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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

20
Mai22

IV - ASSÉDIO JUDICIAL

Talis Andrade

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Ilustração: Amanda Miranda para o Intercept Brasil

 

por Nayara Felizardo /The Intercept

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Aperseguição a jornalistas por meio de processos judiciais vai além das ações impetradas pelos próprios magistrados e sempre ameaçou a liberdade de imprensa. Nos últimos anos, porém, essa prática aumentou tanto que ganhou até um nome: assédio judicial. Isso acontece quando são orquestradas várias ações contra um mesmo veículo ou jornalista, por várias pessoas ou entidades diferentes, e quando uma mesma pessoa processa um jornalista várias vezes, explica a advogada Tais Gasparian, que há mais de 10 anos defende vítimas de processos como esses.

Um exemplo é um caso ocorrido no Paraná em 2016, em que dezenas de juízes e promotores do Ministério Público se incomodaram com uma reportagem sobre seus supersalários, publicada na Gazeta do Povo. De forma simultânea, os juízes e promotores citados no texto moveram mais de 40 processos contra todos os profissionais que assinaram a matéria, incluindo os repórteres e um analista de sistemas.

As ações foram movidas em várias cidades, obrigando os profissionais a viajarem o estado inteiro para audiências. Somados, os pedidos de indenização ultrapassaram a quantia de R$ 1 milhão. O caso foi tão absurdo que o Supremo Tribunal Federal suspendeu todas as ações. A corte agora decide se elas devem ser julgadas pelo Judiciário local ou pelo próprio STF. Valores de indenização muito altos, reforça Gasparian, cumprem a função de intimidar e prejudicar financeiramente o jornalista.

Segundo um levantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, a Abraji, com dados até 2021, jornalistas e veículos de comunicação foram alvo de mais de 4 mil processos por calúnia, injúria e difamação desde 2002 – 97% das ações, contudo, foram movidas nos últimos 10 anos. A maioria delas são de políticos, mas há também os casos que envolvem magistrados, como revela o mapeamento que fiz para esta reportagem. Mesmo quando não é praticado pelo Judiciário, o assédio judicial conta com o apoio de juízes e desembargadores, pois são eles quem condenam os jornalistas ou os veículos a pagarem altas indenizações ou a retirarem conteúdo do ar. Em outras palavras, são os magistrados que ajudam a censura a se concretizar.

Se você fizer uma busca na internet pelo blog paraense Rondon Sem Censura, por exemplo, não vai encontrá-lo. Ele foi censurado. Em 2012, o juiz Gabriel Costa Ribeiro alegou que sua honra estava sendo atacada pelas publicações e conseguiu uma liminar que obrigava o Google a retirar “do mundo virtual” não apenas os textos que o citavam, mas todo o blog. Caso o Google não cumprisse a determinação, a multa diária seria de R$ 100 mil. Como o site ficou no ar por mais de um mês, a justiça do Pará ainda mandou bloquear R$ 3 milhões nas contas da multinacional.

 

            97% dos processos por crimes contra a honra que miraram jornalistas desde 2002 foram movidos nos últimos 10 anos.

 

A liminar requerida pelo juiz Ribeiro foi julgada em apenas dois dias na comarca de Rondon do Pará, cujo único magistrado, na época, era ele mesmo. A decisão foi tomada por um colega, o juiz substituto Jonas da Conceição, que estava temporariamente responsável pelos processos na cidade durante os dois dias que Ribeiro se ausentou por uma licença-médica.

Por considerar que a decisão feria “os princípios constitucionais da livre manifestação de pensamento e liberdade de expressão”, o Google recorreu. A empresa alegou que a maior parte das publicações do blog sequer citavam o juiz Ribeiro e, por isso, excluí-lo por completo causaria “uma gritante desproporção na aplicação da razoabilidade”.

Para Gasparian, obrigar a retirada de uma reportagem do ar é uma ordem extrema que afeta gravemente não apenas a liberdade de expressão, mas a liberdade de informação. “Os sistemas de publicação dos sites de notícias permitem que um texto seja corrigido, se for o caso. Mas excluir um conteúdo e banir informação do conhecimento público é censura”, diz a advogada.

Argumentos como esses não convenceram a desembargadora do Tribunal de Justiça do Pará, Gleide Pereira de Moura, que analisou o recurso do Google. Ela manteve a decisão de retirar o blog do ar e apenas reduziu a multa diária para R$ 2 mil. “Nada há de pedagógico ou informativo no blog referido, mas sim comentários pueris e injuriosos”, escreveu a magistrada. Como queria o juiz Ribeiro, o Rondon Sem Censura desapareceu da internet.

Todos os magistrados foram procurados por meio da assessoria do Tribunal de Justiça do Pará, que não respondeu aos questionamentos feitos.

Em 2014, foi a vez da justiça do Rio Grande do Sul, que censurou uma matéria do repórter Rogério Barbosa, publicada no Conjur, site especializado em assuntos jurídicos. Ele escreveu que a juíza Fabiana dos Santos Kaspary usava o espaço das notas de expediente, publicadas no site do tribunal estadual, para dar conselhos amorosos como esse: “Não precisa agir como um ogro. O amor acabou, mas vocês já se divertiram um bocado juntos”.

Essa e outras dicas para o fim de um relacionamento realmente estavam lá, mas a juíza alegou que foi um “erro cartorário” e que o jornalista se aproveitou disso para ridicularizá-la com “matéria de cunho vexatório”. Ele e o site foram condenados a pagar, juntos, R$ 12 mil. O texto foi excluído do Conjur, mas o encontrei reproduzido em outra página.

