Casas submersas em Lajeado (RS) nesta quarta-feira (6) após a passagem de um ciclone. — Foto: Diego Vara/Reuters
Casa ilhada após ciclone em Bom Retiro do Sul (RS) nesta terça-feira (5). — Foto: Diego Vara/Reuters
Após ciclone, parte fértil do solo é varrida pela correnteza no RS — Foto: Reprodução Globo Rural
Chuvas fortes causam mortes, estragos, enchente e deixa centenas de pessoas desabrigadas — Foto: DIOGO ZANATTA/ESTADÃO CONTEÚDO
Sugestões quanto ao que pode e deve ser feito
por Paulo Brack e Eduardo Luís Ruppenthal
1. Trazer o tema das mudanças climáticas e seus eventos extremos, com base em instituições de referência internacional e nacional, para o centro do debate, localmente, regionalmente e mundialmente, no âmbito governamental, legislativos, conselhos, ministério público e demais setores que tratam de políticas públicas socioambientais. A questão climática tem relação estreita com o aumento dos GEE, o que remete, obrigatoriamente, a que se discuta a matriz energética atual e, de forma inescapável, o modelo de economia hegemônico e energívoro que emite elevadas quantidades de gases de efeito estufa, diminuindo-se o uso de combustíveis fósseis, mas revendo-se a concentração de megaparques de geração elétrica, que vêm gerando impactos ambientais importantes. Em resumo, rever a pegada ecológica e debater com a sociedade, principalmente questionando-se os setores que concentram capital e encabeçam as maiores fontes de liberação de GEE ou mineração predatória em minerais raros, em especial o lítio, associados às fontes de geração mais renováveis, no que chamam de transição energética, porém ainda presa ao paradigma do crescimento econômico e concentração ilimitados.
2. Diagnosticar os maiores riscos sobre as bacias hidrográficas, por parte dos órgãos de meio ambiente e instituições de pesquisa, juntamente com as prefeituras locais.
3. Fortalecer os Comitês de Bacia, em uma recomposição democrática, longe da influência, muitas vezes dominante, de representação de setores econômicos. Os conselhos devem ser compostos, predominantemente, por membros da sociedade, superando-se os atuais conflitos de interesse de representantes vinculados a setores empresariais ou governamentais, recorrentemente com visão econômica imediatistas. Também devem receber apoio e recursos financeiros da cobrança pelo outorga ou uso da água por parte de grandes usuários.
4. Fiscalizar e proteger as cabeceiras do Rio Taquari-Antas e nas demais regiões de nascentes dos rios do Estado. Planejar e buscar programas e projetos para reflorestamento das matas ciliares conforme legislação vigente sobre as APPs, sem oretrocesso da inconstitucional Lei n. 14.285/2021. Há que se controlar e coibir as licenças ambientais para atividades que, inclusive, estão a comprometer a qualidade, a quantidade e a vazão de água na bacia. Arquivar oPL 364/2019do deputado Alceu Moreira, inconstitucional, que retira a proteção dos Campos de Altitude da Lei 11.428/2006, Lei da Mata Atlântica.
5. Proteger as margens dos rios, em especial as matas ciliares da bacia do rio Taquari-Antas.. Há que se lembrar que o Rio Taquari-Antas constitui-se em um dos principais Núcleos da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, enquadrado como Patrimônio da UNESCO e Patrimônio Nacional neste bioma reconhecido pelo Artigo 225 da Constituição Federal, sendo necessária, portanto, a revisão de todas as atividades que comprometam a vegetação nativa e a biodiversidade que, além de Patrimônio Internacional, desempenha papel fundamental nas funções ecológicas e econômicas (serviços ecossistêmicos) da bacia.
6. Preparar governo e sociedade para o enfrentamento dos eventos climáticos extremos. Onde há negacionismo, não se reconhece a gravidade e não há ações, neste caso de adaptação, precaução e prevenção. O efeito El Niño era esperado, houve alerta e não houve preparo de parte de governos para engajamento da população em tomada de medidas prévias e emergenciais, incluindo o deslocamento de pessoas das áreas potencialmente mais atingidas para áreas mais seguras e rotas de fugas. É necessário o treinamento de pessoas para a prevenção, que envolva todas as comunidades, e ações ligadas às medidas emergenciais. A implantação de um sistema de alerta por parte do governo do Estado, defesa civil e de governos dos municípios sujeitos a estas tragédias e preparo da população frente a novos eventos como o que ocorreu no vale do rio Taquari. Avisos prévios, com instalação de sirenes e comunicação pública com carros de som, nos municípios risco de eventos climáticos extremos, neste caso, em toda a Bacia Hidrográfica do Rio Taquari.
7. Rever conjuntamente os empreendimentos hidrelétricos na bacia. Dezenas de barragens, de médias e pequenas centrais hidrelétricas na bacia, alteram a vazão e devem ter controle para se evitar a abertura de comportas. Há que se averiguar a mudança na vazão do rio Taquari-Antas, em decorrência destes empreendimentos, em seu conjunto ou isoladamente, situação que deve ser avaliada por instituições de pesquisa independentes e pelo Ministério Público, e controlada por demais instituições públicas, em especial do executivo estadual e municipais. Há que se fazer modelagens de controle conjunto das comportas de barragens, evitando-se o efeito dominó da abertura conjunta e um pulso d’água agravante da situação. Tudo isso remete a que se estude a situação dos rios, frente a tantas hidrelétricas na bacia, reconhecendo-se um limite para tais, antes da emissão de novas licenças ambientais para novos empreendimentos que afetem matas ciliares e alterem a vazão dos rios da bacia. A integração de instituições de pesquisa, governos e outros setores é fundamental e urgente para se antecipar às tragédias climático-ambientais como as que ocorreram. Cabe se respeitar a Avaliação Ambiental Integrada de toda a bacia hidrográfica, prevista em 2001. A segurança das barragens deve ser avaliada, frente a novas cheias, pois do contrário as tragédias podem ser muito mais elevadas do que as que ocorreram em setembro de 2023 nos municípios da porção mais baixa do rio Taquari.
8. Recuperar as condições naturais, vegetação ciliar e manutenção da sinuosidade dos rios e demais cursos de água (Baptista & Cardoso, 2013) com reflorestamentos genuínos, com diagnóstico e identificação prévia das áreas com maior demanda de recuperação da Mata Ciliar e demais tipos vegetacionais, com planejamentos de programas e projetos. Trazer à necessidade de MORATÓRIA À CONVERSÃO DOS CAMPOS DE CIMA DA SERRA/ CAMPOS DE ALTITUDE (protegidos pela Lei 11.438/2006, compatíveis com a pecuária em campos nativos e turismo rural e ecológico).
A perda de vegetação nativa está conduzindo a maior instabilidade hídrica, menor qualidade das águas e maior vulnerabilidade ambiental
por Paulo Brack e Eduardo Luís Ruppenthal
O cenário preliminar
O cenário de destruição ocasionada pelas chuvas extraordinárias e enchentes do rio Taquari-Antas, ao que tudo indica, não tem precedentes nem mesmo nos registros históricos de chuvas, se tornando uma calamidade de grandes proporções ainda a serem calculadas. A enchente catastrófica, em suas dimensões social, ambiental, econômica e histórica, não pode ser expressa somente em números, apesar de serem impressionantes como umas das maiores já vividas no Rio Grande do Sul. Pelo menos 47 mortos, além de desaparecidos, milhares de desalojados, destruição total ou parcial de milhares de casas e prédios urbanos, comunidades inteiras e municípios devastados, danos psicológicos, perdas de animais de criação e de plantios de subsistência, prejuízos econômicos e perdas ambientais significativas. A retomada da vida de milhares de famílias será muito difícil, após a perda de parentes, de lares e de bens materiais e imateriais.
Levará ainda muito tempo para se conhecer, em maior profundidade, as causas, as consequências e o cenário futuro de aumento da frequência de eventos extremos verificados e previstos para se agravar no mundo inteiro. Os comunicados daOrganização Meteorológica Mundial(OMM) já apontavam que 2023 seria o ano com maior temperatura já registrada na atmosfera do planeta, o que se comprovou a partir de junho deste ano.
