O brutamonte bolsonarista Daniel Silveira corre o sério risco de apodrecer na cadeia, abandonado pelos seus comparsas e totalmente endividado. Um dia após perder sua imunidade parlamentar, o ex-deputado federal pelo PTB do Rio de Janeiro foi preso em Petrópolis, na quinta-feira (2), por descumprir 175 vezes medidas cautelares definidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Poucas horas depois, o troglodita ainda foi dedurado friamente pelo senador Marcos do Val (Podemos-ES) de ter participado de uma patética trama golpista juntamente com o ex-presidente fujão.
Multas de quase R$ 4,4 milhões
Na sentença que determinou originalmente a sua detenção, Daniel Silveira foi acusado pelo ministro Alexandre de Moraes de violar várias cautelares – como o uso de tornozeleira eletrônica, a proibição de utilizar suas redes sociais e a concessão de entrevistas. Por essas violações, o ex-parlamentar já acumula multas de quase R$ 4,4 milhões, segundo balanço feito pelo STF em 15 de dezembro. No documento em que pede sua prisão, o ministro argumenta que o bolsonarista danificou o equipamento de monitoração eletrônica e que segue com seus ataques ao Supremo e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
“Como se vê, nem mesmo o elevado valor das multas acumuladas em seu desfavor foi suficiente para cessar o periculum libertatis do réu condenado, não se notando, do contexto fático-probatório, qualquer efeito intimidatório da medida cautelar pecuniária... As condutas do réu, que insiste em desrespeitar as medidas cautelares impostas nestes autos e referendadas pelo Plenário do STF, revelam o seu completo desprezo pelo Poder Judiciário”, afirma a sentença.
Pela decisão, Daniel Silveira fica proibido de receber visitas na cadeia, salvo dos seus advogados. Ele também não poderá conceder quaisquer entrevistas, somente mediante autorização expressa do STF. “A ordem de prisão foi acompanhada de busca e apreensão de armas, munições, computadores, tablets, celulares e outros dispositivos eletrônicos, bem como do passaporte dele. Moraes ainda expediu ofício à Polícia Federal (PF) para suspender seu porte de armas de fogo. O Exército também deverá suspender imediatamente certificados de registro como colecionador de armas”, relata o site Metrópoles.
R$ 270 mil em espécie na residência do miliciano
A operação de busca e apreensão em sua residência ainda resultou em outro complicador para o bolsonarista. Segundo a Folha, a Polícia Federal encontrou R$ 270 mil em espécie no local. O seu advogado jura que “o dinheiro vivo achado é do salário como deputado”, mas o jornal desmascara a farsa: “Durante as eleições para concorrer a uma vaga no Senado em 2022, a referida quantia não foi declarada integralmente ao TSE. O então parlamentar informou à Justiça um total de R$ 327.002,39 em bens, sendo R$ 132 mil em espécie. O valor é R$ 138 mil menor do que foi encontrado em sua residência”.
Já bastante enrascado, o brutamonte bolsonarista ainda foi surpreendido com a explícita delação do seu ex-compadre, o também militar Marcos do Val. O senador capixaba enviou mensagem ao ministro Alexandre de Moraes responsabilizando Daniel Silveira como autor do “golpe Tabajara” tramado juntamente com o ex-presidente da República. Ele até tenta livrar a cara de Jair Bolsonaro, depois de acusá-lo em entrevista à revista Veja, mais dedura integralmente o atual presidiário – o que pode agravar ainda mais a sua pena na cadeia.
Ex-deputado marombado vai levar a culpa sozinho?
Diante desse cenário, Chico Alves questiona no site UOL: “Daniel Silveira aceitará levar sozinho a culpa pela conspiração golpista?”. Para o jornalista, a situação do paquiderme é terrível. “Na segunda versão da confusa história de Marcos do Val, Silveira aparece praticamente como vilão único, o personagem que tentava convencer outros dois a grampear o ministro Alexandre de Moraes”.
“É comum em tramas mafiosas e milicianas que, quando são flagrados pelos agentes da lei, criminosos convençam um elemento da quadrilha a carregar todas as culpas para livrar o chefe. Além de assistência jurídica, essas figuras recebem recompensa em dinheiro pelo tempo que eventualmente ficarem presas e outras benesses. Seria esse o caso de Daniel Silveira? O ex-deputado marombado, bolsonarista de carteirinha, vai aceitar levar sozinho e calado a culpa por mais essa acusação, ainda mais grave que as outras pelas quais está sendo processado?”.
Quando Eduardo Bolsonaro disse que bastaria um cabo e um soldado para fechar o Supremo Tribunal Federal, certamente não estava imaginando que seriam o cabo da PM Daniel (Lúcio) Silveira e o soldado Marcos do Val, do 38° Batalhão de Infantaria, hoje (ainda) senador, os personagens da comédia tosca que estão encenando para livrar Jair Bolsonaro do destino de punição que espera os golpistas fracassados.
Talvez se pudesse até acreditar, de tão toscos que são os Bolsonaro, que tudo que do Val relatou (e “desrelatou”, ao longo do dia) sobre a conversa que Daniel Silveira o teria levado a ter com Jair Bolsonaro, envolvendo uma armação para que o senador gravasse conversas em que o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, eventualmente escorregasse, na intimidade, em declarações que o marcassem como suspeito na condução dos inquéritos que implica o ex-presidente em manobras golpistas.
Mas, para crê-lo, seria necessário um festival de ingenuidades.
Do Val apresenta-se como “próximo” de Moraes, – “com quem façouns trabalhos“- e se poderia dizer até íntimo do ministro, tal a facilidade com que marca encontros porZapa qualquer hora que queira, ou que se possa achar que Moraes, recebendo um senador sabida e abertamente integrante da “tropa de choque” bolsonarista para falar inconveniências e fazer rompantes.
Logo ele que, há quatro dias, gravou um vídeo (aqui, aos 10 min) dizendo que Moraes é uma “unanimidade” negativa entre os brasileiros e que “nem os ministros do Supremo estão aguentando mais ele”.Amigão, não é?
É evidente que se trata de uma manobra primária para desqualificar o presidente do TSE e tentar retirá-lo da relatoria dos inquéritos relativos à defesa da democracia contra o golpismo.
Esta é a “missão” que recebeu, agora que a vitória de Rodrigo Pacheco na eleição do Senado tornou impossível a “saída” de promover oimpeachmentde Moraes.
O senador nem precisa desistir da alegada renúncia que disse – e “desdisse” – iria apresentar. Vai perder o mandato e terá a honra de abrir a fila da Comissão de Ética nesta legislatura.
O cabo Silveira, em cana, vai ter de dar cambalhotas para justificar os R$ 270 mil achados em sua casa. O soldado do Val, já está levando tombos estrepitosos no primeiro dia de suas “denúncias”.
Mas estas suas manobras diversionistas para livrar Bolsonaro, tal como as declarações de Valdemar da Costa Neto de que “todo mundo tinha” minutas do decreto golpista para estabelecer “Estado de Defesa” e anular as eleições, só vão ajudando a transformar em comédia-pastelão as versões dos golpistas para escaparem às suas responsabilidades.
Até o final desta quinta-feira, depois do seu depoimento à PF, do Val estará completamente desmoralizado e de tudo só restará um Bolsonaro mais golpista e tosco, sem ter nem mesmo o um cabo e um soldado ao seu lado.
Quando Eduardo Bolsonaro disse que bastaria um cabo e um soldado para fechar o Supremo Tribunal Federal, certamente não estava imaginando que seriam o cabo da PM Daniel (Lúcio) Silveira e o soldado Marcos do Val, do 38° Batalhão de Infantaria, hoje (ainda) senador, os personagens da comédia tosca que estão encenando para livrar Jair Bolsonaro do destino de punição que espera os golpistas fracassados.
Talvez se pudesse até acreditar, de tão toscos que são os Bolsonaro, que tudo que do Val relatou (e “desrelatou”, ao longo do dia) sobre a conversa que Daniel Silveira o teria levado a ter com Jair Bolsonaro, envolvendo uma armação para que o senador gravasse conversas em que o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, eventualmente escorregasse, na intimidade, em declarações que o marcassem como suspeito na condução dos inquéritos que implica o ex-presidente em manobras golpistas.
Mas, para crê-lo, seria necessário um festival de ingenuidades.
Do Val apresenta-se como “próximo” de Moraes, – “com quem façouns trabalhos“- e se poderia dizer até íntimo do ministro, tal a facilidade com que marca encontros porZapa qualquer hora que queira, ou que se possa achar que Moraes, recebendo um senador sabida e abertamente integrante da “tropa de choque” bolsonarista para falar inconveniências e fazer rompantes.
Logo ele que, há quatro dias, gravou um vídeo (aqui, aos 10 min) dizendo que Moraes é uma “unanimidade” negativa entre os brasileiros e que “nem os ministros do Supremo estão aguentando mais ele”.Amigão, não é?
É evidente que se trata de uma manobra primária para desqualificar o presidente do TSE e tentar retirá-lo da relatoria dos inquéritos relativos à defesa da democracia contra o golpismo.
Esta é a “missão” que recebeu, agora que a vitória de Rodrigo Pacheco na eleição do Senado tornou impossível a “saída” de promover oimpeachmentde Moraes.
O senador nem precisa desistir da alegada renúncia que disse – e “desdisse” – iria apresentar. Vai perder o mandato e terá a honra de abrir a fila da Comissão de Ética nesta legislatura.
O cabo Silveira, em cana, vai ter de dar cambalhotas para justificar os R$ 270 mil achados em sua casa. O soldado do Val, já está levando tombos estrepitosos no primeiro dia de suas “denúncias”.