Por meio da assessoria do tribunal, a juíza Kaspary respondeu que “o processo em questão não tem relação com liberdade de imprensa e nem com assédio judicial”, portanto, o caso “não se enquadraria no tema abordado” pela reportagem.

Em Pernambuco, a juíza Blanche Maymone Pontes Matos ganhou, após acordo, R$ 10 mil e um direito de resposta no UOL. Ela moveu dois processos contra o veículo e a jornalista Fabiana Moraes, então colunista do site e atualmente colunista do Intercept. A magistrada se incomodou com o texto “Ministra Rosa, juíza Blanche e preso preto: tudo é cor no Brasil de Kafka”, no qual a jornalista recorreu a um jogo de palavras e cores para tratar do racismo estrutural no Judiciário. A juíza foi citada porque, entre outras decisões questionáveis mencionadas no texto, ela considerou legal a prisão em flagrante de um homem negro, acusado de furtar uma bicicleta de aluguel – mas o objeto sequer tinha sido encontrado com ele. Em sua defesa, a juíza Blanche alegou que não é racista, pois é até “casada com um negro”.

Os argumentos dela convenceram o juiz Sérgio Paulo Ribeiro da Silva, da comarca de Recife, que concedeu o direito de resposta à colega de toga. Embora tenha reconhecido que é “inegável e nefasta a existência de racismo estrutural” – exatamente o ponto principal do texto da jornalista –, o magistrado se recusa a admitir que as decisões judiciais tenham alguma coisa a ver com isso, pois acredita que não “sejam eivadas de discriminação racial, a ponto de serem elas as responsáveis pelo perfil dos detentos do país”. Um relatório do Conselho Nacional de Justiça de 2020, contudo, aponta que combater o racismo no Judiciário é urgente.

Os dois magistrados foram procurados por meio da assessoria do Tribunal de Justiça de Pernambuco, que não respondeu aos questionamentos e me orientou a enviá-los para a associação de magistrados do estado. A assessoria da entidade, porém, disse que “não responde por processos movidos individualmente por magistrados e magistradas” e que não tem autorização para passar seus contatos de telefone.

Mais recentemente, em fevereiro deste ano, o jornalista Rubens Valente foi obrigado a pagar cerca de R$ 310 mil por danos morais ao ministro Gilmar Mendes pela publicação do livro “Operação Banqueiro”. A sentença, reformada pelo STJ e confirmada pelo STF, mesmo tribunal do qual Mendes faz parte, ainda impôs ao jornalista que inclua, em uma futura edição do livro, a sentença e a transcrição da petição do ministro, que tem cerca de 200 páginas.

De acordo com um levantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, a Abraji, noticiado pela Agência Pública, a jurisprudência criada pelo STF para condenar o jornalista Valente foi usada em quatro processos no STJ e em outros 10 julgamentos nos tribunais estaduais de primeira e segunda instâncias até dezembro de 2021. Os mesmos argumentos serviram como parâmetro também para o cálculo de reparação por danos morais, com valores semelhantes aos milhares cobrados de Valente.

Em abril de 2021, a Abraji lançou o Programa de Proteção Legal para Jornalistas, para dar apoio jurídico a profissionais de imprensa. A iniciativa, diz o texto de apresentação do projeto, é uma “resposta ao crescimento das ameaças à liberdade de imprensa e do assédio judicial”.

Outra iniciativa para coibir a perseguição à imprensa vem da Associação Brasileira de Imprensa, a ABI, que entrou com duas ações, atualmente em andamento no STF. Uma delas cobra que “apenas a divulgação dolosa ou gravemente negligente de notícia falsa possa legitimar condenações”. A outra pede que os ministros assegurem aos jornalistas “o direito de não responder a ações penais por calúnia ou por difamação pelo simples fato de exercerem com destemor seus ofícios”.

Atualização: 10 de maio, 19h18
No dia seguinte à publicação deste texto, a Associação dos Magistrados Piauienses enviou uma nota afirmando que “o desembargador Erivan Lopes é um cidadão e, como tal, tem direitos” e agiu conforme a lei permite para “defender sua imagem e honra que, no seu entender, estavam sendo atacadas criminosamente pelo jornalista” Arimatéia Azevedo. A Amapi continua, dizendo que a reportagem “omite sabidamente” que Azevedo já havia sido preso em 2005 e tece “considerações tendenciosas”, por, no passado, “a autora da matéria” ter trabalhado no “mesmo grupo de comunicação” que ele. Esclarecemos que o processo a que se refere a nota não tinha relação com o tema desta reportagem, por não haver indício de que o caso configure assédio judicial. Reforçamos ainda que toda a investigação está ancorada em fatos, além de apresentar diversas outras histórias para além da de Azevedo, não havendo qualquer motivação escusa para a publicização do que vem ocorrendo com este e outros profissionais da imprensa.

[Nota deste correspondente: Em mais de 70 anos de jornalismo, escrevendo texto, editando jornais, criei dezenas de termos. Assédio Judicial, inclusive]

20
Dez20

Terrorismo judiciail: Nassif "juridicamente marcado para morrer"

Talis Andrade

censura eleitoral juiz TRE

Criou-se uma atmosfera em tudo semelhante à dos anos 70, quando muitos profissionais, marcados pela ditadura, eram obrigados a mergulhar, a buscar trabalhos de forma clandestina, para não serem esmagados pelas restrições impostas pela ditadura.

