTA ARTHUR LIRA
O presidente da Câmara, que prefere terçar armas com o Executivo, não com o Judiciário, se disse contrário à tese do mandato. Disse que aceita debater a limitação de decisões monocráticas, mas não mandato. Discursou nesta quarta em homenagem aos 35 anos da Constituição. Afirmou:

"A Constituição passou por várias emendas, mas preservou, lógico!, a sua essência. É útil, é pioneira e é desbravadora. Ilumina, ainda hoje, os caminhos por onde cada um dos integrantes deste Parlamento pode trilhar. Estabelece as balizas que delimitam o campo de ação de cada um dos Poderes do Estado, e é importante, sempre, que nós saibamos nos conter, cada Poder desta nação nos seus limites constitucionais. E eu tenho absolutamente certeza de que o Parlamento brasileiro os obedece, os cultiva e os respeita"

Não me parece, à diferença do que se tem dito por aí, que esteja, ele também, "mandando recados" ao Judiciário. De saída, rechaça a bobagem do "Congresso como revisor do STF". E já se sabe que não está disposto a flertar com mandatos para ministros. O que estou dizendo, meus caros, é que, dado o surto que toma o Senado, com as ambições fora do controle, o presidente da Câmara surge, na comparação ao menos, como um pacificador. E isso só chama a atenção para a figura de Pacheco como aquele destinado a ser o que efetivamente não foi. Ou que não foi o que poderia ter sido.

10
Set23

Esposa de Mourão aparece em folha de pagamento vinculada ao exército

Talis Andrade

 

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Filha e sobrinha do general Eduardo Villas Bôas também estão na lista da Poupex militar enquanto aguardam pensão de filha

 

A esposa do general e senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), uma filha e uma sobrinha do ex-comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, aparecem na folha de pagamento de uma associação privada ligada ao Exército, a Poupex, segundo informa o Uol.

Um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), divulgado em maio deste ano, aponta a existência de "indícios contundentes" de nepotismo. Ao todo, foram identificados 221 casos de parentesco entre contratados da Poupex e integrantes das Forças Armadas.

"Os dados analisados permitem concluir que se encontram presentes fortes indícios de que a existência de relação laboral com o Exército, com o MD (Ministério da Defesa) ou com as demais Forças ou de parentesco com membros do conselho de administração, da diretoria e com militares do Exército são fatores possivelmente relevantes para se determinar o êxito na tentativa de se conseguir emprego na Poupex. Neste contexto, aparentemente tem relevância o nível hierárquico ocupado pelo familiar nas Forças", diz trecho do documento.

Os salários da Poupex não são públicos. No entanto, segundo o colunista Aguirre Talento, do portal UOL, uma tabela interna da remuneração dos cargos diz que o cargo de assessor especial tem remuneração básica de R$ 17 mil, que pode variar a depender de gratificações e remanejamentos.

19
Ago23

A conta das Forças Armadas

Talis Andrade
 
 
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O esforço de isolar o Bolsonaro dos generais que estiveram por trás de sua aventura golpista não condiz com os fatos. Desde Temer, eles atuaram para que o ex-capitão fosse a face do projeto de poder dos militares. Agora que gorou, querem descartá-lo

27
Jul23

Dois campos de concentração que farão você pensar melhor sobre o Brasil da ditadura militar

Talis Andrade

 

Indígena é exibido no instrumento de tortura conhecido como pau-de-arara em Belo Horizonte em 1970, durante a cerimônia de graduação da primeira turma da Guarda Rural Indígena. Foto: Jesco von Puttkamer.

 

Minas Gerais terra do comandante civil do golpe o governador e banqueiro Magalhães Pinto e de dois campos de concentração brasileiros: um deles para indígenas, o outro para deficientes mentais. Veja como esses dois campos são retratos da sociedade disciplinar teorizada pelo general Mourão que de Juiz de Fora partiu com suas tropas para a aventura golpista de primeiro de abril de 1964. Os campos de concentração do Brasil

Corpos explorados, mutilados, abusados e arbitrariamente confinados durante uma sangrenta ditadura: se a primeiro momento isso parece ser uma descrição da Segunda Guerra Mundial, na verdade se trata de dois campos de concentração mineiros, duas aproximações drásticas da miséria que o nazi-fascismo oferecia para seus excluídos. O Reformatório Krenak, em Resplendor, e o Hospital Colônia, em Barbacena, são os palcos do terror oferecido pela construção da ordem pós-golpe militar. O primeiro, uma prisão indígena; o segundo, um sanatório aos moldes das descrições de Foucault sobre a época clássica, em “Vigiar e Punir“. As informações são da Agência Pública e do Diário de Pernambuco.

