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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

13
Mar23

Zema: Tire as pás mineradoras e seu projeto político das nossas serras

Talis Andrade

Zema zemando

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Precisamos que Zema retire de nossas serras as pás mineradoras e o projeto político que representa e que nos faz colônia

por Dimas Antônio de Souza

O lema “Tira o pé da nossa serra!” combate a exploração privada de algo que entendemos por coletivo. Nesse sentido, se distancia da essência do zemismo, assim como do bolsonarismo, que é a apologia ao individual, ao lucro privado, em detrimento ao coletivo.

Não por menos, a obra em curso do governador vem sendo as privatizações ou as concessões dos parques e reservas naturais de nosso Estado para a exploração privada, inicialmente pelo turismo e, num futuro não muito distante, para as mineradoras.

“Minas são muitas”, mas, na cabeça nada poética de Zema, elas podem aumentar ainda muito mais. Segundo o Diagnóstico do Setor Mineral de 2020, a pretensão é que o setor minerador “se torne um alicerce do desenvolvimento sustentável do Estado”.

Acontece que, desde o Brasil colônia, as Minas Gerais vem sendo um território de extração de riquezas naturais não renováveis. Minas responde por 53% da produção brasileira de minério de ferro e 29% de minérios em geral, além de ser o maior produtor de ouro, zinco, fosfato e deter 75% da produção mundial de nióbio.

Existem mais de 300 minas em operação no Estado, sendo que, 40 das 100 maiores minas do Brasil estão em Minas Gerais. Um modelo de economia que cresce para atender aos interesses de poucos, pouquíssimos, e que deixa atrás de si um rastro de destruição.

De acordo com a Agência Pública, seis mil empresas mineradoras não recolhem tributos no país, e o volume dos débitos irregulares chegava a R$ 8,6 bilhões. Em Minas Gerais, apenas a Itaminas teria um passivo tributário superior a R$ 555 milhões e as empresas de exploração aurífera deviam irregularmente R$ 47,9 milhões.

Do ponto de vista do trabalho, a vulnerabilidade e os altos índices de acidentes seguidos de morte, são marcas registradas do setor. Além da exposição direta dessas pessoas às condições naturais e de produção dos sítios minerários, com a ocorrência de doenças como a silicose e o câncer de pele.

Do ponto de vista da sustentabilidade, o discurso é mais enganoso, sendo visível a destruição promovida pelas empresas, o que culminou nos crimes provocados pela Samarco e pela Vale S.A em Mariana e em Brumadinho.

Faturamento bilionário para centenas de empresas, perdas e riscos incalculáveis para milhares de pessoas. Esse é mesmo um modelo insustentável, ao contrário do que apregoam os governantes de antes e de hoje.

Precisamos que Zema retire de nossas serras as pás mineradoras e o projeto político que representa e que nos faz eternamente colônia.

Que vivam a Serra do Curral e todos os parques e montanhas de Minas!

04
Dez22

Chacina de Aracruz teria motivação político-ideológica?

Talis Andrade

Assassino entrou nas escolas de arma em punho e com roupas camufladas
 

 

Por que a professora Flávia Amboss Merçon teria sido o primeiro alvo do atirador?

 

Por Aloísio Morais Martins /Jornalistas Livres

Com a confirmação de que a professora Flávia Amboss Merçon Leonardo, de 38 anos, foi a primeira pessoa atingida pelos tiros disparados pelo garoto de 16 anos na Escola Estadual Primo Bitti em Praia do Coqueiral, no município de Aracruz, no Centro do Espírito Santo, ficou reforçado o indicativo de que a chacina tramada durante dois anos pode ter motivação político-ideológica. Afinal, por que o ex-aluno da escola foi direto à sala das professoras? O assassino matou três delas, uma aluna de 12 anos e deixou 12 pessoas feridas, cinco delas ainda internadas em estado grave. Várias manifestações de protesto estão sendo realizadas e programadas na região para denunciar a chacina e exigir punição dos responsáveis. O pai do adolescente é tenente da Polícia Militar, que já instaurou processo administrativo contra o policial. No dia 29, ele e a mulher prestaram depoimento à Polícia Civil.

 

 

Primeiramente, é bom situar o ambiente do crime, que a chamada ‘grande imprensa’ tem escondido: A chacina aconteceu dentro de um condomínio criado pela empresa Aracruz Celulose há algumas décadas, quando se implantou na cidade que acabou adotando seu nome. Fica em local privilegiado, próximo à Praia do Coqueiral e distante 22 quilômetros do centro nervoso da cidade de Aracruz, instalada no interior. O condomínio destinado a funcionários de altos cargos da empresa cresceu e, hoje, virou local de moradia de famílias de alta e média classe média, deixando de ser exclusivo dos servidores da empresa.

O menor, que usava um símbolo nazista no momento dos crimes, é filho de um tenente bolsonarista da Polícia Militar que já fez postagens sobre o livro Minha Luta, do genocida Adolf Hitler, que comprou a pedido do filho. “O livro é péssimo. Li e odiei”, disse. Mas o militar é, sobretudo, uma pessoa de direita. Nas redes sociais o garoto aparece todo garboso ao lado do pai em manifestação bolsonarista. Por sinal, ostentando o mesmo chapéu usado no momento da chacina.