04
Dez20

Juiz Moro prenderia o empresário Moro, comprova Reinaldo Azevedo

Talis Andrade

Reinaldo Azevedo e Sergio Moro

 

247 - "Segundo os critérios com que o então juiz Sergio Moro conduziu a Lava Jato — e ele a conduziu, não é mesmo?—, o agora 'sócio-diretor' da Alvarez & Marsal estaria em prisão preventiva, que seria decretada no mesmo dia em que se efetuaria um espalhafatoso mandado de busca e apreensão em seus endereços, devidamente acompanhado por ao menos uma equipe de televisão, previamente avisada. Tudo combinado com os parças do MPF", escreve o jornalista Reinaldo Azevedo na Folha de S.Paulo.

"Homens de preto invadiriam a sua casa. Com algum requinte, um helicóptero sobrevoaria a residência para indicar a periculosidade da pessoa sob investigação. Ato contínuo, haveria uma entrevista dos procuradores e do delegado federal encarregados da operação. Nessa oportunidade, então, acusações novas se fariam, ausentes do despacho do juiz que autorizou o espetáculo. E pronto! A defesa não teria o que dizer porque sem acesso aos autos".

"No dia seguinte, um repórter farejador de procuradores e delegados vazaria uma informação exclusiva contra o preso".

"Moro mandaria prender Moro com base em que fundamento? 'Garantia da ordem econômica e conveniência da instrução criminal', conforme estabelece o artigo 312 do Código de Processo Penal, uma vez que o suposto crime investigado é grave: corrupção passiva, segundo dispõe o artigo 317 do Código Penal".

Leia a íntegra 

18
Out20

Janio de Freitas: apesar da controvérsia, STF marchou de mãos dadas contra Marco Aurélio

Talis Andrade

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O jornalista Janio de Freitas destaca que “a indiferença da classe privilegiada pelo que se passa abaixo dela recebeu do próprio Supremo Tribunal Federal, instância quase divina da 'Justiça', mais uma autenticação”, no caso que resultou na soltura do traficante André de Oliveira Macedo, o André do Rap.

Escreveu Janio:

O ministro Marco Aurélio considerou justificada a liberação de um detento provisório, que requereu habeas corpus baseado em excesso de prisão, mais do que os 90 dias legais e sem o reexame que a avaliasse. Recém-empossado na presidência do STF, Luiz Fux atribuiu-se o inexistente poder de invalidar a decisão do colega.

Um embate, portanto, que oferece controvérsia para muito tempo, entre defensores de que a lei é igual para todos, e aplicá-la é a função do juiz; de outra parte, os que sobrepõem à lei, ao decidir, presumidas decorrências de sua aplicação - ou, não raras vezes, suas inclinações pessoais.

Controvérsia, mas não para o plenário do STF, que logo marchava de mãos dadas contra Marco Aurélio Mello, como sempre. E o fez com originalidade: abraçou a opinião aplicada por Luiz Fux, mas não que a aplicasse.

Na lei, o prazo é tanto para o detento como para o juiz do caso. O Supremo cuidou, no entanto, de dar-lhes sentidos opostos. O do preso é fechado e dependente. O do juiz é livre, à vontade, a menos que haja intervenção do advogado nunca presente para a imensa maioria dos detidos provisórios sem meios de tê-lo. 

 

19
Set20

Depois de censurado bolsonarismo, Bretas demonstra que tem mais poder: ordenou buscas em 75 alvos, 33 deles residências de advogados

Talis Andrade

https://www.carlosbritto.com/reus-acusados-de-canibalismo-no-agreste-pernambucano-sao-julgados/  2014-11-13T19:10:36Z  https://www.carlosbritto.com/wp-content/uploads/2014/11/Jorge.jpg Jorge  https://www.carlosbritto.com/terceiro-livro-de-escritor ...

 

Por Luiza Calegari / ConJur

Ao chancelar o maior ataque à advocacia registrado no país, o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, acatou integralmente os pedidos do Ministério Público e ordenou o cumprimento de mandados de busca e apreensão contra 75 alvos (mais do que os 50 divulgados anteriormente), em 33 residências de advogados.

Chama a atenção o fato de que os supostos delitos apontados pelo MPF do Rio, que teriam acontecido entre 2012 e 2018, dizem respeito integralmente a supostas transações firmadas entre a Fecomércio e escritórios de advocacia — alguns dos alvos jamais chegaram a fechar contratos com a entidade. Fica claro que a intenção é envergonhar e intimidar os alvos.

Bretas justifica a ordem afirmando que é essencial que as buscas sejam feitas nas casas dos investigados, afastando a inviolabilidade da advocacia, por haver indícios de cometimento de crimes relacionados ao exercício da profissão.

"Isso porque, há índicos do cometimento dos delitos de corrupção, peculato, exploração de prestígio, lavagem de capital e organização criminosa, sendo, pois, a medida de busca é (sic) meio hábil para reforçar a investigação e, por conseguinte, indicar a autoria e materialidade dos delitos imputados. Dessa forma, visando à arrecadação de todas as provas possíveis, entendo ser pertinente a busca e apreensão na residência dos requeridos pelo Ministério Público Federal", afirmou o juiz.

A OAB, ao ingressar com reclamação no Supremo Tribunal Federal, apontou que a ordem de busca contra os advogados foi "genérica" e não apresentou delimitação temática e temporal para conduzir seu cumprimento, o que, segundo a entidade, abriu brecha para a apropriação de elementos sensíveis e não relacionados com a investigação.