Do ponto de vista climático, as previsões já traziam potenciais chuvas históricas, ressaltando-se os alertas da plataformaMetsul Meteorologia, em 31 de agosto e 1ode setembro de 2023, com os títulos respectivos: “Setembro começa com chuva extrema, onda de tempestades e enchentes” e “ALERTA:Chuva virá com volumes excepcionais de até 300 mm a 500 mm. Volumes excepcionalmente altos são previstos pela MetSul Meteorologia para o Sul do Brasil nestes primeiros dez dias do mês[de setembro]”
Também cabe lembrar que em meados de junho de 2023 ocorreu outro ciclone extratropical e uma chuva excepcional devastadora no vale do rio Maquiné e no rio dos Sinos, no município de Caraá, tendo chovido no Litoral Norte do Rio Grande do Sulquase 300 mmem 48 horas. Houve a morte de 16 pessoas, somando-se o Litoral Norte e o Vale do Rio dos Sinos.
Infelizmente, o comunicado prévio da plataforma de divulgação meteorológica MetSul foi desconsiderado pelo governo do Estado do Rio Grande do Sul. O governador Eduardo Leite, em entrevista a um programa daTV GloboNews, em 6 de setembro, alegou que os modelos matemáticos de previsão do tempo não indicavam o elevado volume de chuva que atingiu o estado no evento daquela semana. Como resposta, a MetSul divulgou umanota públicacontestando a declaração do governador, demonstrando que o alerta realmente tinha sido dado.
Quanto à atuação do governo do Estado do Rio Grande do Sul, à semelhança de outros governos estaduais diante de eventos climáticos extremos, o que geralmente se nota, de um lado, é “surpresa” e uma certa dose de cinismo e, não raro, oportunismo em uma narrativa de retirar sua responsabilidade e ao mesmo tempo imputar a culpa em fenômenos naturais. A grande imprensa também reverbera tratar-se de um fenômeno “natural“, desconsiderando que o agravamento de tais eventos está associado também às alterações ambientais provocadas por atividades humanas. O atual excesso de chuvas, temporais, ciclones, secas e ondas de calor são ainda considerados, por governos, como fenômenos “inesperados”, pois, pelo menos na prática, impera onegacionismoda emergência climática-ambiental.
Além do negacionismo por parte de agentes públicos, vários setores econômicos rezam pela mesma cartilha a fim de afastar parte de sua responsabilidade ou inação diante das mudanças climáticas e à destruição ambiental decorrentes de atividades de origem antrópica que agravam essas calamidades. Do outro lado, quem mais paga o custo da tragédia é a população mais vulnerável do ponto de vista social, tanto na perda de dezenas de vidas, de quem mora mais precariamente na beira dos rios, mas também nas perdas materiais e nas condições de sua sobrevivência, na agricultura familiar ou nos pequenos e médios comércios. Qual é o custo de uma vida? Como restabelecer as condições mínimas dignas de vida aos atingidos que sobreviveram a estas calamidades?
As mudanças climáticas negligenciadas
No atual contexto de crise climática, além dos alertas da OMM, os seis relatórios do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) vêm trazendo um conjunto de informações incontestáveis. Principalmente, a partir do 4º relatório, consagra-se cientificamente que os eventos climáticos extremos são predominantemente antropogênicos e cada vez mais intensos e frequentes. No caso da Região Sul do Brasil, em especial o Rio Grande do Sul, além das secas severas dos últimos verões, associadas ao fenômeno La Niña, agora ganha destaque o fenômeno inverso, oEl Niño.
O El Niño, previsto para 2023 e que representa a maior quantidade de chuvas no sul do Brasil, está ligado ao aquecimento, em temperaturas maiores do que a média na superfície do Oceano Pacífico, em decorrência do aumento de gases de efeito estufa, influenciando a formação de nuvens e outros processos climáticos. É importante lembrar que no caso do gás carbônico (CO2) seus valores subiram, desde meados do século XVIII, de 270 ppm (partes por milhão) para421 ppm, na atualidade.
Vale destacar que as enchentes fazem parte da dinâmica de um rio. Entretanto, o uso mais intenso ou a alteração do solo da bacia, como um todo, especialmente suas margens, várzeas inundáveis e as matas ciliares, a intensidade e as consequências desses eventos se torna de maiores dimensões. A intensidade das cheias, em várias partes do mundo, está ultrapassando os registros históricos. O ciclo da água na natureza está sendo rompido por atividades humanas, o que também é comprovadocientificamente. Ademais, a vegetação das bacias tem papel neste ciclo e atua no amortecimento parcial dos picos de cheias. No Brasil, esta proteção está amparada pelaLei n. 12.651/2012(Código da Vegetação Nativa, ou “Código Florestal” Brasileiro ), em especial no que toca às Áreas de Preservação Permanente (APP) que, se não preservadas, além de ambientes de beira de rios ficarem mais vulneráveis a impactos socioambientais, se tornam áreas de risco quando ocupadas pela construção de moradias, prédios, etc.
A vegetação e seu efeito de maior amortecimento às chuvas e às cheias
A vegetação natural (campos, banhados, florestas, etc.) tem papel fundamental na maior função regulatória sobre o ciclo da água, exercendo maior capacidade deestabilizaçãoouefeito tampãoem relação às chuvas volumosas e às cheias. Quando as chuvas caem sobre a estrutura da vegetação (folhas, caules, raízes), a águainfiltra no solo, facilitada pela matéria orgânica de sua superfície e a trama de raízes que atuam, em seu conjunto, quase como um efeito esponja em épocas de maiores quantidades de água pluvial.Solos cobertos por vegetação, portanto, permitem que a água da chuva penetre no solo, infiltre e alimente nascentes e lençóis freáticos e não escoe superficialmente de forma rápida para os arroios e rios(Figura 2).
A vegetação conserva a maior umidade no solo, evitando a erosão, auxiliando a manutenção da permeabilidade e a fertilidade do solo, suavizando o escoamento superficial rápido da água, em solos mais secos e compactados pela agricultura. A vegetação contribui, assim, para a maior regulação do ciclo hidrológico, além de dar abrigo à fauna, mantendo o patrimônio da biodiversidade e suas funções ecológicas e econômicas, proporcionando paisagens diversas que valorizam inclusive o turismo ligado à natureza.
Nas cabeceiras da bacia que inicia-se nos Campos de Cima da Serra, a partir de pelo menos 1000 m de altitude, a maioria dos cursos d’água é drenada ao rio Tainhas e, na sequência, ao rio das Antas com confluência do rio Carreiro que formam rio Taquari. Este é afluente do rio Jacuí, que escoa no rio-lago Guaíba. Seus principais afluentes pela margem esquerda são os rios Camisas, Tainhas e Lajeado Grande e São Marcos, e, pela margem direita, os rios Quebra-Dentes, da Prata, Carreiro, Guaporé, Forqueta e Taquari-Mirim. Nos altos do Planalto das Araucárias, tanto em relevos suaves como nas encostas mais íngremes, a vegetação, que era predominantemente composta por campos, turfeiras, banhados e florestas, com importante proteção e garantia de recarga de nascentes, está se transformando em lavouras, gerando erosão do solo.
Se essa vegetação da região (figuras 4 e 5) seguir sendo retirada, progressivamente, o escoamento das águas da chuva continuará com riscos de picos bruscos, como foi na primeira semana de setembro deste ano, no vale do rio Taquari-Antas, aumentando as chances de cheias mais violentas decorrentes das chuvas torrenciais. O uso cada vez maior de máquinas pesadas de plantios de monoculturas, em especial de soja em campos até então virgens. Grandes superfícies impermeáveis ou sem vegetação podem incrementar a erosão do solo e das margens dos rios, levando ao maior assoreamento e a possibilidade de enchentes de maiores proporções.
Além disso, sem vegetação, que atuaria como filtro para reter parte da lama e resíduos das cheias, as águas dos rios ficam mais barrentas após sua elevação, situação verificada nesta grande enchente do rio Taquari-Antas. A maior perda de vegetação nativa pela agricultura (Figuras 6,7,8 e 9) está conduzindo a maior instabilidade hídrica, menor qualidade das águas e maior vulnerabilidade ambiental. Ou seja, centenas de milhares de hectares de campos nativos de pastagem, com vocação para a pecuária, transformados em agricultura e silvicultura nas cabeceiras do maior rio da região, com mais erosão, assoreamento e escoamento de água que antes infiltrava no solo e alimentava as nascentes.
