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O CORRESPONDENTE

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O CORRESPONDENTE

23
Set22

As visitas de Jair Bolsonaro a matador na prisão | UOL Investiga T2E2

Talis Andrade

Polícia e MP procuram 5 foragidos por suspeita de integrar milícia que  domina Rio das Pedras e Muzema | Rio de Janeiro | G1

 

 

No segundo episódio da segunda temporada do podcast “UOL Investiga”, a jornalista Juliana Dal Piva retrata duas visitas na cadeia do presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ) e de seu filho mais velho, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), ao ex-capitão do Bope Adriano Nóbrega, entre 2004 e 2005, enquanto este estava preso sob a acusação de assassinato. Em 2019, Nóbrega foi apontado como líder de um grupo de matadores de aluguel chamado Escritório do Crime e foi denunciado por participar de uma milícia em Rio das Pedras (RJ). “UOL Investiga - Polícia Bandida e o Clã Bolsonaro” fala da relação da família Bolsonaro com agentes das forças de segurança que se tornaram milicianos e usaram seu treinamento para cometer crimes. Traz ainda detalhes da relação da família Bolsonaro com Adriano Nóbrega, ex-policial militar morto em 2020 e apontado como chefe de assassinos de aluguel –Jair e Flávio inclusive fizeram visitas ao ex-capitão na prisão. Esta temporada tem também a história completa do roubo de uma moto do presidente em 1995, crime que mobilizou parte da polícia do Rio e simboliza vários problemas da segurança pública.

 

Bolsonaro visitou o miliciano Adriano Nóbrega na prisão em 2004 e 2005 

 

por Juliana Dal Piva e Elenilce Bottari /UOL

- - -

O presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ) e seu filho mais velho, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), fizeram, ao menos, duas visitas ao ex-capitão do Bope Adriano Nóbrega entre 2004 e 2005.

Nóbrega foi apontado pelo MP-RJ (Ministério Público do Rio), em 2019, como líder de um grupo de matadores de aluguel chamado de Escritório do Crime e também denunciado por participar de uma milícia em Rio das Pedras, na zona oeste do Rio.

As histórias dessas visitas foram reveladas no episódio dois do podcast "UOL Investiga: Polícia Bandida e o Clã Bolsonaro", que estreou nesta sexta-feira (23). No mesmo episódio, está um registro raro e inédito da voz de Nóbrega, obtido com exclusividade pela coluna.

Questionados sobre os dois episódios das visitas na cadeia, a assessoria do presidente e do senador disseram, por nota, que "à época das homenagens era impossível prever que alguns desses policiais pudessem desonrar a farda" e, ainda, que no caso do motim "trabalharam para resolver uma crise". Veja a nota na íntegra no final.

A primeira visita relatada à coluna ocorreu durante um suposto motim de policiais que estavam presos no recém-criado Batalhão Especial Prisional (BEP), em 28 de outubro de 2004.

Já a segunda foi por ocasião da entrega da medalha Tiradentes, a maior comenda do estado do Rio, pedida por Flávio Bolsonaro na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio) e entregue por ele a Adriano Nóbrega dentro da prisão. Jair Bolsonaro também esteve presente na cerimônia.

Sobre o episódio de 2004, a coluna ouviu duas pessoas que testemunharam a rebelião no presídio. Uma delas pediu anonimato, mas o sociólogo Paulo Baía, que também esteve lá, concordou em gravar entrevista. Ele foi subsecretário de Direitos Humanos do governo do Rio de 2003 a 2005.

Na época, os policiais reclamavam da criação do BEP em Benfica, onde também estavam presos outros acusados pelos mais diversos crimes e que não eram policiais.

Antes da criação do BEP, os policiais ficavam custodiados na carceragem do Batalhão de Choque (ou em suas unidades de origem) e o comando da polícia avaliava que aquele não era um local adequado para prisão dos policiais porque faltava estrutura para um efetivo controle dos presos, o que permitia que, mesmo presos, esses policiais continuassem gozando de regalias.

Em 2004, Adriano Nóbrega estava preso aguardando julgamento pela morte do guardador de carros Leandro dos Santos Silva, ocorrida em novembro de 2003. Ele e um grupo de policiais foram presos em flagrante acusados de executar Silva, que, dias antes, tinha denunciado um episódio de tortura e extorsão liderado por Nóbrega.

