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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

18
Ago21

O contorcionismo da PGR para defender Bolsonaro

Talis Andrade

 

“Não há provas conclusivas a favor das máscaras”, diz a Procuradoria, em último recurso para evitar pedir processo contra presidente. E mais: a Jansen desvia vacinas da África para o Reino Unido; como evitar a eclosão de novas pandemias

 

por Leila Salim e Raquel Torres /OUTRASAÚDE

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TUDO NORMAL

Não há problemas em a autoridade máxima do país promover aglomerações, ignorar o uso de máscaras e mesmo desestimular a proteção de crianças durante a pandemia que já matou mais de 570 mil brasileiros. A conclusão não é de um blog bolsonarista ou de algum movimento negacionista, mas da Procuradoria Geral da República (PGR). 

Ontem, o órgão enviou parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF) sobre os pedidos de investigação movidos pelo PT e PSOL contra Bolsonaro por ter promovido eventos com aglomeração e ter aparecido sem máscara. E a conclusão da subprocuradora-geral da República Lindôra Maria Araújo, nome de confiança do procurador-geral Augusto Aras, é que as ações do presidente não configuram crime. 

mascara direita volver.jpg

 

E mais: para defender Bolsonaro, a subprocuradora questionou a eficácia do uso de máscaras, contrariando evidências cientificas e as orientações das autoridades de saúde. Segundo ela, não é “possível realizar testes rigorosos, que comprovem a medida exata da eficácia da máscara de proteção como meio de prevenir a propagação do novo coronavírus”. Nessa hora, querem ensaios clínicos no padrão-ouro…

A notícia-crime apresentada pelo PT teve como objeto a famigerada “motociata” promovida por Bolsonaro no Rio de Janeiro, marcada por muita aglomeração e nenhuma máscara. A outra, de autoria do PSOL, tratou do episódio em que Bolsonaro abaixou a máscara de uma criança de colo ao confraternizar com apoiadores no Rio Grande do Norte. O pedido imputou ao presidente crimes previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Penal.

Mas, de acordo com a PGR, o desrespeito a leis e decretos que obriguem o uso de máscaras não tem gravidade para justificar uma punição penal, sendo, no máximo, passível de sanção administrativa. Segundo o parecer, o crime de infração sanitária só é configurado quando se cria uma situação de perigo para a saúde pública. “É preciso que a conduta possa realmente ensejar a introdução ou propagação de doença contagiosa”, afirmou o texto.

Pois é: parece que, na conta da PGR, aglomerações e não-uso de máscaras são seguros. Tudo normal.Charge: A máscara que mais combina com Bolsonaro. Por Aroeira

DELTA E CORONAVAC

A entrada recente da Delta na China tornou possível ter as primeiras indicações sobre o desempenho das vacinas utilizadas no país, incluindo a CoronaVac, contra essa variante. E, segundo um estudo (ainda sem revisão de pares) divulgado no The Lancet, ela so fereceram proteção de 69,5% a 77,7% contra pneumonia causada pela covid-19 – mas apenas após as duas doses.

Em um surto com 167 casos da Delta identificados na província de Guangdong, foram rastreados 10.813 contatos próximos dos infectados; é a esses contatos que os resultados da análise se referem. Pouco mais da metade (54,4%) eram não vacinados, 3.130 (28,95%) haviam recebido pelo menos uma dose de vacina e 1.795 (14,6%) receberam as duas doses. Foram basicamente duas as vacinas usadas: a CoronaVac e a HB02, da Sinopharm. Um pequeno número de pessoas (7) havia recebido outros imunizantes. 

