Renato Freitas vereador era alvo de ataques racistas na Câmara de Curitiba e ameaçado de cassação.
Renato Freitas deputado é alvo de ataques racistas na Assembleia do Paraná e ameaçado de cassação
Durante a sessão da Assembleia Legislativa do Paraná desta terça-feira (10), o deputado estadual Renato Freitas, representante do PT, foi alvo de um repugnante comentário racista proferido por uma espectadora na galeria. Uma liderança religiosa, ainda não identificada, insultou o deputado, que teve o microfone cortado após ter sido interrompido pelo presidente da casa, Ademar Traiano, do PSD.
Freitas solicitou a continuação de seu tempo de fala, mas teve seu pedido negado pelo presidente, que alegou que o “tempo estava congelado”. No entanto, o deputado ainda possuía segundos, e mesmo assim não pôde concluir o pronunciamento.
O grupo evangélico foi convidado por parlamentares de extrema-direita para pressionar contra o debate sobre o aborto, que tramita no Supremo Tribunal Federal, apesar de ter sido suspenso o julgamento sobre a questão.
Ao se dirigir às lideranças religiosas presentes e a parlamentares contra o direito das mulheres, o deputado fez referência ao discurso de Jesus em Mateus, quando falou aos fariseus sobre obras e fé. “Hipócritas”, afirmou Freitas, enquanto era vaiado e xingado pelas lideranças extremistas.
Ademar Traiano solicitou à Comissão de Ética que abrisse uma investigação contra Renato Freitas, mesmo sem apresentar qualquer motivo. A decisão foi questionada pelo deputado Zeca Dirceu (PT), que pediu para que o presidente informasse sobre qual artigo do regimento interno ele estaria incluindo Freitas.
Por que Renato Freitas incomoda o sistema? Lições de Vida que mudarão seu olhar sobre a política
Em 1835, o aristocrata francês Alexis de Tocqueville publicou o Livro I de A Democracia na América, subdividido em duas partes. O livro II somente apareceu em 1840. Quase dois séculos depois, de "ondas" democráticas e "ondas" de regressão, o regime permanece sob graves ameaças autoritárias.
No entanto, a obra é atualíssima. Nasce de um improvável autor, o nobre que rejeitou o título nobiliárquico de Visconde. Parte expressiva da família foi dizimada pela afiada guilhotina do terror jacobino. Sofreu na pele e no coração as dores do despotismo monárquico e dos descaminhos do ideal revolucionário de julho de 1789.
Tocqueville tinha suficientes razões para ser um radical e vingativo conservador. Porém, o jovem membro da magistratura francesa, aos 25 anos, de mente privilegiada, atendeu sua vocação política e exerceu um profícuo ativismo como Deputado (de 1839 até 1850). Ao mesmo tempo, tornou-se um fecundo pensador que legou à posteridade duas obras-primas: O Antigo Regime e a Revolução e A Democracia na América.
A decisão de viajar aos Estados Unidos, de maio de 1831 a fevereiro de 1832, para estudar o sistema prisional, o levou a observar com aguda percepção, a realidade de uma democracia que passou a ser um elemento fundamental para seu pensamento e ação ao longo da vida. Impressionante a profundidade com que tratou o tema. Tão profundamente que não faltaram cientistas sociais, a exemplo de Raymond Aron, que o considerassem o grande sociólogo da democracia.
Na excelente biografia O Homem que compreendeu a Democracia: Alexis de Tocqueville (Rio de Janeiro: Record, 2023), o autor, Olivier Zunz dá sugestivo título ao primeiro capítulo "Aprendendo a Duvidar", um ponto de partida do método epistemológico de Tocqueville que abraçou e sentiu o peso das contradições do novo regime, mantendo, porém, uma fidelidade inabalável a convicções básicas e inamovíveis.
De fato, ele chegava às conclusões pela persistência das dúvidas. Nada mais democrático do que duvidar; amar a incerteza; superar dogmas; assumir contradições. Ele mesmo não fazia ideia de como sua obra seria recebida, afinal de contas, o autor carregava uma pesada herança aristocrática. Era dono de um talento especial: capaz de pensar antes de saber o que quer que fosse.
O que dava e dá vitalidade às ideias de Tocqueville: a aguçada observação que o levou a identificar nas democracias a permanente contradição, mais precisamente, a tensão entre liberdade e igualdade. Encarava a igualdade como instrumento da liberdade e, reconhecendo a necessidade de reparar as injustiças sociais, enxergava a igualdade, não como um meio de nivelar, mas de elevar.
De outra parte, confessou "um sentimento profundamente enraizado no coração: o amor pela liberdade". Conciliar estes valores representava uma tarefa vital para a estabilidade da democracia. Assim como, colocar limites e freios sobre o poder da maioria.
De todas as ameaças, a tirania da maioria, nova espécie de despotismo, mereceu especial atenção de Tocqueville. Não admitia o dogma político de que a maioria tem sempre razão. A vontade da maioria é origem do poder, mas não legitima tudo fazer: acima da onipotência da maioria existe o recurso da soberania do gênero humano. Cabe, afirmou James Madison, "numa República não apenas defender a sociedade contra opressão dos seus governantes, mas guardar uma parte da sociedade contra a injustiça da outra".
Com o olhar penetrante no tecido social da democracia americana, Tocqueville alcança a raiz e o suporte do sistema político: o poder e o espírito comunal. Com admirável lucidez, argumenta: "É na comuna que reside a força dos povos livres. As instituições comunais são para a liberdade aquilo que as escolas primárias são para a ciência; pois a colocam ao alcance do povo, fazendo-o gozar do seu uso pacífico e habituar-se a servir-se delas. Sem instituições comunais, pode uma nação dar-se um governo livre, mas não tem o espírito da liberdade".
Assim, o poder descentralizado emerge de baixo para cima: primeiro a comuna, despois o município (ou condado), em seguida, o estado e, por fim, a argamassa de um pacto político que dá vida à União.
Por fim, a obra de Tocqueville não só revela o confessado amor à liberdade, como também, disse ele: "Exprimi uma ideia obsessiva que se apodera da minha mente: a irresistível marcha da democracia".
Certamente, se vivo estivesse e assistisse aos episódios do Capitólio e de 08 de janeiro, certamente concluiria: nenhuma democracia no mundo está segura.