 

Reformatório Krenak: uma prisão de índios

 

Após a falência institucional da SPI (Serviço de Proteção aos Índios) em 1967, denunciada por corrupção e inoperância, e a criação da FUNAI (Fundação Nacional do Índio), o Executivo do estado de Minas Gerais passou a ser o órgão responsável pela garantia da ordem e da assistência às aldeias locais naquele local: naquele mesmo ano, o nascimento Reformatório Agrícola Indígena Krenak acontece sem nenhuma publicação em jornais ou em portarias. Seu funcionamento e tudo que acontecia lá dentro era mantido em sigilo, típico da administração militar, que também era responsável pelo local.

O Reformatório Krenak era um campo de concentração étnico onde índios de todas as regiões do país eram enviados para “reeducação”. Ashaninka e urubu-kaapor, do extremo-norte do país, e guaranis e kaingangs, do sul e sudeste eram submetidos à trabalhos forçados, torturas desumanas e péssimas condições de repouso e alimentação.

O fim da ditadura não foi sinônimo de resolução deste episódio terrível sobre os povos indígenas. Segundo Douglas Krenak, ex-coordenador do Conselho de Povos Indígenas de Minas Gerais (Copimg), “Em 2009, recebi um convite para participar das comemorações, em Belo Horizonte (MG), dos 30 anos da Anistia no Brasil. Havia toda uma discussão sobre a indenização dos que sofreram com a ditadura, mas a questão indígena não foi nem sequer lembrada”. A família de Douglas foi afetada diretamente pelo reformatório, “Meu avô foi preso no reformatório Krenak. Chegou a ser arrastado com o cavalo de um militar, amarrado pelos pés”.

Apesar de ser defendido por Osires Teixeira, senador pelo ARENA, em 1972 como um local em que os indígenas adquiriam conhecimento, aprendiam uma profissão e voltavam com mais saúde para sua tribos (em uma das raras declarações de agentes do Estado sobre a existência do reformatório), os relatos daqueles que lá viviam parecem discordar deste ponto de vista.

De acordo com Diógenes Ferreira dos Santos, índio pataxó levado ao Krenak em 1969, a rotina dos presos era constituída de trabalhos rurais pela manhã, um almoço, e mais trabalho até o fim do dia, depois jantavam coletivamente, tomavam banho e iam dormir. “Íamos até um brejo, com água até o joelho, plantar arroz”, relata. “Botavam a gente para arrancar mato, no meio das cobras, e os guardas ficavam em roda vigiando, todos armados”, revela João Batista de Oliveira, o João Bugre, da etnia Krenak.

O trabalho, descrito por Foucault como uma característica marcante do sistema prisional, que readéqua o confinado para a vida produtiva e para a moral do trabalho duro, era tão central a ponto de fazer parte dos relatórios rotineiros da instituição. Em uma ficha de acompanhamento de um índio karajá, a sua “lerdeza” e “indisposição para o trabalho” são marcadas como signos de sua inutilidade. “É um elemento fraco, parecendo até mesmo ser um retardado. Se pudesse, não faria nenhum serviço”, explicita a ficha.

Os relatórios também expõem o tratamento desumano promovido pelo reformatório, desde a falta de roupas limpas à escassez de comida, “Os índios confinados estão se alimentando de pura mandioca e inhame. Considerando-se a precariedade da alimentação, serão suspensos os trabalhos braçais”.

Hospital Colônia: o confinamento dos loucos

Hospital Colônia
Hospital Colônia. Foto: O Diário

A despeito de ter sido criado em 1903, o Hospital Psiquiátrico Colônia ganhou sua (má) fama nos anos de chumbo. em 1979,  o psiquiatra reformista Franco Basaglia o comparou a um campo de concentração nazista, após uma visita, e toda a exposição do tratamento que os internos eram submetidos chocou a sociedade brasileira nos anos 80. Segundo os dados recolhidos pelo trabalho de Daniela Arbex, no livro “Holocausto Brasileiro“, de 1969 a 1980, 16 pessoas morriam por dia no hospital, que fora construído com capacidade para 200 leitos, mas que chegou a ter 5 mil pessoas em seu interior.

Em suas pesquisas, Arbex descobriu que os internos tinham os cabelos cortados e eram rebatizados ao chegar no hospital. Alguns comiam ratos, bebiam urina ou água de esgoto, dormir sobre o capim e eram espancados e violados pelo agentes internos. O frio, a fome ou as doenças fáceis de se pegar causavam a morte de vários indivíduos lá jogados, o tratamento com eletrochoques também estava nessa lista de causas de morte, que muitas vezes era forte o bastante para derrubar a rede de fornecimento de energia de Barbacena. “Havia uma omissão coletiva. Quem sabia dos atos violentos, ou participava deles, preferia fingir que aquilo não estava acontecendo. A violência foi naturalizada, banalizada”, diz a autora.