 

Flávia Merçom era militante de esquerda e muito querida

Já a professora Flávia Amboss Merçom Leonardo, era conhecida como uma pessoa nitidamente de esquerda. Tinha pós-graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Espírito Santo, doutorado em Antropologia pela Universidade Federal de Minas Gerais, e militava no Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), que no ES tem atuação destacada desde o rompimento da barragem da Vale em Mariana, MG, quando as águas do Rio Doce foram tingidas há cinco anos pelo barro da mineração até a foz, no litoral capixaba. Flávia dedicou sua trajetória acadêmica aos estudos junto às comunidades pesqueiras e nativas do ES. Por que a professora teria sido escolhida como primeiro alvo do assassino? Mera coincidência ou o estudante teria algum ranço ideológico com Flávia? Com a palavra os investigadores.

 

Material apreendido pela Polícia Civil na casa do autor da chacina no condomínio Praia do Coqueiral

 

Vale destacar que o garoto assassino dá bons sinais de que aprendeu muita coisa com o pai, certamente, seu ídolo. Apesar de menor, os vídeos dão mostras de que aprendeu muito bem como conduzir um veículo, inclusive em alta velocidade. Além de sua desenvoltura, os vídeos mostram muito bem como sabe manusear bem as armas que portava. E é bom de pontaria. Com quem aprendeu? Em suas primeiras confissões liberadas pela polícia, ele diz que agiu sozinho e que aprendeu a atirar escondido do pai. Dá pra acreditar? Estaria ele querendo livrar a cara do paizão? A polícia terá que avançar nas investigações destes aspectos. Enfim, essa chacina promete intrigantes capítulos nestes tempos de endeusamento das armas (que esperamos estar chegando ao fim). Vejamos!

E, aliás, não custa perguntar: será que o pai do assassino defende a maioridade penal aos 16 anos, como boa parte dos bolsonaristas? Será que para ele ‘bandido bom é bandido morto?’. Pimenta é muito boa nos olhos dos outros, né não?

 

 

Como pano de fundo da tragédia, temos no Espírito Santo, hoje, um nítido predomínio da direita no estado, onde Bolsonaro, por exemplo, obteve 58,04% dos votos, contra 41,06% de Lula no segundo turno da eleição. Quem esteve lá, como eu, às vésperas da eleição, pôde sentir isso bem claro nas ruas e avenidas, onde carrões e as caminhonetes cabines duplas dominavam o ambiente com suas acintosas propagandas bolsonaristas. A supremacia é de tal forma que o presidente eleito não pôde fazer comícios no estado por falta de palanque. O governador reeleito Renato Casagrande, do PSB, preferiu acender uma vela a deus e outra ao diabo, colhendo votos de lulistas e de bolsonaristas ao descartar posar ao lado do petista.

 

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O pai e o filho assassino em uma manifestação de bloqueio golpista de rodovia pró Bolsonaro ditador
 
 
[A Polícia Militar de Renato Casagrande esconde as fotografias, o nome do pai e o nome do filho. Revelou que o pai era tenente. Tenente tenente ou tenente coronel? A mãe do assassino é ou foi professora das escolas tiroteadas pelo assassino em massa?]
 
 
09
Nov22

Mariana, o Brasil e a impunidade

Talis Andrade

O desastre — Caso Samarco

 

por Cristina Serra

- - -

Este 5 de novembro assinala os sete anos de um crime que não pode ser esquecido: o colapso da barragem de Fundão, em Mariana, que matou 19 pessoas e inundou o rio Doce com rejeitos minerais, ao longo de 660 km. A lama deixou três povoados em ruínas e provocou prejuízos em 40 municípios de Minas Gerais e do Espírito Santo.

Até hoje, a Samarco, controlada por Vale e BHP, duas das maiores mineradoras do mundo, não reconstruiu os povoados. É difícil não ver na morosidade a velha estratégia de vencer as vítimas pelo cansaço. Moradores vivem dispersos, perdem laços comunitários, sua luta acaba enfraquecida. Prevalece a lei do mais forte.

O sistema jurídico brasileiro não foi capaz de julgar os responsáveis pelo crime conforme a denúncia do Ministério Público Federal. A maioria dos réus já se livrou do processo e caminha a passos largos para o refúgio da impunidade enquanto milhares de pessoas esperam suas indenizações.

A ineficiência do judiciário levou 200 mil vítimas a buscar reparação na Inglaterra, onde a BHP tem uma de suas sedes. A corte inglesa, em Londres, aceitou a jurisdição do caso em julho e as partes já terão que apresentar seus argumentos agora em dezembro, na ação movida pelo escritório de advocacia Pogust Goodhead em nome dos atingidos.

O processo abre a perspectiva de uma justiça de caráter decolonial. Mostra que as corporações globais, que atuam na periferia do mundo, obtendo seus lucros à custa de buracos na paisagem e na vida das pessoas, não estão livres de prestar contas nos seus países de origem.