Na carceragem do Choque, enquanto o ex-caveira aguardava julgamento, a então mulher dele, Danielle Nóbrega, chegou a passar algumas noites com ele sem autorização legal, o que rendeu a Nóbrega uma sindicância interna. Rodrigo Pimentel, ex-instrutor de Nóbrega no Bope, recebeu telefonemas do antigo aluno de dentro da carceragem.

No entanto, a transferência dos policiais para o BEP gerou revolta. Os PMs se queixavam que em Benfica estavam no mesmo local onde ficavam presos alguns supostos criminosos que eles tinham ajudado a capturar. Por causa disso, teria se iniciado a rebelião.

O sociólogo Paulo Baía recorda que foi despertado no início da manhã do primeiro dia da rebelião por um telefonema do então deputado estadual Flávio Bolsonaro, à época, em seu primeiro mandato na Alerj. "Ele falou assim: 'Está havendo uma rebelião e nós fomos acionados e eles estão querendo alguém dos direitos humanos'", conta Baía.

O sociólogo disse que, em seguida, acionou sua equipe e soube que todos também tinham recebido ligações de Flávio nas primeiras horas da manhã. Na sequência, Baía e a equipe foram ao BEP, que ficava na Casa de Custódia de Benfica, na zona norte do Rio.

Baía conta que, ao chegar lá, Flávio e Jair Bolsonaro já estavam no local. "Eu já acompanhei amotinados em várias situações, e a situação de amotinados, os amotinados usam escudos humanos, crianças, mulheres, reféns, para se proteger. Eu nunca vi amotinados de peito aberto, sem uma proteção fora disso".

"Quando eu cheguei no presídio, já estavam lá, o deputado Flávio Bolsonaro e o deputado Jair Bolsonaro. Eu conversei com os dois, mais com o Flávio do que com o Jair, o Flávio era deputado estadual e nós tínhamos uma relação grande porque o Flávio acompanhava os inquéritos", conta.

Baía diz que, durante as negociações, Flávio conversou com Adriano Nóbrega. "O principal interlocutor do Flávio Bolsonaro era o Adriano. E aí eu procurei saber quem é esse rapaz aí que fala com o Flávio?", afirma o sociólogo.

Além disso, segundo Baía, os presos estavam com celulares dentro da cadeia. "Todos com celulares. Eu não posso afirmar, seria leviandade da minha parte, que eles falaram com Jair Bolsonaro, porque o Jair Bolsonaro foi muito discreto. Ele ficou lá, mas ficou na dele", diz.

"Conversou com o comandante da unidade ao lado dos Bombeiros, ele ficou conversando. Chegaram mais dois oficiais da PM, capitães ou tenentes, e conversaram com ele, mas ele não entrou nas celas de negociação, o Flávio entrou, até porque o Flávio tinha uma função institucional. Ele era deputado estadual e era da comissão de controle", conta Baía.

Na opinião do sociólogo, o episódio foi montado. "Eu quero frisar que esta rebelião é uma falsa rebelião, é um circo armado para projetar Flávio Bolsonaro".

Adriano Nóbrega morreu em uma operação policial na Bahia, em fevereiro de 2020, após passar um ano como foragido da Justiça. Ele foi denunciado na Operação Intocáveis pelo MP-RJ (Ministério Público do Rio).Image

 

 
06
Nov19

Moro atua como jagunço de milicianos e bandidos

Talis Andrade

adriano-magalhaes-de-nobrega-ex-bope-1555442110241Adriano Magalhães da Nbrega, por André Toma

 

O líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (RS), acusou hoje (5) o ex-juiz e atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, de usar o cargo para atuar como “jagunço de milicianos e bandidos” e ao mesmo tempo perseguir adversários políticos e manipular investigações.

A afirmação de Pimenta foi feita a propósito da notícia de que a Polícia Federal pediu a prisão da ex-presidenta Dilma Rousseff num processo no qual ela não é investigada e nunca foi chamada a prestar qualquer esclarecimento.

O líder lembrou que a ex-presidenta Dilma é um exemplo de honestidade em toda a sua trajetória de vida pública ao longo de décadas, tanto que mora há mais de 20 anos em um mesmo apartamento em um prédio modesto de Porto Alegre. “Nós, da Bancada do PT, reafirmamos toda a confiança e total admiração à ex-presidenta”, disse o líder Paulo Pimenta.