No período investigado, a venda de corpos foi um ponto notável. Mais de 1,8 mil corpos foram vendidos para universidades sem nenhum questionamento e geraram um lucro que, atualizado, seria o equivalente a R$ 600 mil. Estes corpos eram prontamente vendidos ou tratados em ácido, para que as ossadas fossem utilizáveis.

Luiz Alfredo, repórter fotográfico que captou as imagens utilizadas neste texto, ainda guarda em sua memória a impressão imediata ao entrar no hospital. “Cheguei em Barbacena sem saber direito o que estava fazendo e sem saber o que iria encontrar. De repente vi tudo aquilo. Fiz imagens chocantes”, conta.

Os loucos e os presos: confinados fora da ordem

Hospital Colônia e seus internos.
Hospital Colônia e seus internos. Foto: Psicologia Saúde

 

O Hospital Colônia e o Reformatório Krenak tinham vários pontos em comum: os internos eram tratados de forma desumana, não tinham a assistência mínima para a sobrevivência, passavam fome, não tinham vestimentas adequadas e seu funcionamento era completamente sigiloso – porém, há uma característica importante: ambos eram receptáculos dos anormais. Não somente daqueles que “deveriam” estar lá, mas de qualquer tipo de inadequado que pudesse ser colocado nas diretrizes dos locais.

O Krenak era o local de concentração para índios “viciosos”: homicidas, ladrões, consumidores de álcool (que na época era duramente repreendido pela FUNAI) e usuários de drogas eram encaminhados para o reformatório, porém, além desse tipo de interno, vítimas da prostituição, briguentos, indivíduos que conflitavam com os chefes dos postos da FUNAI, “pederastas” e “vadios” também eram encaminhados para reeducação.

O reformatório tinha uma função prática de manter o povo indígena dentro das regras morais do ocidente, representado pela ditadura militar e seus órgãos. Qualquer índio, na prática poderia ser preso, “não sabemos a causa real que motivou o seu encaminhamento, uma vez que não recebemos o relatório de origem”, relata um cabo do local ao escritório da Ajudância Minas-Bahia, sobre um índio xavante de bom comportamento, preso há cinco meses.

A historiadora Geralda Chaves Soares, que trabalhou no Conselho Indigenista Missionário (Cimi) conta que “uma das histórias contadas é a de dois índios urubu-kaápor que, no Krenak, apanharam muito para que confessassem o crime que os levou até lá. O problema é que eles nem sequer falavam português”. A língua tinha que ser aprendida na marra, pois somente o português era permitido – quando falavam em línguas indígenas, os guardas achavam que estavam falando sobre eles e os puniam.

João Bugre e o avô de Douglas Krenak, já citados, também foram vítimas da arbitrariedade militar. Segundo João, ele foi preso por transportar uma garrafa de pinga para dentro da aldeia, “muitos, como eu, não tinham feito nada. Tomei uma pinga. Será que uma pinga pode deixar alguém preso quase um ano?”, questiona. Já o avô de Krenak foi preso por atravessar as fronteiras permitidas pelo órgão, outra falta grave, “meu avô chegou a ser arrastado com o cavalo de um militar, amarrado pelos pés, porque tinha saído da aldeia”. José Alfredo de Oliveira, também Krenak, passou pela mesma situação, “eu, uma vez, fiquei 17 dias preso porque atravessei o rio sem ordem, e fui jogar uma sinuquinha na cidade”.

No Hospital Psiquiátrico Colônia, não só pessoas com distúrbios psiquiátricos diagnosticados eram internados, mas também homossexuais, prostitutas, mendigos, alcoólatras, epiléticos e meninas violentadas e/ou que perderam a virgindade antes do casamento.

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Alguns bebiam urina ou água do esgoto. Foto: Diário de Pernambuco

 

Segundo Arthur Galvão Serra, mestre em psicologia, esta função dos internamentos não é um efeito colateral de uma suposta má administração, por não seguir à risca seus próprios discursos, “vemos que a cura aparecia nos discursos não porque os discursos são precisos e idôneos, mas sim porque ele favorecia essa prática de internação”, conta.

Desta forma, a internação era importante por servirem como dispositivos para a inclusão dos internos, assim como “a escola inclui jovens, o exército inclui desde homens jovens, até desenvolverem disciplina e normalização para ocuparem postos onde terão ‘mais liberdade'”. O poder, por meio de seus aparelhos e dispositivos, inscreve o sujeito na hierarquia, lhe dando possibilidade limitadas de ação que são todas incluídas naquilo que chamamos de “normal”.

Esses campos de concentração são locais de “inclusão em uma posição na sociedade”, diz Arthur Serra. Os internos precisam sentir na pele o ferro em brasa da disciplina, é por isso que o trabalho, como oposição à vida sem moral, negadora de deus e da sina do trabalho duro fora do éden, tem grande papel no Reformatório Krenak, da mesma forma, é por isso que se tenta dar aos internos do Hospital Colônia um fim lucrativo (vendendo seus corpos e ossadas), já que seus corpos não podem ser adaptados (ainda vivos) nas circunstâncias materiais que se encontravam naquele momento .