Para compreender e enfrentar esse fenômeno, é fundamental reconhecer que sua origem reside na crescente desigualdade social e na miséria que corroem o tecido social, gerando um aumento da polarização e da violência
por André Naves
Correio Braziliense
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As recentes turbulências políticas em Israel, as eleições espanholas, diversos novos governos europeus, ataques violentos nos Estados Unidos e no Brasil, são os alertas para o grave fenômeno do crescimento da extrema direita pelo mundo. Infelizmente, esse cenário encontra solo fértil em nosso país, onde células nazistas têm se disseminado, lançando sombras sobre a nossa sociedade. Contudo, para compreender e enfrentar esse fenômeno, é fundamental reconhecer que sua origem reside na crescente desigualdade social e na miséria que corroem o tecido social, gerando um aumento da polarização e da violência.
O aumento da desigualdade social tem sido um combustível para a disseminação de ideologias extremistas. Os países, onde as estruturas sociais são mais desiguais, estão mais suscetíveis a movimentos que prometem "soluções" radicais e simplistas para os problemas complexos da sociedade. A extrema direita, aproveitando-se das brechas sociais e da insatisfação popular, apresenta-se como uma alternativa sedutora para aqueles que se sentem marginalizados, desesperançados e esquecidos pelas políticas tradicionais.
Nesse contexto, a disseminação de células nazistas em nosso país é uma chaga que reflete a profundidade das desigualdades e a ausência de políticas públicas efetivas para mitigá-las. A crescente polarização política e social apenas amplia o abismo entre os extremos, fomentando um ambiente de animosidade e violência.
A polarização política e o apelo ao populismo exacerbam a divisão entre "nós" e "eles", transformando adversários políticos em inimigos mortais. Nessa dinâmica, o inimigo político deixa de ser apenas um oponente de ideias e passa a ser encarado como uma ameaça existencial. Esse "canto mortal das sereias populistas" convence uma parcela da população de que a eliminação do "outro" é a solução para os problemas sociais.
Contudo, acreditar nessa cilada é um equívoco que pode ter consequências catastróficas. O combate a problemas sociais não pode ser simplificado na eliminação física ou no silenciamento de grupos e indivíduos divergentes. Investir contra os aparentes problemas, sem analisar suas raízes e nuances, é condenar-se a uma empreitada vazia e ineficaz.
Para combater essa colheita macabra, é urgente mudar o plantio. Isso significa abraçar a democracia e seus valores fundamentais. Democracia é muito mais do que votar em representantes periodicamente; é assegurar a vontade da maioria sem desrespeitar a dignidade das minorias. Aprofundar e concretizar os direitos humanos é o caminho para uma sociedade mais justa, igualitária e inclusiva.
Os direitos humanos não são meros conceitos abstratos; eles estão intrinsecamente ligados à essência da vida humana. Garantir a plenitude das condições existenciais das pessoas, respeitar sua liberdade, promover a igualdade de oportunidades, assegurar a propriedade e a segurança em suas diversas dimensões são pilares para uma sociedade mais justa e menos suscetível ao ódio fascista.
Aliás, os direitos humanos devem ser entendidos como todos aqueles decorrentes da vida, entendida como a plenitude das condições existenciais da pessoa; da liberdade, entendida como a possibilidade de cada indivíduo ser, e se portar, segundo seus desígnios; igualdade, entendida como igualdade concreta de condições de emancipação humana; propriedade, entendida como possibilidade de se assegurar, e desenvolver, tudo aquilo que é próprio ao ser humano; e Segurança, que vai muito além do combate à violência, materializando-se como a oportunidade de satisfação das necessidades existenciais humanas (segurança alimentar, segurança sanitária, segurança educacional...).
A equalização das barreiras estruturais da sociedade, a promoção da inclusão social e a busca por uma convivência diversa e plural constituem a melhor vacina contra o segregacionismo. Ao enfrentarmos a desigualdade social, desarticularemos a base que sustenta o ódio e o extremismo político e social. Uma sociedade verdadeiramente sustentável é aquela que reconhece e valoriza a diversidade, que protege e fortalece os direitos humanos de todas as pessoas, independentemente de sua origem, etnia, gênero ou crença. Somente por meio de uma sociedade inclusiva e justa poderemos construir um futuro melhor, livre dos grilhões do ódio e da violência.
É fundamental reconhecer que o crescimento da extrema direita e a disseminação de células nazistas no Brasil são sintomas de um problema maior: a desigualdade social e a miséria que corroem os alicerces de nossa sociedade. O caminho para combater essa ameaça não é abraçar o extremismo, mas, sim, aprofundar a nossa democracia, pautada nos valores dos direitos humanos. Ao investirmos na construção de uma sociedade mais justa e igualitária, estaremos plantando sementes de esperança, em prol de um futuro em que a convivência pacífica e a harmonia prevaleçam sobre a polarização e a violência.
31 de março marca a data do golpe em que se iniciou o período da ditadura civil-militar em 1964. Passados quase 60 anos da instauração do regime, ampliar a compreensão sobre o período é ainda absolutamente relevante. Em contraposição às pretensões de comemoração daquela data em uma espécie de desafio à democracia, desponta como necessário preservar a memória do período do regime antidemocrático e expor as suas entranhas autoritárias e ofensas aos direitos humanos — para que nunca mais aconteça.
Mais do que isso, vale resgatar as falácias da ditadura que turvam o conhecimento da realidade do período de repressão, limitação às liberdades e violência. Um olhar desatento à legislação da época poderia até mesmo afirmar que a "revolução", como se autodesignava o regime na intenção de camuflar a evidência do golpe, teve como fundamento assegurar o respeito à dignidade da pessoa humana.
Ora, dignidade humana está surpreendentemente inscrita como um dos valores elencados no Ato Institucional nº 5 de 1968 para justificar a edição do ato que inaugurou a época de maior agressividade do regime autoritário, com a suspensão da garantia de habeas corpus em casos políticos. Ao passo que declarava a intenção de assegurar a liberdade e a dignidade da pessoa humana, na prática desumanizava por sequestros, torturas e assassinatos. Bem por isso, a justiça de transição, as comissões da verdade, e a pauta do direito à memória são tão importantes.
Outro elemento que constava no Ato Institucional nº 5 era o atendimento à reconstrução econômica e financeira pela "luta contra a corrupção", ditando a falsa percepção de que o governo militar era a salvação para um Estado afligido pela corrupção.
É necessário observar, como premissa, que a tomada do poder por regimes autoritários é historicamente precedida de discursos anticorrupção. O emprego do discurso de combate à corrupção como argumento falacioso contra um inimigo interno é útil à instauração de Estados de exceção que declaram suspensão provisória da ordem jurídica, mas que na realidade se prolongamento no tempo. Foi com fulcro nesta espécie expediente que se construiu o rompimento com o Estado de Direito em 1964, culminando na ditadura que se instalou por 21 anos no país [1].