Mas estas suas manobras diversionistas para livrar Bolsonaro, tal como as declarações de Valdemar da Costa Neto de que “todo mundo tinha” minutas do decreto golpista para estabelecer “Estado de Defesa” e anular as eleições, só vão ajudando a transformar em comédia-pastelão as versões dos golpistas para escaparem às suas responsabilidades.
Até o final desta quinta-feira, depois do seu depoimento à PF, do Val estará completamente desmoralizado e de tudo só restará um Bolsonaro mais golpista e tosco, sem ter nem mesmo o um cabo e um soldado ao seu lado.
Partido da família Abreu paga mesada a Deltan Dallagnol, ex todo poderoso procurador da Lava Jato, chefe da cruzada contra a corrupção, comandante da autodenominada Liga da Justiça da autodenominada República de Curitiba. O ex-juiz suspeito, considerado parcial pelo Supremo Tribunal Federal, e chamado de ladrão no Congresso Nacional, Sergio Moro também recebe jabaculê do Phodemos.
Cinicamente, pelo Instagram, Dalagnol divulgou uma nota de "transparência sobre minha atividade pública" e comparou o valor que receberá do partido com o que ganhava no MPF: "corresponderá num ano a cerca de metade do total que recebi líquido como procurador da República em 2020 e consta nos meus contracheques, no portal da transparência".
A renda de Dallagnol - 15 mil mensais - será patrocinada pelo fundo eleitoral do Phodemos. Ou seja, paga pelo contribuinte brasileiro. Idem a de Moro (22 mil por mês, para não fazer nada de nada)
Partido de apoio a Bolsonaro
O Phodemos é um partido da direita fundado pela rica família Abreu acusada de corrupção. Passa de pai para irmão e deste para a filha.
Escreve Brenno Grillo:
A história do Podemos, a presença de alguns nomes controversos nos quadros da sigla e a alta aderência dela às pautas do governo Bolsonaro no Congresso põem em dúvida a firmeza dos compromissos assumidos com a filiação de Moro.
O Podemos nasceu em 2017, após a fusão do PTN com o PHS. O primeiro era o sócio mais relevante nesse novo consórcio. Ao menos desde 1995, o PTN era mais um dos partidos altamente fisiológicos que contaminam a política brasileira. Um negócio familiar, como outros: o presidente era Dorival de Abreu, que morreu e deixou o controle do partido para seu irmão, José de Abreu. Este transferiu esses poderes em 2013 para sua filha, Renata Abreu, que hoje lidera o Podemos.
Embora a nova marca sugira o contrário, o projeto tem um passado. E ele não é imaculado.
Fisiologismo e corrupção
Ainda como PTN (1995-2017), o partido pediu R$ 1 milhão para apoiar Eduardo Paes nas eleições municipais de 2012. No ano seguinte, um dos tios de Renata, Paulo Masci de Abreu - que foi filiado ao PTN - ganhou as manchetes por oferecer a José Dirceu um emprego de gerente num hotel de Brasília.
A oferta de R$ 20 mil mensais foi feita para que o petista (à época condenado apenas no Mensalão) pudesse usufruir do regime semiaberto. O acordo não se concretizou depois que a imprensa noticiou a história. Anos depois foi descoberto que o sócio majoritário do hotel era uma offshore no Panamá, a Truston International.
A empresa tinha entre seus diretores, à época dos fatos com Dirceu, José Eugenio Silva Ritter, ex-auxiliar de escritório da Morgan & Morgan - especializado em abrir trustes e responsável por registrar a consultoria do petista no Panamá.
Passados três anos desse caso, o partido se viu envolvido na Lava Jato. Wellington Magalhães - à época vereador em Belo Horizonte - foi citado nas delações de diretores da Odebrecht pelos apelidos "aço" e "navalha". Ele foi indiciado pela PF por omitir R$ 2,6 milhões em rendimentos.
Considerado homem forte da Casa (que chegou a presidir, assim como o diretório mineiro do PTN), Magalhães foi alvo de processo disciplinar pelo Podemos logo que o partido mudou de nome. Mas deixou a sigla rumo ao Democracia Cristã antes de ser expulso - o político também foi cassado pela Câmara da capital mineira em 2019 após ser acusado de corrupção passiva.
A própria transição de PTN para Podemos foi questionada quando ocorreu. Pois, na realidade, o partido apenas mudou de nome, com Renata Abreu permanecendo na presidência. Ela, inclusive, é uma das representantes institucionais do Podemos em ação por 60 supostas candidaturas laranja de mulheres em 2018.
No caso é apurada ainda a conduta de Roberto Lucena e Marco Feliciano (expulso do partido por apoiar o governo Bolsonaro e hoje no PL).
Segundo a presidente do Podemos, a ação foi movida por candidatas insatisfeitas com os valores que receberam do partido para disputar as eleições de 2018. O argumento desse grupo é que os baixos montantes pagos configuram suas candidaturas como laranjas. O julgamento da ação no TSE está marcado para semana que vem, de acordo com a deputada.
A força da dinastia Abreu no Podemos é tamanha que nem a absorção do PHS, em 2019, alterou seu poder no partido - inclusive, no ano seguinte à incorporação, o fundo partidário do Podemos dobrou, chegando a R$ 77 milhões. Só que a chegada dos novos parceiros trouxe consigo problemas na Justiça.
Apesar de já terem deixado o Podemos, Laércio Benko e Clelia Gomes, por exemplo, são investigados pela PF por suposto esquema de rachadinhas que teria ocorrido ainda na época do PHS. Eduardo Machado, que também veio do partido extinto e ocupa a vice-presidência do Podemos, é outro com sua porção de denúncias.
Ele foi acusado por diretores da extinta legenda de roubo de documentos, chegando a ser afastado do PHS, e de usar dinheiro do fundo partidário da sigla para custear gastos pessoais. Uma das obras mais recentes de Machado foi colocar Patrique Welber para dirigir o diretório do Podemos no Rio de Janeiro.
O bombeiro é conhecido na política fluminense, tendo coordenado a campanha de diversos políticos, como Jorge Picciani (MDB) - o ex-presidente da Alerj foi condenado a 21 anos de prisão na Lava Jato. Como recompensa, em setembro deste ano, Welber foi nomeado secretário do Trabalho do Rio.
A cadeira dada por Cláudio Castro foi um aceno ao partido, que integra a base do governador na Alerj. O bombeiro então levou consigo Francisco Floriano, ex-deputado federal investigado por lavagem de dinheiro, e Clébio Lopes Pereira, empresário acusado de participar de esquemas de corrupção durante a gestão Marcelo Crivella na Prefeitura do Rio.
Ainda no plano nacional, Luiz Claudio Souza França, secretário-geral do partido, foi filmado durante as investigações da Operação Caixa de Pandora (também conhecida como mensalão do DEM) recebendo R$ 38 mil de Durval Barbosa, ex-secretário de Relações Institucionais do DF.
Sobre França, o Podemos afirmou ao Bastidor que não comentará o caso, pois é "algo relacionado diretamente à defesa do secretário-geral na Justiça". Ressaltou, porém, que ele assumiu um posto no partido por indicação do PHS no momento da incorporação - França já disse diversas vezes à imprensa "que pedirá a prescrição" do seu processo.
Ziguezagues ideológicos
O caminho adotado pelo Podemos desde que deixou de ser PTN foi reforçar cada vez mais a agremiação como apoiadora do Judiciário e do Ministério Público. A presidente do partido, Renata Abreu, afirmou ao Bastidor que ele surgiu como "renascimento de um movimento" que elegeu Jânio Quadros, mas renovado para entender demandas de um eleitorado digital que não se identifica com partidos analógicos.
Um exemplo a favor do Judiciário é o líder do Podemos no Senado, Álvaro Dias, integrar a frente parlamentar ampla pela prisão após condenação em 2ª instância e pelo fim do foro privilegiado.
A chegada de Moro, contudo, desagradou alguns parlamentares do Podemos. Por exemplo, os deputados federais José Medeiros (MT), que é apoiador de Jair Bolsonaro, e João Carlos Bacelar Batista, que é próximo ao PT da Bahia.
Esses descontentamentos refletem bem a orientação política do partido, que, como PTN, apoiou Dilma Rousseff em 2010 e Aécio Neves quatro anos depois. A variação ideológica também é resultado do histórico de José de Abreu, pai de Renata, que foi filiado ao PMDB (atual MDB) e ao PSDB - onde foi buscar espaço político e terminou eleito deputado federal em 1994.
O partido, apesar de não integrar a base de apoio do presidente no Congresso, vota com os bolsonaristas. Em 2019, o Podemos foi a sigla com mais aderência (92% ) às pautas do governo, seguido pelo Patriota (90%) - agremiação que negociou o chegada de Jair Bolsonaro para disputar as eleições de 2022.
No Senado, Marcos do Val e Eduardo Girão defenderam o governo durante a CPI da Pandemia. E Styvenson Valentim, que apoiou Bolsonaro em 2018, agora se diz decepcionado com o presidente da República. (Transcrevi trechos)
SEGUINDO OS PASSOS do seu ex-chefinho informal, Sergio Moro, o ex-coordenador da Lava Jato Deltan Dallagnol anunciou que iniciará uma carreira na política. Mas isso não é bem uma verdade. A sua carreira política foi iniciada há muitos anos de maneira ilegal dentro do Ministério Público. E aqui não estou opinando, mas fazendo uma constatação com base nos fatos levantados por inúmeras reportagens da Vaza Jato. Relembremos alguns.