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, negou pedido da PF em operação que buscou provas, nesta terça-feira (5), contra os senadores Jader Barbalho (MDB-PA), Renan Calheiros (MDB-AL) e Eduardo Braga (MDB-AM) num caso relacionado a financiamento de campanha pela JBS em 2014.

 

Estado policial

Para Pimenta, o Brasil está hoje “mergulhado num Estado policial que protege cúmplices como Fabrício Queiroz”, que o líder chamou de “tesoureiro da família Metralha”, numa referência ao presidente da República Jair Bolsonaro e seus três filhos.

Pimenta observou que Queiroz nunca deu depoimento formal nas investigações sobre esquema de “rachadinhas” no mandato do ex-deputado estadual pelo Rio de Janeiro e hoje senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), mas, enquanto isso, a PF é instrumentalizada por Moro para “perseguir adversários políticos”.

Pimenta observou que Queiroz recebia dinheiro da mulher e da mãe do capitão Adriano, ambas funcionárias do gabinete de Flávio Bolsonaro, e repassava para a família do atual presidente da República, até para a hoje primeira dama Michele Bolsonaro. Capitão Adriano, foragido, é acusado de chefiar um “escritório do crime” e de ter participado do assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes, em março de 2018.

 

Milicianos

Pimenta assinalou que o atual governo, em menos de um ano, já mostrou para a população que de “nova política” não tem nada, dado o grande número de escândalos em que se envolveu, como tráfico de cocaína em avião presidencial, laranjal do PSL, negociatas em torno de acordo com o Paraguai sobre a hidrelétrica Itaipu Binacional. “É um governo que envergonha o Brasil, com um presidente que é jardineiro do quintal dos Estados Unidos”.

O líder advertiu que o governo Bolsonaro é uma ameaça às instituições e ao Estado de Direito e que, apesar das ameaças tanto do capitão-presidente, como de seus filhos e sua base de apoio, a oposição não se deixará intimidar. “O povo brasileiro a cada dia diz mais basta a Bolsonaro e a sua quadrilha de corruptos. É um governo incompetente, corrupto, formado por uma quadrilha e com fortes laços com organizações criminosas e milicianos do Rio de Janeiro”, completou.

Além de Adriano Magalhães da Nóbrega, também são procurados os intocáveis Jorge Alberto Moreth, o Beto Bomba; Fabiano Cordeiro Ferreira, o Mágico, Marcus Vinícius Reis dos Santos, o Fininho; Geraldo Alves Mascarenhas; Júlio Cesar Veloso Serra; e Daniel Alves de Souza. Todos foram denunciados pelo Ministério Público por organização criminosa armada, homicídio, grilagem de terras e agiotagem

 

21
Abr19

Subiu para 22 o número de mortos no desabamento de dois prédios da milícia no Rio de Janeiro

Talis Andrade

Rio-das-Pedras.jpg

 

 

Subiu para 22 o número de mortos no desabamento de dois prédios na comunidade da Muzema, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, no último dia 12. Os bombeiros retiraram dos escombros neste sábado, 20, os corpos de mais duas crianças. 

 

As obras dos dois edifícios que desabaram eram irregulares e estavam formalmente embargadas desde novembro, segundo a administração do prefeito Marcelo Crivella (PRB). No entanto, como a própria Prefeitura reconheceu em nota, Muzema é área “controlada por milícia”, os grupos paramilitares formados, em sua maioria, por ex-policiais militares que dirigem e exploram bairros inteiros da cidade.

 

Depois da tragédia do desabamento de dois prédios na Muzema, na Zona Oeste do Rio, 16 prédios do condomínio Figueiras do Itanhangá serão implodidos pela Prefeitura. Três imóveis que serão demolidos ficam próximos aos dois prédios que desabaram.

 

As demolições ocorrerão após terminarem as buscas pelos desaparecidos, que ainda estão sendo procurados pelo Corpo de Bombeiros.

 

Outras quatro liminares estão sendo analisadas, e mais prédios podem ser demolidos.