22
Jul23

O labirinto do genocídio

Talis Andrade

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20
Mai23

CPI DO MST. Ricardo Salles defende passar 'a boiada' e 'mudar' regras enquanto atenção da mídia está voltada para a Covid-19 (vídeos)

Talis Andrade

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Declarações ocorreram em reunião ministerial do governo Jair Bolsonaro, cujas imagens foram divulgadas pelo ministro do STF Celso de Mello

 

por O Globo

Durante a reunião ministerial do dia 22 de abril de 2020, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, alertou os ministros sobre o que considerava ser uma oportunidade trazida pela pandemia da Covid-19: para ele, o governo deveria aproveitar o momento em que o foco da sociedade e da mídia está voltada para o novo coronavírus para mudar regras que podem ser questionadas na Justiça, conforme vídeo divulgado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello

Segundo ele, seria hora de fazer uma “baciada” de mudanças nas regras ligadas à proteção ambiental e à área de agricultura e evitar críticas e processos na Justiça. "Tem uma lista enorme, em todos os ministérios que têm papel regulatório aqui, para simplificar. Não precisamos de Congresso", disse o ministro do Meio Ambiente.

O material integra o inquérito que investiga suposta interferência do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal, após denúncias do ex-ministro da Justiça Sergio Moro.

Depois da divulgação do vídeo, o ministro se justificou em uma rede social. "Sempre defendi desburocratizar e simplificar normas, em todas as áreas, com bom senso e tudo dentro da lei. O emaranhado de regras irracionais atrapalha investimentos, a geração de empregos e, portanto, o desenvolvimento sustentável no Brasil", disse Salles.

 

Declarações de Salles

 

Salles começou sua fala comentando uma apresentação do ministro da Casa Civil. "Presidente, eu estava assistindo atentamente a apresentação do colega, ministro Braga Neto, e na parte final ali no slide as questões transversais está o Meio Ambiente, mas eu acho que o que eu vou dizer aqui sobre o meio ambiente se aplica a diversas outras matérias", explicou Salles.

Na sequência, ele citou o momento de foco da imprensa na pandemia. "Nós temos a possibilidade nesse momento que a atenção da imprensa está voltada exclusiva quase que exclusivamente pro COVID, e daqui a pouco para a Amazônia, o General Mourão tem feito aí os trabalhos preparatórios para que a gente possa entrar nesse assunto da Amazônia um pouco mais calçado, mas não é isso que eu quero falar", disse o ministro.

 

"A oportunidade que nós temos, que a imprensa está nos dando um pouco de alívio nos outros temas, é passar as reformas infralegais de desregulamentação, simplificação, todas as reformas que o mundo inteiro nessas viagens que se referiu o Onyx certamente cobrou dele, cobrou do Paulo, cobrou da Teresa, cobrou do Tarcísio, cobrou de todo mundo." - Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente

 

 

Na fala seguinte, Salles explica os itens que teriam sido cobrados dos representantes do governo nas viagens internacionais, diz que elas podem ser feitas em atos de governo e que as mudanças são mais questionadas dentro do Ministério do Meio Ambiente.

"A segurança jurídica, da previsibilidade, da simplificação, essa grande parte dessa matéria ela se dá em portarias e norma dos ministérios que aqui estão, inclusive o de Meio Ambiente. E que são muito difíceis, e nesse aspecto eu acho que o Meio Ambiente é o mais difícil de passar qualquer mudança infralegal em termos de infraestrutura, é instrução normativa e portaria, porque tudo que a gente faz é pau no judiciário, no dia seguinte", disse o ministro.

 

"Então pra isso precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de COVID e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas. De IPHAN, de ministério da Agricultura, de ministério de Meio Ambiente, de ministério disso, de ministério daquilo. Agora é hora de unir esforços pra dar de baciada a simplificação, é de regulatório que nós precisamos, em todos os aspectos." - Ricardo Salles

 

 

Salles, que é advogado, citou a importância da participação da Advocacia-Geral da União (AGU) neste esforço. "E deixar a AGU - o André não tá aí né? E deixar a AGU de stand by pra cada pau que tiver, porque vai ter, essa semana mesmo nós assinamos uma medida a pedido do ministério da Agricultura, que foi a simplificação da lei da Mata Atlântica, pra usar o Código Florestal. Hoje já está nos jornais dizendo que vão entrar com medidas, com ações judiciais e ação civil pública no Brasil inteiro contra a medida. Então pra isso nós temos que estar com a artilharia da AGU preparada pra cada linha que a gente avança ter uma coisa", disse o ministro.