Dallagnol: “(eu) seria facilmente eleito” no lugar de Alvaro Dias
Em janeiro de 2018, ano eleitoral, Dallagnol abriu uma janela do seu Telegram e iniciou uma conversa consigo mesmo sobre o futuro da sua carreira. O aplicativo não servia apenas para combinar as tramoias lavajatistas, mas era usado também como o seu cantinho de autorreflexão. Dallagnol falou para Dallagnol: “Tenho apenas 37 anos. A terceira tentação de Jesus no deserto foi um atalho para o reinado. Apesar de em 2022 ter renovação de só 1 vaga e de ser Alvaro Dias, se for para ser, será. Posso traçar plano focado em fazer mudanças e que pode acabar tendo como efeito manter essa porta aberta”. Em outras divagações sobre sua candidatura, concluiu: “(eu) seria facilmente eleito”.
Assim como usou a fama adquirida na Lava Jato para engordar sua conta bancária com palestras e venda de livros, Dallagnol agora pretende usá-la para concretizar o antigo sonho de se eleger senador. Nas conversas, Dallagnol afirma por mais de uma vez que teria apoio dos integrantes da Lava Jato caso decidisse concorrer, o que indica que houve debates internos no Ministério Público sobre o tema. A construção da carreira política do procurador, portanto, é um spoiler antigo da Vaza Jato de tudo o que está acontecendo hoje. Ninguém pode se dizer surpreso.
As reportagens da Vaza Jato confirmaram que Dallagnol projetava sua carreira política enquanto abusava do poder que tinha para investigar políticos — principalmente aqueles com potencial para serem seus adversários no futuro. O procurador gastava um bom tempo do seu trabalho no MP conjecturando hipóteses e traçando possibilidades para o seu futuro político.
Nunca é demais lembrar que Alvaro Dias, citado no bate-papo de Dallagnol consigo mesmo, é o político que foi poupado pelas investigações da Lava Jato. Ele apareceu como beneficiário de propinas em dois episódios diferentes investigados pela operação. Mesmo assim, jamais foi oficialmente investigado por ela. Em um desses episódios, foi acusado de receber propina para ajudar a melar a CPI da Petrobras. Dias até chegou a prestar depoimento para Moro em 2017 sobre o caso, mas o ex-juiz e o então procurador Diogo Castor pegaram tão leve que nem perguntaram se ele havia mesmo recebido a propina. Enquanto o possível suborno do atual correligionário de Moro e Dallagnol foi ignorado pelas investigações, os investigadores planejavam prender Lula pelo roubo um objeto que já era dele com base em uma fake news que circulava na internet.
Naquele ano, Alvaro Dias se candidataria à presidência como um político representante da Lava Jato, prometendo fazer aquilo que o bolsonarismo fez: tornar Sergio Moro ministro da Justiça. Hoje, o Podemos, partido do qual Alvaro Dias é o principal cacique, abrigará todos os potenciais candidatos da Lava Jato. Hoje, após ter a barra aliviada pela força-tarefa, Dias oferece abrigo na sua sigla para os lavajatistas que almejam o poder. O Podemos virou o partido da Lava Jato.
Segundo levantamento do Congresso em Foco em 2020, o partido da Lava Jato é o mais fiel ao bolsonarismo dentro da Câmara. O segundo mais fiel é o Patriota, que anunciou há algum tempo o Japonês da Federal como presidente do partido no Paraná. É importante registrar que ele foi preso por facilitar contrabando antes de virar celebridade graças à Lava Jato, mas claro que isso não é um problema para o partido da… Lava Jato.
Ao contrário do que se imagina, o lavajatismo segue bastante alinhado ao bolsonarismo nas principais questões para o país. Além do Japonês da Federal, Moro e Dallagnol, uma outra figura que fez fama com a operação pretende surfar na popularidade para se eleger: o ex-procurador geral da República, Rodrigo Janot — aquele democrata lavajatista que confessou ter planejado o assassinato de Gilmar Mendes no STF (e por muito pouco não o realizou). Como vocês já devem imaginar, o Podemos foi o partido escolhido para lançar Janot. Perceba como as peças desse quebra-cabeça vão se encaixando.
Outras conversas de 2018 no Telegram confirmam que Dallagnol usou o cargo público para articular sua candidatura para as eleições de 2022, o que é proibido pela Constituição. Numa das reportagens publicada pela Agência Pública ficou claro que Dallagnol queria formar uma base eleitoral, mirando principalmente os evangélicos. De junho a setembro de 2018, “o procurador participou de pelo menos 18 encontros com evangélicos, entre palestras e reuniões fechadas, média de uma por semana”.
Mas não foi apenas do eleitorado evangélico que Dallagnol se aproximou. Ele também se articulou “com maçons, rotarianos, empresários e representantes de entidades patronais. As procuradorias das cidades por onde ele passava viravam praticamente comitês da campanha de 2022″. A Vaza Jato revelou um escândalo com potencial para destruir a carreira do procurador, o que não aconteceu. Pelo contrário, ele continuou a ser incensado pela grande imprensa — principalmente a Globo — e pôde concluir com tranquilidade o sonho de construir uma nova carreira na política.
Ao abandonar a carreira no Ministério Público Federal, Dallagnol garantiu também o arquivamento dos 52 processos do qual era alvo no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Dallagnol já havia sido punido em dois casos. Agora, se eleito, ficará ainda mais protegido pelo foro privilegiado. Mas não é o foro privilegiado que o move nessa mudança de carreira. O que o move é a sede pelo poder, como ficou explícito nas mensagens.
O lavajatismo pavimentou a estrada para a passagem da motociata do neofascismo bolsonarista
O lavajatismo é o pai do bolsonarismo que hoje destrói o país em todos os setores. Além de ter tirado o principal adversário de Bolsonaro do páreo de maneira ilegal, a força-tarefa contribuiu imensamente para a demonização da prática política, abrindo os caminhos para que um messias-salvador-antissistema com discurso extremista ascendesse o poder para por um fim à era dos “politicorruptos”. O lavajatismo pavimentou a estrada para a passagem da motociata do neofascismo bolsonarista — e esse é um fato que não pode ser negado por ninguém que tenha um pingo de vergonha na cara.
Dallagnol e Sérgio Moro agora poderão reviver na política partidária o entrosamento das tabelinhas que faziam nas suas carreiras jurídicas. Como não lembrar de quando o juiz indicou para o procurador uma testemunha para acusação de um caso em que iria julgar? Como esquecer do juiz sugerindo ao procurador a troca de uma das procuradoras da Lava Jato antes de ser prontamente atendido? O juiz atuava dos dois lados do balcão: cobrava do procurador agilidade em novas operações, dava conselhos estratégicos e pistas informais de investigação, antecipava decisões e dava broncas em Dallagnol como se fosse seu chefe — tudo isso tendo na mão a caneta que decidiria o futuro político daqueles que seriam seus futuros adversários na política partidária.
Era para ser um escândalo de proporções suficientes para enterrar suas pretensões políticas, mas ambos seguem sendo altamente prestigiados na grande imprensa como valorosos soldados da luta contra a corrupção. Para a imprensa lavajatista, pouco importa se os fatos apontem na direção oposta.
Na trilha da política, o alinhamento ideológico entre bolsonarismo e lavajatismo é ainda mais evidente. Não é à toa que as candidaturas lavajatistas são vistas com bons olhos pelos militares, hoje o principal pilar de apoio do governo Bolsonaro. Sergio Moro já convidou muitos oficiais de alta patente para a cerimônia de sua filiação ao Podemos. Entre os convidados está o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência de Bolsonaro. O partido da Lava Jato inclusive já o convidou para se candidatar ao Senado. Não é coincidência.
A Lava Jato morreu como operação, mas o lavajatismo permanece vivo como uma corrente política de extrema direita. Os lavajatistas podem ser ainda mais perigosos que os bolsonaristas do ponto de vista democrático. Contam com apoio maciço da grande imprensa, que lhes conferiu um falso verniz civilizatório e os vende como políticos moderados de centro-direita, numa clara tentativa de fazê-los ocupar o espaço ainda vago da terceira via.
Esses elementos reunidos aumentam a margem para que, com o poder nas mãos, cometam atrocidades antidemocráticas ainda piores que as que cometeram em suas carreiras jurídicas. Como ficou claro com as reportagens da Vaza Jato, a Lava Jato é um partido político, e o lavajatismo é um projeto de poder.
A CANDIDATURA de Sérgio Moro é o novo balão de ensaio da terceira via para as próximas eleições presidenciais. A turma do “nem Lula, nem Bolsonaro” agora tenta emplacar um candidato que perseguiu Lula enquanto juiz para tirá-lo da disputa presidencial, ostentou o status de super ministro do governo de extrema direita e depois foi trabalhar em uma consultoria que atua para ajudar a recuperar financeiramente a Odebrecht, a construtora que ele ajudou a falir quando usava toga. Essas são as credenciais éticas e morais daquele que é incensado como um herói moderado e anticorrupção.
Nesta semana, o movimento pela candidatura do ex-juiz tomou corpo. Entre as iniciativas para bombar a candidatura está o lançamento de um livro escrito por Moro chamado “Contra o sistema de corrupção”. Sim, o homem que “sempre violou o sistema acusatório” (palavras de uma procuradora da Lava Jato) para prejudicar seus adversários políticos, teve essa cara de pau monumental ao escolher o nome do livro.
A candidatura Sérgio Moro 2022 ainda não é uma certeza. Ele tem dito para amigos mais próximos que ainda está pensando. O ex-ministro bolsonarista cogita outras possibilidades, como disputar uma vaga ao Senado por São Paulo ou Paraná, ou continuar faturando confortavelmente na iniciativa privada. De qualquer maneira, já há uma grande movimentação de partidos, políticos e movimentos anticorrupção para a construção da candidatura presidencial de Moro.