Quanto ao Brasil, que tenta voltar à normalidade política e institucional, há muito a ser feito. Lula deu destaque à proteção ambiental em sua campanha. Os desastres da mineração (não podemos esquecer Brumadinho) mostram que o Estado desossado é um componente na produção de tragédias. É urgente a reversão desta lógica e o fortalecimento da legislação e dos órgãos de controle.

 

ALMG: Revolta e pedido de CPI marcam 5 anos do crime ambiental em Mariana -  Jornal Voz Ativa

 

24
Fev22

No governo Bolsonaro, Deus tem castigado o Brasil

Talis Andrade

ANO 2019

Em 25 de janeiro, no primeiro mês do governo Bolsonaro, o rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, operada pela Vale, resultou na morte de pelo menos 270 pessoas. Trata-se da maior catástrofe ambiental provocada pela ação humana em solo brasileiro. "A pior do mundo em 3 décadas" informou em manchete a BBC de Londres. 

Fevereiro, 08:
Dez pessoas morreram e quatro ficaram feridas em um incêndio de grandes proporções no Centro de Treinamento Ninho do Urubu, do Flamengo, em Vargem Grande, no Rio de Janeiro. As chamas começaram por volta das 5h. A maioria dos mortos era de adolescentes jogadores da base do time carioca, entre 14 e 17 anos. O alojamento, onde ficavam atletas da base cujas famílias moravam longe ou fora do Rio de Janeiro, foi totalmente destruído pelas chamas.

Março, 13:
Em Suzano, a 50 km de São Paulo, dois atiradores entraram em uma escola e dispararam contra alunos e funcionários. Cinco estudantes, uma diretora e uma coordenadora da escola foram assassinados pelos ex-alunos Guilherme Taucci Monteiro, 17 anos, e Luiz Henrique de Castro, 25.

Obedecendo a um pacto de morte, ambos se suicidaram assim que a PM chegou à instituição de ensino. Antes, Guilherme já havia matado o tio, Jorge Antônio de Moraes, 51 anos, alvejado no escritório da loja de veículos dele.

Setembro, 12:
Um incêndio atingiu o Hospital Badim, na rua São Francisco Xavier, no Maracanã (zona norte do Rio de Janeiro). Os bombeiros confirmaram que 12 pessoas morreram. Ao todo, 103 pacientes estavam internados na unidade no momento do incêndio.

Segundo o que funcionários relataram à polícia e publicações nas redes sociais, o incêndio teria começado por volta das 18h15 em um prédio antigo onde funcionava o setor de laboratórios do hospital.

Dezembro, 1º:
Uma perseguição policial com troca de tiros durante um baile funk em Paraisópolis, zona sul de São Paulo, deixou nove pessoas mortas após serem pisoteadas. Outras sete ficaram feridas. Segundo a polícia, os militares realizavam a Operação Pancadão na região, quando dois homens em uma motocicleta atiraram contra os PMS. Após os disparos, a moto fugiu para o baile funk.

Com isso, os agentes começaram a perseguir os suspeitos, que entraram na festa que reunia cerca de cinco mil pessoas. Os jovens foram pisoteados e a maioria morreu por asfixia e trauma na medula. Um vídeo gravado de uma casa da região mostra a movimentação da polícia e também a correria das pessoas que estavam na noitada. Veja:

 

Importantes livros historiam a desumanidade capitalista, a crueldade assassina do neocolonialismo, a ambição das minineradoras estrangeiras, o entreguismo dos governos de Minas Gerais e do Brasil

Amazon.com.br eBooks Kindle: ARRASTADOS - Os bastidores do rompimento da  barragem de Brumadinho, o maior desastre humanitário do Brasil, Arbex,  Daniela

Brumadinho: na tragédia da lama, sou um sobrevivente | Amazon.com.br

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Memórias de Brumadinho: Vidas que Não se Apagam | Amazon.com.brTragédia de Brumadinho: reflexões acerca dos impactos jurídicosLivro - Brumadinho - Fundamentos de uma hipótese - Livros de Ciências  Humanas e Sociais - Magazine Luiza

PDF) QUANTO VALE?: UMA ANÁLISE INTERDISCIPLINAR DO DIREITO SOBRE AS  TRAGÉDIAS DE MARIANA E BRUMADINHO - Ler Online, eBook, Resumo - Ler Livros

UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais - Livro busca respostas para o  'mar de lama da Samarco'

Livro: Vozes e silenciamentos em Mariana: crime ou desastre ambiental? está  disponível para download - Ecoa

Para passar a boiada do ministro Ricardo Salles, o governo Bolsonaro iniciou a destruição da maior floresta tropical do mundo, com o fogo e a serra elétrica o desflorestamento da Amazônia, a contaminação dos rios com o mercúrio da mineração invasora e ilegal, a violência relacionada à regularização fundiária, demarcação de terras e reforma agrária na Amazônia Legal e no Cerrado. O holocausto, o genocídio dos povos indígenas. (Continua)

27
Jan22

Brumadinho, crime e impunidade

Talis Andrade

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por Cristina Serra

Com atraso, li a obra “Brumadinho – a engenharia de um crime” (editora Letramento), dos jornalistas Lucas Ragazzi e Murilo Rocha, que está sendo relançada, no momento em que o desastre completa três anos. O livro traz uma impressionante reconstituição dos fatores que levaram ao desmoronamento da barragem da Vale, que matou 272 pessoas e poluiu o rio Paraopeba.