Destruição das matas ciliares e avanço urbano em APPs e a consequente impermeabilização do solo
Segundo a Lei 12.651/2012, em seu Art. 6º, consideram-se como Áreas de Preservação Permanente (APPs), entre outras, aquelas cobertas com florestas ou outras formas de vegetação destinadas a (Inciso I) “conter a erosão do solo e mitigar riscos de enchentes e deslizamentos de terra e de rocha”. Entretanto, o que se constata é, em grande parte, o contrário, onde as matas ciliares estão sendo destruídas, e não recuperadas como a lei prevê e obriga,
Hidrelétricas
Na bacia se destacam três Usinas Hidrelétricas (UHE) e dezenas de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH, com até 30MW). As Hidrelétricas são UHE Castro Alves (130MW), UHE Monte Claro (130 MW), UHE 14 de Julho (100MW). É importante destacar que a FEPAM já realizou, há cerca de 20 anos, uma Avaliação Ambiental Integrada (AAI) da bacia do rio Taquari-Antas, recomendando que ⅓ de um conjunto de mais de 50 hidrelétricas não fosse construído e que outro tanto passasse por rígidos estudos de impacto ambiental.
No caso atual da tragédia do rio Taquari-Antas, oMinistério Público Federal solicitouinformações de providências à Defesa Civil e também cópias de todas as comunicações eventualmente recebidas de parte da Companhia Energética Rio das Antas (Ceran), responsável por hidrelétricas no rio, sobre o monitoramento do aumento do nível das águas do rio em decorrência das chuvas e, eventualmente, abertura de comportas, situação que vem sendo imputada à empresa por parte de moradores atingidos à jusante dos empreendimentos hidrelétricos. A empresa negou apresentar comportas com abertura em fluxos mais elevados dos rios.
Por outro lado, um documento da CERAN, no caso da UHE Castro Alves, denominado “PACUERA – Plano Ambiental de Conservação e Uso do Entorno a Das Águas” (ABG, 2013) admite a presença de comportas e modificação eventual de vazão da mesma para facilitar esportes, em especial rafting (página 43): “ ‘comporta do rafting’ pela qual é possível regular o fluxo de água e liberar mais volume de água para a prática do esporte”. Ou seja, não se pode afirmar que as hidrelétricas ou pequenas centrais hidrelétricas da bacia tenham alguma influência no problema das cheias. É um assunto delicado, ainda mais em um momento desses. Mas, evidentemente, as hidrelétricas, em outras regiões, influenciam desde a retirada da mata ciliar até algumas mudanças na vazão dos rios, principalmente pela abertura de comportas, alteração na sedimentação do rio, etc.,criando, pelo menos em outros rios, picos abruptos de elevação dos rios à jusante das barragens após a abertura das comportas. De qualquer maneira, é papel do órgão ambiental, em especial a FEPAM, monitorar a gestão do fluxo da água dos rios por parte de UHEs e PCHs.
Em trabalho coordenado pela ONGWWF(2012) foram identificados treze fatores de risco na bacia do rio Paraguai, entre eles, os três primeiros, nesta ordem, são: centrais hidroeléctricas, urbanização e agricultura.
Na Amazônia, o ecólogoPhilip Fearnside (2015), do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, afirma que na Hidrelétrica de Balbina (PA), na estação de chuvas, a grande quantidade de chuvas que pudesse passar por cima do limite do barramento, causaria danos, o que “obrigou a ELETRONORTE a abrir as comportas completamente. Em consequência disto, o nível do rio entre Balbina e Cachoeira Morena subiu vários metros acima do seu máximo normal, assim inundando as casas e muitas das roças dos residentes ao longo do rio, assim como os poços que a ELETRONORTE tinha cavado para eles”. Háinformações desencontradasquanto à abertura de comportas durante as cheias do rio Taquari por parte de hidrelétricas, o que deve ser esclarecido pelos órgãos responsáveis. (continua)
No ar, o”Hino” ao Inominável. Com letra de Carlos Rennó e música de Chico Brown e Pedro Luís.
Autoironicamente intitulada “hino”, é uma canção-manifesto contra a contra a candidatura de Jair Bolsonaro (PL) à presidência da República.
Num vídeo criado pelo Coletivo Bijari (versão integral, acima, tem 13min40), 30 artistas interpretam-na.
Entre eles, Wagner Moura, Bruno Gagliasso, Lenine, Zélia Duncan, Chico César, Paulinho Moska, Leci Brandão, Marina Lima, Mônica Salmaso e Zélia Duncan.
Os versos falam de temas recorrentes no discurso do ex-capitão, como a ditadura militar, racismo, machismo, destruição ambiental.
Citam literalmente ou se baseiam em declarações dadas pelo ‘inominável’ e encontradas na internet e em jornais.
“Feito pra lembrar, pra sempre, esses anos sob a gestão do mais tosco dos toscos, o mais perverso dos perversos, o mais baixo dos baixos, o pior dos piores mandatários da nossa história. E pra contribuir, no presente, pra não reeleição do inominável”, frisa o texto que acompanha o vídeo lançado nesse em 17-09-2022.
“Na íntegra, são 202 versos, mais o refrão, contra o ódio e a ignorância no poder no Brasil”, prossegue o texto.
Que arremata: “Porém, apesar dele – e do que, e de quem e quantos ele representa – a mensagem final é de luz, a luz que resiste, pois, como canta o refrão ‘Mas quem dirá que não é mais imaginável / Erguer de novo das ruínas o país?’”.
“Sou a favor da ditadura”, disse ele, “Do pau de arara e da tortura”, concluiu. “Mas o regime, mais do que ter torturado, Tinha que ter matado trinta mil”. E em contradita ao que afirmou, na caradura Disse: “Não houve ditadura no país”.
E no real o incrível, o inacreditável Entrou que nem um pesadelo, infeliz, Ao som raivoso de uma voz inconfiável Que diz e mente e se desmente e se desdiz.
Disse que num quilombo “os afrodescendentes Pesavam sete arrobas” – e daí pra mais: Que “não serviam nem pra procriar”, Como se fôssemos, nós negros, animais. E ainda insiste que não é racista E que racismo não existe no país.
Como é possível, como é aceitável Que tal se diga e fique impune quem o diz? Tamanha injúria não inocentável, Quem a julgou, que júri, que juiz?
Disse que agora “o índio está evoluindo, Cada vez mais é um ser humano igual a nós. Mas isolado é como um bicho no zoológico”, E decretou e declarou de viva voz: “Nem um centímetro a mais de terra indígena!, Que nela jaz muita riqueza pro país”.
Se pronuncia assim o impronunciável Tal qual o nome que tal “hino” nunca diz, Do inumano ser, o ser inominável, Do qual emanam mil pronunciamentos vis.
Disse que se tivesse um filho homossexual, Preferiria que o progênito “morresse”. Pruma mulher disse que não a estupraria, Porque “você é feia, não merece”. E ainda disse que a mulher, “porque engravida”, “Deve ganhar menos que o homem” no país.
Por tal conduta e atitude deplorável, Sempre o comparam com alguns quadrúpedes. Uma maldade, uma injustiça inaceitável! Tais animais são mais afáveis e gentis.
Mas quem dirá que não é mais imaginável Erguer de novo das ruínas o país?
Chamou o tema ambiental de “importante Só pra vegano que só come vegetal”; Chamou de “mentirosos” dados científicos Do aumento do desmatamento florestal. Disse que “a Amazônia segue intocada, Praticamente preservada no país”.
E assim negou e renegou o inegável, As evidências que a Ciência vê e diz, Da derrubada e da queimada comprovável Pelas imagens de satélites.
E proclamou : “Policial tem que matar, Tem que matar, senão não é policial. Matar com dez ou trinta tiros o bandido, Pois criminoso é um ser humano anormal. Matar uns quinze ou vinte e ser condecorado, Não processado” e condenado no país.
Por essa fala inflexível, inflamável, Que só a morte, a violência e o mal bendiz, Por tal discurso de ódio, odiável, O que resolve são canhões, revólveres.
“A minha especialidade é matar, Sou capitão do exército”, assim grunhiu. E induziu o brasileiro a se armar, Que “todo mundo, pô, tem que comprar fuzil”, Pois “povo armado não será escravizado”, Numa cruzada pela morte no país
E num desprezo pela vida inolvidável, Que nem quando lotavam UTIs E o número de mortos era inumerável, Disse “E daí? Não sou coveiro”. “E daí?”
“Os livros são hoje ‘um montão de amontoado’ De muita coisa escrita”, veio a declarar. Tentou dizer “conclamo” e disse “eu canclomo”; Não sabe conjugar o verbo “concl…amar”. Clamou que “no Brasil tem professor demais”, Tal qual um imbecil pra imbecis.