O historiador Carlos Fico [2] aponta que alardear uma "crise moral" foi um dos motes utilizados pelos golpistas de 64 para justificar a derrubada da democracia. Juntamente com o combate à "subversão" e ao comunismo, "acabar com a corrupção" era uma das bandeiras empregadas como pretexto para instalar a ditadura.
Vale ressaltar, com Juarez Tavares [3], que corrupção é um termo polissêmico e pode ser compreendida como uma referência a infração de normas sociais ou jurídicas, caracterizando-se tanto como violação de costumes quanto de proibições previamente definidas, e, portanto, um termo genérico que pode abranger diversos enfoques, a serviço de interesses persecutórios do poder.
Em uma aproximação à acepção jurídico-penal, o jurista Nelson Hungria, em seus Comentários ao Código Penal de 1958, definiu o tipo central da corrupção como a venalidade em torno da função pública, apenando-se na forma passiva quando se tem em vista a conduta do funcionário corrompido, e também na forma ativa ao se considerar a atuação do corruptor [4].
Assim, importa alcançar a questão essencial: era o regime de 64 mais resistente ao crime de corrupção na forma como insculpido no Código Penal?
A evidência é de que a resposta é negativa. Segundo Sérgio Habib em Brasil — 500 anos de corrupção, a partir de 1964 o Brasil ingressou em seu ciclo supremo de corrupção, "jamais tantos casos afloraram e de forma seguida como nos governos que sucederam ao golpe militar".
A censura e a repressão à oposição não evitam ou mitigam a ocorrência de corrupção, mas dificultam que os casos tornem-se conhecidos e sejam investigados, mesmo assim alguns eventos conseguiram romper essas barreiras, tal como as suspeitas de corrupção na construção ponte Rio-Niterói [5], suspeitas de desvio de dinheiro na nunca completamente concluída Transamazônica [6], ou os "escândalos financeiros verificados no país após a criação do Banco Central e reformulação do Sistema Financeiro Nacional (SFN), incluindo casos como Delfim, Halles, Banco de União Comercial"[7].
Emblemático para ilustrar a ilusão da luta contra a corrupção naquele período é o caso do diplomata José Jobim, que foi sequestrado, torturado e morto pela ditadura em 1979 pouco depois de revelar que denunciaria o superfaturamento na construção da usina hidrelétrica de Itaipu [8].
É sabido que os arquitetos do golpe de 1964 não foram isoladamente as forças armadas, o rompimento democrático se deu no contexto de uma articulação entre empresários, militares e apoio estrangeiro. Destas relações pode ser compreendida a gênese de alguns dos casos de corrupção durante a ditadura civil-militar, casos dos quais pouco foi elucidado, mas que naquilo que revelados se revelam significativos.
A intenção de enfrentar a corrupção que prejudica a administração pública, ao contrário do que se poderia esperar com base no discurso empregado pelos correligionários do regime autoritário, deixou de constituir um projeto essencial para dar lugar à perseguição política. A corrupção na ditadura não deixa de existir, o que arrefece é a sua percepção pela ausência de denúncias públicas e punição, ocasionadas pela ausência de uma imprensa livre e de órgãos de apuração independentes [9].
Vale ressaltar que no Estado democrático de Direito há, sim, o enfrentamento do delito de corrupção, sendo idealmente realizado a partir de apreciação dos fatos pelos órgãos e agentes do Estado com respeito a direitos fundamentais e a condição de pessoa de investigados e acusados. Fatalmente, a garantia de direitos é absolutamente compatível com a perseguição e punição de comportamentos ilícitos.
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[1] FERNANDES, Fernando Augusto. Geopolítica da Intervenção. São Paulo: Geração editorial, 2020, p. 429.
[2] FICO, Carlos. Como eles agiam – os subterrâneos da ditadura militar. Rio de Janeiro: Record, 2001, p. 149.
[3] TAVARES, Juarez. Corrupção. In: MAGALHÃES, José Luiz Quadros de; et al. Dicionário de Direitos Humanos. Porto Alegre: Fi, 2023, p. 69.
[4] HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, 1958, p. 365.
Aproveito aqui a posse do Presidente Lula, dos ministros e governadores para tomar posse também de coisas que havia perdido ou estavam proibidas e esquecidas.
Tomo posso do ar mais tranquilo, da democracia, do clima mais feliz e ameno, da alegria e da risada. Tomo posse do meu direito de ser como eu quiser, de amar quem eu quiser e me vestir como eu quiser. Tomo posse do direito de acreditar no deus que eu escolhi, na religião que eu sigo ou mesmo de não acreditar em nada ou ninguém.
Tomo posse do direito de ser gordo, magro, negro, branco, amarelo indígena ou europeu. É meu direito também pensar como eu quero, ajudar o próximo, fazer da educação meu objetivo maior, ler o que eu quiser, ouvir a música que mais eu curto naquele momento. No momento seguinte posso mudar. Tomo posse também de todas as comidas e bebidas que existem nesse país e que estejam ao meu alcance. Tomo posse do direito de matar a fome de todos, de restabelecer o amor entre as pessoas, de conviver com as diferenças, de ouvir as conversas, dar risadas, respeitar o entendimento e o trabalho coletivo.
Tomo posse da terra, da casa, do meu lugar preferido. A posse das ruas, das praças, das praias, das planícies e das montanhas, dos rios, mares, lagos e praias. Posse das riquezas que temos, do petróleo, da pecuária, das florestas, das plantas medicinais, do conhecimento dos povos originários, da tradição passada de boca em boca, dos ensinamentos, dos truques e da sabedoria. Falando em sabedoria temos que tomar posse novamente da ciência, das vacinas, da medicina, do SUS, dos médicos, enfermeiros, técnicos em enfermagem, de todos aqueles que nos ajudaram a combater a Covid.
Tomamos também posse da nossa relação de gratidão com os professores, alunos, funcionários, escritores, artistas, atores, músicos, comediantes, cartunistas, jornalistas, pesquisadores e doutores que nos ajudaram a manter de pé não só o país mas todos aqueles que resistiram ao fascismo que ameaçou a nossa identidade e a nossa cultura estes anos todos.
Tomamos posse também do país, do Brasil, dos seus símbolos, das suas características da sua bandeira, suas cores e sua paisagem. Tomamos posse da Amazônia para que não seja mais desmatada nem queimada. Tomamos posse das riquezas deste solo- mãe gentil que nos fornece o suficiente para sermos felizes. Vamos tomar posse novamente do orgulho de ser brasileiro, da alegria de dividir o pão, de compartilhar o trabalho e olhar no rosto do outro o sorriso que gostamos de dar e ver.