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Tanto quanto o colapso do reservatório da Samarco, em Mariana (19 mortos e o rio Doce contaminado), o rompimento em Brumadinho era uma tragédia anunciada. No caso da barragem da Vale, o livro mostra que a empresa sabia dos riscos e não tomou as medidas adequadas porque teria que paralisar atividades no local e interromper ganhos. Ao agir assim, a mineradora escreveu uma sentença de morte contra os trabalhadores, os moradores das redondezas e todos que tiveram a infelicidade de estar ao alcance da lama em 25 de janeiro de 2019.

Com tudo que se sabe sobre o caso, é doído fazer algumas perguntas: por que uma das maiores mineradoras do mundo construiu um refeitório e os escritórios no pé da barragem, contrariando o simples bom senso? Por que a empresa não levou em conta alertas de especialistas? Por que os órgãos de fiscalização não cumpriram o seu papel? Por que estes se dobraram ao poder da Vale?

E, finalmente, por que o judiciário brasileiro não foi capaz, até agora, de julgar os responsáveis? As respostas a essas questões tão elementares preenchem de dor, sofrimento e revolta a vida dos que perderam amores e amigos na voragem da lama mineral, tão violenta que até hoje não foi encontrado nenhum vestígio de seis vítimas.

Sobre essa dor, cortante como lâmina, recomendo o premiado documentário do jornalista Fernando Moreira, “[O vazio que atravessa]”, que estará disponível gratuitamente em 26 e 27/janeiro em mostratiradentes.com.br. De um ponto de vista delicado e intimista, o filme reverbera o clamor das vítimas contra a impunidade.

O vazio que atravessa (Short 2021) - IMDb

 

13
Jan22

"Em Minas Gerais, vivemos com bombas-relógio", diz biólogo do Movimento dos Atingidos por Barragens

Talis Andrade

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Biólogos e ativistas do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB) de Minas Gerais monitoram região da barragem no subdistrito de Bento Rodrigues, onde aconteceu a tragédia da ruptura da barragem da Samarco, em 2015.

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Biólogos e ativistas do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB) de Minas Gerais monitoram região da barragem no subdistrito de Bento Rodrigues, onde aconteceu a tragédia da ruptura da barragem da Samarco, em 2015.
 © Movimento dos Atingidos por Barragens

Minas Gerais tem hoje 364 barragens de mineração ativas. Entre elas, três atingiram o nível de segurança máximo, onde a mineradora já não tem controle sobre a estrutura, como o dique Lisa da mina do Pau Branco, cujo transbordamento causou pânico em Nova Lima no fim de semana passado. O biólogo Guilherme Camponês, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), detalhou a precariedade da fiscalização e a flexibilização da lei ambiental brasileira num território dominado por mineradoras.\

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Após as tragédias de Mariana e Brumadinho, as instituições e o governo brasileiro parecem ainda não terem se dado conta da importância de efetuar as transformações necessárias para evitar que novas catástrofes ambientais que ceifam centenas de vidas humanas continuem acontecendo, num contexto de aparente impunidade das mineradoras.

O biólogo Guilherme de Souza Camponês, ativista do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), explicou à RFI que o susto do final de semana passado em Nova LIma, na região metropolitana de Belo Horizonte, quando se cogitou um novo rompimento de barragem, foi, na verdade, um "transbordamento do chamado dique de Lisa que fica na mina de Pau Branco da [empresa francesa] Vallourec".

"Foi confirmado que não se tratava de um rompimento, mas uma pilha de sedimentos que caiu. Nessa mina, eles utilizam o método de disposição a seco do detrito, eles tiram a água do rejeito para armazenar, então as pilhas de rejeito caíram dentro do dique de Lisa, uma barragem que continha água de chuva mais o sedimento fino que escorreu dessa pilha de rejeitos", conta Camponês. O método de armazenamento a montante é considerado um dos mais perigosos e faz parte de 39 barragens no estado de Minas Gerais. Do total de 364, 46 estão com "o nível de emergência acionado, e três estão no nível de segurança máximo".O biólogo Guilherme de Souza Camponês, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).O biólogo Guilherme de Souza Camponês, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

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O biólogo Guilherme de Souza Camponês, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). © Guilherme de Souza Camponês

"Três pilhas dessas com sedimentos da mineração caíram dentro do dique em Nova Lima e provocaram transbordamento, que gerou o vazamento que passou por cima da barragem e se espalhou pela BR-040 que liga Brasília ao Rio de Janeiro passando por Belo Horizonte", relata o profissional. "E esses sedimentos também escorreram para baixo da própria rodovia que ficou paralisada por dois dias por conta disso", diz.

