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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

26
Fev23

Para uma menina do Recife

Talis Andrade

 

Recupero um texto que publiquei em 2012. Mas não é possível, há 11 anos? Uma explicação é que talvez o tempo tenha passado muito depressa

 

 

Penélope, a menina do Recife a quem me dirijo em 2012, não está só, ainda que fale em seu nome ao me procurar por e-mail. De modo bem didático, ela me conta que, num coletivo de alunos da 8ª série do Instituto Capibaribe, prepara um trabalho para ser exibido na feira de conhecimento da escola. E que esse trabalho foi solicitado pelos professores Mauro Santos, de Português, e Júlia Vergeti, de História. Eu deveria responder logo que ainda há educadores no Recife. Mas me calo para aqui terminar a didática da história.

Penélope Andrade tem apenas 13 anos. Pois a menina mocinha me procura pra saber notícias da ditadura no Recife, e com uma maturidade que talvez eu não tivesse na sua idade. É preciso dizer que o mais ardente em curiosidade sou eu? O que viria das perguntas e entrevista da menina? Acompanhem por favor a história.

 

Quantos anos tinha nessa época? E o que fazia? – Penélope começa. 

Ao que respondo:

– Quando houve o golpe, no dia primeiro de abril e não em 31 de março como os militares golpistas dizem com medo, porque desejam afastar o ridículo que é um golpe no dia universal da mentira, em primeiro de abril de 1964 eu estava com 13 anos de idade.

Era estudante de escola pública, que na época era a melhor escola que havia, e de tal maneira que chamávamos as escolas privadas de PP (Pagou, Passou). Eu era um adolescente angustiado – e que adolescente não é? – carregado de traumas familiares (aqueles traumas que não confessamos a ninguém), que adorava ler, que sonhava em ser ator de teatro, poeta, desenhista, pintor e galã de cinema. Se possível, na ordem inversa. Mas o espelho e a realidade me livraram de ser Rodrigo Santoro. (Embora digam que depois de maduro eu melhorei muito…). As ideias da esquerda já me chegavam, mas eu era um reacionário leitor de Seleções Reader’s Digest, uma revista infame de propaganda norte-americana. Pra minha sorte, os amigos que mais me influenciaram eram de esquerda. De um deles ouvi pela primeira vez o nome Darwin, e a sua teoria da evolução, que batia de frente contra a criação do homem por Deus, como eu acreditava e discutia furioso. Em resumo: eu tive a sorte de as melhores pessoas que eu conheci, quando eu mais precisava, terem sido de esquerda. Isso foi, é uma riqueza sem tamanho.

 

– Considerando fatores econômicos e político, sabendo que nessa época estávamos sendo governados por João Goulart, como estava a situação do país? – Penélope continua.

Respondo:

– O Brasil era subdesenvolvido, o que quer dizer: atrasado, tanto do ponto de vista econômico quanto social. Pra você ter ideia, os trabalhadores da zona da mata de Pernambuco, os cortadores de cana, recebiam menos, muito menos que o salário-mínimo. Foi no primeiro governo de Arraes, a partir de 1962, que os trabalhadores da cana tiveram a conquista do salário-mínimo. Isso foi tão bom, que Paulo Cavalcanti (historiador e jornalista, comunista histórico do Recife) contou que os trabalhadores compravam 2 relógios, “um pro horário de verão, outro pro horário de mesmo”. As ligas camponesas nasciam e ameaçavam o domínio dos latifundiários, os grandes donos de terras. O Nordeste, Pernambuco em particular, fervia muito além do frevo. Estávamos com o MCP, Movimento de Cultura Popular, que reunia artistas de valor, engajados na luta pelas reformas (como chamavam as reivindicações para dar ao povo o direito de cidadão), um movimento em que Abelardo da Hora, o maior escultor do Brasil, vivo e trabalhando ainda hoje, criou tantas esculturas, lindas, como o Vendedor de Pirulito, que pode ser visto no Parque 13 de maio.

Abelardo da Hora 

 

Era o tempo em que no Recife estavam Celso Furtado, Josué de Castro, Paulo Freire, intelectuais que foram reconhecidos em todo o mundo, mas perseguidos pelo regime militar que se instalou. Vale dizer, a repressão que se abateu veio com força absoluta sobre os pernambucanos, a ponto de cometerem barbaridades públicas, como o espancamento de Gregório Bezerra nas ruas, com golpes de ferro na cabeça. Queriam inclusive enforcá-lo na praça de Casa Forte. Esse era o tempo e o clima. Um país que exigia reformas urgentes, que os Estados Unidos interpretaram como um caminho aberto para o comunismo, e por isso apoiaram o golpe que os militares deram.