Este é o Brasil que eu quero novamente e se faltou alguma coisa para tomar posse é só juntar nessa lista. Temos o direito e o dever de tomar não só posse como tomar conta deste país para que não aconteça novamente de o perdermos de vista. Viva a democracia, as eleições e o presidente Lula. E possuído deste sentimento de Brasil termino por aqui para que todos nós possamos tomar posse da cidadania que tanto nos faltou.
A mise-en-scène pseudopatriótica com o pavilhão verde-amarelo disfarça a vileza, para enganar os bobos
por Luiz Marques /A Terra É Redonda
A democracia nasceu cinco séculos antes da era cristã, em Atenas. À mesma época, tinha início a transição romana do reinado à república aristocrática, democratizada por pressão dos plebeus e seus líderes que se julgaram qualificados o suficiente para integrar o círculo político de poder, apoiados no forte princípio da igualdade. Depois, a democracia hibernou durante mais de um milhar de anos, para redespertar aos poucos naspólisde Veneza e Florença, já na Itália medieval e renascentista.
Robert A. Dahl, emA democracia e seus críticos, compara as experiências igualitaristas e isonômicas de dois mil e quinhentos anos atrás “à invenção da roda ou à descoberta do Novo Mundo”. Etimologicamente o termo “democracia” deriva do grego, combinademos(povo) comkratia(governo, autoridade). Portanto, é o “governo do povo”. Um achado revolucionário que trouxe possibilidades inusitadas para a administração da sociedade, jamais imaginadas noutras modalidades de governo. As cidades-Estado deram lugar aos Estados-nação.
A democracia viveu problemas de identidade, no percurso. Há distintos modos ditos democráticos de governar. Na Antiguidade, prevaleceu a participação direta; na Modernidade, a representação. Ao se pronunciar no Ateneu Real de Paris, em 1819, Benjamin Constant avaliou que o deslocamento da participação para a representação esteve vinculado à metamorfose da concepção de liberdade dos antigos (dedicada à vida pública) para a concepção de liberdade dos modernos (dedicada à vida privada), dadas as circunstâncias históricas. Tudo sob os controversos avatares da democracia.
Em uma obra instigante sobre o tema,Democracia e representação, Luís Felipe Miguel considera que esses são territórios em disputa. “A expressão ‘democracia representativa’ guarda uma tensão interna que não deve ser escamoteada, mas mantida como um desafio permanente. A representação estabelece, por sua lógica, um movimento de diferenciação oposto ao requisito da igualdade, que é próprio da democracia. Lutar contra essa tendência, buscando a redução do diferencial de poder entre os representantes e os representados, é uma tarefa sempre renovada”. (Veremos em 2023).
Hoje, a passagem da participação para a representação possui um caráter geopolítico. Textos de ciência política escritos por sul-americanos evocam a participação; escritos por autores europeus destacam principalmente a representação. Onde o Estado se deixa permear por demandas sociais, a representação é bem acatada. Onde o Estado é mera correia de transmissão das classes dominantes, a participação é uma exigência das classes trabalhadoras para compensar ohandicap. Não à toa, as edições inaugurais do Fórum Social Mundial (FSM) ocorreram na América Latina, em Porto Alegre, a capital do Orçamento Participativo (OP) para aprimorar a gestão das finanças públicas.
Democracia e república
Demosé uma noção polissêmica, às vezes exclusiva de segmentos (nobres, proprietários, homens, brancos); às vezes inclusiva da população (mulheres, imigrantes, negros, analfabetos). No fundo, a dificuldade está em que a democracia designa um ideal de governança e, em simultâneo, descrições empíricas da institucionalidade em países que aparentam incongruência ao utilizar a terminologia. A polissemia também atinge a tradição republicana: ora aristocrático-conservadora com uma solução de equilíbrio entre os ricos e os pobres; ora democrático-progressista com a recusa à coexistência de instituições com pontos de vista classistas. A contraposição do interesse geral ao dos particulares simplificou o dilema; em tese, sem a divisão de classe incrustada no aparato dereprésentation.
O caminho para a democracia e a república é sinuoso e contraditório. Vide a Venezuela, que polariza emoções no espectro político ocidental. Uns classificam o Estado venezuelano de ditatorial, comandado pela mão de um tirano, e propõem romper relações diplomáticas. Outros reputam-no democrático, a cargo de um legítimo exponencial da vontade majoritária, ungido pelo voto em eleições livres. Os contorcionismos sobre os significantes esvaziam a sua (a nossa) inteligibilidade.
O passo das cidades-Estado aos Estados-nação levou às associações políticas transnacionais. ONU, UE, Nafta, Otan, Brics e COPs são articulações mais complexas do que as registradas no alvorecer da democracia. Entre a Grécia clássica e o século XVIII, se postulou que os Estados democráticos e republicanos deveriam ser minúsculos, em território e população, pelos padrões atuais. Das cidades-Estado, restaram San Marino e Liechtenstein como legados pitorescos de um passado desaparecido. As reuniões em assembleias com a totalidade dos cidadãos, de logística complicada naságoras, tornaram-se quimeras. O aumento populacional fez John Stuart Mill descartar o assembleísmo.
A representação procura aplicar o vetor da igualdade aos sistemas políticos de magnitude. Corpos legislativos, que na Idade Média garantiam os predicados de donos das terras e dos comerciantes, se transmutaram em órgãos para atender o conjunto da população (válida). A democratização dos Estados nacionais não partiu de uma tábua rasa. Seu desdobramento discursivo, em instituições imprescindíveis nas sociedades de porte volumoso, foi esmiuçado pelo conceito de “poliarquia” formulado por Robert A. Dahl. A poliarquia (“governo de muitos”) não é mais do que a democracia liberta de incumbências pelos democratas insatisfeitos, com ela. Corresponde a uma “democracia formal”, sem um poder demiúrgico e disruptivo para reordenar o mundo à revelia da política.
Países com governos poliárquicos caracterizam-se pela universalização dos direitos individuais, funcionários concursados, sufrágio direto e inclusivo, direito de concorrer aos cargos eletivos, liberdade de expressão, informação alternativa e autonomia associativa. Essa taxonomia contém o mínimo para uma nação merecer o selo de autenticidade democrática – e dirimir dúvidas a respeito.
Se comunidades pequenas acarretam a opressividade dos indivíduos não-conformistas (Atenas foi intolerante com Sócrates), comunidades populosas tendem a ser tolerantes em face das dissidências. Para tanto, é essencial lideranças que prezem o pluralismo político e ideológico, os conflitos se atenham em limites suportáveis e não se esgrimam coerções violentas (polícia, militares) para conquistar e manter o domínio em “hegemonias fechadas”, pelo autoritarismo ou o totalitarismo.