Vigora agora o que não é ignorável: Os ignorantes ora imperam no país (O que era antes, ó pensantes, impensável)… Quem é essa gente que não sabe o que diz?
Mas quem dirá que não é mais imaginável Erguer de novo das ruínas o país?
Chamou de “herói” um coronel torturador E um capitão miliciano e assassino. Chamou de “escória” bolivianos, haitianos… De “paraíba” e “pau de arara” o nordestino. E diz que “ser patrão aqui é uma desgraça”, E diz que “fome ninguém passa no país”.
Tal qual num filme de terror, inenarrável, Em que a verdade não importa nem se diz, Desenrolou-se, incontível, incontável, Um rol idiota de chacotas e pitis.
Disse que mera “fantasia” era o vírus E “histeria” a reação à pandemia; Que brasileiro “pula e nada no esgoto, Não pega nada”, então também não pegaria O que chamou de “gripezinha” e receitou (sim!), Sim, cloroquina, e não vacina, pro país.
E assim sem ter que pôr à prova o improvável, Um ditador tampouco põe pingo nos is, E nem responde, falador irresponsável, Por todo ato ou toda fala pros Brasis.
E repetiu o mote “Deus, pátria e família” Do integralismo e da Itália do fascismo, Colando ao lema uma suspeita “liberdade”… Tal qual tinha parodiado do nazismo O slogan “Alemanha acima de tudo”, Pondo ao invés “Brasil” no nome do país.
E qual num sonho horroroso, detestável, A gente viu sem crer o que não quer nem quis: Comemorarem o que não é memorável, Como sinistras, tristes efemérides…
Já declarou: “Quem queira vir para o Brasil Pra fazer sexo com mulher, fique à vontade. Nós não podemos promover turismo gay, Temos famílias”, disse com moralidade. E já gritou um dia: “Toda minoria Tem de curvar-se à maioria!” no país.
E assim o incrível, o inacreditável, Se torna natural, quanto mais se rediz, E a intolerância, essa sim intolerável, Nessa figura dá chiliques mis.
Mas quem dirá que não é mais imaginável Erguer de novo das ruínas o país?
Por vezes saem, caem, soam como fezes Da sua boca cada som, cada sentença… É um nonsense, é um caô, umas fake-news, É um libelo leviano ou uma ofensa. Porque mal pensa no que diz, porque mal pensa, “Não falo mais com a imprensa”, um dia diz.
Mas de fanáticos a horda lamentável, Que louva a volta à ditadura no país, A turba cega-surda surta, insuportável, E grita “mito!”, “eu autorizo!”, e pede “bis!”
E disse “merda, bosta, porra, putaria, Filho da puta, puta que pariu, caguei!” E a cada internação tratando do intestino E a cada termo grosso e um “Talquei?”, O cheiro podre da sua retórica Escatológica se espalha no país.
“Sou imorrível, incomível e imbrochável”, Já se gabou em sua tão caracterís- Tica linguagem baixo nível, reprovável, Esse boçal ignaro, rei de mimimis.
Mas nada disse de Moise Kabagambe, O jovem congolês que foi aqui linchado. Do caso Evaldo Rosa, preto, musicista, Com a família no automóvel baleado, Disse que a tropa “não matou ninguém”, somente “Foi um incidente” oitenta tiros de fuzis…
“O exército é do povo e não foi responsável”, Falou o homem da gravata de fuzis, Que é bem provável ser-lhe a vida descartável, Sendo de negro ou de imigrante no país.
Bradou que “o presidente já não cumprirá Mais decisão” do magistrado do Supremo, Ao qual se dirigiu xingando: “Seu canalha!” Mas acuado recuou do tom extremo, E em nota disse: “Nunca tive intenção (Não!) De agredir quaisquer Poderes” do país.
Falhou o golpe mas safou-se o impeachável, Machão cagão de atos pusilânimes, O que talvez se ache algum herói da Marvel Mas que tá mais pra algum bandido de gibis.
Mas quem dirá que não é mais imaginável Erguer de novo das ruínas o país?
E sugeriu pra poluição ambiental: “É só fazer cocô, dia sim, dia não”. E pra quem sugeriu feijão e não fuzil: “Querem comida? Então, dá tiro de feijão”. É sem preparo, sem noção, sem compostura. Sua postura com o posto não condiz.
No entanto “chega! […] vai agora [inominável]”, Cravou o maior poeta vivo, no país, E ecoou o coro “fora, [inominável]!” E o panelaço das janelas nas metrópoles!
E numa live de golpista prometeu: “Sem voto impresso não haverá eleição!” E praguejou pra jornalistas: “Cala a boca! Vocês são uma raça em extinção!” E no seu tosco português ele não pára: Dispara sempre um disparate o que maldiz.
Hoje um mal-dito dito dele é deletável Pelo Insta, Face, YouTube e Twitter no país. Mas para nós, mais do que um post, é enquadrável O impostor que com o posto não condiz.
Disse que não aceitará o resultado Se derrotado na eleição da nossa história, E: “Eu tenho três alternativas pro futuro: Ou estar preso, ou ser morto ou a vitória”, Porque “somente Deus me tira da cadeira De presidente” (Oh Deus proteja esse país!”).
Tivéssemos um parlamento confiável, Sem x comparsas seus cupinchas, cúmplices, E seu impeachment seria inescapável, Comninquéritos, pedidos, CPIs.
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Não há cortina de fumaça indevassÁvel Que encubra o crime desses tempos inci-vis E tampe o sol que vem com o dia inadiÁvel E brilha agora qual farol na noite gris. É a esperança que renasce onde HÁ véu, De um horizonte menos cinza e mais feliz. É a passagem muito além do instagramÁvel Do pesadelo à utopia por um triz, No instante crucial de liberdade instÁvel Pros democráticos de fato, equânimes, Com a missão difícil mas realizável De erguer das cinzas como fênix o país.
E quem dirá que não é mais imaginável Erguer de novo das ruínas o país?
Mas quem dirá que não é mais imaginável Erguer de novo das ruínas o país?
“Hino” ao Inominável
Produção e direção musical:Xuxa Levy
Produção e direção artística:Carlos Rennó
Colaboração musical e artística:Pedro Luís e Chico Brown
Intérpretes
André Abujamra
Arrigo Barnabé
Bruno Gagliasso
Caio Prado
Cida Moreira
Chico Brown
Chico César
Chico Chico
Dexter
Dora Morelenbaum
Héloa
Hodari
Jorge Du Peixe
José Miguel Wisnik
Leci Brandão
Lenine
Luana Carvalho
Marina Íris
Marina Lima
Monica Salmaso
Paulinho Moska
Pedro Luís
Péricles Cavalcanti
Preta Ferreira
Professor Pasquale
Ricardo Aleixo
Thaline Karajá
Vitor da Trindade
Wagner Moura
Zélia Duncan
Músicos:
Ana Karina Sebastião: baixo Cauê Silva : percussão Fábio Pinczowski: teclados Juba Carvalho: percussão Léo Mendes: guitarra Thiago Silva: bateria Webster Santos: violões Xuxa Levy: máquina de escrever e programações
Participação especial:violoncelista Jacques Morelenbaum
Vídeo:
Coletivo Bijari Edição: Guilherme Peres Direção de fotografia: Toni Nogueira
Enquanto nossa “imprensa de mercado” segue fingindo pavor com o tamanho da PEC da Transição e exigindo que Lula designe o que pretende seja seu delegado no Ministério da Fazenda, a fim de que possa, desde logo, “domesticá-lo” a seus interesses, é paupérrima e superficial a cobertura do que será, a partir de amanhã, a reinserção do Brasil na principal agenda econômica do planeta no século 21, a desesperadora necessidade de reverter a destruição ambiental e suas consequências climáticas.
Nada mais próprio da mediocridade de uma elite que só consegue ver o país como um entreposto comercial e, pior ainda, sequer capaz de, mesmo na produção e comercialização de bens primários, enxergar alguma coisa diferente de um contínuo aumento de oferta, ainda que isso só agrave a injustiça e a ruína dos termos de troca internacionais.
Eles acham que “agenda ambiental” para o Brasil se resume a conseguir umas quantas “doações” ou “empréstimos a fundo perdido” para o país, apenas para se refletirem em comerciais institucionais de televisão para governos e empresas ou páginas coloridas em seus relatórios de “responsabilidade social e ambiental”. No máximo, alguma coisa que “entre” no tal mercado de “créditos de carbono”, uma historinha que ouvimos há mais de uma década, sem produzir resultados reais nas economias periféricas como a nossa.