O Estatuto da Advocacia, ao prever exceções ao princípio da inviolabilidade do trabalho do advogado, determina que as acusações devem ser pormenorizadas e prevê que a operação de busca seja feita "na presença de representante da OAB". Mas não foi o que aconteceu no caso.

Alvos da operação ordenada por Bretas relataram à ConJur que as buscas nas casas dos advogados não foram, de fato, acompanhadas por representantes da Ordem. Os mandados, segundo os relatos, não tinham cópias ou trechos da decisão judicial que os autorizava. Ainda por cima, uma das residências foi invadida pela PF pela porta dos fundos, e os policiais entraram no quarto em que o advogado dormia com sua esposa.

No pedido, o MPF justifica as buscas nos escritórios e residências citando jurisprudências do STF e do Superior Tribunal de Justiça. Bretas cola uma das justificativas do MPF em sua decisão, para mostrar que há precedentes autorizando buscas nas residências dos investigados sem a participação de representante da Ordem.

Na decisão citada, no entanto, o agravo regimental em pedido de Habeas Corpus foi desprovido pelo STJ por ser instrumento inadequado para "revolvimento do material fático/probatório dos autos". Ou seja, não houve análise de mérito do pedido, que alegava que a casa do advogado não poderia ser considerada extensão de seu local de trabalho.

Ilegalidades e abusos
As violações à jurisprudência e às prerrogativas da advocacia cometidas pelo MPF e chanceladas por Marcelo Bretas fizeram com que a OAB recorresse ao Supremo para pedir a anulação de todas as decisões relacionadas à delação de Orlando Diniz.

A Ordem sustenta que as apurações envolvem autoridades com prerrogativa de foro e, por isso, a competência para julgar e processar o caso seria do STF. Além disso, acusa o Ministério Público Federal no Rio de empreender um "malabarismo jurídico" na tentativa de manter o caso correndo na primeira instância.

Os pedidos da OAB incluem a suspensão dos efeitos da homologação da delação premiada de Orlando Diniz, de forma cautelar, e o envio do material ao Supremo; e, no mérito, o reconhecimento da competência do STF para processar o caso e a declaração de nulidade das decisões da 7ª Vara Federal do Rio.

Incompetência e erro de imputação
A ordem de devassa contra os escritórios foi considerada uma tentativa de criminalização da advocacia pela comunidade jurídica. Além disso, contém erros de competência, já que a Fecomercio é uma entidade privada e deveria ser investigada pela Justiça Estadual; e de imputação de crimes, já que seus dirigentes não podem ser acusados de corrupção nem peculato. Em outra vertente há quem entenda que, por pretender investigar ministros do STJ e do TCU, a competência seria do STF.

O empresário Orlando Diniz já foi preso duas vezes e vinha tentando acordo de delação desde 2018 — que só foi homologado, segundo a revista Época, depois que ele concordou acusar grandes escritórios de advocacia. Em troca da delação, Diniz ganha a liberdade e o direito de ficar com cerca de US$ 1 milhão depositados no exterior.

Trechos vazados da delação de Diniz ainda mostram que o empresário foi dirigido pelo Ministério Público Federal do Rio no processo. Em muitos momentos, é uma procuradora quem explica a Diniz o que ele quis dizer. Quando o delator discorda do texto atribuído a ele, os procuradores desconversam, afirmando que vão detalhar nos anexos.

Bloqueio desastrado
Escritórios de advocacia também relatam ter tido valores bloqueados de suas contas correntes. Nos autos, Bretas admitiu ter ordenado o sequestro, mas afirmou que era para ter acontecido no dia da operação, como é de praxe. Já que o bloqueio não constaria do sistema, ele levantou o sigilo sobre o pedido, expondo os alvos da operação — isso após a divulgação de notícias, da Folhae da ConJur, de que o bloqueio teria sido efetivado.

Segundo Bretas, a mudança do sistema BacenJud para o SisbaJud ocasionou um erro técnico, e o bloqueio não foi feito. "Somente no dia seguinte, ao que tudo indicava, a ordem teria sido finalmente transmitida aos bancos, porém até hoje não consta do Sisbajud a confirmação de que a ordem foi cumprida", afirmou, justificando o levantamento do sigilo.

STF desmoralizado

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Este correspondente alerta: Os novos mandados de busca acontecem depois da censura a Bretas, por suas atividades políticas de apoio a Sérgio Moro, quando ministro da Justiça e Segurança Pública, ao governador Witzel, ao prefeito Marcelo Crivella, a Bolsonaro, de quem se diz "terrivelmente evangélico". 

Depois que o ministro do STF Gilmar Mendes deu cinco dias para sua divindade explicar ao Supremo sobre a Operação E$quema S, considerada por especialistas como um ataque à advocacia e ao Estado Democrático de Direito.

A decisão de Gilmar Mendes ocorre por provocação de uma ação apresentada pelo advogado do ex-presidente Lula e alvo das investigações, Cristiano Zanin Martins, que questiona a competência da Justiça Federal de primeira instância para supervisionar a operação. A ação de Zanin, assim como ações de seccionais da OAB e do ministro do STJ Napoleão Nunes Maia Filho, tramita em segredo de Justiça.

Escreve Sérgio Rodas sobre a tardia censura:

O Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (RJ e ES) concluiu, por 12 votos a 1, nesta quinta-feira (17/9), que Bretas praticou os atos de superexposição e autopromoção e o condenou à pena de censura. As condutas são proibidas pelos artigos 3º, II, "a" e "b", e 4º, IV, da Resolução 305/2019 do Conselho Nacional de Justiça, e 13 do Código de Ética da Magistratura.