"A gente fala aqui em Minas Gerais que vive com as bombas-relógio em cima das nossas cabeças; aqui no estado são 364 barragens segundo a ANM, Agência Nacional de Mineração. São barragens conhecidas que estão registradas mas tem várias ainda que não estão cadastradas. 39 barragens foram construídas com aquele método de construção a montante, o mesmo método da barragem de fundão que se rompeu em Mariana e da mina do Córrego do Feijão, que se rompeu em Brumadinho", denuncia.

Segundo Guilherme, as três barragens que se encontram hoje no nível de segurança máximo pertencem à companhia Vale do Rio Doce. "Temos a P3 e a P4, que ficam em Nova Lima, a Forquilha 3 que fica em Ouro Preto e o dique Lisa de Nova Lima, da Vallourec, que também entrou em nível três de segurança", explica. "Nesse nível três exigido que todas a população que todas as pessoas que estejam ali na zona do rompimento onde o rejeito vai chegar sejam evacuadas", relata.

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Mina de Pau branco, explorada pelo conglomerado francês do Vallourec, que fica em Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte. © Bruno Costalonga Ferrete

Sobre o que pode ser feito para se evitar novas tragédias num contexto de mudanças climáticas, o biólogo afirma que "o que pode ser feito é que as mineradoras sigam à risca os protocolos de segurança; a lei ainda tem brechas: por exemplo essa barragem de Nova Lima que transbordou. Ela estava com a documentação em dia e teoricamente a Agência Nacional de Mineração a fiscalizou e estava ok, mais isso não garante que a barragem estava segura, tanto é que aconteceu o transbordamento", aponta.

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Transferência de responsabilidade do Estado para mineradoras

 

"O que acontece na verdade hoje é apenas um automonitoramento das próprias mineradoras diretamente ou através de empresas terceirizadas, mas de toda forma essa fiscalização fica na mão delas. O trânsito na BR-040 foi liberado com a condição de que a mineradora assegurará a segurança da via, ou seja, não é Agência Nacional que atesta que o local está seguro, então estamos em zona de risco e não sabemos se e quando a barragem vai romper. Existe uma transferência de responsabilidade onde a empresa joga a bola para o Estado e vice-versa", denuncia.

Segundo ele, a população continua exposta por que os governos federal e estadual fazem esse tipo de concessão para a mineradora. "Hoje todo poder está na mão da mineradora; as leis ambientais são flexibilizadas para permitir a mineração e o processo de fiscalização é precário, o território é controlado pelas mineradoras", diz. Camponês explica que as licenças ambientais para instalar e operar mineradoras são emitidas pelo governo do Estado de Minas Gerais, mas o principal órgão de fiscalização é a Agência Nacional de Mineração, uma instituição federal.

"É incrível, a Vallourec não falou ainda quantas pessoas ou quantas famílias foram evacuadas. A gente soube pela defesa Civil que foram seis pessoas, mas não existe um comunicado oficial da empresa", afirma Camponês. "O poder ficar todo na mão das mineradoras. Na nossa avaliação, enquanto não houver soberania do povo sobre o território vai continuar acontecendo isso. O objetivo das mineradoras é o lucro elas não estão preocupados com a segurança das pessoas ou do Meio Ambiente. Elas estão preocupadas com a maximização do lucro. Enquanto seguirmos essa lógica continuaremos a ter esse tipo de crime e de tragédia", concluiu o biólogo.Image

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05
Jan22

Depois da terra plana tem um rio

Talis Andrade

 

O Horto Florestal, na zona norte da metrópole, criado em 1896, por decreto, no governo de Bernardino de Campos, por iniciativa do botânico sueco da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo, Albert Löfgren, me revelou que a política e a ciência, encontro de gente com clareza no pensamento, produz suas pérolas, um legado para gente futura.

Mais de um século após,  num parque estadual deserto, livre, fiz meu ritual para o ano que se inicia, escrevi nas águas da lagoa e da chuva, um FORA BOLSONARO, às aves e peixes entreguei o desejo de um mundo pleno para aqueles que virão.

O que há de novo nas árvores, seres tão velhos que encontro por aí? Ou numa lagoa, em um rio, o que nos faz pensar as águas?

Como um rio ou árvore aprendi a entender o tempo, alegorias boas para essas dimensões em que vivemos mergulhado. 2@22 anuncia-se assim, espaço e tempo, um período determinado onde as águas se juntam, dividem margens, leito comum num tempo que escorre, percorre, avoluma-se num leito entre floresta. Selvagens, vivas, arcaicas, as imagens dos anos recentes denunciam delírios na barbárie, mais que o moderno, moderna guerra de redes.

Tudo tão rápido, mas nessa passagem me deparo com um ciclo que se conclui, tanta chuva assim após as queimadas imensas.

De 2015, recordo, entre artistas amordaçados, acordamos todos em 2022. Despertos estamos, mais espertos, incrédulos habitantes, após Mariana, Brumadinho, as cinzas e a pandemia .

Parece ontem, mas 7 anos decorridos, tão emocionante, ricas, anunciam-se as nuvens, céus e seus turbilhões.