Quando pensam na participação brasileira na questão o fazem pensando assim, na qual o sucesso é apenas uma boa barganha financeira, na qual um Brasil “esperto” faria uma espécie de chantagem com seus ativos ambientais, como a Amazônia.
Não é isso que verão a partir de amanhã.
Lula vai propor algo muito além disso. Vai colocar o Brasil à frente de uma proposta de um acordo mundial muito mais complexo que isso, no qual os países importadores de energia e alimentos assumam responsabilidades pelos danos que a produção destes bens cria ambiental e socialmente para as nações que precisam desta exploração para suas economias funcionarem e atenderem – ainda que mínima e insuficientemente – às necessidades de suas populações.
O Brasil, através dele, não vai condicionar a isso a fixação de suas metas ambientais e muito menos colocar suas ações sob o controle internacional. Não precisamos de bravatas amazônicas, como fez o governo que se encerra, para isso.
O que será posto é que não se trata de uma opção para as economias mais fortes assumir uma postura diferente daquela que drenou recursos e riquezas naturais do mundo colonizado durante séculos. Será dizer que é isso ou o suicídio, porque o planeta é uno e indivisível quando se trata da sobrevivência dos povos e que não fazem nenhum favor aos países em desenvolvimento ao definirem regras e iniciativas que estimulem, inclusive na economia, as condições sociais para que o ambiente seja preservado e, até, recuperado naquilo que for possível.
Esta é a posição necessária para, ao longo dos próximos meses, chegar a iniciativas concretas na governança mundial e a chave para que o Brasil assuma uma posição decisiva na sua formulação.
O Brasil da Cop-27 não será um pedinte, mas um líder, se quisermos ir a algum lugar.
Mas isso é, de fato, um raciocínio complexo demais para uma mídia e uma elite financeira que acha que não podemos ir além de passar o chapéu.
Apreensivos com os resultados do primeiro turno das eleições no Brasil e de olho na votação do próximo dia 30, manifestantes se reuniram neste sábado (22) na Place de la Nation, a leste de Paris, em defesa da democracia.
Por Andréia Gomes Durão /RFI
Ídolo dentro e fora dos gramados, o eterno craque Raí subiu ao palanque compartilhando com o público seu entusiasmo pelo exercício cívico de ir às urnas no segundo turno, convidando os eleitores a votarem “contra as desigualdades sociais, à agressão ao meio ambiente, contra o desrespeito ao direito das minorias e contra o ódio, mas principalmente a votarem a favor do amor”.
Sob gritos de “Fora Neymar”, que declarou publicamente seu apoio a Jair Bolsonaro, Raí afirmou que “o Brasil se encontra em um momento terrível, depois de tudo que se passou nos ‘últimos quatro anos’”, se recusando a pronunciar o nome do atual presidente brasileiro.
Representantes e líderes de entidades francesas e brasileiras comprometidas com a defesa da democracia se revezavam no palco. A presidente do grupo Amitié France-Brésil no Senado, Laurence Cohen, destacou a importância de mostrar que, “na França, há uma solidariedade em relação ao Brasil, em relação à democracia”.
“Já dei meu apoio a Lula quando ele estava na prisão, assim como me solidarizei a Dilma Rousseff, quando ela foi ameaçada de impeachment e, infelizmente, conseguiram tirá-la do poder. [...] É preciso mostrar que os democratas franceses estão mobilizados pelo mundo inteiro, e não apenas pelo Brasil, onde a democracia está ameaçada porum governo que tem ódio da população negra e dos povos autóctones, que é contra o direito das mulheres”, enfatiza a senadora em declaração àRFI.
“Sociedade francesa atenta”
Glauber Sezerino, co-presidente da associação Autres Brésils, uma das entidades organizadoras da manifestação, faz coro ao discurso de Laurence Cohen, uma vez que o ato evidencia que “a sociedade francesa está atenta ao que está em jogo hoje no Brasil, que é a continuidade de um projeto mortífero”.
“Vimos um aumento considerável de assassinatos no Brasil, um aumento da pobreza, da fome. E nós conseguimos reunir uma série de organizações francesas, que desenvolvem trabalhos na França, mas com um olhar em relação ao Brasil, para mostrar que o Brasil não aguenta mais quatro anos de governo Bolsonaro. Estamos mostrando que vamos continuar mobilizados, solidários a todos os movimentos no Brasil”, sublinha Sezerino.
Em seu discurso, a ativista indígena e antropóloga Kowawa Apurinã falou da importância da luta de todos os povos “com esse sentimento de mudar o mundo”. “A democracia é uma utopia que nós estamos sempre correndo atrás dela, e no Brasil ela está se tornando algo quase inalcançável.A resistência se faz em ocupar todos os lugares de luta, não só pelo poder, mas uma luta de vida no Brasil.Nós estamos lidando com o mal, estamos lidando com coisas malignas. O Brasil está na escuridão. Nas eleições, esperamos que o fascismo seja finalmente derrotado. [...] Se Bolsonaro não cair, iremos fazer uma revolução.”
A condição dos povos originários também estava entre as principais motivações para a artista plástica Cláudia Camposs participar da manifestação, uma vez que as populações indígenas tangenciam de diversas formas seu trabalho. “Estou muito emocionada com esse movimento todo a favor da democracia aqui em Paris. E eu sempre fui muito motivada às alianças com os representantes indígenas dentro da minha arte.É inadmissível manter Bolsonaro no poder, porque os direitos [desses povos] não estão sendo respeitados.Ele é um genocida e não dá a essas pessoas o direito de viver em seus territórios ancestrais. Isso já acontecia, é histórico, mas piorou muito. A democracia tem que ser defendida, [...] não podemos privilegiar apenas os interesses do homem branco”.
Meio ambiente
Não somente os povos originários, mas uma pauta tão inerente quanto, o meio ambiente, é o que leva o animador gráfico Meton Joffily a participar desta manifestação com uma obra em punho: uma releitura do mapa do Brasil. “Não é só o Brasil que está em jogo. Meu cartaz vem aqui manifestar esta preocupação com a Amazônia, com o tip point, o ponto de não retorno, que está muito próximo. E ainda há brasileiros achando que Bolsonaro é aceitável, depois de quatro anos as pessoas ainda votam nele. Ou elas são inocentes e estão sendo manipuladas pelas mentiras e fake news ou são meio mal caráter e concordam com essa agenda que é realmente autoritária. Todo mundo sabe que um segundo mandato vai fechar o caixão do Brasil.”
O também artista plástico Julio Villani expressou sua preocupação em “recuperar tudo que o Brasil perdeu”. “Sobretudo essa destruição da palavra que a extrema direita tem feito no mundo e especialmente no Brasil é a coisa que mais me tira o sono. Porque quando a palavra perde o sentido, a educação perde o sentido, a cultura, tudo é destruído. E é o retrato do Brasil atual. Eu tento ao máximo ser otimista. Eu tento me agarrar a esse otimismo, porque a gente ainda vai ter que lutar muito.”
Para o performer, coreógrafo e escritor Wagner Schwartz, esse encontro de pessoas e ideias representa um exercício democrático. “O mais importante de estar aqui é de encontrar as pessoas que são constituintes, que compõem esse grupo que forma a democracia no Brasil. É importante que a gente se encontre nesse momento porque a democracia realmente está em crise. E quando a gente se vê, a gente se sente menos desamparado”, acredita.
Para o artista plástico Ivar Rocha, encontros como esse, em defesa da democracia, são também uma oportunidade de autocrítica. “É importante olhar para este momento como uma crítica para a esquerda, para nós todos, para entender a fragilidade do momento e entender que todos nós temos que dar um passo à frente. Porque meu medo, além do Bolsonaro, é constatar que a nossa geração talvez esteja longe de fato querer lutar pela emancipação do homem, e sim querer humanizar um capital, e isso seria uma tragédia muito maior do que qualquer Bolsonaro. Um momento como esse serve para a gente refletir e entender qual é nosso limite, quais são as nossas fronteiras na luta, na entrega, na organização.”
O psicólogo e fotógrafo Jean-Pierre Guis destaca que, independentemente no resultado nas urnas no próximo domingo, o Brasil seguirá fortemente dividido, o que torna a defesa da democracia ainda mais relevante para assegurar o diálogo e o equilíbrio entre lados tão opostos, que ele traduz como o contraste entre o paraíso – os avanços durante o governo Lula, a cultura brasileira, o calor humano de seu povo – e o inferno, representado pela gestão de Bolsonaro, pela manipulação dos evangélicos e pela agravamento das desigualdades sociais. “Sem um Brasil democrático, o planeta Terra terá se tornado um erro”, ele sintetiza.