 

Depois da tragédia do desabamento de dois prédios na Muzema, na Zona Oeste do Rio, 16 prédios do condomínio Figueiras do Itanhangá serão implodidos pela Prefeitura. Três imóveis que serão demolidos ficam próximos aos dois prédios que desabaram.

 

As demolições ocorrerão após terminarem as buscas pelos oito desaparecidos que ainda estão sendo procurados pelo Corpo de Bombeiros.

 

Outras quatro liminares estão sendo analisadas, e mais prédios podem ser demolidos.

 

Os proprietários desses edifícios foram,  possivelmente, todos presos na Operação os Intocáveis, desencadeada no dia 21 de janeiro último. 

 

O objetivo da ação é desmantelar uma milícia que explora o ramo imobiliário ilegal em Rio das Pedras. Segundo informações da polícia, o grupo atuaria de forma violenta. Há indícios de que dois dos alvos comandem o chamado Escritório do Crime, braço armado da organização, especializado em assassinatos por encomenda. Os principais clientes do bando de matadores profissionais são contraventores e políticos.

 

Na ação, foi preso o major da Polícia Militar Ronald Paulo Alves Pereira, 43 anos. O oficial da PM é investigado por integrar a cúpula do Escritório do Crime.

 

O major foi denunciado por comandar negócios ilegais, como grilagem de terra e agiotagem. É réu no processo de homicídio de cinco jovens na antiga boate Via Show – o crime aconteceu em 6 de dezembro 2003 – e vai a júri em abril deste ano.

 

Também foi preso Manuel de Brito Batista, o Cabelo, que atua na quadrilha como contador e gerente armado.

 

Para o general Richard Nunes, a vereadora Marielle Franco (PSOL) foi morta porque milicianos acreditaram que ela podia atrapalhar os negócios ligados à grilagem de terras na Zona Oeste do Rio.

 

A Interpol deve receber um alerta da Polícia Federal, a pedido do MP-RJ (Ministério Público do Rio), a respeito dos sete milicianos foragidos, após a realização da Operação Os Intocáveis. A lista de procurados internacional deve incluir, principalmente, o policial Adriano Magalhães da Nóbrega, ex-capitão do Bope (Batalhão de Operações Especiais), acusado de ser o chefe da milícia de Rio das Pedras, uma das mais antigas e perigosas do Estado.

 

Além de Adriano, são procurados Jorge Alberto Moreth, o Beto Bomba; Fabiano Cordeiro Ferreira, o Mágico, Marcus Vinícius Reis dos Santos, o Fininho; Geraldo Alves Mascarenhas; Júlio Cesar Veloso Serra; e Daniel Alves de Souza. Todos foram denunciados pelo MP por organização criminosa armada, homicídio, grilagem de terras e agiotagem.

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Jorge Alberto Moreth, o Beto Bomba

 

 

 

 

 

27
Fev19

COMO RIO DAS PEDRAS VIROU SEDE DO ESCRITÓRIO DO CRIME

Talis Andrade

A região afastada, na Zona Oeste do Rio, é controlada pela mais antiga e influente milícia do Estado

Reportagem de Elenilce Bottari
A Operação Os Intocáveis tentou desbaratar grupo criminoso de milicianos. O major Ronald Paulo Alves Pereira (de boné e camisa clara) é apontado como integrante da cúpula do Escritório do Crime Foto: Gabriel Paiva / Gabriel Paiva

 

 

 

O Escritório do Crime — elaborada definição para uma quadrilha de matadores de aluguel — nasceu no berçário das milícias do estado: a favela de Rio das Pedras, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. A comunidade de mais de 60 mil moradores cresceu desordenadamente ao longo de cinco décadas, espalhando-se por uma área equivalente a quatro Maracanãs, entre os bairros de Jacarepaguá, do Anil e do Itanhangá. A região é controlada pela mais antiga e influente milícia do Rio de Janeiro, organização criminosa que tem entre seus integrantes agentes de segurança do estado, entre servidores da ativa, aposentados e afastados. O grupo se imiscuiu em atividades ilegais, como a grilagem de terras, a construção e venda de imóveis sem licença, a extorsão de moradores e de comerciantes e o controle e cobrança de serviços essenciais como água, gás, luz e transportes públicos. A quadrilha também negocia permissões para que candidatos possam pedir votos nas áreas que domina. Só faz campanha ali quem paga pedágio.