23
Jan20

Marco Aurélio: Fux age como censor e conduz ao descrédito do STF!

Talis Andrade

É uma autofagia!

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O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), chamou de “autofagia” a decisão do ministro Luiz Fux de derrubar, na quarta-feira 22/I, a liminar do presidente da Corte, Dias Toffoli. Na semana passada, Toffoli prorrogou por seis meses a implantação da figura do juiz de garantias, que é parte do pacote anticrime aprovado em dezembro pelo Congresso Nacional.

Ontem, Fux derrubou a decisão e suspendeu a criação dessa figura jurídica por tempo indeterminado.

Para Marco Aurélio, o colega agiu como “censor”.

"A autofagia é péssima, conduz à insegurança jurídica, ao descrédito da instituição. Não há censor no Supremo, e acabou o ministro Fux assumindo a postura de censor em relação a um ato logo do presidente do Supremo. Respeite-se um pouco mais essa cadeira, para benefício da sociedade como um todo. Essa problemática é nefasta, ruim e perniciosa", afirmou Marco Aurélio ao Globo.

"Ironia que se verifica: o vice que ainda não foi eleito presidente e que o será em setembro (Fux) afasta do cenário um ato do presidente. Isso é terrível em termos institucionais e apenas revela tempos estranhos, muito estranhos. Não sabemos como poderá proceder este ou aquele ministro diante de uma situação que acredite errônea. Nós, integrantes do Supremo, ombreamos e acima de cada qual apenas está o plenário, o colegiado", disse ainda. [Transcrito do Conversa Afiada]

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21
Jan20

Surpresa! Existe um juizado de garantias nos EUA: há dois séculos!

Talis Andrade

Um dos principais argumentos contra a implantação do juiz de garantias é a falta de recursos. Como, se o Judiciário brasileiro é um dos mais caros do mundo? Além disso, o juiz de garantias não é uma invencionice brasileira, pois existe em países da Europa e nos EUA

 

Por Thales Coelho

Os Divergentes

O fascínio que exerce o direito norte-americano, atualmente, sobre membros de nossa Judicatura, do Ministério Público e aspirantes a essas instituições é notório. Há, no entanto, elementos que compõem o sistema judicial dos EUA que, por ignorância ou má-fé, são omitidos quando se tecem loas à jurisdição daquela nação tão admirada nos círculos jurídicos nacionais. Prefiro, ainda, acreditar que seja por ignorância, considerado o nível sofrível do ensino jurídico no Brasil.

A propósito, acabo de ler que um turista ucraniano foi preso em flagrante, no final do ano passado, no Rio de Janeiro. Apresentado, em seguida, a uma juíza em audiência de custódia, esta, por seu turno, solicitou a interveniência de intérprete oficial da “União Soviética” (sic). Informada, posteriormente, do fim da URSS, há algumas décadas, expediu o mesmo pedido às autoridades consulares russas!

Pelo visto, Sua Excelência jamais deve ter ouvido falar, nos bancos escolares, dos mais de um milhão de camponeses ucranianos mortos de fome, nos anos 30 do século passado, quando ainda havia União Soviética; tampouco ficou sabendo da anexação, pela Rússia, da Crimeia − considerada território ucraniano pela comunidade internacional −, há pouco mais de cinco anos. Desnecessário dizer que a ilustre magistrada devia ignorar que na Ucrânia fala-se ucraniano, e não russo.

Coisas de nossas faculdades de direito e dos cursinhos preparatórios para concursos. “Aquele que só sabe o direito, nem o direito sabe”, dizia o Justice Oliver W. Holmes Jr. E já que o negócio é copiar o que ditam os norte-americanos, talvez seja recomendável a pretendentes de operadores do direito no Brasil a leitura de “O Primeiro Ano”, do genial Scott Turow, sobre sua experiência como calouro em Harvard.

Oliver Wendell Holmes Jr


Mas, voltando aos EUA, um bom exemplo da assimilação filtrada de suas instituições por nossas autoridades judiciais pode ser trazido à baila no contexto dos debates sobre a adoção dos juizados de garantia. Bobagem dizer que isso existe na Itália, em Portugal ou outros países latino-americanos; bobagem dizer que já há experiência exitosa nesse sentido no Estado de São Paulo.

O que importa saber é se esse tal de juizado de garantia funciona nos EUA. Talvez não tenha sido ensinado aos doutores da lei: trata-se de um interessante elemento da engrenagem judicial norte-americana, que existe desde a adoção da famosa Quinta Emenda do “Bill of Rights”, em 1791.

O juizado de garantias é praticado desde aquela época, nos EUA, de uma maneira muito peculiar. É conhecido entre eles como “grand jury”. De acordo com a Quinta Emenda, ressalvados os casos submetidos à competência de cortes marciais, nenhum processo criminal, em casos de delitos infamantes (corrupção, por exemplo) ou crime capital (pena de morte), pode ser aberto sem que, antes, um corpo soberano de jurados, decida, por maioria qualificada (2/3 ou 3/4 de seus membros, conforme o Estado), se o Ministério Público dispõe ou não de indícios razoáveis de materialidade e autoria, regularmente coligidos, para oferecer uma denúncia, que, posteriormente, será processada e julgada perante um juízo.