“Deus levantou Bolsonaro”, disse Zequinha Marinho no 7 de Setembro; candidato ao governo do Pará atua ao lado de Éder Mauro como interlocutor de garimpeiros e madeireiros em Brasília (Foto: João Laet/Repórter Brasil)
Matar passou a ser um símbolo político do Bolsonarismo. Matar índio. Matar negro. Matar favelado. O evangélico eleitor de Bolsonaro faz vista grossa para o “Não matarás” (Ex 20,13). Apenas cisma com o aborto.
Nesta eleição não vote em deputado homicida. O Congresso parece um coito do cangaço. Tem até serial killer, o psicopata que matou mais de três pessoas.
A ditadura militar de 1964 registra a presença nojenta, viscosa, de militares e policiais serial killers como os coronéis Ustra, Paulo Manhães, os delegados Fleury, Pedro Seelig.
No Congresso e assembléias legislativas temos parlamentares que, nesta campanha presidencial, ameaçaram matar Lula. Na lista aparecem homicidas e arruaceiros prontos para o golpe, para a guerra civil de Bolsonaro, que já anunciou o Brasil precisa matar uns 30 mil políticos, para o progresso de sua imobiliária, e expansão do Escritório do Crime sediado no Rio das Pedras, rio de sangue do senhor capitão, pistoleiro de aluguel, Adriano Magalhães da Nóbrega, que na cadeia, recebeu "ao menos duas visitas" do presidente e seu filho mais velho, o senador Flávio Bolsonaro, relata Juliana Dal Piva.
Os parlamentares que ameaçaram matar Lula: Marcio Tadeu Anhaia de Lemos, Eliezer Girão Monteiro, André Luiz Vieira de Azevedo, Paulo Adriano Lopes Lucinda Telhada, Washington Lee Abe, Otoni de Paula Junior, Carla Zambelli, Junio Amaral. Não sei qual alma sebosa tem a marca de Caim.
Ex-delegado, Éder Mauro (PL-PA) assume ter executado várias pessoas e camufla atuação contrária aos povos do campo e ao meio ambiente com discurso moralista; candidato é alvo de 101 denúncias em ouvidoria por sua atuação como policial
Depois de rezar e cantar o hino nacional, o deputado federal Éder Mauro (PL-PA), candidato à reeleição, começa seu discurso dizendo que, caso a esquerda volte ao poder, o incesto será legalizado, “para que o pai possa casar com a filha”. É umamentirausada pelo ex-delegado ao longo da campanha e que voltou a ser repetida, em Belém (PA), em ato de comemoração ao 7 de Setembro. Mas o tom moralista, ao lado da atuação como policial com pretensão de justiceiro, serve para camuflar outra faceta dopolítico: a de ruralista que atua sistematicamente contra omeio ambientee os povos do campo.
Éder Mauro, 61 anos, foi delegado da Polícia Civil do Pará por 30 anos, entre 1984 e 2014, quando foi eleito deputado federal pela primeira vez. Já disse que “matou muita gente”, masfez uma ressalva: “todos eram bandidos”. Por sua atuação como policial, foi alvo de pelo menos 101 denúncias na Ouvidoria do Sistema Integrado de Segurança Pública e Defesa Social (Sieds) do Pará, que incluem acusações de assassinatos, torturas e invasões de domicílio, segundo levantamento obtido pelaRepórter Brasil. O ex-delegado foi citado norelatório final da ‘CPI das Milícias’ da Assembleia Legislativa do Pará, em 2015, mas acabou não sendo indiciado.
O político usa um emoticon de caveira no Instagram para ostentar seu posto de líder da bancada da bala na Amazônia. Mas a análise de sua atuação na Câmara sugere que poderia trocar a imagem por um boi: o deputado é o terceiro pior colocado noRuralômetro 2022, ferramenta desenvolvida pelaRepórter Brasilque avalia a atuação da Câmara em temas como meio ambiente, povos indígenas, quilombolas e trabalhadores rurais. O ranking, que está em sua segunda edição, possibilita saber a “febre ruralista” de cada parlamentar. Nele,Éder Mauro arde com temperatura de 40,9°C.
Na atual legislatura, Mauro foi o único deputado com atuação 100% negativa para o meio ambiente e os povos do campo, segundo as 22 organizações que avaliaram as votações e os projetos de lei usados para pontuar os parlamentares no Ruralômetro. Em todas as 17 votações que participou, o ex-delegado foi contrário à agenda socioambiental, apoiando a regulamentação de atividades econômicas em terras indígenas, a ampliação da posse de armas no campo, a dispensa do licenciamento ambiental para diversos empreendimentos e a liberação de agrotóxicos cancerígenos. Também foram classificados como negativos os três projetos de lei de sua autoria compilados pela ferramenta.
Amazônia na mira
A pauta ambiental foi apenas figurante no 7 de Setembro, quando o deputado desfilou em cima de uma aparelhagem de som pelo bairro Umarizal, o mais nobre de Belém. Somente um discreto cartaz em um caminhão fazia uma referência à temática. “A Amazônia é dos brasileiros, não dos piratas estrangeiros”, dizia.
Cartaz era das poucas referências à Amazônia no ato em Belém; silêncio contrasta com a forte atuação do bolsonarismo paraense nos retrocessos ambientais (Foto: João Laet/Repórter Brasil)
Estrela da extrema-direita paraense em campanha pela reeleição, o candidato prefere flertar com o eleitorado evangélico e conservador, que o tietava de verde e amarelo pelas ruas de Belém. Prioriza a mesma estratégia em suas redes sociais, onde possui quase 450 mil seguidores. Declarando guerra contra pedófilos e comunistas imaginários, Éder Mauro vai deixando pelo caminho não apenas as vítimas de sua atuação na polícia: como defensor dogarimpo, o ex-delegado atira para matar contra o futuro da Amazônia.
Protagonista da parada paramilitar, a caminhonete que puxou a aparelhagem de som de Éder Mauro recebeu também o senador e candidato ao governo do Pará Zequinha Marinho (PL-PA) que, em seu discurso, disse que Bolsonaro foi uma escolha do “pai celestial”.
Além de devotos do presidente, Zequinha Marinho e Éder Mauro estão unidos pela defesa do garimpo. Pastor da Assembléia de Deus, o senador é um dos principais lobistas para legalização da exploração mineral em terras indígenas, como mostrou aRepórter Brasilemjulho do ano passadoe emfevereiro deste ano. “Chama o Zequinha” se tornou uma frase repetida por quem busca sua ajuda para atividades ilícitas,revelou a Públicaem agosto.
Éder Mauro, por sua vez, é autor de projetos de lei que favorecem o garimpo, dos quais dois estão na base de dados doRuralômetro. O PL 5.248 permite que órgãos municipais possam fazer o licenciamento ambiental de lavras garimpeiras de pequeno porte, fragilizando a fiscalização, e o PL 5.822 quer autorizar o garimpo em reservas extrativistas.
Na mesma época, Zequinha e Éder repetiram a dobradinha ao articular umareunião de garimpeiros do Sul do Pará com a cúpula do governo Bolsonaro. O intuito do encontro era acalmar protestos de representantes do setor após uma operação ambiental destruir máquinas usadas pelo garimpo ilegal.
Já acostumado a se posicionar na Câmara a favor dos ruralistas, Mauro decidiu tornar-se um deles em 2020, com a compra de uma fazenda de 300 hectares no município de Bujaru, no nordeste do Pará.A transação é investigada pela Polícia Civildo estado por suspeita de fraude, pois a área foi registrada em 2018 em nome de uma pessoa que já estava morta havia 15 anos. Avaliada em R$ 2,8 milhões, a fazenda Bênção Divinal foi adquirida por Mauro por R$ 330 mil e ajudou a dar corpo ao seu patrimônio, que quintuplicou desde que entrou para a política. Na eleição de 2014, o então delegado declarou bens que somavam R$ 595 mil, valor que subiu para R$ 2,9 milhões no atual pleito.