 
27
Nov21

Máquina de moer gente 2

Talis Andrade
 

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Greyce Elias

por Cristina Serra

 

Volto ao tema do Código de Mineração, em discussão na Câmara dos Deputados. Para quem não acompanha o assunto, um breve resumo: o projeto da relatora Greyce Elias (Avante-MG) propõe que a mineração seja considerada “essencial à vida humana” e de “utilidade pública”. Se é tão essencial, o projeto deveria aperfeiçoar o controle por parte do Estado e não afrouxá-lo, como sugere. 

Uma teia de conexões talvez ajude a explicar a benevolência com o setor. O marido de Elias, Pablo César de Souza, ex-vereador, conhecido como Pablito, consta na Receita Federal como sócio em três empresas de mineração. Uma delas, a Mina Rica, tem sociedade com outra empresa, detentora de requerimentos de lavra e pesquisa na Agência Nacional de Mineração (ANM) para exploração de ouro e outros minerais.  

Em 2017, Pablito foi nomeado superintendente do antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), em Minas Gerais, no governo Michel Temer. O DNPM foi substituído pela ANM. Procurei Pablito e a deputada Greyce Elias para ouvi-los a respeito do que me parece ser um claro conflito ético. A deputada disse que não vê tal problema e que o projeto está sendo construído com “integral transparência”. Pablito disse que deixou as empresas há seis meses, embora seu nome conste nos registros. 

O exercício de funções institucionais no Brasil virou um vale-tudo. O debate sobre o código não tem legitimidade sem a voz dos parentes dos quase 300 mortos em Mariana e Brumadinho. Como considerar “essencial à vida humana” uma atividade privada, dominada por corporações globais preocupadas com a geração de lucros para seus acionistas?

Para terminar, um registro: se a vida de Pablito como empresário foi breve, como afirma, ele não ficou desamparado. Com salário de R$ 22.943,73, é assessor no gabinete do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Congresso e pré-candidato a presidência da República.

Veja os perfis das vítimas do rompimento da barragem de Brumadinho

Tragédia de Brumadinho: familiares descrevem 'alegria e sonhos  interrompidos' das vítimas - BBC News Brasil

Brumadinho: Número de mortos vai a 142; 194 desaparecidos

Sobe para 121 número de mortos em Brumadinho | Notícias e análises sobre os  fatos mais relevantes do Brasil | DW | 03.02.2019

Sobe para 99 o número de mortos na tragédia de Brumadinho, na Grande BH

Sobe para 99 o número de mortos e há 259 desaparecidos em Brumadinho -  @aredacao

20
Mai21

Brasil, pária ambiental

Talis Andrade

Marcio Vaccari | Humor Político – Rir pra não chorar

por Cristina Serra

- - -

O projeto de lei que desmonta o licenciamento ambiental no Brasil, aprovado na Câmara, é um crime contra o meio ambiente, a sociedade e a Constituição. Nosso atual sistema de licenciamento resulta de décadas de construção legal e do aprendizado com enormes erros no passado.

Exemplos na mineração ajudam a entender essa evolução. Antes da Constituição e das normas atuais, algumas empresas lançavam rejeitos em rios e lagos, como se estes fossem latas de lixo. 

Já com o licenciamento em vigor, tivemos duas grandes tragédias na mineração: o colapso das barragens da Samarco, em Mariana, e da Vale, em Brumadinho, com quase 300 mortos.

Estudei a fundo o licenciamento da barragem da Samarco. O que aconteceu ali foi leniência do órgão licenciador, com indícios de corrupção. No caso da Vale, houve um licenciamento atipicamente célere, em favor da conveniência da empresa e não da segurança da estrutura. O problema não foi a lei, mas a má aplicação dela pela autoridade licenciadora.

É claro que uma legislação sempre pode ser melhorada e atualizada. Mas o projeto em questão não tem este objetivo. Muito ao contrário. Ele faz parte de um ataque sistemático ao meio ambiente, com asfixia dos órgãos de fiscalização e desidratação orçamentária. Uma das malandragens do projeto é o tal licenciamento autodeclaratório. Ou seja, o poder público deixaria de exercer seu papel regulador do impacto ambiental das atividades econômicas. É raposa no galinheiro que chama?

Na prática, o projeto todo implanta um “liberou geral” para vários setores da economia, notadamente para a agropecuária, base de apoio do bolsonarismo. Se aprovado em definitivo, ao contrário do que dizem seus defensores, ele não vai destravar a economia. Vai prejudicar a atração de investimentos e piorar ainda mais a imagem do Brasil no exterior, onde já é visto como pária ambiental pelo descontrole no desmatamento. Ainda é tempo de barrar a boiada no Senado.

05
Nov20

Samarco retoma atividades em Mariana sem dar conta do legado de destruição

Talis Andrade

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por Pedro Stropasolas/ Brasil de Fato
 

O rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana (MG), em novembro de 2015, reforçou a dependência a um modelo de mineração, que causa crimes e empobrecimento. Hoje, cinco anos após o crime da Samarco/Vale/BHP, não há espaço para outras atividades econômicas no município.