Não há sequer um magistrado a supervisionar o trabalho dos jurados, embora o órgão conte com apoio técnico de pessoal do Poder Judiciário. O curioso é que os norte-americanos não discutiam se haveria ou não dinheiro bastante para instalar “grand juries” nas comarcas de todos os Estados. Simplesmente os instalavam, em que pese terem sido os EUA, naquela ocasião, uma nação nascente, sem pujança econômica alguma e saída, fazia pouco, de uma terrível guerra de independência que durara mais de oito anos e que só havia terminado com a assinatura do Tratado de Paris, em 1783

A assinatura do Tratado de Paris, segundo pintura inacabada, de Benjamin West

 

Mesmo após a devastadora guerra contra o Reino Unido, em 1812, na qual a capital Washington foi totalmente incendiada e a incipiente economia norte-americana arruinada, ninguém ousou pôr em dúvida a legitimidade do “grand jury” como garantia fundamental dos cidadãos contra a persecução estatal. Ninguém quis impedir o funcionamento desse juizado de garantia antes, durante ou depois da Guerra de Secessão, finda em 1865, deixando para trás muita destruição e mais de seiscentos mil mortos. E olha que o erário arcou, desde sempre, com as despesas de manutenção dos jurados, cidadãos comuns, enquanto estes estão convocados e no exercício de suas funções – que podem durar meses − num “grand jury”.

O juizado de garantias é praticado desde aquela época,
nos EUA, de uma maneira muito peculiar.
É conhecido entre eles como “grand jury”

Não nos daríamos ao luxo de dispor de jurados por meses, mas, se a questão que impede, entre nós, a instalação de juizados de garantia é realmente de natureza orçamentária, não seria conveniente passar um pente fino nos gastos do Poder Judiciário, especialmente no que diz respeito a remunerações de magistrados? Até quando suportaremos conviver com a ampla, geral e inconstitucional extrapolação do teto remuneratório de R$ 39.200?

Vale lembrar que gastamos 2% de nosso PIB com a manutenção do Poder Judiciário. A média nos países da OCDE é 0,5% e, na União Europeia, nenhum país gasta mais do 0,7% do PIB com sua respectiva judicatura. Do montante destinado entre nós ao Poder Judiciário, 90% são destinados a pagamento de pessoal. Na Europa, 70%.

Se ativéssemo-nos, efetivamente, à remuneração máxima “permitida”, isso já daria para pôr em funcionamento muitos juizados de garantia país afora.

Em recente conversa com uma jurista alemã, residente em Berlim,  − cujo país gasta apenas 0,3% do PIB para manter seu Poder Judiciário − recebo a informação de que, atualmente, a remuneração de ingresso na carreira da magistratura na capital germânica é de cerca de € 4.000 (bruto), o que, ao câmbio atual equivaleria a aproximadamente R$ 18.400. No final de carreira, um juiz berlinense ganha € 7.000 (bruto), ou R$ 32.200. Importa recordar que, com base na progressividade tributária, chega-se lá à alíquota de 45% no imposto de renda e que, evidentemente, os magistrados não se desvencilham desse tributo. Que tal?

Os que, aqui, na Magistratura, lançam uma cortina de fumaça quando falam em gastos excessivos para refugar a implantação do juizado de garantias, não querem, na verdade, abrir mão de autocráticas prerrogativas que lhes confere o nosso arcaico processo penal inquisitório, coisa que, aliás, não existe nos EUA.

Diria Noel Rosa: eis aí “o xis do problema”.

A estátua da Justiça, de Aldredo Ceschiatti – Foto: Orlando Brito

 

 

18
Jan20

O Juiz de Garantia: Marco da evolução da democracia brasileira

Talis Andrade

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por Clemilton Saraiva

A mais de um ano publiquei este artigo no https://www.brasil247.com/…/os-monarcas-absolutistas-e-o-ju…. Nele procuramos refletir, sem muitas pretensões, e discorrer um pouco sobre a percepção que tínhamos com relação as profundas raízes absolutistas que estão fincadas e marcam parte da gênese da justiça brasileira.

Com a aprovação da Lei que instituiu o Juiz de Garantia pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República do Brasil, entidades de representação dos magistrados brasileiros foram ao Supremo Tribunal Federal - STF pedir a inconstitucionalidade da lei alegando, segundo elas, falta de recursos para sua implementação. Será?

Em sentido contrário a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, afirmou que a implementação do Juiz de Garantia no País não implicará em necessidade de novos recursos pois o sistema de Processos Judiciais Eletrônico – PJE, ferramenta de gestão do judiciário brasileiro, garante a proteção dos cidadãos de possíveis abusos de certos “monarcas judiciais” e que a intuição do Juiz de Garantia as decisões judiciais poderão não mais estarem eivadas da falta de imparcialidades e menos contaminadas do viés de cunho político ideológico ou de partes estranhas ao processo.

É de conhecimento geral que o expressivo envolvimento do Juiz no curso de um processo criminal, por exemplo, o envolve muito e na maioria dos casos traz prejuízos incalculáveis a necessária imparcialidade no momento de suas decisões. O Juiz de Garantia inova ao criar a fase de instrução processual da lide, ou seja, a realização de um levantamento legal e criterioso de informações que irão subsidiar a formação do juízo de julgamento.