Entre os doadores da sua campanha neste ano está Walacy da Silva Moraes. O valor de R$ 12 mil doado diz respeito ao uso de uma caminhonete pela campanha do ex-delegado. O doadorfoi preso em 2014acusado justamente de participar de uma organização criminosa especializada em roubar esse tipo de veículo no Pará. Moraes é réu pela acusação e responde em liberdade. Parte dos processos a que a reportagem teve acesso mostram que Éder Mauro estava à frente da investigação do grupo quando era delegado. Questionado sobre a doação e sobre sua relação com Moraes, o deputado não respondeu.
Procurado pelaRepórter Brasil, Moraes confirmou o empréstimo da caminhonete para a campanha de Mauro. Ao ser questionado sobre o processo que corre na Justiça, a ligação caiu, e o empresário não voltou a atender o telefone nem respondeu às perguntas enviadas por mensagem
Liberdade de opressão
Um triciclo preto ornado com caveiras e correntes era palco de selfies de apoiadores de Éder Mauro. “Bolsonaro e os candidatos dele defendem a liberdade e a livre expressão”, elogiou um homem fantasiado de Capitão América.
Adotando a mesma estratégia de Jair Bolsonaro, Mauro abusa dessa “liberdade de expressão” para capturar a atenção com polêmicas e desviar dos assuntos mais importantes, como as acusações de corrupção envolvendo sua família – irmão do ex-delegado, Amaurivaldo Cardoso Barra foi exonerado em março deste ano da Secretaria Nacional de Pesca apósoperação da Polícia Federal que investigou fraudes no órgão público.
Em seus oito anos no Congresso, mulheres de esquerda foram os alvos preferidos de seus ataques. Em um desses bate-bocas, Mauro acusou a deputada federal Vivi Reis (PSOL-PA) de defender “indígenas fake” (questionar a legitimidade do movimento indígena é uma das obsessões do ex-delegado nas redes sociais). Ao rebater, a parlamentar disse que fake era a peruca dele, em referência à franja com fios mais negros que a asa da graúna. O penteado do bolsonarista rendeu-lhe o apelido de “peruquinha” entre seus inimigos políticos.
Em outra ocasião, chamou a deputada Maria do Rosário (PT-RS) de “Maria do Barraco”, ao que ela rebateu chamando-o de “assassino”. “Infelizmente, já matei, sim, e não foram poucos, foi muita gente”, contestou Éder Mauro.
“Estou respondendo um monte de processo na Justiça por homicídio, invasão de propriedade e alguns por tortura, mas nenhum por corrupção”, reiterou em entrevista recente a umpodcast paraense.
A fama de justiceiro e o orgulho em dizer que matou muitas pessoas contrasta com a ausência de condenações de Éder Mauro, que já foiabsolvido de duas acusações de tortura pelo STF. Advogados, defensores de direitos humanos e líderes comunitários foram procurados pela reportagem para saber sobre o passado policial do ex-delegado, mas quando o assunto da entrevista é revelado, quase ninguém fala abertamente. A justificativa: “medo”.
Entre as poucas pessoas dispostas a falar sobre Éder Mauro em Belém está Bruna Lorrane, especialista em marketing eleitoral e digital. Em 2019, durante uma eleição para uma associação de bairro, ela e o deputado apoiavam diferentes candidatos. “O candidato dele estava perdendo e queria encerrar a votação antes do horário. Eu não deixei, fiquei na porta para impedir a entrada e fui agredida”, relata Bruna, que diz ter ficado com o corpo repleto de hematomas e está processando Mauro pela agressão.
“As pessoas gritavam dizendo que era covardia bater em mulher e o Éder Mauro respondia: ‘não tem mulher nenhuma para eu bater aqui’”, lembra Bruna, que é transexual. Após a agressão ganhar onoticiário paraense, passou a ser atacada por uma horda virtual da extrema direita.
Outra vítima de Éder Mauro e seus discípulos é o coordenador da campanha da candidata a deputada federal Nice Tupinambá (PSOL), Richard Callefa. Ativista do movimento LGBTQIA+ no Pará, Callefa foi eleito coordenador do diretório de estudantes da maior universidade privada do estado em 2019. Depois da eleição, Mauro criticou o ativista em suas redes sociais, o que o tornou alvo até de ameaças de morte. “Ele estimulou o ódio”, lembra.
Pouca surpresa para alguém, como eu, que já escreveu tanto sobre esses ataques a essa serra rica em minério de ferro.
Talvez eu pudesse me surpreender pela hora (três da madrugada, quando boa parte das aves que moram ali estão dormindo) em que os esforçados burocratas do governo de Minas encerraram o processo de votação. Num sábado!
Não faço ideia de quem os esporeou – ou de quanto ganharam de bônus pelo trabalho extra. Há empresários que sabem recompensar bem seus subordinados, quando o lucro possibilitado pela dedicação e empenho de um grupo de oito pessoas é previsivelmente muito grande.
Mas tem gente que trabalha até de graça…
Também não me surpreendi, nem um pouco, ao ler que o representante da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) votou a favor da Taquaril Mineração S.A. (Tamisa).
Por outro lado, ando descrente da possibilidade de que a Justiça impeça que esse novo ataque que se fez sob as bênçãos do governador Romeu Zema – um empresário bem sucedido – se concretize.
Enfim, boa sorte aos ambientalistas e políticos que vão tentar a empreitada de reverter a decisão do Copam em ano eleitoral.
O correspondente do jornal francêsLe Mondeno Brasil, Bruno Meyerfeld, lança nesta segunda-feira (12), em Paris, o livro “Cauchemar brésilien” (Pesadelo brasileiro, em tradução livre) pela Editora Grasset. Baseada em reportagens pelo país, entrevistas e pesquisas sobre a história política do Brasil, a obra expõe a visão do jornalista sobre a personalidade e a trajetória do presidente brasileiro Jair Bolsonaro e as ações de seu governo.
“O Bolsonaro é uma figura diversa e muito complicada. Foi difícil atribuir um título só para esse personagem. Ele é um produto do interior do Brasil, do Rio de Janeiro, onde foi deputado durante muitos anos, e um produto da política de Brasília”, diz Meyerfeld sobre o processo que o levou a escolher o título da obra.
“Alguns dizem que ele é um doente, um louco, outros dizem que ele é um grande estrategista, que conseguiu criar uma configuração perfeita para chegar ao poder. Ao mesmo tempo, outros dizem que é um ditador, um fascista. Mas os que gostam dele dizem que ele é um democrata e que o STF o impede de governar”.
Finalmente o título do livro foi definido em uma conversa de bar no Rio, quando uma prima do jornalista expressou seu sentimento de que sob Bolsonaro os brasileiros vivem um verdadeiro pesadelo.
“Pesadelo é interessante porque é apavorante, parece surreal, mas fala muito sobre você e seu inconsciente. Acho isso uma característica muito forte do Bolsonaro e tão louco que pareça o bolsonarismo hoje, e especificamente o presidente, ele fala muito sobre a história do Brasil, a sociedade brasileira e suas raízes. Para mim, de certa forma, ele é um pesadelo”, diz o jornalista franco-brasileiro.
Sob o ponto de vista francês, a política do governo Bolsonaro para o meio ambiente é um dos pontos que justifica qualificar sua gestão de pesadelo. “Para os franceses, esse processo de destruição incrível que acontece na Amazônia é apavorante”, afirma. Mas, segundo Meyerfeld, para os brasileiros,as maiores críticas podem vir da gestão da Covid-19 e da crise econômica, agravada pela inflação alta, a taxa de desemprego e a fome que atinge 33 milhões de cidadãos.
No entanto, para o correspondente doLe Monde, que chegou ao Brasil em 2019, quando Bolsonaro assumiu o governo, o mais grave diz respeito à crise relacionada à democracia do país. “Os ataques do Bolsonaro, dos bolsonaristas e de seu governo contra as instituições e contra as urnas eleitorais e o sistema de votação brasileiro, que era um motivo de orgulho dos brasileiros até hoje, vão ter consequências no longo prazo”, avalia.
O grande número de armas em circulação no Brasil, estimado em 1 milhão, também são motivo de preocupação. “Essas armas vão ficar e poderão ter um impacto bastante grande nas relações sociais e no clima de violência que existe no Brasil”.
No texto, o autor alerta que o Brasil se transformou em uma espécie de “laboratório sobre os riscos do extremismo” e Bolsonaro é uma demonstração concreta do que o populismo de extrema direita é capaz de fazer, como a propagação da desconfiança na democracia e a utilização das redes sociais em um país que se encontra, segundo Bruno, em uma “bolha”. “Nessa bolha você pode fazer e falar o que quiser, exprimir qualquer tipo de opinião e está tudo bem. Tudo é muito extremo no Brasil porque às vezes você não tem o autocontrole, uma parte da sociedade brasileira se sente legítima para falar o que quiser”, afirma.