Como prestadores de serviços sujos, o Escritório do Crime acumula indícios de envolvimento em dezenas de assassinatos. O mais rumoroso deles foi o da vereadora Marielle Franco (PSOL). Até 14 de março de 2018, data da morte de Marielle, os crimes da quadrilha passaram impunes. Nenhum dos homens do grupo de extermínio havia sequer pisado na calçada da Delegacia de Homicídios da capital do Rio, que fica a menos de 10 quilômetros da favela onde está o Escritório do Crime. Eram considerados intocáveis, situação que deu nome à operação realizada na última terça-feira para prender integrantes do grupo de extermínio e da milícia que controla aquela parte da cidade, hoje turbulenta.

Mas nem sempre foi assim. Até os anos 50, Rio das Pedras era apenas o nome do córrego que cortava a bucólica Jacarepaguá, perto da Lagoa da Tijuca. Atraídas pela expansão imobiliária da Barra da Tijuca e de suas cercanias — alavancada pelo ousado plano diretor do arquiteto Lúcio Costa — e pela oportunidade de emprego na construção civil, famílias nordestinas fincaram raízes na região. Sem lugar para morar, muitos invadiram uma área pantanosa do sistema lagunar de Jacarepaguá, aterraram seus manguezais e ergueram ali os primeiros barracos.

Em 1964, ameaçadas de remoção por pessoas que se diziam donas do terreno, 96 famílias conseguiram que o então governador, Negrão de Lima, desapropriasse as terras, transformando-as em área de interesse social. Entre os beneficiários estava Octacílio Brás Bianchi. Ele foi um dos fundadores da primeira associação de moradores da favela. Sem a presença do poder público para garantir outros direitos, eles criaram as próprias leis. “O seu Octacílio era amado por comerciantes, que contribuíam de forma voluntária com a associação, que espantava ladrões e evitava que o tráfico invadisse a comunidade”, contou um antigo morador, que na terça-feira comemorou a prisão dos atuais chefes da organização.

Não demorou para que a favela ganhasse fama de matar bandidos na “peixeira”— faca comprida e afiada, comum no Nordeste, que era usada como arma branca.Com uma nova expansão a partir dos anos 80, a cobrança de taxa dos comerciantes passou a ser obrigatória. Em seguida, o crescimento do transporte público ilegal, batizado como “alternativo”, tornou-se novo filão de lucros. À medida que os negócios cresciam, o comando passou a ser cobiçado. Em 1989, Bianchi foi assassinado. Sua mulher, Elita, conhecida como Dinda, lhe sucedeu e acabou sendo morta seis anos depois, dentro da associação de moradores. O policial civil Félix Tostes assumiu o comando, com o apoio de outros policiais da ativa, para manter o local protegido de traficantes e de qualquer fiscalização que pudesse atrapalhar os negócios.

Em 2004, a associação lançou candidato próprio à Câmara dos Vereadores do Rio, o comerciante Josinaldo Francisco da Cruz, o Nadinho de Rio das Pedras. Ele concorreu pelo PFL, mesmo partido do prefeito Cesar Maia, reeleito naquele ano. Com muito dinheiro para a campanha, Nadinho foi o nono vereador mais votado, com 34.764 votos. Na mesma eleição, o então jovem candidato Carlos Bolsonaro também foi eleito, com bem menos votos: 22.355.

Assim as milícias entraram de vez na política. Outros dois candidatos de regiões controladas por milicianos foram eleitos no mesmo pleito: o policial civil Jorge Luís Hauat, o Jorge Babu (PT), reeleito com 24.532 votos; e Jerônimo Guimarães Filho, o Jerominho (PMDB), que conquistou 33.373 votos, integrante da Liga da Justiça, que se tornou nos anos 2000 a maior milícia do estado do Rio, controlando grandes bairros da Zona Oeste carioca, como Campo Grande, Inhoaíba, Paciência e Santíssimo.Em 2006, de nove candidatos com origem na área de segurança pública que fizeram campanha para deputado em áreas dominadas por milícias, cinco conseguiram se eleger. Entre eles estava o secretário de Segurança Pública do governo Garotinho, o delegado federal Marcelo Itagiba.