 

– Após o regime, como foi a redemocratização do país e a escolha do presidente? – A menina do Recife pergunta.

Respondo:

– Você pulou cedo demais. Antes de “após o regime”, houve o pior, o “durante o regime”. Isto é, o tempo da ditadura. Você não pode nem imaginar o filme de terror, pior que um filme de terror, porque era real, insuportavelmente real, os anos de ditadura. Artes, música, cinema, literatura censuradas. Jornais sob censura prévia. Prisões, mortes e assassinatos sob torturas. Deixo pra você alguns artigos que escrevi sobre aquele tempo em Ivanovitch, 1964  e Raquel, a viúva que amamos, mais suave, mas igualmente verdadeiro.

Deputados defendem frente democrática, como a das Diretas Já, que reuniu, entre outros, Tancredo Neves e Ulysses Guimarães (Foto: Célio Azevedo)

 

A redemocratização do país não veio como sonhávamos. Ou seja, queríamos a realização, a continuação da história interrompida, com o aprofundamento da democracia pela qual o povo lutara antes do golpe. Queríamos trabalho para todos, as artes e a ciência para todo o mundo, o socialismo no poder, a punição severa dos crimes praticados pelos torturadores. Nada disso se cumpriu. Para nós, a redemocratização começou a dar uns lampejos no governo Lula e na continuação com a presidenta (atenção, a forma “presidenta” é legítima) Dilma. Começou, apenas.

 

– Que heranças econômicas foram deixadas após o regime? Você as considera boas ou ruins? – Penélope continua.

Respondo:

– É claro que a herança vinda do regime é a pior possível. Tanto do ponto de vista social, porque houve um desmantelamento da qualidade do ensino público no Brasil (e a direita, esperta, põe na conta do pós-ditadura), quanto do econômico, porque aumentou a centralização do desenvolvimento no Sudeste. Isso quer dizer, o Nordeste afundou sob os anos de ditadura. A cultura brasileira foi rompida, rasgada, e muitos de seus melhores artistas enlouqueceram (Glauber, Torquato Neto, Vandré…).

Mais: e se houve algum avanço econômico, e depois de 21 anos algum deve ter havido, paga o preço de tantas pessoas cortadas, barbarizadas? Seria o mesmo que acreditar que a herança deixada por um homem morto é melhor que a sua vida.  

 

– Comparando o antes e depois do regime militar o que mudou na sua vida?

– Muito mudou. Fiquei menos feio e sou escritor. Mas as perdas pessoais foram imensas, e aqui faço uma homenagem a uma pessoa em particular, que vem a ser o seu tio-avô Luiz Paulo. Ele foi uma das melhores pessoas que conheci naquele maldito ano de 1973, quando foram assassinados seis militantes socialistas no Recife, e sobre os quais escrevi Os Corações Futuristas e Soledad no Recife. (Em 2023, acrescento: “A mais longa duração da juventude”)

Urariano Mota

 

Luiz Paulo era um intelectual, um escritor de grande senso de humor, que perdemos antes do seu fim, porque ele se autoexilou em São Paulo, por conta das burrices e divisões autofágicas na esquerda do Recife. Com ele fundamos o jornal A Xepa, o primeiro jornal alternativo no Recife sob a ditadura. E escrevo “com ele” pra não dizer: A Xepa foi Luiz Paulo e o resto. Para esse jornal, dele veio o maior estímulo e dedicação, porque acreditávamos, na época, que estávamos fundando um novo Pasquim no Recife. Sonhar era bom e Luiz Paulo esteve ao nosso lado nesse sonho.

E aqui terminei a entrevista.

Terminei, não, fiz uma pausa, fizemos uma pausa, eu e Penélope, eu e os alunos como ela. Essa continuação da história que passamos adiante, essa continuidade de gênese e recriação do mundo com que nos confraternizamos, esse despertar de educadores para a realidade política da ditadura é como descobrir um mundo melhor do que imaginávamos.

Calderón de La Barca dizia que a vida é sonho, ao que a realidade nos diz que o sonho é a vida, apesar de tantos pesadelos. O que afinal guarda uma coerência interna, pois o pesadelo é gêmeo univitelino do sonho. Esse pesadelo imenso e geral tem pausas e intervalos felizes, como o da curiosidade histórica dessa mocinha Penélope. Para mim, ela é A menina do Recife a quem mando um sorriso e um abraço.

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19
Dez20

Gilmar Mendes determina que CNJ apure conduta de Marcelo Bretas

Talis Andrade

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O Conselho Nacional de Justiça deve apurar a conduta do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro e responsável pela "lava jato" no estado. As informações são da TV Globo.