Bruno Meyerfeld refuta qualqueratribuição de Bolsonaro como “Trump Tropical”, em referência ao ex-presidente americano Donald Trump, ou de comparações com outros políticos populistas, como o húngaro Viktor Orban e a francesa Marine Le Pen, líder da extrema direita no país. “Isso é ignorar as especificidades do Brasil e do Bolsonaro. Ele é produto de uma história do Brasil moderno, da ditadura militar, da época da construção de Brasília também dos anos 1950 e 60, e de 30 anos de democracia. Ele tem características próprias”, garante.
França virou obstáculo
No livro de 361 páginas, Meyerfeld busca fornecer pistas de reflexão para os franceses que, na sua opinião, estão com uma certa dificuldade em acompanhar as mudanças que ocorreram no Brasil desde a ascensão de Jair Bolsonaro ao poder.
“Estou percebendo uma forma de incompreensão muito forte. O Brasil de alguns anos atrás era visto como um símbolo de desenvolvimento, progresso de uma democracia mais alegre e progressista, com um líder operário que conseguiu tirar milhões de pessoas da pobreza e de diminuir a taxa de desmatamento em 80%, era algo forte. Era uma democracia nova que estava dando certo. Hoje, com o Bolsonaro, que é visto aqui como o extremo do extremismo, um símbolo de desespero e retrocesso, as pessoas não entenderam muito bem a transição”, avalia.
Durante o processo da produção do livro, Bruno Meyerfeld tentou várias vezes entrevistar o presidente, mas sem sucesso. Segundo ele, Bolsonaro não tem uma relação difícil apenas com a imprensa brasileira, mas também com os jornalistas estrangeiros e particularmente franceses. O obstáculo é reflexo também deuma crise diplomática entre os dois países depois dos embates de Jair Bolsonaro com o francês Emmanuel Macron, um recorrente crítico das políticas ambientais em vigor no Brasil. “Há pessoas inclusive do primeiro escalão do governo [brasileiro] que têm bastante respeito, até são francófilas, mas tem uma certa dificuldade em demonstrar afinidade por causa dessa briga do presidente com Emmanuel Macron”, explica.
“Fui a Brasília várias vezes, falei com vários assessores e entendi muito rapidamente que Bolsonaro não iria dar uma entrevista a um jornalista francês”. O pior, segundo Bruno Meyerfeld, é que o presidente conseguiu expandir sua visão hostil sobre a França para diferentes regiões. “Muitos setores favoráveis ao presidente Bolsonaro têm uma antipatia e até uma certa raiva contra a França. Isso dificulta muito mais o meu trabalho”, explica.
O livro “Cauchemar Brésilien” é lançado às vésperas do 1° turno da eleição presidencial no Brasil, ocasião para os franceses entenderem melhor o clima político instaurado no país e que pode se tornar imprevisível. “Lula é favorito e tem grandes chances de ganhar, mas o Bolsonaro tem uma dinâmica muito forte e ninguém pode menosprezar as chances do atual presidente se reeleger. Oito meses atrás ele tinha perdido cerca de metade dos eleitores dele. Atualmente, a perda é entre 20% e 25% . Hoje ninguém ganha com 70% no segundo turno e a sociedade vai continuar bastante dividida no futuro, com certeza”, opina.
Aprovado a toque de caixa em 2021, um polêmico projeto de instalação de quatro termelétricas flutuantes na Baía de Sepetiba, no Rio de Janeiro, foi embargado pela Justiça estadual. O empreendimento, da companhia turca KPS (Karpowership), ameaça um ecossistema rico em fauna marinha e manguezais.
A empresa foi a vencedora de um leilão emergencial da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em outubro passado, na esteira da crise energética no país provocada pela seca em 2021. Entretanto, apesar de planejar se instalar em uma área onde vive a maior população de botos-cinza do Estado, o projeto foi dispensado de um estudo de impactos ambientais pelo governo estadual, por se tratar de uma obra "estratégica".
A decisão desagradou ambientalistas e levou a ONG Instituto Internacional Arayara a protocolar uma ação judicial para questionar o procedimento. Na sexta-feira (22), a Justiça determinou a imediata suspensão das obras e das instalações das usinas a gás, que funcionam sobre balsas que estavam prontas para serem posicionadas na baía.
“É uma área de grande importância ecológica, com mangues bem preservados, criadouro de peixes e crustáceos, além do boto-cinza, uma espécie ameaçada de extinção. Ali, nós temos a maior de população do Estado: são de 500 a mil indivíduos”, explica a professora Helena de Godoy Bergallo, do Departamento de Ecologia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). “As linhas de transmissão serão instaladas em 14 quilômetros de extensão e já destruíram 7 hectares de mangue, que é um berçário de vida marinha e Mata Atlântica. Ou seja, o impacto é muito grande, não só na água, como na terra.”
Impacto ambiental
A KPS afirma que o projeto, inédito no país, tem capacidade de gerar 560 megawatts de energia e “atende aos mais rigorosos requisitos ambientais brasileiros e internacionais”. Mas uma instalação de tamanha magnitude exige estudos mais aprofundados, garante a professora da UERJ.
“Temos de ter também o princípio de precaução. É um empreendimento novo no mundo inteiro, não só no Brasil”, ressalta Bergallo. “A gente ainda não conhece todos os seus impactos, e não temos sequer respostas para muitas dúvidas que a gente têm, sobre os impactos que poderão vir, inclusive na sociedade que vive no entorno. São pescadores, marisqueiros e quilombolas que vivem na região”, frisa a especialista em ecologia.
A companhia turca tem buscado ampliar a atuação em países em desenvolvimento, em especial africanos. A empresa já teve um projeto semelhante cancelado na África do Sul e outro projeto, no Líbano, foi denunciado por envolvimento em corrupção.
247 -O jornalista Jamil Chade, em entrevista à TV 247, comentou a mudança da imagem internacional do Brasil durante o governo Jair Bolsonaro. Enquanto governos anteriores levaram o País a ser admirado em todos os cantos do planeta, hoje ele é percebido como uma ameaça à sobrevivência da humanidade, relatou Chade, que vive em Genebra.
Segundo o correspondente do portal UOL, questões como o aumento do desmatamento, a má gestão do governo federal da pandemia de Covid e as constantesameaças contra a democracianos últimos anos contribuíram para o deterioramento da percepção geral dos europeus sobre o Brasil.
“O governo Bolsonaro conseguiu uma enorme façanha, destruir a imagem do Brasil no exterior de uma forma extremamente acelerada e eficaz", sentenciou. "São três elementos que colaboraram com isso: primeiro, os incêndios e a questão do desmatamento na Amazônia. É muito interessante, porque vários líderes internacionais sabiam quem era Bolsonaro, mas a opinião pública, os estudantes e as pessoas na rua conheceram o Bolsonaro pelas chamas na floresta. Foi em 2019 que o nome Bolsonaro passou a fazer parte do ambiente internacional da opinião pública, do taxista, da vendedora de pão, as pessoas que não estão envolvidas diretamente com a política. O nome dele desembarca naquele momento, e o Brasil é apresentado como uma ameaça planetária e à sobrevivência em termos ambientais”, disse.
“Em seguida, com a pandemia, o Brasil passa a ser uma ameaça sanitária internacional”, enumerou. “Isso é completo com a ameaça democrática. Essa é a destruição”.
Chade avaliou que o estrago está feito e que a recuperação da imagem internacional do Brasil deve passar por um árduo processo de reconciliação. “A visão que o mundo tinha do Brasil também era errada e ilusória, de um país legal e que não tem problemas, que sabemos que era mentirosa. A história do País é uma história de estupro e violência, e mesmo assim conseguia passar ao mundo uma ideia de um país simpático. Hoje, não existe mais essa imagem. É mais complexa, talvez mais realista, mas que contou com uma destruição avassaladora nos últimos três anos e meio”, sentenciou.
No Piauí, terra de Ciro Nogueira, chefe da Casa Civil de Bolsonaro e do Orçamento Secreto, e da mãe dele senadora Eliane Nogueira:
Luiz Ricardo Saldanha de Oliveira
@LuizRic59002187
Tereza Campello
@CampelloTereza
Transbordando de alegria. Entreguei o nosso livro “Da Fome à Fome: diálogos com Josué de Castro” ao nosso amado Presidente