O processo democrático
O processo democrático permitiu à humanidade alcançar: (a) a liberdade política sob o crivo da autodeterminação individual e coletiva; (b) o desenvolvimento humano com autonomia moral e responsabilidade pelas próprias escolhas e; (c) a proteção e a promoção dos interesses e dos bens que as pessoas compartilham entre si. Esse processo, que está longe da perfeição, está ligado aos valores da igualdade. Fato que o converte em “um meio necessário para a justiça distributiva”.
A visão democrática vai além do edifício do real ao focar na perspectiva de mudança dostatus quo, por via pacífica. Caso contrário, a democracia não teria superado as instituições e as crenças que sustentavam o feudalismo, ou o fascismo e o nazismo na Europa, ou as ditaduras civis-militares sangrentas em nosso continente. A democracia se reinventa nas lutas por direitos, na direção do igualitarismo possível para construir uma sociedade sem discriminação, acolhedora e plural.
O ataque à democracia foi revigorado na década de 1980, com a crescente dominação desde então do neoliberalismo em nível internacional. O receituário neoliberal não é só um modelo econômico, mas “la nouvelle raison du monde” como mostram Pierre Dardot e Christian Laval, em um livro de mesmo título. A nova razão do mundo separa as aspirações democráticas do princípio de igualdade. Defende a desigualdade como meta prioritária dos governantes, fiel ao Consenso de Washington. O retrocesso civilizacional destruiu os imperativos éticos vindos da Revolução Francesa, através da tríadeliberté, égalité et solidaritépara a sedimentação de um Estado de direito democrático.
“Liberdade”, no sentido que se possa viver sem estar submetido às arbitrariedades de ninguém. “Igualdade”, no sentido positivo da equanimidade para que cada um tenha acesso aos expedientes de uma vida com autonomia. “Igualdade”, no sentido negativo contra a exclusão social e política, bem como contra a pobreza, a humilhação e a invisibilidade. “Solidariedade”, no sentido da dupla realização da liberdade e da igualdade para transcender os particularismos, acessar as oportunidades justas de autodesenvolvimento e comungar o bem comum com direito a um tratamento digno para todas, todos e todes. As estruturas sociais e a consciência andam juntas com a cidadania plena.
Alguns citam Alexis de Tocqueville, emA democracia na América, ao argumentar sobre a suposta dinâmica que ao unir a democracia e a igualdade dispararia uma propensão autodestrutiva, a longo prazo. O colapso das instituições democráticas na Itália, na Alemanha e na Espanha, entre 1923 e 1936, confirmaria a conjectura do pensador. Contudo, a tempestade teve uma curta duração.
Não é a expansão do igualitarismo nos hábitos, costumes e ideias, senão a introjeção inconclusa dos valores da igualdade que acirra os conflitos, em defesa dos privilégios de classe. As políticas igualitárias necessitam de um tempo para formar um novo senso comum, na sociedade. Nos países em que as instituições democráticas existem há mais de uma geração, e houve um acerto de contas transparente com o passado, a substituição da democracia por um regime de exceção é algo raro.
Os acampamentos patriotários
“O patriotismo é o último refúgio dos canalhas”, a frase do crítico literário inglês Samuel Johnson data de 1775. Referia-se aos que por detrás das juras de amor à pátria e à liberdade, hipocritamente, escondem as ambições pessoais. A pantomima não é uma invenção da extrema-direita bolsonarista. Mas foi aperfeiçoada pela massa de manobra que aterrizou defronte os quartéis e, inclusive, na frente de uma loja da Havan, em Santa Catarina. Como se enviassem uma mensagem criptografada ao “pato manco” que ainda chora a derrota nas urnas, apesar dos estupros eleitorais cometidos na campanha com dinheiro público e privado. Ou como se cobrassem, do Véio, um cachê atrasado.
Estados antidemocráticos funcionam como moedas aos que vendem seu apoio e voto, em troca de proventos espúrios com a hiperexploração dos trabalhadores e a retirada de direitos trabalhistas e previdenciários dos mais vulneráveis. É o que mobilizou frações da burguesia financeira, industrial e comercial em favor da reeleição do genocida que carrega no currículo 400 mil óbitos evitáveis, na pandemia do coronavírus. Amise-en-scènepseudopatriótica com o pavilhão verde-amarelo disfarça a vileza, para enganar os bobos com uma estética que recende as manifestações nazifascistas.
Ações externas após os eventos de 2013 e 2015 ressignificaram, com o mote da corrupção, o período em que o presidente Lula e o Partido dos Trabalhadores (PT) governaram o Brasil (2003-2016). O questionamento sobre o resultado das eleições de 2014, vencidas por Dilma Rousseff, e a guinada programática que fez a presidenta eleita pressionada pela crise econômica “largar a mão da esperança”, de um lado; de outro, as pautas de lesa-pátria introduzidas pelo inominável pulha que mandava na Câmara dos Deputados redundaram noimpeachment, capitalizado pelo extremismo da direita populista que eclipsou a centro-direita tradicional. Com as peças em movimento no tabuleiro de xadrez, um palhaço sociopata subiu a rampa da presidência e municiou organizações criminosas.
Em Brasília, o acampamento patriotário teve dez mil membros; agora contabiliza menos de 800 zumbis. Arsenais de armas pesadas (fuzis, submetralhadoras) foram apreendidos. O incêndio de carros, ônibus, agressões e intimidações extrapolaram a legalidade. Implodiram a sociabilidade dodemos,com a conivência de autoridades corrompidas pelo bolsonarismo. No apagar das luzes do sinistro espetáculo, que foi o desgoverno, decretos oficiais liberam a devastação de terras indígenas e indicam um militar para ocupar a Secretaria de Cultura nas últimas semanas, com o propósito de atiçar as pulsões de morte. Os terroristas, com a bomba armada no caminhão de combustível para aviões, no aeroporto do Distrito Federal, pretendiam suscitar o caos – para variar. Eles merecem ser punidos com exemplaridade, “dentro das quatro linhas da Constituição”. Não é o circo, é o terror.
O novo governo precisa mostrar que sabe cuidar do povo e, o povo organizado, do governo de reconstrução. Vai para o lixo da história o golpe malogrado. Os financiadores do mal e os fanáticos negam ao eleitorado a isonomia participativa e representativa, e o igualitarismo político para eleger o presidente do Brasil. Creem-se superiores à soberania popular, em uma realidade paralela. Mas a força da ideologia democrática é tal que até o déspota do Qatar rendeu-se: “Esta foi a Copa da igualdade”. Descontado o cinismo, importa o reconhecimento sub-reptício da democracia. Ouçam o rufar dos tambores:O patigiano portami via / O bella ciao, bella ciao, bella ciao, ciao, ciao…
O eleitor vai se contrapor ao medo, instrumento de controle da liberdade
por Gustavo Krause
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“Viver é negócio muito perigoso…[…] O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria. Aperta e daí, afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”. Guimarães Rosa falava, fluentemente, alemão, francês, inglês, espanhol, italiano e esperanto. Lia sueco, holandês, latim e grego, bem que podia escolher qualquer idioma para escrever. Brasileiramente, escolheu a língua-mãe, o português, mas foi o autor de uma revolução linguística.