De acordo com a decisão, Bretas se recusou a cumprir determinação de Gilmar Mendes para que o juiz envie à Justiça Eleitoral de Goiás processo que envolve Alexandre Baldy, secretário de transportes de São Paulo. 

Assim, o ministro determinou que o CNJ afira se houve infração disciplinar por parte do juiz de piso. "Diante da recusa da autoridade coatora em cumprir a decisão monocrática de 1.10.2020, que determinou a imediata remessa à Justiça Eleitoral do Estado de Goiás dos autos (...) bem como de toda e qualquer investigação em sede policial ou ministerial relacionada aos fatos, determino que seja oficiado ao Conselho Nacional de Justiça (CNI), para a apuração de eventual responsabilidade funcional do magistrado", diz trecho da decisão.

Em setembro, Gilmar já havia suspendido ação penal contra Baldy. Ele é acusado pelo Ministério Público Federal de ter praticado os crimes de corrupção passiva, fraude a licitação, peculato e organização criminosa em contratações de organização social atuante na área da saúde no estado de Goiás. Mas, para o STF, o juiz Bretas não é competente para conduzir esse processo — daí a determinação de enviar os autos para a Justiça Eleitoral de Goiás.

Nesta terça-feira (15/12), o desembargador Luiz Paulo da Silva Araujo Filho, da Corregedoria do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, também já havia ordenado que Bretas cumprisse imediatamente a decisão do STF.

Rcl 43.130

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24
Mai20

Vazamento e abafa da Operação Furna da Onça que beneficiou Flávio Bolsonaro

Talis Andrade

 

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O Ministério Público Federal e a Polícia Federal vazaram e abafaram a Operação Furna da Onça. Estão esquentando o noticiário para proteger Sergio Moro, que saiu atirando do governo Bolsonaro.

A TV Globo se faz de cega. Historia a Wikipedia:

Em dezembro de 2018, veio à tona um relatório de 422 páginas do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) que havia sido anexado pelo MPF à investigação que originou a Operação Furna da Onça e que ganhou grande repercussão nacional por envolver um ex-assessor parlamentar de Flavio Bolsonaro, filho Zero 1 do presidente Bolsonarol. É preciso lembrar que, a partir de 1 de janeiro de 2019, Sergio Moro passou a comandar a PF e a Coaf. 

O documento reúne informações a respeito de operações bancárias de 75 funcionários e ex-servidores da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) citadas em comunicados sobre transações financeiras suspeitas. As operações suspeitas, que envolvem pessoas que trabalham ou trabalharam em 20 gabinetes de deputados estaduais do Rio de Janeiro de diferentes matizes ideológicas, totalizam mais de R$ 207 milhões. Também são citados no relatório outros 470 funcionários e ex-servidores da Alerj na condição de remetentes ou destinatários de recursos.

Eis os deputados estaduais, cujos funcionários realizaram transações suspeitas entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, de acordo com o relatório do Coaf, e os valores movimentados por gabinete:[

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Um dia após a deflagração da Operação Furna da Onça, o desembargador relator da operação no TRF-2, Abel Gomes, afirmou que havia indícios de que parte dos investigados tinha conhecimento prévio da ação deflagrada no dia anterior. O suposto vazamento foi denunciado pela Polícia Federal, cujo teor encontra-se sob sigilo, e oficializado em decisão em que Gomes negou a revogação das prisões temporárias solicitada pela defesa de alguns dos alvos da operação. Antes da decisão, um post no blog do Lauro Jardim relata que havia parlamentar que, um dia antes da deflagração da Operação Furna da Onça, tinha conhecimento de uma operação da Polícia Federal que ocorreria no dia seguinte.

Diversos indícios indicam que deputados alvos da operação tinham de fato conhecimento prévio da operação. No dia da deflagração da Operação Furna da Onça, policiais federais encontraram na casa do deputado estadual Coronel Jairo somente um computador com todos os arquivos e históricos de navegação apagados. Também em relação a Jairo, investigadores descobriram que o parlamentar e a filha haviam saído de todos os grupos de WhatsApp que participavam no dia anterior ao da operação. Já Affonso Monnerat, outro alvo da operação, recebeu a equipe policial, que cumpria mandado de prisão temporária, vestido socialmente e com diploma de formação acadêmica devidamente separado. Nas casas de Affonso Monnerat e de Marcus Vinícius Neskau e no gabinete do segundo, não foram encontrados computadores.

 

Na época, que a grande imprensa e a lava jato apoiavam, inclusive realizaram campanhas partidárias e eleitorais, que forças ocultas retiraram da lista de presos os nomes de Flávio Bolsonaro e Fabrício Queiroz? 

 

 

 

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