 

"Mas tem uma lista enorme, em todos os ministérios que têm papel regulatório aqui, para simplificar. Não precisamos de Congresso. Porque coisa que precisa de Congresso também, nesse fuzuê que está aí, nós não vamos conseguir aprovar." - Ricardo Salles

 

"Agora tem um monte de coisa que é só, parecer, caneta, parecer, caneta. Sem parecer também não tem caneta, porque dar uma canetada sem parecer é cana. Então, isso aí vale muito a pena. A gente tem um espaço enorme pra fazer", afirmou Salles.

03
Mar23

Não há política de direitos humanos sem pensar na questão racial, diz ministro brasileiro em Genebra

Talis Andrade

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O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, durante reunião da ONU em Genebra em março de 2023.
O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, durante reunião da ONU em Genebra em março de 2023. © Violaine Martin/ONU

Daqui para frente, tudo vai ser diferente. Essa é a mensagem que o ministro brasileiro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, quis passar esta semana em que esteve em Genebra, na Suíça, participando de reuniões do Conselho de Direitos Humanos da ONU.

“Não é só porque eu quero, é que precisa ser diferente. Precisa ser diferente, em primeiro lugar, por conta do que todo mundo viu, que foram esses últimos quatro anos. Ou seja, quatro anos de vergonha. Vergonha para nós brasileiros de uma maneira geral, vergonha para a história do Brasil, daquilo que o Brasil construiu de melhor. Pode parecer que tudo aquilo que falamos é cheio de ambição, mas sem ambição não haveria necessidade de estarmos aqui hoje, de contribuir para um Brasil novo”, disse ele à RFI.

O ministro explicou que a vinda dele à Genebra teve a “intenção de reconectar o Brasil com o sistema internacional de direitos humanos, que é um palco importantíssimo da atuação política do Brasil”. Ele diz acreditar que “essa reconexão é muito importante para a recondução, para a reorientação da política nacional de direitos humanos”

“Nos últimos anos, o Brasil teve uma série de prejuízos por conta desse afastamento. Acho que muitas das conquistas que o Brasil teve em termos de direitos humanos são resultado desse diálogo, desse debate em que o Brasil não só recebeu uma série de subsídios importantes para construção da sua política nacional, mas também o Brasil contribuiu e muito com o mundo, para demonstrar que existem outras perspectivas em relação aos direitos humanos, que não aquelas perspectivas conduzidas a partir de uma visão do Norte do mundo”.  

 

Yanomamis: preocupação com candidatura de Damares

 

O ministro vê com “com muita preocupação” a candidatura da senadora Damares Alves, ex-ministra dos direitos humanos, a uma vaga para comissão que monitora a crise dos Yanomami. Ele lembre que ela foi integrante do governo Bolsonaro que negligenciou a assistência aos Yanomami. Isso demonstra, segundo Almeida, um “grave problema da institucionalidade brasileira”.

Segundo o ministro, “não somos capazes de estabelecer formas de contenção desse tipo de ação, de movimentação que, na verdade, tem o propósito de minar, de descredibilizar as próprias ações institucionais em prol dos direitos humanos”. Ele afirma que um relatório com conclusões das investigações realizadas sobre a situação dessa população indígena, resultado de visitas das equipes à Roraima, será divulgado na próxima semana.

“O relatório que vai demonstrar todas as coisas que foram feitas e deixaram de ser feitas e que redundaram nessa tragédia. Encontramos alguns documentos que demonstram que houve negativa para envio de ajuda emergencial aos povos yanomami. Havia, inclusive, uma ordem judicial da Corte Interamericana de Direitos Humanos que determinava a tomada de providências para garantir a vida, a sobrevivência, que foi descumprida”, afirmou.

Segundo o ministro, as conversas todas nas Nações Unidas foram no sentido de apresentar que o Brasil tem uma série de projetos que demandam apoio internacional. Ele disse também que o que ele pediu e que o que pediram a ele nas reuniões e encontros na ONU foi a mesma coisa: cooperação.

“Pedir aos Estados e seus representantes e aos organismos internacionais que pudessem dar suporte a essa nova visão que a nova administração brasileira traz, que é pensar os temas dos direitos humanos a partir de uma perspectiva que leva em consideração a questão econômica, a necessidade de fortalecer os mecanismos democráticos, o combate aos discursos de ódio. Ao mesmo tempo, nós fomos solicitados para a mesma coisa. O que nos foi pedido é aquilo que pedimos também: uma cooperação no esforço para que nós pudessemos fazer uma política de direitos humanos coordenada”.

 

Fortalecer sistema de proteção social para enfrentar trabalho escravo

 

Ao ser questionado sobre a situação dos mais de 200 trabalhadores resgatados em condição de escravidão, o ministro disse que esse episódio “nem de longe é um caso isolado”. Segundo ele, “o Brasil ainda possui uma série de problemas que levam à reprodução desse tipo de violência contra os trabalhadores e as trabalhadoras”. Também disse não ter se surpreendido com declarações das próprias empresas.