Criou quase uma dezena de milhar de neologismos e, segundo os estudiosos, 30% do léxico de Rosa não está dicionarizado. A primeira leitura de “Grandes Sertões: veredas” exige esforço na busca dos significados, depois, o leitor viaja do regional para universal, uma fusão de sentimentos, de sabedoria com gosto de carne seca e rapadura para os da banda de cá.
O que mais me sensibilizou foi a reflexão existencial que propõe coragem para enfrentar o vaivém da vida. É exatamente esta virtude de que necessitamos no processo político-eleitoral para sair de casa e exercer o poder-dever do voto.
O que deveria ser um ato praticado, em clima de paz e esperança que ratifica a democracia e fortalece o plebiscito cotidiano que forja a nação, transformou-se num ambiente de insegurança e de medo, decorrente do aprofundamento da radicalização, sobretudo, da violência política que permeia a sociedade brasileira.
O processo vem se agravando, mundo afora, e foi objeto da obra magistral de Manuel Castells “Redes de indignação e esperança na era da Internet” que analisa em profundidade as manifestações ocorridas com um posfácio dedicado ao Brasil de 2013.
A voz das ruas deixou uma clara e contundente mensagem: “vocês não nos representam”: grave abalo nas democracias liberais por conta da descrença e do ressentimento em relação ao estabilishment.
Resultado: as líderanças populistas e autocráticas encontraram o ambiente fértil para as mensagens messiânicas.
No Brasil, o Presidente surfou na onda, desafiou instituições, desrespeitou pessoas. Sua contraparte, Lula, reaparece com promessas de paz e amor: “um museu de grandes novidades”(crédito para Cazuza em “O tempo não para”).
Nós vamos ofertar à democracia o que ela quer de nós: coragem cívica. Em troca, a democracia vai, como escreveu Guimarães Rosa, “desinquietar” os exaltados, garantir liberdade, direitos fundamentais e paz social.
O eleitor terá a palavra final. E vai contrapor ao medo, instrumento de controle da liberdade, a virtude da coragem que se mantém entre dois abismos: a covardia e a temeridade.
Ministros Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski foram empossados presidente e vice-presidente do TSE. Foto Antonio Augusto/Secom/TSE
por Danilo Vital /ConJur
Ideais republicanos, respeito pelas instituições, vocação pela democracia, liberdade de expressão, garantia do Estado Democrático de Direito e tempo de união foram os principais temas abordados pelo ministro Alexandre de Moraes, no discurso preparado para sua posse no Tribunal Superior Eleitoral.
Na noite de terça-feira (16/8), ele reuniu membros do Judiciário, do Legislativo e do Executivo, embaixadores, ministros de Estado, o presidente Jair Bolsonaro, quatro ex-presidentes da República e outros dois presidenciáveis na sede do tribunal, em Brasília, em um evento maiúsculo pós-epidemia a menos de dois meses da eleição.
Ao discursar diante dos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco e da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, além de diversas outras autoridades, Moraes relembrou seu histórico pessoal, reforçou seu discurso de combate à desinformação e às fake news e, além disso, conclamou por um novo tempo de união.
Ao lado do presidente Jair Bolsonaro, refutou muitas das estratégias usadas pelo presidente para atacar o sistema eleitoral, momentos que geraram rodadas de aplausos. Mas em diversos momentos chamou a atenção para a importância da presença do presidente da República no momento de transição da presidência do TSE.
Veja os principais trechos do discurso do presidente do TSE
Histórico pessoal
Hoje tomo posse no honroso cargo de presidente do Tribunal Superior Eleitoral com os mesmos ideais com os quais iniciei formação acadêmica pela tradição da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, em 1986: respeito à Constituição Federal; devoção aos direitos fundamentais, realização de Justiça rápida, efetiva e eficiente; fortalecimento das instituições; e concretização e aperfeiçoamento da democracia, pressupostos essenciais para o desenvolvimento do Brasil. Com humildade e serenidade, firmeza e transparência, juntamente com meus colegas de tribunal, direcionarei todos meus esforços para dar continuidade ao belíssimo trabalho que vem sendo realizado pelo TSE sob o comando do ministro Luiz Edson Fachin na organização das eleições gerais de 2022.
Elogios a Fachin
Nessa oportunidade, reitero meus cumprimentos ao ministro Luiz Edson Fachin, reafirmando minha honra em poder ter convivido durante sua presidência no tribunal. A firmeza de caráter, a excelência de postura e o competente trabalho são características natas do ministro Fachi, que nos deixa um importante legado de incansável e intransigente defesa do Estado Democrático de Direito.
O vice ideal
Faço um cumprimento especial ao ministro Ricardo Lewandowski, que me honrou com a possibilidade de compartilhar a responsabilidade da condução da Justiça Eleitoral, como amigo e companheiro de departamento da Faculdade de Direito do Largo São Francisco e, mais que isso, meu professor e professor do ministro Toffoli, de teoria geral do estado, no longínquo ano de 1986, quando ingressei nas Arcadas. Durante esses 37 anos, minha admiração e amizade só foram crescentes. É uma tranquilidade poder contar nesse importante momento do país com parceria de um dos homens públicos mais competentes e experientes do país.
Michelle Bolsonaro, Michel Temer, Lula, José Sarney e Dilma Rousseff na posse de Alexandre no TSE
Respeito pelas instituições
A Justiça eleitoral não poderia comemorar melhor e de maneira mais honrosa seus 90 anos de instalação. Com a presença, nessa cerimonia, do chefe de Estado de governo, presidente Jair Bolsonaro, do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, do presidente da Câmara, Arthur Lira, do nosso presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux, bem como dos ex-presidentes da República, José Sarney, Dilma Roussef, Luiz Inácio Lula da Silva e Michel Temer. E com a presença de 22 governadores de estado.
Essa cerimônia simboliza o respeito pelas instituições como único caminho de crescimento da República e a força da democracia como único regime politico, onde todo poder emana do povo e deve ser exercido pelo bem do povo. Somos 156,4 milhões de eleitores aptos a votar. Somos uma das maiores democracias do mundo em termos de voto popular — estamos entre as quatro maiores. Mas somos a única democracia do mundo que apura e divulga os resultados eleitorais no mesmo dia, com agilidade, segurança, competência e transparência. Isso é motivo de orgulho nacional.