Uma limitação do estudo é que os resultados são gerais, não divididos de acordo com o imunizante utilizado. Outra é decorrente da ótima vigilância da China, que não deixa o vírus se espalhar tanto. Apesar de 10 mil pessoas não ser uma quantidade desprezível, é de se imaginar que boa parte dos infectados fossem assintomáticos, já que todos os contatos são testados; o artigo não menciona quantos tiveram sintomas em cada grupo (vacinados e não vacinados), então não dá para saber a proteção contra doença sintomática. Não houve nenhum caso grave entre os vacinados, o que sugere para uma boa proteção – porém, entre quem não tomou a vacina esse número foi muito pequeno (19 casos) para que se pudesse determinar a efetividade. Ninguém morreu, em nenhum dos grupos.

A boa notícia, relevante estatisticamente, se refere aos casos de pneumonia: foram identificados 102, sendo 85 em pessoas não vacinadas, 12 em indivíduos com pelo menos uma dose das vacinas e apenas 5 casos em pessoas com esquema vacinal completo. Com apenas a primeira dose, não foi observada proteção. 

FALTAS EM CUBA

Cuba é o país que tem hoje a maior média de casos e mortes diárias por covid-19 nas Américas, considerando o tamanho da população. Os números absolutos são baixos (81 óbitos e 8,7 mil novos casos por dia), mas a ilha tem pouco mais de 10 milhões de habitantes. Quase não houve problemas com o coronavírus por lá no ano passado; só no início deste ano é que uma pequena onda começou a se pronunciar. Desde julho, porém, a subida foi galopante. 

Segundo as autoridades, “esta situação se deve ao não cumprimento das medidas sanitárias, à mobilidade da população e à presença da variante Delta”, que já se tornou predominante. Uma diferença brutal entre 2020 e 2021 foi a reabertura das fronteiras em novembro, aponta o Deutsche Welle. A vacinação no país demorou a começar, mas depois se desenrolou bem – o uso de imunizantes totalmente nacionais é uma baita vantagem. Ainda assim, o percentual da população atingido não é suficiente para garantir allívio: cerca de 42% da população tomou uma dose e 26% o regime completo. Considerando que pouca gente havia se infectado até agora, há muitos suscetíveis ao vírus. 

Como se sabe, tem havido falta de medicamentos na ilha. E, para completar, nos últimos dias passou a haver um problema gravíssimo de escassez de oxigênio medicinal. É que a principal usina produtora ficou inoperante após a quebra de uma peça, o que fez com que a produção ficasse extremamente limitada. Segundo o Granma, foi criado um Centro de Gestão para tentar solucionar o problema. 

FLUXO BIZARRO

Ativistas sul-africanos estão pedindo a divulgação completa dos contratos do governo com a Janssen, ameaçando entrar com uma ação legal para obter as informações. Sua preocupação está fundada num escândalo: o New York Times revelou que a farmacêutica tem exportado milhões de doses envasadas no país para a Europa

Essa vacina é muito adequada para países de baixa renda e/ou com dificuldade de distribuição, porque é barata, de dose única e não necessita ser mantida em temperaturas muito baixas. A empresa concordou em vender doses para imunizar um terço do continente africano, e parte delas passou a ser produzida por um fabricante na África do Sul, a Aspen Pharmacare. Não se trata da produção do IFA (o ingrediente farmacêutico ativo), mas do preparo e envase a partir de matéria-prima importada. Ao todo, a África do Sul encomendou 31 milhões de doses, mas só dois milhões chegaram à população. Enquanto isso, “os registros de exportação revisados ​​pelo NYT mostram que a Johnson & Johnson despachou 32 milhões de doses nos últimos meses, embora isso não capture o número total que deixou a África do Sul”. 

O problema parece estar no contrato, obtido pelo jornal. Muitos países conseguiram estabelecer que doses produzidas no próprio território deveriam ficar para si próprios, mas o contrato da Johnson & Johnson com a África do Sul exigia que o país renunciasse ao direito de impor restrições. “O governo não teve escolha: assine contrato ou fique sem vacina”, justificou Popo Maja, porta-voz do Ministério da Saúde. Mesmo que os ativistas consigam a publicização dos termos, haverá o que fazer – além da denúncia?