“A luta contra o trabalho escravo envolve o fortalecimento do sistema de proteção social dos trabalhadores. Precisamos fortalecer as representações dos trabalhadores, os sindicatos. É isso que vai garantir que os trabalhadores não fiquem à mercê desse tipo de exploração”.

Segundo o ministro, está marcada uma reunião em que será tratada a possibilidade de revisão do plano nacional de erradicação do trabalho escravo.

Ele diz que o Brasil é um país forjado no autoritarismo, na dependência econômica que gera desigualdade e no racismo. “Toda e qualquer política de direitos humanos que se pense tem que levar em consideração a questão racial”, disse ele, que escreveu o livro “Racismo Estrutural”. “Eu sou o primeiro homem negro a ser ministro de Estado de Direitos Humanos do Brasil. Pra mim, é um compromisso ético e político dos mais relevantes”.

 

Guerra na Ucrânia: “Alguns fantasmas continuam muito vivos”

 

Sobre a guerra na Ucrânia, o ministro frisou que a posição do Brasil “prioriza a abertura de espaços de diálogo, de conversação, de compreensão, que é a única forma, na verdade, de encerrar um conflito dessa proporção, que é chamando as pessoas para conversar, mas nunca transigindo com violação de direitos humanos”.

“O fato de o Brasil estar aberto ao diálogo não significa que o Brasil não reconhece que haja violação de direitos humanos. Não significa que o Brasil se cale diante disso e não significa que o Brasil tenha uma posição de, digamos, de neutralidade diante da violação de direitos humanos”.

De acordo com o ministro, essa é uma guerra “que interessa a todos nós, do mundo inteiro”. O conflito na Ucrânia também desnuda, segundo ele, “algumas faces da humanidade que nós não queríamos encarar, como a instrumentalização da política de direitos humanos para interesses de países específicos, a seletividade racial”.

“Acho que essa guerra está demonstrando, tristemente, que alguns fantasmas que nós achávamos que haviam sido superados, principalmente depois dos desastres que a humanidade já conheceu, continuam muito vivos”.  

 

Uma guerra global

 

Silvio Almeida disse ainda que em todo contexto de guerra a violação dos direitos humanos se apresenta e os afetados “são os trabalhadores, as minorias, as mulheres, as meninas, as pessoas que mais sofrem em toda e qualquer guerra. Eu estou falando que sofrem as pessoas de todos os envolvidos na guerra.

“Acredito que essa guerra não é uma guerra regional, não é uma guerra que envolve apenas a Europa. É uma guerra que, na minha concepção, tem contornos globais, e que faz com que cada um de nós, em todos os lugares do mundo, sejamos por ela afetados e temos, portanto, a responsabilidade de recolocar as coisas no seu devido lugar”.

 

Visita de relatores da ONU ao Brasil: "não tenho nada a esconder"

 

No último dia de missão em Genebra, o ministro Silvio Almeida se reuniu com o Alto Comissário das Nações Unidos para os Direitos Humanos, Volker Turk, e o convidou para ir ao Brasil. As visitas dos relatores da ONU, que há anos não vão ao país, deverão ser retomadas.

“Esse governo não tem problema nenhum com visita de relatores porque não tenho nada a esconder, nada, muito pelo contrário. Acreditamos que abrir a situação dos direitos humanos no Brasil é algo que nos favorece porque faz com que tenhamos que tomar as atitudes necessárias para proteger o nosso povo”, disse.

Questionado por um jornalista estrangeiro se tinha pretensões de se candidatar à presidência no futuro, Almeida foi diplomata. “O presidente Lula me deu a honra e a missão de ser ministro de Estado de Direitos Humanos e Cidadania do meu país. Isso é um fardo, mas é uma honra. E quais são as minhas intenções? A primeira delas é honrar a confiança que o presidente me deu e a minha intenção mais ambiciosa nesse momento é ser o melhor ministro de Direitos Humanos e Cidadania que o Brasil já teve. Essa é a minha intenção. Se eu fizer isso, acho que já cumpri um belíssimo papel e meus ancestrais ficaram muito orgulhosos de mim”.

Almeida falou ainda da necessidade de retomar certos debates, como a relação entre direitos humanos e economia, direitos humanos e democracia, “a participação política efetiva das minorias, daqueles que são afetados pelas decisões que são tomadas no âmbito político. Aumentar a possibilidade de participação popular, por exemplo, “para não transformar a humanidade num clube”, em que só alguns podem entrar, “aqueles que não parecem com a maioria das pessoas que vivem e levam sua vida no Sul global”.