O União Brasil, o novo partido criado pela fusão do PSL com o DEM, tem trabalhado ativamente nos bastidores para lançar Moro como seu candidato. Mas a expectativa é de que nos próximos dias ele se filie ao Podemos, o partido do seu grande aliado político Álvaro Dias — aquele que foi poupado pelo então juiz durante a Lava Jato, conforme ficou comprovado pela Vaza Jato. As pesquisas eleitorais da última semana mostram que a presença de Moro na disputa desidrata outros candidatos da terceira via como Ciro Gomes, João Doria e Mandetta. O ex-juiz já aparece na frente de todos eles, com 8%.
Durante esta semana a hashtag #MoroPresidente2022 apareceu entre os assuntos mais comentados do Twitter. A campanha nas redes sociais não é espontânea como se quer fazer parecer. É organizada e articulada pelo Podemos e por dois perfis ainda pouco conhecidos como “Brasil Consciente” e o “Movimento Grita!”. Esses movimentos estão articulados com as contas do Podemos e do senador Álvaro Dias. Eles costumam compartilhar os mesmos conteúdos e impulsionam hashtags defendendo pautas lavajatistas e exaltando a figura de Sérgio Moro.
O senador Álvaro Dias, do Podemos, principal aliado de Moro. Foto Jefferson Rudy/Agência Senado
O Brasil Consciente (@BrasConsciente) foi criado em dezembro do ano passado para defender as pautas da finada operação anticorrupção e, agora, se dedica quase que exclusivamente a apoiar a candidatura de Moro. O site divulgado pelo perfil é o fazendoacoisacerta.com.br, cujo nome é inspirado numa platitude dita pelo ex-juiz: “Faça a coisa certa, pelos motivos certos, do jeito certo”.
O dono do domínio do site é o Instituto Campo Social, uma ONG pertencente aos empresários Enrique Faber da Silva e Susana Moreira dos Santos. Ambos também são sócios de uma empresa de comunicação e marketing, a Qualiarte Comunicação e Marketing Ltda. O Brasil Consciente se apresenta como “um grupo de brasileiros que não perdeu a esperança e luta pelas pautas de combate à corrupção e à impunidade”. Mas não é bem assim. O feed do Instagram do grupo nos últimos meses mostra que é um perfil quase que totalmente dedicado a divulgar a candidatura Moro.
A “espontaneidade” desse movimento é tanta que Sérgio Moro apareceu parabenizando o Brasil Consciente um dia após o perfil do grupo ter sido criado no Twitter. O ex-juiz ajudou a divulgar uma live do grupo que contava com a presença de Modesto Carvalhosa, o advogado quetramou de maneira ilegal junto com a procuradora lavajatista Thaméa Danelon o impeachment do ministro do STF Gilmar Mendes.
Um outro grupo que tem se mobilizado para alavancar a candidatura Moro e as pautas lavajatistas é o Movimento Grita!, que também costuma fazer lives com Modesto Carvalhosa e com o senador Álvaro Dias.Ele se define como um “movimento que inspira os eleitores a levantarem sua voz e unirem esforços para eleger um Congresso Nacional que verdadeiramente represente a população”.
Assim como o RenovaBr, apoiado por Dallagnol, o Grita! também tem a pretensão de eleger uma bancada de parlamentares alinhados às suas pautas. O objetivo para as eleições em 2022 é “identificar e eleger uma Bancada GRITA!, de pelo menos 150 Deputados e 35 Senadores, que se apresentem como candidatos independentes de siglas partidárias. Seu plano de atuação, se eleitos, será previamente conhecido dos eleitores e formalmente anunciado como pauta obrigatória da Bancada”. É uma maneira de driblar os partidos políticos e, assim, formar uma bancada em defesa do lavajatismo. Caso tenham sucesso, Sergio Moro já teria uma bancada para chamar de sua.
O site do Grita! informa que o grupo “foi fundado a partir da indignação de 4 engenheiros do ITA, formados em 1964, que resolveram fazer de sua indignação uma Plano de Ação de Cidadania”. Parece mais um movimento espontâneo da sociedade civil, mas também não é bem assim. Um dos engenheiros à frente do projeto é Cassio Taniguchi, um dos fundadores do grupo. Ele já foi prefeito de Curitiba por duas vezes e deputado federal pelo Paraná uma vez. Apesar de Taniguchi pretender liderar um movimento anticorrupção, a sua carreira política foi marcada por alguns escândalos de… corrupção.
Cassio Taniguchi, um dos fundadores do Grita! Foto: Nani Gois/Assembleia Legislativa do Paraná
Em 2010, ele foi condenado pelo STF a seis meses de prisão em regime fechado por mau uso do dinheiro público enquanto ocupava a prefeitura de Curitiba, entre 1997 e 2000. Ele foi acusado de desviar a grana de um convênio firmado entre a prefeitura e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O dinheiro deveria ser destinado para investimentos no setor de transportes da cidade, mas Taniguchi usou parte dos recursos para pagar um precatório, o que configura crime de responsabilidade. Após a confirmação do crime pelo STF, a ação judicial foi extinta, já que o tempo para cumprir a pena já havia prescrito.
O ex-prefeito também foi condenado pelo Tribunal de Justiça a pagar multa por ter usado recursos públicos para fazer campanha eleitoral em 2000, quando conseguiu sua reeleição. A sentença também determinou a inelegibilidade do paranaense por oito anos. Uma curiosidade: em seu site o movimento Grita! diz que só aceitará políticos ficha limpa. Portanto, Taniguchi não poderia fazer parte da bancada do grupo que fundou, já que é ficha suja. Há muitos outros casos nebulosos envolvendo o fundador do Grita. Esse tipo de hipocrisia é a cara do lavajatismo. Percebam que até aqui todos os nomes envolvidos na campanha para alavancar a candidatura de Moro são paranaenses como ele. A República de Curitiba vive!
Apesar de estar inelegível, Taniguchi continuou próximo dos políticos lavajatistas. No ano passado, o delegado bolsonarista e lavajatista Fernando Francischini anunciou Taniguchi como o criador dos seu plano de governo para a disputa da prefeitura da capital paranaense. Ele perdeu a eleição e continuou como deputado estadual. Nesta semana, Francischini teve o mandato cassado pelo TSE por mentir sobre a existência de fraudes nas urnas eletrônicas.
A campanha Moro 2022 já está na praça. É a candidatura da terceira via que nasceu e cresceu sob as asas da extrema direita, mas agora quer se passar por centrista e moderado. Resta saber se o ex-juiz terá coragem suficiente para largar o bom salário na iniciativa privada para se aventurar novamente numa carreira política incerta, que até aqui foi desastrosa.
Velhas lideranças do Podemos patrocinadoras da candidatura de Moro
A CPI da Covid tem que denunciar senadores envolvidos na necropolítica. Pela divulgação de medicamentos ineficazes.
Hospital da polícia militar do RS testou proxalutamida sem autorização da Anvisa em pacientes com Covid-19
Pacientes internados no Hospital da Brigada Militar de Porto Alegre receberam remédio fabricado na China e tratado por Bolsonaro como a “nova cloroquina”. Não havia liberação para testá-lo em seres humanos na capital gaúcha.
Participação na CPI da Covid
Os responsáveis pelo experimento, segundo o major médico Christiano Perin, foram o endocrinologista Flávio Cadegiani e o infectologista Ricardo Zimerman, que trabalha como especialista terceirizado no hospital desde 2017, e teria sido o coordenador principal dos testes rodados na capital gaúcha.
Em maio, Zimerman depôs na CPI da Covid a convite do senador Luis Carlos Heinze (PP-RS), para defender o uso de medicamentos ineficazes contra o coronavírus, de antiparasitários a antimaláricos. Na ocasião, também defendeu o uso de antiandrogênicos, como a proxalutamida. Outro suposto estudo semelhante ao de Porto Alegre, mas realizado em Manaus na mesma época, com participação de Cadegiani e Zimerman, está sob investigação da Conep por indícios de irregularidades e infrações éticas. O órgão prepara uma denúncia ao Ministério Público Federal com base em uma apuração interna sobre as irregularidades cometidas no estado do Amazonas.
Topa tudo por dinheiro
Essa ideia de testar bloqueadores de testosterona para conter o coronavírus existe desde o início da pandemia e tem sido promovida pela Applied Biology, um centro de pesquisas norte-americano focado em inventar e patentear terapias contra a calvície. Um dos idealizadores da tese do potencial dos antiandrogênicos contra a Covid-19 foi o presidente da empresa, o dermatologista norte-americano Andy Goren, que se define como um especialista na “descoberta de novas terapias”.
Infográfico: Pedro Papini
Antes mesmo de publicar o primeiro artigo sobre a teoria ou testar sua eficácia clinicamente, a empresa deu entrada para uma patente do tratamento antiandrogênico contra a Covid-19 nos EUA ainda em março de 2020, com menos de dois meses de pandemia decretada. Esse pedido de patente da Applied Biology tem validade internacional desde julho de 2020, após ter sido registrado na Organização Mundial de Propriedade Industrial (OMPI), na qual o Brasil é signatário. Isso significa que, no caso da aprovação de eventuais tratamentos antiandrogênicos contra a Covid-19, governos e hospitais deverão royalties à Applied Biology pela invenção. E o tratamento com proxalutamida sequer seria a primeira patente da clínica norte-americana no Brasil, que já reserva royalties a duas terapias para calvície criadas pelo centro de pesquisas.