Histórico conturbado
A Justiça eleitoral atua com competência e transparência, honrando — e continuará a honrar — sua histórica vocação de concretizar a democracia e a autêntica coragem para lutar contra forças que não acreditavam no Estado Democrático de Direito e que pretendiam, à época de sua instalação, continuar capturando a vontade soberana do povo, desvirtuando os votos que eram colocados nas urnas.
Aqueles aqui presentes que, como eu, atuaram como promotor eleitoral — eu em Aguaí (SP) — ou fiscais sabem bem do que estou falando: o desvirtuamento das urnas, os votos riscados, a caneta que se colocava no punho. E a Justiça Eleitoral, com coragem, competência e transparência, simplesmente encerrou essa nefasta fase da democracia brasileira.
A vocação pela democracia e a coragem de combater aqueles contrários aos ideais constitucionais e aos valores republicanos de respeito à soberania popular permanecem nessa Justiça Eleitoral e nesse Tribunal Superior Eleitoral, que continuamente vem se aperfeiçoando, principalmente com a implementação e melhoria das urnas eletrônicas.
Segurança das urnas
O aperfeiçoamento foi, é e continuará sendo constante. Sempre, absolutamente sempre para garantir total segurança e transparência ao eleitorado nacional, como demonstra a implementação da biometria, que só não foi finalizada em virtude da trágica pandemia da Covid-19.
Esse aperfeiçoamento sempre será constante e permitiu que, em todas as últimas eleições, os resultados fossem conhecidos no mesmo dia da votação. Importante destacar — isso me veio à mente quando o discurso já estava pronto, mas deu tempo de incluir — que se somarmos os votos dados no primeiro e segundo turnos das eleições gerais em 2018, temos aproximadamente 180 milhões de votos. 180 milhões de vezes que brasileiras e brasileiros apertaram a urna eletrônica, confirmaram seu voto e a Justiça Eleitoral computou e depois proclamou o resultado.
A democracia que todos queremos
A Justiça Eleitoral nada mais é do que um instrumento constitucional para o exercício seguro e transparente das escolhas democráticas pelos brasileiros e brasileiras, em respeito à soberania da vontade popular, um valor estruturante essencial e imprescindível na construção e fortalecimento de uma democracia estável, justa, igualitária e solidária. Tenho absoluta certeza que é democracia que todos nós aqui presentes queremos para o Brasil.
Liberdade
A mais importante — e aqui não há nenhuma dúvida —, garantia da democracia configura-se na liberdade do exercício do direito de voto e deve ser efetivada, tanto com observância do sigilo do voto, plenamente garantido pelas urnas, quanto pela possibilidade de o eleitor receber todas as informações possíveis sobre os candidatos — suas opiniões, preferências, propostas — pela imprensa, redes sociais, por informações dos candidatos, durante a campanha eleitoral.
A liberdade no exercício do direito ao voto exige a ampla liberdade de discussão e de informação, no sentido de proporcionar ao eleitor a escolha livre e consciente. Impedir qualquer coação, opressão por grupos políticos ou econômicos. A liberdade do direito de voto depende preponderantemente da ampla liberdade de discussão, de maneira que deve ser garantida aos candidatos a ampla liberdade de expressão e manifestação, possibilitando ao eleitor acesso às informações necessárias para o exercício da livre destinação do seu voto.
Liberdade de expressão
Tanto a liberdade de expressão quanto a participação política em uma democracia representativa só se fortalecem em ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das diversas opiniões sobre os principais temas de interesse do eleitorado e seus próprios governantes. A democracia não resistirá nem existirá onde a liberdade de expressão for ceifada, pois constitui essencial condição ao pluralismo de ideias, valor estruturante para funcionamento do sistema democrático.
Nesse cenário, a livre circulação de ideias, pensamentos e críticas visa a fortalecer o Estado Democrático de Direito e democratização do debate no ambiente eleitoral, de modo que a intervenção da Justiça Eeleitoral deve ser mínima, em preponderância ao direito de liberdade de expressão dos candidatos, candidatas e do eleitorado. É plena a proteção constitucional da exteriorização da opinião, o que não permite a censura prévia pelo poder público. Entretanto, essa plena proteção constitucional não significa impunidade. Não significa a impossibilidade posterior de análise e responsabilização por eventuais informações injuriosas, difamantes, mentirosas e fraudulentas. O direito à honra, intimidade, vida privada e à imagem formam a proteção da dignidade da pessoa humana, salvaguardando espaço instransponível por intromissões externas.
Discursos de ódio
A Constituição Federal não permite a propagação de discurso de ódio, de ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado Democrático de Direito. Tampouco a realização de manifestações pessoais, nas redes sociais ou por meio de entrevistas visando rompimento do Estado de Direito ou a consequente instalação do arbítrio.
A constituição não permite, de maneira irresponsável, a efetivação do abuso no exercício de direito constitucionalmente consagrado. Não permite liberdade de expressão como escudo protetivo para prática de discurso de ódio, ameaça, violência, infrações penais e toda sorte de atividades ilícitas.
Não canso de repetir e não poderia deixa-lo de fazê-lo: liberdade de expressão não é liberdade de agressão; não é liberdade de destruição da democracia; de destruição das eleições; da dignidade e da honra alheias. Liberdade de expressão não é liberdade de propagação de discurso de ódio e ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado de Direito. Inclusive durante a propaganda eleitoral, uma vez que a plena liberdade do eleitor para escolher seu candidato depende da tranquilidade e confiança nas instituições democráticas e no próprio processo eleitoral.
Papel da Justiça Eleitoral
A intervenção da Justiça Eleitoral será mínima, porém célere, firme e implacável no sentido de coibir práticas abusivas ou divulgações de notícias falsas ou fraudulentas. Principalmente naquelas escondidas no covarde anonimato das redes sociais, as famosas fake news. E assim atuará a Justiça Eleitoral, de modo a proteger a integridade das instituições, o regime democrático e a vontade popular. A Constituição Federal não autoriza que se propaguem mentiras, que se atente contra a lisura e a normalidade das eleições.