Essa é a análise de especialistas ouvidos pelo Brasil de Fato ao avaliar a atual realidade econômica da cidade, que só iniciou uma retomada de emprego e renda a partir de 2018. Isso se deu por meio do aumento das ações no município da própria Vale – uma das acionistas da Samarco – e também pelos repasses da Fundação Renova, vinculada às mineradoras.

Desde 2015, a prefeitura de Mariana anunciou uma perda de 28% na arrecadação, deixando de receber R$ 240 milhões do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e, principalmente, da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem). Antes do crime, os impostos gerados pelas atividades da mineradora correspondiam a aproximadamente 54% da receita da cidade.

Em 2019, o prefeito Duarte Júnior (Cidadania) chegou a declarar calamidade financeira no município – após a paralisação de uma das minas da Vale – , anunciando cortes em serviços essenciais e o desligamento de trabalhadores.

Hoje, ele cobra da BHP Billiton, a outra controladora da Samarco, R$ 1,2 bilhão de compensação pelos gastos extras após o rompimento. O processo corre na Justiça de Manchester, no Reino Unido, país sede da empresa.

“Assim que aconteceu a tragédia, eles não pagaram mais nada. Por mais que a gente tenha cobrado e demonstrado que esse recurso era importante para a manutenção das obrigações públicas. O Cfem ou todo recurso direto ou indireto relacionado à produção da Samarco eles não pagaram um real. Eu não consigo entender a cabeça de um acionista que fica 40 anos tirando a riqueza daqui. É como nós dois sermos sócios, mas você fica com 98% e eu com 2%. Que parceria é essa?”, desabafa o prefeito sobre a relação com a mineradora.

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Rio Doce, Aimorés

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A lama percorreu 633km até encontrar o mar

Duarte Júnior cita o crescimento da demanda por serviços públicos, especialmente na saúde, como os principais efeitos do crime. Segundo o prefeito, as pessoas não conseguiram mais pagar planos de saúde privados. Além disso, foi notável o aumento da demanda da Secretaria de Assistência Social e os custos com a recuperação das estradas.

“A Samarco é um nome fantasia. Vale e BHP são responsáveis por essa tragédia. E esses acionistas tem um retorno financeiro sobre Mariana incalculável”, destaca o prefeito.

Cfem

De acordo com a Constituição Brasileira, os recursos minerais extraídos pelas empresas são patrimônio da União, o que exige uma compensação aos estados e municípios em forma de arrecadação de tributos. O principal meio de arrecadação desses valores é a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (Cfem).

Analisando os dados obtidos no sistema da Agência Nacional de Mineração (ANM), em 2015, ano do crime, Mariana foi a cidade que mais arrecadou a Cfem em Minas Gerais, um total de R$ 104 milhões. Em 2014, a compensação paga somente pela Samarco correspondeu a 8,8% das receitas correntes de Mariana. O lucro líquido da mineradora foi de R$ 2,81 bilhões no mesmo ano.

Com as interrupções das atividades no complexo de Germano, onde estava a Barragem do Fundão, o valor da Cfem caiu de R$ 134 milhões em 2014 para R$ R$ 68,5 milhões em 2017. 

O cenário começou a se reverter em 2018, com uma compensação de R$ 106 milhões em virtude do aumento do valor das operações da Vale no município, fazendo Mariana, pela primeira vez após o crime, ter uma arrecadação maior do que as despesas. Os números podem ser acessados no Portal da Transparência do município. 

Hoje, a atuação da acionista da Samarco na região inclui a exploração mineral nas minas Alegria, Fábrica Nova e Fazendão e os projetos Capanema e Conta História. Apenas no terceiro trimestre de 2020, e em plena pandemia, a Vale registrou um lucro líquido de R$ 5,3 bilhões. A prefeitura estima que hoje em torno de 89% das receitas advêm da mineração.

Minério-dependência

O professor Tadzio Coelho, do Departamento de Ciências Sociais (DCS) da Universidade Federal de Viçosa (UFV), faz parte do Grupo Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade (PoEMAS).

Ele explica que a expansão da mineração a céu aberto, como é o caso do Quadrilátero Ferrífero, em Mariana, já retraía outras atividades econômicas antes do rompimento da barragem, por fatores como a dinâmica do rebaixamento dos lençóis freáticos, a poluição e a própria especulação imobiliária com a chegada dos empreendimentos. Além destes efeitos, Coelho destaca o efeito simbólico da atividade mineradora no imaginário popular.

“A situação da minério-dependência não se restringe a questão econômica, é um conjunto de relações de poder, e através disso as mineradoras instauram uma estrutura política, que representa e garante seus interesses. Além disso, tem uma dimensão mais simbólica da minero dependência que as pessoas não conseguem vislumbrar outras formas de sociedade e alternativas sociais e econômicas", explica o pesquisador.

Em Mariana, a área plantada de culturas tradicionais para a agricultura familiar como o café, a banana, a mandioca, o feijão, o milho e a cana-de-açúcar passou por uma redução drástica após a lama. Em 2015, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), eram 2.286 hectares plantados. Em 2017, o número passou para 165 hectares, uma redução de 93%.