Há uma máxima corrente no ambiente dos operadores do direito, usada de forma jocosa, que diz: " tem juiz que não ‘se acha’ que é Deus! Ele tem certeza." Apesar de bem-humorada, a expressão é carregada de um caráter de cunho absolutista que nutre o mental e a cultura, de parte dos “togados” ou “capas pretas” brasileiros, que em certos casos exaram comportamentos perceptíveis por meio dos fundamentos de suas decisões públicas ou até mesmo em suas ações no mundo privado, frente a investidura e poder do cargo público, como seres que devem ser “temidos” ou seguidos. Lembra do adágio popular: “sabe com quem está falando”, ele tem na sua “genética” os resquícios de uma cultura totalitária que ainda marcam a sociedade brasileira. 

Diante destas questões que povoam as subjetivas formações de caráter do nosso povo, o Juiz de Garantia vem em boa hora e poderá se transformar em um marco de evolução da democracia brasileira, impedindo que certos atores do judiciário se valham de artifícios interpretativos e procurem se absterem de julgamentos e decisões que fujam da estrita observância aos preceitos do devido processo legal e ao irrestrito e amplo direito de defesa.

10
Out19

As motivações políticas da Lava Jato

Talis Andrade

Instaura-se o paradoxo: a luta anticorrupção é boa, desde que não se fale em corrupção da própria “luta anticorrupção”

 

O que se coloca em jogo na Lava Jato não é a mera existência de política e, sim, o papel que essa dita “política” exerceu sobre as atuações das organizações jurídicas, as motivações da operação, as alianças indisfarçáveis que vão se tornando cada vez mais nítidas entre as forças que geraram, primeiramente, algumas escoriações no Estado democrático de direito e que, agora, deixam-no cada vez mais capenga. É esse o esforço ao longo desse texto, mostrar que, em que pese a existência de política no direito, tal reconhecimento não pode entravar a sua busca e reivindicação por autonomia, a constante restrição de sua discursividade, exigindo alianças cada vez mais consistentes. Embora o direito seja também política, sabe-se que ele não é somente isso.

O grande problema da Lava Jato, para falar com Deltan Dallagnol, é que a questão jurídica é filigrana dentro do contexto maior, que é o político.

O problema da Lava Jato não é somente quando existe alguma política norteando as decisões, mas quando esse Estado fica tão moribundo que a questão jurídica se torna filigrana dentro do contexto “maior”, que é o político, em sentido oposto do qual deveria ser pensada a discursividade do mundo do direito, em que o contexto político é que deveria ser a filigrana.

A Lava Jato se torna um absoluto quando adquire o poder do rei, quando passa a ser incontestada, dona da verdade e da bondade; quando não se envergonha de utilizar métodos neofascistas de tortura para atingir os seus objetivos, tal como quando cinicamente autorizou devassa na vida da filha de um acusado da operação, com o claro objetivo de amedrontar e martirizar o seu pai; ou quando demonstra desdém e absoluto desrespeito perante a morte dos familiares dos investigados, “esses que não são gente como a gente”, tal como no falecimento da esposa e neto de Lula, chegando ao absurdo higienista e separatista da procuradora Thaméa Danelon afirmar que a presença e humanidade de um membro do MP no funeral era mesmo uma traição, demonstrando “partidarismo”; claro, os partidários são sempre os outros!

A Lava Jato vira soberana quando, passando a ocupar o lugar de Deus, Onisciente e Onipotente, a posição do Neutro, ignora seus próprios problemas, inclusive, a sua própria corrupção e política, e passa a perseguir a corrupção e a política dos outros, esses sim, essa “gentalha política corrupta e atrasada”, que é menos “gente” que eles, tal como os nazistas, em outros tempos, contextos e proporções, mas que também construíram os judeus como outros que não humanos, demarcando o fim da humanidade ao menos como pensada pelo humanismo iluminista.

Isso se torna claramente um problema quando, não podendo atuar sobre os poderes nas urnas, investe-se pesadamente no messianismo jurídico que, enquanto projeto de poder, tem por objetivo utilizar as estruturas do direito e a “supremacia moderna” de suas organizações, para atingir os fins que somente seriam possíveis de serem atingidos através da política, agora, no sentido “moderno” do termo, quando este se torna, para falar como Isabelle Stengers, uma restrição leibniziana, um modo de construção de sentido possuidor de suas próprias regras de ingresso e disputa.

Não importa que exista política na Lava Jato, o que interessa é quando a Lava Jato se torna propriamente a política, só que disfarçada de direito; quando existe tal discursividade norteante, bailando e maculando cada ato da operação e seus atores.

Justicia impotente impunidade corrupção .jpg

 

É quando roboticamente e obsessivamente o coordenador da Lava Jato, Deltan Dallagnol, fala em um membro do MP concorrendo ao Senado por Estado, o que, nos termos de Dallagnol, equivaleria a um partido da Lava Jato (...)

Esses propósitos de Dallagnol seriam ainda mais perniciosos se não fosse a morte prematura da tal “organização” ou, melhor falar, “partido” da Lava Jato, formado com os fundos de R$ 2,5 bilhões da Petrobras, quando alguns agentes da operação viram nesta algo como a “galinha dos ovos de ouro”, um passo adiante da notável lucratividade da “luta” contra a corrupção, anteriormente colocada apenas a título de remuneração de palestras, livros e eventos. Naquela ocasião, a promessa era de que o fundo iria incentivar projetos “apartidários” anticorrupção, aquilo que, após ação de Raquel Dodge, foi suspenso pelo STF.

Instaura-se o paradoxo: a luta anticorrupção é boa, desde que não se fale em corrupção da própria “luta anticorrupção”: afinal, após o conflito interno no MPF, entre Raquel Dodge e Lava Jato, os membros ministeriais da operação informaram ter “desistido” da atuação – como se fosse possível desistir após o fracasso, como se restasse alternativa ao que já estava decidido, um modo de demonstração de poder, coerente ao projeto lavajatista, que Gilmar Mendes tão bem definiu como “projeto de poder”.