Inicialmente, o tratamento em vias de ser patenteado para Covid-19 previa o uso de outros antiandrogênicos já disponíveis no mercado, como a dutasterida. A escolha pela proxalutamida como droga-propaganda da teoria surgiu após a Kintor, a farmacêutica chinesa que fabrica o medicamento, fazer sua primeira oferta pública de ações na bolsa de valores de Hong Kong, em maio daquele ano. Desde a sua fundação, em 2009, a startup opera no vermelho. A empresa se beneficiou de uma mudança de lei no mercado de capitais chinês que permitiu a oferta de ações de companhias que operam no prejuízo – mas a crise financeira que surgiu no início da pandemia atrapalhou parte do otimismo da startup, que foi forçada a fechar as portas de um centro clínico em Miami. A ideia da abertura das ações era viabilizar os trâmites necessários para a comercialização da proxalutamida, que recém concluía estudos preliminares que sugeriam sua potencial eficácia contra o câncer.
Na época, as ações da Kintor foram vendidas a preços entre HK$ 17,80 e HK$ 20,15 (em valores de dólares de Hong Kong), o equivalente a R$13,30 e R$ 15, segundo o câmbio do período, conforme a calculadora do Banco Central. Dois meses depois, em julho de 2020, a farmacêutica fechou uma colaboração com a Applied Biology dias após o pedido da patente para a terapia antiandrogênica ser registrado pelos norte-americanos. Hoje, com mais de um ano de parceria e as especulações sobre a eficácia da proxalutamida contra a Covid-19, o valor das ações da companhia em Hong Kong atingiu HK$ 79,95 em julho deste ano, o equivalente a R$ 54 por ação, uma valorização de quase 350%, que tem atraído ceticismo de agentes do mercado financeiro.
Um dos motivos dessa desconfiança são informações duvidosas divulgadas pela própria Kintor a investidores: em julho, os chineses anunciaram uma aprovação emergencial para uso da proxalutamida no Paraguai que não existiu, conforme apuração da Agência France-Press. Procurado, o Ministério da Saúde paraguaio não respondeu às tentativas de contato do Matinal. No caso da Covid-19, a vigilância sanitária paraguaia depende das aprovações de nações vizinhas para autorizar vacinas em caráter emergencial – porém, o órgão não explica bem como funciona o processo para a aprovação de outros medicamentos contra o coronavírus. Sobre o caso, a Kintor Pharmaceutical se limitou a indicar as informações oficiais contidas em seu site, que não respondiam a nenhuma das perguntas enviadas.
Após a divulgação de resultados sem revisão de cientistas do estudo com indícios de fraude no Amazonas, em 11 de março, as ações da Kintor Pharma valorizaram mais de 300%. Fonte: Google Finance
O endocrinologista Flávio Cadegiani, um dos coordenadores do experimento realizado em Porto Alegre, foi diretor clínico da Applied Biology, conforme sugerem os “conflitos de interesse” apontados pelo próprio médico nos artigos sobre a proxalutamida que assinou com pesquisadores da companhia. Junto a Andy Goren, o presidente da empresa norte-americana, Cadegiani se reuniu com o ministro de Ciência e Tecnologia Marcos Pontes no ano passado com o objetivo de promover a teoria antiandrogênica no país. Desde ao menos outubro de 2020, o médico promove o uso da proxalutamida em supostos testes clínicos, inclusive com postagens públicas em suas redes sociais e recrutamento de voluntários via WhatsApp – o que não é usual em pesquisas médicas por criar um viés em que apenas os pacientes com tendência a “acreditar” na terapia são selecionados.
No início do ano, a mesma Applied Biology, com apoio da Kintor Pharmaceutical e em parceria com o grupo hospital amazonense Samel, rodou o já mencionado estudo clínico com indícios de irregularidades no estado do Amazonas, com participação da dupla de médicos. Nessa época, Ricardo Zimerman havia viajado para Manaus a convite do Ministério da Saúde para promover o uso de cloroquina no estado por meio do TrateCov. Lá, encontrou-se com Cadegiani e passou a auxiliá-lo na pesquisa com proxalutamida. Em seguida, os dois médicos ampliaram o uso do medicamento para o Hospital da Brigada Militar, onde Zimerman trabalha. O infectologista gaúcho havia sido convidado pela pasta para viajar ao Amazonas por indicação do médico Helio Angotti, o secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde da pasta, um dos principais entusiastas do tratamento precoce no governo federal, que apresentou o experimento com proxalutamida realizado no Amazonas ao presidente Jair Bolsonaro.
Na época, Bolsonaro se animou com a divulgação dos supostos resultados milagrosos da droga e chegou a usar um almoço que debateria a demissão do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello para discutir uma eventual aprovação do uso emergencial do medicamento. A Anvisa marcou duas reuniões com uma consultoria especializada em regulação de medicamentos contratada pela Applied Biology para discutir a aprovação da proxalutamida no Brasil, mas o escritório desmarcou e nunca mais procurou a agência reguladora.
Em abril, o governo federal tentou convencer a Fiocruz a produzir a proxalutamida no Brasil, diante da falta de interesse de farmacêuticas da iniciativa privada brasileira. À Fiocruz, a Kintor Pharmaceutical garantiu que poderia entregar 100 milhões de comprimidos do medicamento ao País a partir de junho, segundo uma reportagem da CNN Brasil, mas as negociações novamente travaram na falta de anuência da Conep aos experimentos realizados no Amazonas.
No mês seguinte, em maio, na CPI da Covid, o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, chegou a ser perguntado sobre uma eventual aprovação do uso da proxalutamida pelo senador Eduardo Girão (PODE/CE), um dos defensores do uso do medicamento. Torres relatou o que discutiu sobre o remédio em conversas realizadas nos dias 11 e 15 de março, das quais participaram a Applied Biology, autoridades da Anvisa e o médico Flávio Cadegiani. “Um dos pontos que apresentamos foi, sim, a necessidade da interlocução com a Conep, porque, sem ética em pesquisa, absolutamente, não dá para fazer nada, a ética tem que prevalecer na seleção dos voluntários testadores, enfim, é fundamental. E esse grupo não voltou mais a nos contatar”, respondeu Torres na ocasião.
Anvisa veta uso de remédio defendido por Bolsonaro contra a COVID-19
O medicamento proxalutamida, que vinha sendo testado no tratamento da COVID-19 no Brasil, foi barrado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A Diretoria Colegiada da agência reguladora decidiu, por unanimidade, suspender o uso da droga em pesquisas científicas no país e a importação da substância. A proibição foi feita de forma cautelar diante de denúncias e investigações que estão sendo feitas a respeito dos estudos com o fármaco, exaltado pelo presidente Jair Bolsonaro.
Em agosto, o Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul abriu um inquérito civil público para investigar o uso irregular da proxalutamida em testes no Hospital da Brigada Militar, em Porto Alegre. A medicação teria sido aplicada em cerca de 50 pacientes, em um ensaio supostamente clandestino, apesar de a Brigada ter assegurado que "o estudo obedeceu às exigências dos órgãos competentes e as normas legais aplicáveis aos procedimentos em questão" - afirmou em nota.
Porém, a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), órgão vinculado ao Conselho Nacional de Saúde (CNS) - responsável por autorizar a realização de pesquisa com seres humanos no país -, negou ter recebido "qualquer solicitação para a realização de estudo com a substância proxalutamida no Hospital da Brigada Militar de Porto Alegre" [Transcrevi trechos de reportagem de Maria Eduarda Cardim, para o Correio Braziliense]. É desconhecido o número de mortos nesse experimento nazista à Mengele em Porto Alegre.
Unesco denuncia 200 mortes com experiência bolsonarista da proxalutamida no Amazonas como "das mais graves da história"
A Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) considerou a denúncia de 200 mortes de voluntários de pesquisa clínica com a proxalutamida feita no Amazonas uma das infrações éticas mais graves da história da América Latina. A declaração foi divulgada nesse sábado (9) por meio da Rede Latino-americana e Caribenha de Bioética (Redbioética-Unesco). A informação foi publicada pelo jornal Folha de S.Paulo.
A Unesco deu seu posicionamento, após a Conep (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa) fazer uma denúncia à Procuradoria-Geral da República no mês passado. A entidade é responsável por regular a participação de seres humanos em pesquisas científicas no Brasil.
Jair Bolsonaro defendeu o uso da substância no combate ao coronavírus, mas o remédio não teve eficácia comprovada contra a Covid-19. O uso da substância em pesquisas científicas também foi vetado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no começo do mês passado.
De acordo com o comunicado da rede de bioética da Unesco, a denúncia da Conep incluiu graves violações dos padrões éticos de pesquisa com a proxalutamida. "É ética e legalmente repreensível, conforme consta do ofício da Conep, que os pesquisadores ocultem e alterem indevidamente informações sobre os centros de pesquisa, participantes, número de voluntários e critérios de inclusão, pacientes falecidos, entre outros", disse.
"Qualquer alteração em um protocolo de pesquisa deve ser aprovada pelo sistema de ética em pesquisa local", afirmou.
Por que o senador Marcos do Val deu “ombrada” no deputado Luis Miranda?
Escreve Caio Barbieri: Em mensagens disparadas por WhatsApp no dia 23 de março deste ano, as quais o Metrópoles teve acesso, Luis Miranda questionou ao ajudante de ordens de Bolsonaro o motivo da falta de respostas do presidente sobre a pressão sofrida pelo irmão dele, Luis Ricardo Miranda, que é concursado do Ministério da Saúde, para autorizar a aquisição do imunizante indiano.
“Bom dia irmão, o PR [presidente da República] está chateado comigo? Algo que eu fiz? Só precisamos saber o que fazer em uma situação como essa”.
Como resposta, o militar que assessora o presidente da República respondeu: “Bom dia. Negativo, deputado. São muitas demandas. Vou lembrá-lo”.