As milícias se multiplicaram na cidade, saltando de 42 para 92 áreas dominadas. Enquanto essas organizações paramilitares declaravam guerra a quadrilhas de traficantes pela disputa de território, às vésperas da realização dos Jogos Pan-Americanos de 2007, em novembro de 2006, o prefeito Cesar Maia afirmou que milícias eram “autodefesas comunitárias” e “um mal menor que o tráfico”. As declarações foram vistas como apoio velado. Entre 27 e 31 de dezembro daquele mesmo ano, facções do tráfico lançaram uma série de ataques contra alvos civis, da polícia e até do governo em toda a cidade, em represália ao avanço das milícias. Os traficantes incendiaram ônibus e jogaram bombas em prédios públicos. Nos ataques, 19 pessoas foram mortas.

No início de 2007, Félix Tostes foi assassinado, após se desentender com Nadinho de Rio das Pedras. Segundo investigações da polícia, o vereador encomendou o crime a outro grupo de extermínio, a Liga da Justiça, comandada pelo ex-vereador Jerominho e por seu irmão, o ex-deputado estadual Natalino José Guimarães (DEM).Já em seu segundo mandato como deputado estadual, Flávio Bolsonaro (PP) votou contra a instalação da CPI das Milícias e chegou a defender sua legalização. “As classes mais altas pagam segurança particular, e o pobre, como faz para ter segurança? O Estado não tem capacidade para estar nas quase 1.000 favelas do Rio. Dizem que as milícias cobram tarifas, mas eu conheço comunidades em que os trabalhadores fazem questão de pagar R$ 15 para não ter traficantes”, afirmou.

Em 2008, a CPI das Milícias foi instalada na Alerj, sob a presidência do deputado Marcelo Freixo (PSOL). Ao depor, Nadinho admitiu a existência do grupo na favela de Rio das Pedras e afirmou que, a partir daquela audiência, sua vida corria perigo. Ele foi assassinado em junho de 2009, na porta de sua casa, com mais de dez tiros.

A CPI das Milícias revelou 170 áreas dominadas por esses grupos, e identificou e indiciou 226 integrantes, entre eles Jorge Alberto Moreth, o Beto Bomba, presidente da associação de Rio das Pedras, que chegou a ser preso acusado de participação na quadrilha e condenado, mas conseguiu absolvição em segunda instância. Beto Bomba voltou a ser preso na última terça-feira.O Escritório do Crime tem estrutura própria e existe há pelo menos cinco anos. Só entrou no foco da polícia há alguns meses, com as investigações do assassinato de Marielle e de seu motorista, Anderson Gomes. A principal pista para ligar o grupo à execução da vereadora veio do interrogatório de um de seus integrantes. Embora ele tenha negado que estivesse no bairro do Estácio, onde Marielle foi morta, no dia do crime, dados de antenas de celulares, cruzados com um aparelho usado pelo suspeito, indicaram que ele estava no local no dia e na hora do assassinato.

Outro indício contra o grupo foi a confirmação de que o carro, modelo Cobalt, usado pelos assassinos de Marielle e Anderson passou pelo Itanhangá antes de seguir para a emboscada à vereadora. Uma câmera da prefeitura flagrou o veículo seguindo em direção a Rio das Pedras.

A lista de assassinatos atribuídos pela polícia ao Escritório do Crime é extensa. O grupo é suspeito do assassinato do presidente da Portela Marcos Vieira de Souza, conhecido como Falcon, de 52 anos, em setembro de 2016. Ele concorria a uma vaga de vereador pelo PP e foi executado em seu comitê eleitoral, em Oswaldo Cruz, na Zona Norte, quando seus seguranças o deixaram sozinho por alguns minutos. Foi o tempo suficiente para dois homens encapuzados entrarem no local e assassinarem o candidato com tiros de fuzil na cabeça. Nem a presença de câmeras no local inibiu a ação.

Outro homicídio atribuído aos mercenários é o do sargento reformado da PM Geraldo Antonio Pereira, no estacionamento de uma academia no Recreio, na Zona Oeste, em maio de 2016. Em junho do ano passado, a vítima foi o contraventor Haylton Carlos Gomes Escafura, de 37 anos, filho do bicheiro José Caruzzo Escafura, o Piruinha. Mais uma vez, o crime foi cometido por dois homens, que subiram até um quarto no oitavo andar de um hotel na Barra da Tijuca, onde estavam a vítima e sua acompanhante, a PM Franciene Soares de Souza, de 27 anos. Todos os crimes continuam sem solução.