24
Jan23

Tristeza, vergonha, crimes e fome: Bolsonaro precisa pagar pelas vidas yanomamis

Talis Andrade

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Protesto indígena nos tempos de cólera Bolsonaro presidente

 

Se, diante de tudo isso, não conseguirmos conduzir um processo severo na justiça contra Bolsonaro, teremos fracassado como sociedade

 

por Clarissa de Franco

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Nesta semana vieram ao grande público imagens que nos remeteram a países como Etiópia, Sudão, Zambia, Congo, países que carregam a marca de constarem no mapa da fome mundial. Tomar consciência da realidade dos yanomamis em Roraima. 11 mil casos de malária, desnutrição, síndrome respiratória aguda, verminoses, grave insegurança alimentar, contaminação por mercúrio, falta de medicamento e de assistência de saúde... a lista das mazelas é enorme e assusta.

Assusta ainda mais é saber que 21 ofícios foram enviados ao governo Bolsonaro e o que foi feito foi justamente liberar ainda mais as terras indígenas para o garimpo ilegal. Em julho de 2020, o então presidente Jair Bolsonaro promoveu vários vetos ao Plano Emergencial para Enfrentamento à Covid-19 nos territórios indígenas, tendo vetado, inclusive pontos que previam o acesso das aldeias a leitos hospitalares, à água potável, a materiais de higiene, entre outros. 

 Não se pode dizer que Bolsonaro nos apresentou uma farsa quanto a este tema. Foi tudo bem explícito, na verdade. Em 2017, anunciou que, se dependesse dele não seria demarcado “nenhum centímetro” de terra indígena. Durante a campanha presidencial em 2018, ele foi bem claro, afirmando: “Não podemos ter ambientalismo xiita no Brasil. Vamos acabar com a indústria da demarcação de terras indígenas”. Chamando, portanto, a demarcação de território indígena de indústria e o ambientalismo que protege os povos originários de xiita, Bolsonaro nos forneceu ao longo de anos, aulas de como o Estado pode se tornar uma ferramenta de genocídio histórico, cultural, político, patrimonial, ambiental, e em última instância, humano. Tudo na nossa frente. Queimadas, garimpos, desmatamentos, assistimos à legalização da morte, enquanto o mundo retirava apoio financeiro para proteger a Amazônia e fazia do Brasil um alvo de chacota pública por termos eleito um representante do nível Bolsonaro. 

Rita Segato, uma grande pesquisadora decolonial argentina que atuou durante anos no Brasil, na UNB, apontou que o contato de garimpeiros, madeireiros e empreiteiros com os povos indígenas produz uma série de adoecimentos e violências no ecossistema indígena. O olhar colonizador do homem branco que depreda a terra vê a mulher indígena e seu corpo também como um território a ser dominado, invadido, violado, violentado. Além da violência explícita, a sexualização da nudez, torna-se um legado simbólico difícil de ser apagado. 

Para os indígenas, os mal tratos e as violências ao território representam violar uma parte fundamental e vital de seu povo, já que a terra é uma extensão de sua existência. Não há vida indígena sem terra. E não há Brasil sem indígenas.  O que temos assistido como efeitos catastróficos do governo da necropolítica é o desprezo pela nossa história e pelas nossas vidas. Se, diante de tudo isso, não conseguirmos conduzir um processo severo na justiça contra Bolsonaro, teremos fracassado como sociedade. 

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Polícia Federal revela o mandante dos assassinatos de Bruno Pereira e Dom Phillips. Segundo a PF, Rubens Villar Coelho, conhecido como "Colômbia", mandou matar o indigenista brasileiro e o jornalista britânico em junho do ano passado no Vale do Javari, no Amazonas
Amazonas.
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12
Jan23

“Acabar com a democracia para salvá-la nunca funcionou”, diz brasilianista americano sobre bolsonaristas

Talis Andrade
 
Bolsonaristas invadiram prédios dos Três Poderes em Brasília no domingo, 8 de janeiro.
Bolsonaristas invadiram prédios dos Três Poderes em Brasília no domingo, 8 de janeiro. AP - Eraldo Peres

Os atos antidemocráticos de domingo (8) evidenciaram o radicalismo da oposição bolsonarista ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e tendem a marginalizar ainda mais a extrema direita, avalia o cientista político Anthony Pereira, diretor do Centro Latino-Americano e Caribenho Kimberly Green, na Universidade Internacional da Flórida. Os ataques contra os Três Poderes poderão até "ajudar" no projeto de reconciliação nacional do novo governo, mas a pacificação provavelmente não virá no tempo de um mandato, avalia o estudioso. 

O respeitado brasilianista anglo-americano acompanha a política brasileira desde a redemocratização e vê o movimento formado em frente aos quartéis brasileiros, para pedir uma intervenção militar mesmo após a posse de Lula, como integrado por pessoas com “uma perspectiva um tanto esquisita da história".