“Obrigado irmão! Você sabe que a vontade é de ajudar. Estamos juntos”, agradeceu o deputado, mas acabou ficando sem respostas.
O militar chefiava desde janeiro a Diretoria de Programas do ministério, mas foi exonerado em meados de abril após a chegada do atual ministro Marcelo Queiroga.
“O coronel Pires foi um dos que pressionou meu irmão a assinar a compra da Covaxin, mas o processo estava todo errado e cheio de falhas. Esse foi um dos pontos que levamos ao presidente Bolsonaro sobre o que estava acontecendo no Ministério da Saúde”, garantiu o congressista em conversa exclusiva.
No print encaminhado à coluna Janela Indiscreta, o militar que ocupava a diretoria da pasta escreveu: “Obrigada, meu amigo, estamos com muitos brasileiros morrendo. Precisamos fazer tudo para ajudar. O representante da empresa veio agora a noite falar com o Elcio para agilizar a LI para embarcar as vacinas esta semana. Quatro milhões”.
Bolsonarista e propagandista do tratamento precoce, do kit cloroquima, o kit me engana, o senador Marcos do Val não gostou do atrapalho dos irmãos Miranda, que colocaram uma pedra no meio do caminho do gabinete paralelo e o gabinete de Bolsonaro.
O deputado Luis Miranda (DEM-DF) e o senador Marcos do Val (Podemos-ES) se desentenderam durante intervalo de sessão da CPI da Covid na sexta-feira 25/6. No vídeo é possível ver que outros parlamentares precisaram apartar a briga entre as partes.
Marcos do Val é instrutor da SWAT desde o ano de 2000 e membro de Honra da SWAT de Beaumont no Texas desde 2003. Fundador e instrutor-chefe do CATI - International Police Training, inc, primeira e única empresa de treinamento policial Multinacional da atualidade, com filiais na Europa e EUA. Criador das inovadoras técnicas de IMOBILIZAÇÕES TÁTICAS®, hoje difundidas em várias unidades policiais ao redor do mundo. Treina policiais para derrubar com pernada, golpe de mão e ombrada.
Do Val era mediador da entrega do kit covid (vide tags). Victor Fuzeira e Luciana Lima registraram: Luís Miranda reclamou da briga. “Aqui mesmo, no intervalo. Sempre admirei o Marcos Durval, e ele teve um descontrole comigo. Onde está a nossa história?”, disse. Onde? Uma história que precisa ser contada. Ninguém bate no próximo, dentro do Senado, de graça.
Reunião secreta revela que o gabinete paralelo do Ministério da Saúde não era informal, mas organizado e com amplo acesso à alta cúpula do governo, inclusive ao presidente
EM JUNHO deste ano, a CPI da Covid recebeu um vídeo que confirmou a suspeita dos senadores sobre a existência de um Ministério da Saúde não oficial, que ficou conhecido como gabinete paralelo. Nele, é possível ver Bolsonaro em uma reunião com Osmar Terra e outros médicos negacionistas defendendo o tratamento precoce com remédios comprovadamente ineficazes contra covid.
Lá também estava o biólogo negacionista Paolo Zanotto, grande amigo de Jair Bolsonaro e contra a vacinação em massa. No vídeo, Zanotto fala abertamente sobre o gabinete paralelo, o qual ele chama de “shadow board” e coloca em dúvidas a eficácia da vacinação — contrariando todas as evidências científicas. As imagens da reunião deixaram claro porque Pazuello foi negligente no processo de compra das vacinas. Ele não era o ministro de fato, mas uma marionete comandada pelas decisões desse gabinete paralelo.
No mês passado, apareceu mais um vídeo do gabinete paralelo. Dessa vez, Zanotto aparece em uma reunião online com Pedro Batista Jr., diretor-executivo da Prevent Senior. A conversa entre os dois deixou claro que o protocolo macabro idealizado pela Prevent Senior para aplicar os medicamentos do kit covid em pacientes era de conhecimento do governo federal. O gabinete paralelo não só sabia que a Prevent Senior tratava pacientes como cobaias humanas como acompanhou de perto os experimentos.
Nesta semana, o Intercept publicou um outro vídeo que traz novos elementos sobre o gabinete paralelo. As imagens mostram uma reunião online secreta em junho deste ano comandada pelo empresário Carlos Wizard. Wizard é aquele bilionário bolsonarista que fugiu da CPI como o diabo foge da cruz, e quando finalmente apareceu, preferiu se esconder atrás da Bíblia e fazer proselitismo religioso.
O empresário carola teve a oportunidade de demonstrar sua inocência na CPI, mas preferiu se proteger atrás de um habeas corpus. O silêncio soou como um berro de confissão de culpa. Se ele ficou quieto na CPI para não se incriminar, no escurinho da reunião secreta ele era o mais falante e atuava claramente como um coordenador das ações negacionistas do gabinete paralelo.
No vídeo, Wizard parece atuar como um diretor-executivo do gabinete das sombras. Médicos representantes de 27 estados participaram da reunião. Entre eles estava Emmanuel Fortes, um dos vice-presidentes do Conselho Federal de Medicina, o CFM. Suas declarações no vídeo confirmam que a entidade trabalha 100% alinhada ao governo na implementação do tratamento precoce em massa. Fortes chegou a dizer na reunião que é “mais seguro” para médicos receitar do que não receitar a cloroquina — o que, já naquele momento, contrariava todas as evidências científicas.
O médico nunca escondeu sua admiração por Jair Bolsonaro. Pelo contrário, fez questão de demonstrar isso ao publicar uma foto ao lado do presidente em suas redes sociais em março deste ano. O vice-presidente do CFM aproveitou a postagem para tecer elogios e prometer fidelidade ao genocida em suas redes sociais: “Estive em solenidade onde estava o presidente Bolsonaro e aproveitei para fazer o registro e declarar que continuo confiando em seu governo”. E completou prometendo apoio à sua reeleição e contando uma série de mentiras sobre a atuação do presidente na presidência: “Estarei consigo em 2022 porque, nesses últimos trinta anos foi o presidente que mais investiu em construir a infraestrutura em normativos, leis, decretos, portarias e programas para efetivamente termos políticas de estado, não políticas de governo”.
Emmanuel Fortes ao lado do presidente Jair Bolsonaro, para quem fez campanha em 2018.
Outra figura importante da tropa de choque negacionista é o senador Marcos do Val, do Podemos do Espírito Santo. Ele, que é integrante da CPI da Covid, aparece no vídeo dizendo que trabalha para convencer autoridades sobre a eficácia do kit covid e organizar a sua distribuição. Na reunião fica claro que Do Val atuava como um dos braços políticos do esquema negacionista. Ele revelou ter tratado do assunto com políticos, militares e integrantes do Ministério Público.
Do Val era uma espécie de faz-tudo do gabinete paralelo para ajudar a promover medicamentos comprovadamente ineficazes. No vídeo, Wizard apresenta o senador como um representante do grupo “seja diante do Ministério Público, seja diante de alguma questão com a Anvisa, seja diante do Exército (…) seja alguma intermediação com o seu governador, com o prefeito local”. Ou seja, temos um senador bolsonarista atuando como lobista dos interesses de um gabinete que é objeto de investigação da CPI, da qual ele é membro.
O “padrinho” do gabinete paralelo atuava dos dois lados do balcão, fingindo investigar o grupo para o qual trabalhava com afinco. Trata-se de um escândalo por si só.
Durante o depoimento de Wizard na CPI, o senador mentiu ao dizer que o gabinete nunca lhe pediu alguma coisa. Já no depoimento do deputado Luis Miranda, em que ficou demonstrada a prevaricação do presidente diante de uma denúncia de corrupção no Ministério da Saúde, Do Val levantou-se da cadeira e o empurrou como um cão de guarda do bolsonarismo.
Mas ninguém pode se dizer surpreso com a desfaçatez da atitude do senador. Ele é o cara que se elegeu na onda do bolsonarismo depois que conquistou milhões de seguidores nas redes sociais se vendendo como um ex-policial da Swat sem nunca ter sido um policial da Swat. Do Val nem policial é. É um professor de taekwondo que deu treinamentos de imobilizações táticas para a polícia americana.
Teve algum destaque no Senado como relator na Comissão de Constituição e Justiça do pacote anticrime proposto pelo ex-ministro da Justiça, Sergio Moro. Graças à sua atuação na defesa da flexibilização de armas nessa CCJ, ele foi condecorado pelo presidente da República com a Ordem do Mérito da Defesa. Entidades da sociedade civil apontaram conflito de interesses pelo fato do senador ter um histórico de relacionamento com a Taurus, fabricante de armas. Do Val é também aquele senador que demitiu a namorada do seu próprio gabinete para que ela pudesse ser recontratada graças à ajuda de “amigos do Senado” que lhe deram um cargo na Diretoria-Geral do Senado, onde passou a receber um salário maior.
Então ficamos assim: a tropa de choque do Ministério da Saúde paralelo era liderado por um bilionário bolsonarista, protegido politicamente por um senador bolsonarista e contava com o apoio de um médico bolsonarista integrante do CFM — e mais um punhado de médicos que flertam com o charlatanismo. O “”Conselho Científico Independente” — nome eufemístico que Wizard deu para o gabinete negacionista — tinha largo acesso às principais figuras do governo, inclusive ao presidente da República, e contava com grande espaço na estatal TV Brasil para boicotar as vacinas e difundir um tratamento comprovadamente ineficaz.