Agora, após o início da Vaza Jato, sabe-se bem quais são essas organizações “apartidárias” de Deltan Dallagnol, que seriam beneficiadas pelo fundo bilionário administrado pela Lava Jato, que, inclusive, foram utilizadas para forçar o impeachment de Dilma Rousseff. Outra influência direta da Lava Jato nos modos de operação da política foi a divulgação seletiva das conversas grampeadas de Lula que, ao longo das temporalidades da Lava Jato, desencadeou uma série de ações: nomeação de Lula para a Casa Civil -> que gerou cancelamento via decisão de Gilmar Mendes -> que aprofundou a crise do governo de Dilma -> que desencadeou, ao longo da série sucessiva de episódios, o golpe de Temer e a prisão de Lula. Talvez agora Gilmar Mendes se arrependa de ter alimentado o monstro, mas, ao que tudo indica, na cadeia de eventos no tempo, a sua atuação foi no mínimo fundamental para chegar onde chegamos. Transcrevi trechos   

corrupcao brasil bolsonaro.jpg

 

29
Jun19

JUSTIÇA DE ATORES HOSTIS E DISCRICIONÁRIOS

Talis Andrade

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por ROBERTO M. PINHO

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(...) “O judiciário nunca possuiu uma dinâmica de trabalho. São patrões de si mesmo. Daí hostis e discricionários. Não existe controle rígido das tarefas, essas sequer são cobradas, eis que inexiste controladoria capaz de romper a blindagem do serviço público”.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, no dia 26 de junho o projeto conhecido como dez medidas da corrupção, que inclui a punição ao abuso de autoridade de magistrados e integrantes do Ministério Público. A partir de agora o cerco se fecha em cima de magistrados, promotores e autoridades, indo no sentido do pleito dos deputados que inseriram a definição de abuso de autoridade justamente para restringir o poder dos investigadores. Juízes e membros do Ministério Públicos ficam proibidos, por exemplo, de atuar com "evidente motivação político-partidária" e de participar em casos em que sejam impedidos por lei. Há uma restrição para a realização de comentários públicos de casos em andamento, mas ela é mais rígida para juízes (de quem é proibida qualquer "opinião").
 
Nepotismo - O Judiciário é o Poder mais fechado do país e alinha-se com o executivo e o legislativo como um dos mais corruptos e insolentes. Isso acaba provocando grandes distorções e facilitando a orgia de salários nos tribunais, além de outras praticas nocivas. Nepotismo com artimanhas envolvendo parentes, troca de nomeações entre os gabinetes e sessões. Para melhor avaliar a lesão causada às contas da União, pesquisa realizada em 2016 mostrou que 76,48% dos magistrados ganham acima do teto constitucional de (R$ 33,7 mil), valor com as gratificações e penduricalhos, chegam a R$ 100 mil/mês. Com isso o orçamento de 2017 consumiu 93,2% com a folha de salário. Os maiores salários são recebidos por ministros dos tribunais superiores, desembargadores e juízes.
 
Dados levantados e divulgados pela entidade Contas Abertas, apontam que a União gastou em 2017 R$ 72,8 bilhões com o Judiciário, incluindo restos a pagar. O valor engloba salários, benefícios e estrutura do Judiciário Federal. Não inclui, portanto, os gastos dos Judiciários Estaduais. O valor surpreende, principalmente quando se compara aos gastos da União com Saúde: 109,8 bilhões em 2017, e Educação: 129,6 bilhões. Só Justiça Federal, no mesmo ano, gastou R$ 40,6 bilhões e do Trabalho R$ 19,9 bilhões. Mas não é possível pegar só um número e se analisar, é preciso ver com detalhes como está sendo gasto.
 
Juízes TQQ - O judiciário nunca possuiu uma dinâmica de trabalho. São patrões de si mesmo. Conseqüentemente hostis e discricionários. Não existe controle rígido das tarefas, essas sequer são cobradas, eis que inexiste controladoria capaz de romper a blindagem do serviço público. Nas varas o preposto do patrão (União) é o juiz, mas existe uma troca de favores, para que este não fique assoberbado e tenha folgas alem do permitido. Quem conhece as entranhas de um tribunal, sabe perfeitamente que nos gabinetes e secretarias, os servidores, formam grupo de trabalho, de forma que todos só trabalhem quatro dias por semana. Os magistrados por sua vez, só trabalham três duas vezes por semana. Por conta disso os advogados os denominam de TQQ (terças - quartas e quintas).
 
Camuflagem - Quem controla o judiciário? A resposta é que não há controle. Ele navega “livre, leve e solto”. Apesar disso reagem raivosos, quanto a receber criticas da sociedade. Do outro lado soberano e vetusto, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), na cúpula dos tribunais é um órgão que possui a missão de contribuir para o aperfeiçoamento da justiça, possui composição de membros que coincide com o perfil dos magistrados brasileiros, no entanto são corporativistas e decidem no sentido de favorecer seus pares. O que chama a atenção é o fato de as informações, mesmo sendo públicas, estarem camufladas. É quase impossível ter acesso às folhas de salários dos tribunais do Brasil. Não há uniformização nos procedimentos de busca, o que dificulta o entendimento e a interpretação dos dados pelos cidadãos. Em suma inexiste uma simbiose com o cidadão-contribuinte.
 
 

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