"Não é somente uma evocação do regime militar, mas uma afinidade com uma parcela desse regime, a mais linha dura, autoritária e intolerante, representada por pessoas como o general Sylvio Frota, que enfrentou Ernesto Geisel para manter um regime forte e repressivo, na fase da liberalização”, observa Pereira, em entrevista à RFI. “É também uma reflexão sobre o desespero com a democracia: a ideia de que ela é tão corrupta e disfuncional que seria necessário limpar o terreno para começar de novo. Mas acabar com democracia para salvá-la nunca funcionou”, salienta. "Você não vai melhorar a democracia acabando com as instituições democráticas, incluindo eleições legítimas.”

 

Risco político da antidemocracia

O cientista político nota que Jair Bolsonaro, ao se manter passivo diante das manifestações golpistas desde a eleição e dissuadir as Forças Armadas de dissipá-las em meio à ameaça crescente de atentados terroristas na posse de Lula, seguiu o exemplo “infeliz” de Donald Trump nos Estados Unidos. Bolsonaro e seus aliados, que também se recusaram a transmitir o cargo ao novo presidente e seu governo, "provavelmente receberam conselhos" de pessoas como o guru americano da extrema direita Steve Bannon.

"Talvez seja ingenuidade da minha parte, mas apesar dos danos e do choque das imagens, talvez isso vá ajudar no projeto de reconciliação. Muitas pessoas que apoiaram o Bolsonaro na eleição se juntaram àqueles que condenaram os atos de vandalismo e enfatizar que o Brasil terá eleições em 2024 e em 2026 – e esse é o canal legítimo para expressar as divergências políticas", afirma o pesquisador em Harvard. "O efeito de tudo será, talvez, marginalizar ainda mais a ala radical do bolsonarismo, porque essas pessoas não tem lugar no espaçol público democrático. 

Pereira ressalta que "havia outros exemplo melhores a seguir" no campo da direita latinoamericana, como José Antonio Kast, que ao perder para o Gabriel Boric no Chile, foi ao escritório do rival e o parabenizou. Rodolfo Hernández, embora seja apelidado de 'Trump colombiano’, também saudou o opositor nas urnas. Em ambos os países, a cultura democrática se mostrou forte apesar do avanço da extrema direita. 

"Você não pode ser a favor da democracia em outros lugares e apoiar alguém que tentou derrubar a democracia no seu próprio país. Acho que Bolsonaro agora está entrando nesse terreno”, avalia o pesquisador, fundador do Instituto de Estudos Brasileiros no King’s College de Londres.

Pereira frisa ainda que, diferentemente do ex-colega americano, Bolsonaro nunca contou com uma máquina como a do Partido Republicano. Ele avalia que as omissões do ex-presidente deixam o caminho aberto para outras lideranças emergidas no bolsonarismo, como o ex-vice Hamilton Mourão ou o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, ocuparem o espaço na oposição nos próximos meses e anos.

 

Anthony Pereira é cientista político e diretor do Centro Latino-Americano e Caribenho Kimberly Green, na Universidade Internacional da Flórida.
Anthony Pereira é cientista político e diretor do Centro Latino-Americano e Caribenho Kimberly Green, na Universidade Internacional da Flórida. © Arquivo Pessoal

 

Alianças para base aliada não significam reconciliação nacional

Enquanto isso, Lula se esforça em acomodar as forças políticas aliadas, mas também divergentes, como o União Brasil, em um novo governo com 37 ministérios. Pereira observa que, ao trazer Geraldo Alckmin e outras pessoas associadas a Fernando Henrique Cardoso, como Pedro Malan e Armínio Fraga, o petista "colapsou" o antigo eixo PSDB-PT e consolidou a frente anti-Bolsonaro.

"Essa coligação, me parece, não vai ser igual às maiorias que ele teve nos anos 2000, quando Lula chegou a ter 80% dos votos favoráveis no Congresso. Mas pelo menos ele vai conseguir chegar a uma maioria básica para passar projetos ordinários”, aposta Pereira.

Entretanto, se, por um lado, a construção da base aliada no Congresso parece encaminhada, por outro a diminuição da rejeição que Lula enfrenta junto aos mais de 58 milhões de eleitores que preferiram Bolsonaro na última eleição se anuncia uma missão mais difícil.

“Apesar de as pesquisas mostrarem que Bolsonaro tem um índice maior de rejeição do que Lula, é por pouco. Vai ser difícil convencer a parte do eleitorado que associa Lula ao Petrolão e à corrupção sistemática”, sublinha. “Se você olha a questão das restrições de orçamento do novo governo, é pouco provável que todas as ansiedades da população brasileira, como a questão social, a inflação, o emprego, serão resolvidas. Duvido que o governo Lula vá solucionar todos esses problemas em quatro anos.”

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