Enquanto estendia o tapete vermelho para a picaretagem, o governo federal dava um perdido na Pfizer e boicotava a compra de vacinas. Quantas mortes podem ser colocadas na conta de um gabinete que trabalhou contra um medicamento que salva-vidas de pacientes com covid e investiu pesado em outros que comprovadamente não salvam? Quantas vidas seriam poupadas se esse gabinete paralelo não tivesse se mobilizado para difundir o protocolo macabro da Prevent Senior à revelia da ciência?
Hoje, depois de todas as provas divulgadas pela imprensa e pela CPI, dizer que houve um genocídio comandando pelo governo Bolsonaro e sua tropa de choque é a mera constatação de um fato. Mas, se a CPI ainda quiser mais provas, bem poderia reconvocar o falante Carlos Wizard para se sentar no banco dos depoentes.
MAIS VÍDEOS
REPORTAGENS
Com anuência do CFM, Prevent Senior transformou brasileiros em cobaias humanas
Em reunião secreta, Marcos do Val afirma a grupo de médicos que trabalhava para garantir acesso à droga; CFM e Ministério participaram.Ilustração: Rodrigo Bento/The Intercept Brasil; Folhapress
O senador Marcos do Val, do Podemos do Espírito Santo e membro da CPI da Covid, trabalhou com o gabinete paralelo que orientou o uso de medicamentos e políticas públicas inúteis contra a covid-19. Em uma longa reunião privada, classificada pelo empresário Carlos Wizard como um “encontro nacional” com médicos de “27 estados”, o senador foi apresentado como o “padrinho político” da iniciativa.
Uma gravação do encontro foi entregue agora ao Intercept por uma fonte que pediu para se manter anônima por medo de represálias. O material, com confissões até então inéditas, não faz parte dos documentos recolhidos pela CPI. Para preservar a identidade da fonte, o Intercept optou por não publicar a íntegra do vídeo, mas apenas trechos dele.
Numa fala de quase dez minutos, do Val afirmou que trabalhava para convencer autoridades para que adotassem o chamado kit covid, assim como para organizar a distribuição de fármacos comprovadamente ineficazes contra o novo coronavírus. O senador mencionou tratativas dele com as Forças Armadas, governadores, prefeitos, o Ministério Público e a Anvisa, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária. A reunião ocorreu em 28 de junho de 2020.
“Estou aqui não só como padrinho, mas como ponta de lança para entrar onde vocês vão ter dificuldade”, disse o senador no encontro. “Até peço: não entre na seara política, que é muito complicada. Pode contar comigo que vou estar na neutralidade, não quero e não vou fazer publicidade disso. Para mim, fazer publicidade disso é um crime”.
A confissão do senador – que meses depois mentiu a respeito, como mostram notas taquigráficas de sessão da CPI – foi feita em uma reunião fechada de duas horas do grupo, que se autodenomina “conselho científico independente”.
No mesmo encontro virtual, o médico Emmanuel Fortes, que é um dos vice-presidentes do Conselho Federal de Medicina, o CFM, e membro ativo do gabinete paralelo, confirma que a entidade trabalhou alinhada aos defensores do tratamento precoce para dar garantias a quem prescrevesse a medicação inútil a pacientes de covid-19.
Além disso, o vídeo confirma o papel central de Wizard no gabinete paralelo montado por Jair Bolsonaro para aconselhá-lo no combate à covid-19. Ao longo de mais de duas horas, é ele quem preside a reunião, distribui tarefas e faz pedidos aos médicos que participam do encontro virtual.
O coquetel de medicamentos, que contém cloroquina e ivermectina, é comprovadamente ineficaz contra o vírus que já matou quase 600 mil brasileiros, de acordo com estudos da Organização Mundial da Saúde e da Universidade de Oxford, na Inglaterra.
Eu procurei Marcos do Val para que comentasse o vídeo. Em entrevista, o senador confirmou que trabalhou pela aquisição de cloroquina, mas negou que atuava para ajudar o presidente Jair Bolsonaro, principal interessado em vender a ideia de que a cloroquina significava a cura da covid-19 para incentivar que os brasileiros voltassem às atividades rotineiras e evitassem a retração econômica. Do Val disse, inclusive, que se revolta ao ver o presidente provocando aglomerações, e que nunca esteve em reuniões com ele para tratar de qualquer assunto.
“Não fazia parte de um gabinete ou nenhum conluio. Para mim isso não existia”, disse. O vídeo, contudo, o desmente. Do Val também argumentou que sua atitude foi correta à época, mas que, com o surgimento das vacinas e novas evidências da ineficácia das drogas do kit covid, ele reviu sua posição.
Na época da reunião, no entanto, o governo dos EUA já afirmava não ser “razoável” acreditar na eficácia da cloroquina. E um estudo conduzido pelo governo britânico não encontrou qualquer benefício no uso do medicamento. Ou seja: no mínimo, não havia qualquer informação científica que autorizasse a corrida para inundar o Brasil com comprimidos de cloroquina. Hoje, sabe-se que o uso da droga inclusive aumentou a mortalidade de pacientes de covid-19, segundo uma pesquisa publicada pela revista científica Nature.
Os senadores Jorginho Mello, do PL de Santa Catarina (de máscara) e Marcos do Val cumprimentam o empresário e entusiasta da cloroquina Luciano Hang antes do depoimento dele à CPI, no Senado. Foto: Roque de Sá/Agência Senado
A mentira do senador
Marcos do Val jamais revelou detalhes de sua atuação junto aos médicos, apesar do grupo ser um dos focos centrais da investigação de que ele mesmo faz parte. Pior: durante o depoimento de Wizard à CPI, em 30 de junho passado, do Val apenas disse que foi convidado para uma live com Wizard e que nunca lhe pediram nada.
“Não me foi pedido nada, apoio de nada, absolutamente nada. Então, eu queria deixar claro isto pra sociedade, pra todos que estão assistindo: como eu acabei te conhecendo, como eu acabei conhecendo a equipe de médicos e cientistas”, disse, na CPI.
O encontro secreto mostra outra fotografia. Um ano antes do depoimento prestado por Carlos Wizard, do Val disse que tinha proximidade com o empresário, com o presidente Jair Bolsonaro, e se cacifou como representante dos médicos que buscavam promover um medicamento sem eficácia contra o coronavírus.
O parlamentar revelou que por seus esforços conseguiu “fazer com que as Forças Armadas disponibilizassem oficialmente o Exército aqui no meu estado para armazenar a medicação e fazer a distribuição”. “Consegui recursos com o Ministério da Saúde para compra de mais de 200 mil kits para o meu estado, são 4 milhões de moradores”, orgulhou-se.
Adiante, ele repetiu a afirmação: “A gente está conseguindo fazer o movimento mesmo com o governador [do Espírito Santo, Renato Casagrande, do PSB] ter sido contrário, do secretário de Saúde ser extremamente contrário a isso. Consegui [empurrar a distribuição da cloroquina] via Ministério Público, via CRM”, falou, referindo-se ao Conselho Regional de Medicina capixaba.
À época da reunião, o país vivia a primeira escalada de casos de covid-19 e somava cerca de 55 mil mortes. Bolsonaro já havia defendido a cloroquina e trabalhava para viabilizar a importação dos insumos. O Laboratório Químico e Farmacêutico do Exército produzia o medicamento em larga escala.
Mas todo esse esforço já não encontrava respaldo na Organização Mundial da Saúde, que estava revendo pesquisas com a droga por conta do risco do medicamento à saúde dos voluntários. Dias depois, em 4 de julho, a OMS encerraria definitivamente as pesquisas sobre a cloroquina.
Nada disso importava para quem participava daquela reunião virtual. O encantado Wizard contava que via do Val como um lobista do grupo – e da cloroquina – junto a órgãos públicos.
“Por que um grupo de médicos de 27 estados precisa do apoio de um senador que nem médico é? Quero dizer a todos vocês que em alguns momentos específicos, vamos precisar do apoio do senador do Val. Seja diante do Ministério Público, seja diante de alguma questão com a Anvisa, seja diante do Exército, para dispensar os remédios no seu município, no seu estado, seja alguma intermediação com o seu governador, com o prefeito local. Seja muito bem-vindo, senador. Agradecemos e contamos com seu apoio”, aplaudiu o empresário.
As falas de Wizard e do Val foram acompanhadas por ao menos 16 pessoas de todas as regiões do país e que faziam lobby pelo uso do kit covid junto a estados e prefeituras.
‘A gente tem um inimigo muito grande contra esse movimento, que é a Rede Globo’.
No encontro esteve também o atual secretário-executivo adjunto do Ministério da Saúde, Alessandro Vasconcelos, que à época era assessor especial da Secretaria-Executiva, comandado pelo coronel Élcio Franco. As médicas Nise Yamaguchi, Luciana Cruz, e os médicos Guili Pech e Roberto Zeballos também participaram.
O senador é novato na política: foi eleito em 2018 na onda do bolsonarismo. Dono de uma empresa que dá treinamentos de segurança a policiais, do Val orientou os médicos cloroquiners a evitarem conflitos e processos judiciais enquanto batalhavam pelo tratamento precoce.
“A gente tem um inimigo muito grande contra esse movimento, que é a Rede Globo. Eu tô botando o nome porque eu me sinto à vontade para falar isso com vocês, para não ter melindre. Não adianta entrar em rota de colisão com a Globo, não adianta entrar em rota de colisão com governador que é contrário, a gente tem que criar estratégia e saber chegar ao resultado sem fazer vídeos batendo, sem fazer vídeos agredindo ninguém. Porque isso vai trazer um processo judicial que vai tirar o tempo de vocês”, explicou o senador.