Ronald Paulo Alves Pereira Fotografia Reginaldo Pi

Ronald Paulo Alves Pereira, capo do Escritório do Crime

 
 
 

 

27
Fev19

RJ investiga policiais suspeitos de atuar como agentes duplos para milícias

Talis Andrade

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Adriano Magalhães da Nóbrega, ex-capitão da PM-RJ, foragido da Justiça

 

247 - Um levantamento divulgado pelo Portal UOL revela que nos últimos 15 meses houve suspeita de vazamentos de informações sigilosas em ao menos cinco operações de enfrentamento a grupos paramilitares no Rio. Uma destas operações envolve o principal suspeito de ter executado a tiros a vereadora Marielle Franco (PSOL) e seu motorista, Anderson Gomes, na noite de 14 de março passado: o ex-capitão do Bope (Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar) Adriano da Nóbrega, que segue foragido da Justiça há cerca de um mês.

Um dos alvos da operação "Os Intocáveis", o ex-oficial caveira - como são chamados os policiais que passam pelo curso do Bope - contaria com uma rede de proteção formada por agentes da lei infiltrados em batalhões e delegacias do Rio para se manter longe da prisão.

O episódio mais recente de infiltração aconteceu no último dia 14, quando dois policiais militares foram presos por suspeita de terem antecipado à milícia chefiada por Wellington da Silva Braga, o Ecko, informações sobre uma operação "Volante" desencadeada pela Polícia Civil na Zona Oeste do Rio. As equipes foram às ruas para tentar cumprir 20 mandados de prisão, sendo que dez deles em nome de suspeitos que já estavam presos. Apesar disso, apenas um homem foi detido na ação policial.

A reportagem de Sérgio Ramalho aponta ainda que interceptações telefônicas mostraram que o trabalho acabou prejudicado pelo PM Marcelo Tinoco Petuquio, que teve uma conversa telefônica captada pelas escutas autorizadas pela Justiça. No diálogo, ele dava detalhes sobre a operação a um interlocutor ligado ao grupo paramilitar. Além dele, também foi detido o sargento Marcelo Costa Brito, lotado no Batalhão de Policiamento em Vias Expressas (BPVE), apontado como chefe da milícia de Rio da Prata, em Campo Grande. O grupo do PM tem ligação com a "Liga da Justiça", milícia chefiada por Ecko.

Em 22 de janeiro, durante a operação "Os Intocáveis", apenas cinco dos 13 mandados de prisão foram cumpridos pelos policiais civis envolvidos na ação, sendo que dois dos presos são oficiais da PM, o major Ronald Paulo Alves Pereira e o tenente aposentado Maurício Silva da Costa. Caso permanecessem foragidos, ambos perderiam prerrogativas, dentre elas, salário e aposentadoria. No dia seguinte, dois outros suspeitos foram detidos, elevando para sete o número de mandados cumpridos.

Além do ex-capitão Adriano, outro que conseguiu escapar da operação foi o presidente da Associação de Moradores de Rio das Pedras, Jorge Alberto Moreth, o Beto Bomba. Em um trecho da denúncia encaminhada pelo Ministério Público à Justiça consta a informação de que Beto Bomba tinha acesso a dados privilegiados sobre operações policiais realizadas nas localidades sob influência de milicianos e, com isso, alertava seus aliados com antecedência. Veja a vida de Adriano Magalhães da Nóbrega e suas ligações com o senador Flávio Bolsonaro aqui

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Milícia de Itaguaí tinha cemitério clandestino para enterrar inimigos

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A polícia descobriu que a milícia que atua em Itaguaí, Região Metropolitana do Rio, e é um braço da comandada por Wellington da Silva Braga, o Ecko, tinha um cemitério clandestino para enterrar “inimigos”. Segundo as investigações da Polícia Civil, pelo menos 10 corpos foram enterrados no local.

quadrilha de ecko.png

 

 

Milícia é máfia. Esses grupos são compostos em parte por agentes da lei, que atuam como agentes duplos, servindo ao crime organizado enquanto recebem salários para proteger o cidadão

Marcelo Freixo (PSOL-RJ), deputado federal

 

 

 

 

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