Democracia sempre
A democracia não é um caminho fácil, exato ou previsível. Mas é o único caminho. A democracia é uma construção coletiva daqueles que acreditam na liberdade, na paz, no desenvolvimento, na dignidade da pessoa humana, no emprego, no fim da fome, na redução das desigualdades, na prevalência da educação, na garantia de saúde de todas as brasileiras e brasileiros. É a construção coletiva de todos que acreditam na soberania popular. E de todos que acreditam e confiam na sabedoria popular, que acreditam que nós todos somos passageiros. As instituições devem ser fortalecidas, pois são permanentes, imprescindíveis para um Brasil melhor e de sucesso e progresso, para um Brasil com mais harmonia, justiça social, igualdade e solidariedade, com mais amor e esperança.
Tempo de união
A presença de todos no Tribunal da Democracia nos honra e dignifica a Justiça Eleitoral. A presença do presidente da República, Jair Bolsonaro, do chefe do Poder Judiciário, ministro Luiz Fux, dos presidentes da Câmara, deputado Arthur Lira, e do Senado, senador Rodrigo Pacheco, do procurador-geral da República, Augusto Aras, e todos os ministros do Supremo Tribunal Federal, dos 22 governadores, dos prefeitos de grandes capitais, das mais altas autoridades dos três Poderes e quase cinco dezenas de embaixadores demonstra que é tempo de união. É tempo de confiança no futuro. E, principalmente, tempo de respeito, de defesa, fortalecimento e consagração da democracia. Viva a democracia. Viva o estado de direito. Viva o Brasil. E Deus abençoe o povo brasileiro.
Em lugar de privilegiar o berço histórico do grito do Ipiranga Bolsonaro convoca seus apoiadores e tenta enrolar as Forças Armadas em um destrambelhado comício em Copacabana
Que o museu restaurado deveria ser o palco principal de comemoração da efeméride fica evidente e com emoção no pequeno vídeo que tem sido reproduzido pelo movimento sindical:
Nele a Jazz Sinfônica em uma concepção de vídeo de Fábio Borba e de direção de Jarbas Agnelli executa o Hino da Independência com o acompanhamento dos operários que, também eles, executaram as obras de restauração e embelezamento do museu. Emoção pura que traz como subtexto a denúncia da descabelada tentativa bolsonarista de sequestro da comemoração.
Com outras várias iniciativas concorrentes e convergentes a carta às brasileiras e aos brasileiros e o manifesto articulado pela Fiesp, lidos nas Arcadas, marcam a defesa intransigente da democracia e do respeito às eleições e garantem em modo nobre o resgate do orgulho de ser brasileiro.
As centrais sindicais, as direções de base e os ativistas apoiam estas e todas as iniciativas com o mesmo propósito, contribuindo decisivamente para que nosso povo tenha esperança e conquiste mudança.
Há pouco, tentei atravessar este dilema: escrever minha coluna ou sair com todo os democratas para exigir a volta da liberdade ao Brasil?
Sei que muitos democratas poderiam responder: e existe esse dilema? E continuariam: – É sair ou sair, sem qualquer dúvida ou hesitação. Outros, mais ponderados dirão: – Neste 11 de agosto de 2022, não tem dilema. Você escreve e sai. Ou sai e escreve depois…
Antes, esclareço que escrevo esta coluna durante a quinta-feira, porque não quero atrasar a sua publicação na sexta. E a movimentação de protestos no Recife é daqui a pouco, a partir das 15 horas. Então, como achar o ponto de partida do texto e seu desenvolvimento, para concluir o dever de escritor até as 14 horas? O espaço de tempo é miserável e cruel: estamos às 10 e 30 da manhã, perto das 11, e enquanto penso e arrumo parágrafos, teria que partir rumo à Rua da Aurora. Estaria feliz assim, sem terminar o texto que virou uma obrigação religiosa? Por outro lado (e parece existir só um), se não puder chegar a tempo, encerrando o texto às 17 horas, ausente portanto do maravilhoso protesto, estarei com a consciência em paz? Olhem, se me expresso como escritor, devo dizer: essa ausência é o mesmo que uma noite de amor perdida. Não volta mais nunca.
Então, enquanto penso em participar e cumprir o que devo, comento.
O ocupante infame da presidência, ainda nesta semana, zurrou: “Vimos agora há pouco uma cartinha em defesa da democracia…..”.
Mas a cartinha exigindo o respeito ao voto democrático tem quase um milhão de assinaturas. E possui a eloquência dos justos, de uma onda que cresce nestas palavras:
“Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando a convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.
Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.
Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional”.
Mas sabemos todos que bem antes do início da campanha, aquele que assenta o traseiro na cadeira da presidência já faz jogadas eleitorais em tentativas de comprar a consciência dos mais vulneráveis da população brasileira, com uma esmola de 600 reais por mês, para assim manter a massa como gado. Nisso vai o respeito que ele tem pelo povo. Manda pagar uma ração até as eleições, e todo rebanho há de fazer o que ele quiser, pelo que ele espera. Ao mesmo tempo, seus ataques à honestidade das urnas, com o apoio dos militares servis à negação do Brasil, faz boicotes declarados ou ilícitos, desonestos, à votação legítima.
Por isso fala a “cartinha” mais justa dos últimos tempos:
“Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral”.
Para isso, o genocida fantasiado de presidente incentiva os seguidores à violência para a matança dos democratas:
“Comprem suas armas. Isso também está na Bíblia”,
Ao que responde a cartinha da civilização brasileira:
“Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar de lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática…
No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.
Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:
Estado Democrático de Direito Sempre!”
É claro, é mais que uma carta, é um roteiro de esperança. Sabemos todos que as vozes do passado da ditadura continuam impunes, os assassinos passeiam e gritam como se fossem bravos heróis. Bem sabemos que a tortura continua a ser praticada nos presídios brasileiros e nas delegacias de polícia, Que a morte é uma sentença permanente contra negros, pobres e humilhados do Brasil. Que a própria existência de um animal como presidente é reflexo da barbárie nacional, que ainda sobrevive.
Mas é com esse roteiro que um clamor de perseguidos vem crescendo, e ganham vulto os protestos contra a fome, a volta dos resistentes de todas as idades, jovens e idosos de volta à rebeldia da juventude. As notícias falam que um eletricista de nome Celestino Conceição Lima, de 81 anos, declarou:
“Em 81 anos de vida, já vivi de tudo. E posso garantir que a democracia é o melhor regime que o Brasil já teve. Sou contra qualquer golpe. Quero deixar pros meus bisnetos um Brasil de liberdade”.
Isso para mim é poesia viva, uma prova de humanidade que Homero não cantou.
Enquanto isso, o escritor não foi às ruas. Diabo, como poderia fugir do impasse de estar presente e não aparecer no maravilhoso ato? Espero que os amigos e leitores me concedam a graça de ter estado entre eles com estas linhas. A civilização pela qual lutamos é a pátria da compreensão. E do mais generoso consolo também.