Em vários momentos da reunião, os participantes relatam estratégias para driblar as políticas públicas de cidades contrárias ao tratamento precoce. Em um dos relatos, a médica Luciana Cruz, que integra grupos que promovem desinformação sobre a covid-19, disse ter convencido os gestores de Várzea Grande, na região metropolitana de Cuiabá, a adotarem o tratamento precoce. Ela apresentou a notícia como uma forma de driblar a resistência ao ineficaz tratamento precoce que havia encontrado na capital do Mato Grosso.
Emmanuel Fortes, vice-presidente do Conselho Federal de Medicina: ‘É preciso que quem se queixa venha a encontrar provas de que foi a prescrição medicamentosa [da cloroquina] que gerou o dano à saúde’. Foto: Divulgação/Facebook
CFM garantiu disseminação da cloroquina
Ainda que tenha falado menos do que o senador Marcos do Val, o médico Emmanuel Fortes, vice-presidente do CFM, é outra estrela da reunião.
“Eu sou o coordenador do Departamento de Fiscalização e da Propaganda e Publicidade Médica [no CFM]. E sou o responsável, fui o relator do parecer sobre uso off label do medicamento”, ele disse, em referência ao relatório de 2016 que autorizou a prática. “Então, tudo que está sendo feito agora [com a cloroquina] está amparado em uma nota técnica do CFM e no parecer sobre uso off label dos medicamentos”, vangloriou-se Fortes.
O uso off label é a indicação de um medicamento para fins não especificados na bula pelo fabricante nem reconhecidos pela Anvisa. Além do parecer de 2016, uma segunda nota técnica, publicada em 2020 pelo CFM, deu sustentação para que médicos alinhados a Bolsonaro pudessem prescrever cloroquina, ivermectina, azitromicina e outros remédios que não têm nenhum efeito contra a doença causada pelo novo coronavírus sem medo de sofrer punições por infringir a ética médica. O texto de 2020 distorceu o conceito de autonomia do médico para ajudar na disseminação do kit covid.
Assim como o senador, Fortes orienta os médicos a não confrontarem colegas de profissão contrários ao tratamento com cloroquina. Ele argumenta, sem explicar bem seu raciocínio, que os profissionais que desconfiaram – com razão – da cloroquina é que corriam riscos de ser processados por pacientes insatisfeitos.
“Se tiver problemas [derivados do uso da cloroquina], é necessário que haja uma relação de causa e efeito. É preciso que quem se queixa venha a encontrar provas de que foi a prescrição medicamentosa que gerou o dano”, falou, com frieza.
“Agora, [no caso de] quem não prescreve, aí a situação fica muito mais complexa. Basta ir no prontuário e ver que a pessoa não tomou providência preliminarmente e [isso] pode [resultar nela] ser acionada judicialmente. […] A gente tem que dizer àqueles que prescrevem [a cloroquina] que a salvaguarda deles é muito maior do que para quem não prescreve”, calculou Fortes.
Jair Bolsonaro e o general da ativa do Exército Eduardo Pazuello, o ministro da Saúde que liberou o uso generalizado da cloroquina contra a covid-19: intenção era criar a impressão de que havia uma cura fácil para a doença. Foto: Andressa Anholete/Getty Images
Apoio no Ministério da Saúde
Também participou da reunião virtual o então diretor do Departamento de Gestão do Trabalho em Saúde, Alessandro Vasconcelos. À época, ele era subordinado ao general da ativa Eduardo Pazuello, então ministro interino da Saúde.
Após pedidos dos médicos que estavam na live, Alessandro se comprometeu a enviar documentos da Secretaria-Executiva (à época comandada pelo coronel Élcio Franco) que informassem a data em que os estados receberam cloroquina e a quantidade do medicamento enviado. O objetivo era ter em mãos documentos para pressionar os governadores a distribuir a droga aos municípios.
Vasconcelos se dispôs a interferir junto ao Conass, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde, que representa secretários estaduais, em busca de reuniões entre o gabinete paralelo e autoridades locais de municípios que tinham “bloqueios”, classificação no grupo para as cidades em que a cloroquina era barrada.
Diferentemente de quando depôs à CPI, onde se agarrou a uma decisão do Supremo Tribunal Federal e repetiu dezenas de vezes que não iria responder a pergunta alguma, Carlos Wizard parece à vontade ao longo da reunião virtual. Além de coordenar o encontro, ele estimulou que líderes do grupo dessem entrevistas a meios de comunicação para disseminar os efeitos (inexistentes) cloroquina contra a covid-19.
“Seja a doutora Luciana, o doutor Zeballos, a doutora Nise, o doutor Anthony, [ou] os demais membros do conselho. Entra pelo Skype, entra pelo Zoom. O que nós queremos é cada vez mais divulgar esse protocolo de tratamento precoce”, disse Wizard.
Marcos do Val com os colegas senadores Flávio Bolsonaro, do Republicanos do Rio, e Marcos Rogério, do DEM de Rondônia: contra a ciência, jogando a favor da cloroquina. Foto: Leopoldo Silva/Agência Senado
Senador se diz arrependido
Na quarta-feira, 6 de outubro, à noite, enviei questionamentos à assessoria do senador Marcos do Val. Em seguida, ele mesmo pediu para dar uma entrevista por telefone sobre o caso. Em cerca de 1h20 de ligação, me explicou suas ações e contextualizou a época do vídeo. Depois, ainda me enviou vídeos de suas redes sociais e documentos que a seu ver legitimam sua atuação em prol da cloroquina.
Na mesma noite, Edvaldo Fernandes, da Advocacia do Senado Federal, me mandou mensagem, a pedido do senador, para emitir uma opinião sobre as atitudes dele.
“O senador Marcos do Val reportou o contato de vocês, enviou documentos e esclarecimentos. Pelos dados disponíveis, não identificamos nada de irregular, já que o senador sempre atuou sob o manto da imunidade parlamentar, fez sim defesa de tratamento precoce e preventivo no começo da pandemia, mas convergiu para a posição ortodoxa quando a ineficácia dessas abordagens se provaram cientificamente ineficientes”, escreveu Fernandes.
A advocacia do Senado serve aos senadores, mas é incomum jornalistas receberem posicionamentos desses servidores sem que o órgão seja procurado para esclarecimentos.
Na conversa comigo, Do Val fez questão de mostrar o ofício enviado ao Ministério da Defesa. Como já havia dito na reunião, ele reiterou que intermediou a doação de cloroquina de laboratórios a um hospital privado, que por sua vez repassaria os comprimidos para médicos os receitarem a pacientes em clínicas particulares.
“Não lembro a quantidade, lembro que nem tive acesso a esses remédios, nem vi, nem toquei [neles]. Só falei para os médicos: olha, está chegando [cloroquina] para o hospital [privado] aqui no estado, o MedSênior, eles que vão receber, porque têm toda liberação da Anvisa. E vocês vão pegar lá, cada médico, e botar sua identidade e tudo mais. Eles [os médicos] pegaram e dentro de suas clínicas particulares receitaram”, disse. O senador disse que a articulação foi comunicada ao Ministério Público do Espírito Santo.
Ele disse, ainda, que conseguiu “uma doação que foi feita diretamente de fábrica para hospital, que entregou para os médicos”. “Eram amostras grátis. Fui pedindo rebarba de remédios, que iriam vencer em seis meses, e até a entrega às farmácias estariam vencidos”, acrescentou. Para embasar o que falava, me mostrou um ofício da Eurofarma em que registram a doação em julho de 2020 para a empresa Samedil.
‘A gente ia ser uma linha de ajuda para os médicos que queriam receitar a cloroquina’.
“Hoje, como integrante da CPI, eu vi, foram descortinadas coisas que eram feitas e que, se eu soubesse [na época], não teria participando dos grupos e movimentos”, disse.
Do Val admitiu que em nenhum momento foi cobrado ou trabalhou pela aquisição de respiradores ou insumos para leitos de UTI – duas alternativas reais para salvar vidas –, mas apenas pela entrega de cloroquina aos médicos.
O senador do Val disse que se interessou pela pauta da cloroquina quando teve covid, em maio de 2020. À época, foi procurado pelo médico Fábio Pimenta, membro suplente do Conselho Regional de Medicina do Espírito Santo. No entanto, me relatou que sua atuação só ganhou força após os encontros com Wizard.
“[A live com Wizard] Era exatamente para dizer como a gente ia trabalhar para ajudar. Não era convencer [a sociedade], não, porque não sou médico. Era ajudar os médicos que eram favoráveis. A gente ia ser uma linha de ajuda para os médicos que queriam receitar isso [a cloroquina]”, afirmou.
Ele contou que montou um grupo com 76 dos 78 secretários municipais do seu estado para discutir demandas, e que atuou diretamente com eles, sem procurar o Conasems, o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde, entidade responsável por tratar e definir políticas públicas junto ao Ministério da Saúde.
Sobre as críticas à Globo, disse que a empresa age politicamente e queria criticar os métodos do presidente. Já sobre sua fala na CPI de que não ofereceu ajuda, disse que ele foi mal interpretado.
“A minha fala de não pedir nada é [não pedir] nada ilícito. Digo que não me pediram nada, eu tenho que complementar com o ‘ilícito’? Eu não sou político de carreira, então tem que ter essa malícia, pode ser que nas próximas eu seja mais detalhista”, esquivou-se.
Após a publicação da reportagem, a Advocacia do Senado enviou uma nota em que repete as considerações ditas por Marcos do Val na entrevista. Ela pode ser lida na íntegra aqui.
Procurei o advogado de Carlos Wizard, Adelmo Emerenciano, e perguntei sobre a reunião, o contato com o senador e articulação do gabinete paralelo. Ele respondeu que, “tendo em vista que não acessou o material da reunião, Carlos Wizard não vai se manifestar”.
O Ministério da Saúde e o Conselho Federal de Medicina foram procurados por e-mail, mas não se manifestaram.