 

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Após o rompimento, o desemprego chegou a 28% no município. Antes, o percentual ficava em torno de 6%, segundo a prefeitura. Os dados são do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que indicam que apenas em 2018, começaram a haver mais admissões do que pessoas demitidas na cidade. 

A melhoria no número de empregos também se relaciona com a atuação da Fundação Renova, que, a partir de 2017, empregou aproximadamente 6,5 mil pessoas nas obras de reparação, em 39 municípios. A oferta de mão de obra, porém, é marcada pela precarização.

É o que levanta o diretor do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção Pesada de Minas Gerais (Siticop-MG) Eduardo Armond. Ele avalia que com a saída da responsabilidade direta das mineradoras as condições de trabalho pioraram e com elas as dificuldades de fiscalização por parte do sindicato. 

“A armadilha que foi feita pela Samarco de colocar a Renova como biombo funcionou, no sentido de desviar a responsabilidade direta. Tanto que em paralelo, a Samarco foi buscar a continuidade da produção sem nenhuma preocupação com as questões relativas a remediação do acidente”, opina.

Uma nova Samarco?

Em setembro de 2019, a Samarco obteve a concessão do Licenciamento Operacional Corretivo (LOC) para a volta das atividades no Complexo de Germano. As licenças ambientais estavam suspensas desde outubro de 2016 por decisão da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), que convocou a mineradora a apresentar um novo LOC.Para o prefeito Duarte Júnior, no entanto, Mariana espera “anos de bonança” para o próximo período. Ele cita a receita do município de agosto para setembro, que aumentou R$ 10 milhões e tende a se tornar "perene" por conta das operações da Vale.A expectativa maior, no entanto, é a retomada da Samarco. A prefeitura estima um acréscimo mensal de R$ 2,3 milhões com a volta da empresa, que está prevista para o segundo semestre de 2021. 

"É como se tivesse chegando uma nova empresa na cidade. E por mais que não seja o caminho pensar na mineração, porque nós sabemos que ela tem um tempo de validade, mas, neste momento, é uma nova empresa, gerando quase mil empregos e trazendo para economia local só para o município mais R$ 3.5 milhões de receita", afirma Júnior. 

A Samarco anuncia que a retomada será gradual e sem a utilização de barragens, com a implantação de um sistema de disposição e tratamento de rejeitos para empilhamento a seco. Na região, a mineradora começa a fazer uma ampla mobilização pela retomada, tendo como um dos eixos, o anúncio de postos de trabalho nas comunidades.

Recolonização

Luiz Paulo Siqueira, do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM), explica que a mineradora vem anunciando a volta como "uma salvação para Mariana" e se colocando como uma empresa "mais limpa", que "se repaginou" e agora vai fazer "uma nova mineração". 

"Isso é martelado cotidianamente nos meios de comunicação, nas escolas, no ambiente de trabalho, em todas as audiências, as empresas têm uma política para a manutenção e exercício da hegemonia nos territórios. Essa batalha de ideias, elas fazem de forma muito profissional, cooptando lideranças, tentando abafar determinadas pautas", explica.

Para o militante do MAM, a incapacidade do poder público e da própria sociedade de se organizar e pautar alternativas à mineração, abre caminho para a empresa utilizar estas narrativas, ainda mais em uma conjuntura econômica onde a pobreza e o desemprego se consolidam no país. 

"Em um contexto de uma economia extremamente fragilizada, uma empresa mineradora que anuncia a retomada com anúncio de novos empregos, dificilmente vai ter resistência para a implantação destes projetos”, afirma Siqueira. 

O crime

rompimento da barragem do Fundão marcou, no Brasil, o fim do mega ciclo das commodities, que ocorreu entre 2003 e 2013, e registrou um aumento de 630% das importações globais de minérios. Para especialistas, é consensual que as mudanças produtivas para aproveitar os preços dos minerais foi um dos fatores que explicam o rompimento.  

Isso foi observado também na prática pelo ritmo intenso de construção e expansão da Barragem de Fundão, feita sem as medidas de segurança necessárias. Em 2008, a barragem recebeu licença de operação e, em 2011, já apresentava o Estudo e Relatório de Impacto Ambiental para a otimização da estrutura.

No relatório, as obras para aumento da capacidade da barragem, entre 30 de julho de 2014 e 26 de outubro de 2015, tiveram uma velocidade de alteamento de 12,3 metros/ano. A taxa recomendada para o setor está entre 4,6 metros e 9,1 metros/ano.
 
Na história de atuação da Samarco na região, o dano pelo rompimento da barragem do Fundão não foi o primeiro. Desde 1996 até 2015, a Samarco acumulava 18 autuações, quase que uma por ano ao longo destes 20 anos. As informações foram agrupadas no livro Quando vier o silêncio, da Editora Expressão Popular.

"Eles estão voltando para a mesma armadilha. Tudo que a gente conversou de como esse modelo de mineração, de como essa dimensão institucional e política gerou os rompimentos de barragens. É bom a gente dizer que esta estrutura não acabou, ela continua intacta", conclui Tádzio Coelho, um dos autores.

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