DISSOLUÇÃO

O governo de São Paulo decidiu dissolver o Centro de Contingência do Coronavírus, formado por cientistas e médicos que ajudavam na formulação de decisões. A informação tinha sido adiantada na sexta-feira e ganhou mais detalhes ontem: dos 21 antigos membros, sobrarão apenas sete, entre eles João Gabbardo e David Uip. “Doria não vai mais poder dizer que está seguindo a ciência. Vai continuar criticando o Bolsonaro, mas eles estão muito próximos”, diz ao Globo o infectologista Marcos Boulos, que foi dispensado do Centro – numa comparação que consideramos… exagerada.

Não que Doria seguisse sempre as recomendações dos especialistas – ainda segundo Boulos, a dissolução do grupo já era esperada há algum tempo, justo por conta disso. A flexibilização geral iniciada esta semana, por exemplo, não teria passado pelo Centro. Segundo outro ex-membro, Doria afirmou aos participantes que era preciso “um maior alinhamento com as demandas e necessidades do governo”. Já o governo refuta essa acusação, indicando que a mudança reflete um novo momento da pandemia no estado, com queda de casos, internações e mortes, e que “não se pode esperar que um grupo tão grande continue atuando pro bono por mais tempo”. 

CONFIRMOU

Os senadores integrantes da CPI da Covid pretendem denunciar Jair Bolsonaro por falsificação de documento público e crime de responsabilidade no caso do falso documento do TCU com informações infundadas sobre a notificação de mortes por covid-19. Isso depois do depoimento de Alexandre Marques auditor do Tribunal de Contas da União (TCU), ontem. Ele não trouxe muitas surpresas, mas confirmou que Bolsonaro alterou seu documento com informações falsas sobre a suposta supernotificação de mortes na pandemia, para dar a ele ares de estudo oficial do TCU. 

 

 

A novidade é que Bolsonaro, aparentemente, confirmou o feito. O senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP), vice-presidente da CPI, exibiu vídeo de uma das lives do presidente em que ele insiste na tese da supernotificação e na existência de “dados que irão aparecer”, afirmando textualmente que a tabela que comprovaria a suposta fraude nos números foi feita por ele, e não pelo TCU. “Errei quando falei do TCU. A tabela não é do TCU, foi feita por mim. Me desculpa aí o TCU”, disse o presidente.  

O crime de falsificação de documento público tem pena de dois a seis anos mais multa, podendo ser aumentada em um sexto quanto o autor, o que é o caso de Bolsonaro, é funcionário público. 

Em tempo: na programação de hoje na CPI, está o depoimento de Tulio Silveira, advogado da Precisa, a empresa intermediária acusada de irregularidades no caso Covaxin. Reportagem da Folha revelou que a Precisa e a Envixia Pharmaceuticals, intermediária dos Emirados Árabes Unidos, esperavam receber comissões de até US$ 23 milhões com a venda da vacina ao governo Bolsonaro.

PARA NÃO REMEDIAR

Um grupo de pesquisadores liderado pelo Instituto de Saúde Global da Universidade Harvard, de Cambridge (EUA) lança hoje um relatório avaliando o risco de enfrentarmos novas pandemias e apontando as principais recomendações para evitá-las. Segundo o estudo, o principal problema a ser enfrentado é o chamado spillover (transbordamento), que é como os biólogos chamam o processo de transmissão de vírus ou outros agentes infecciosos de um animal para um humano.

A principal conclusão é que são necessárias medidas para restringir o contato de pessoas com animais hospedeiros de vírus. Como conta a reportagem  d’O Globo, em termos gerais, o custo seria pequeno: US$ 22 bilhões por ano, apenas 2% das perdas econômicas globais causadas pela pandemia da covid-19. 

Segundo os pesquisadores, em média dois casos de spillover são registrados por ano, mas é muito difícil antecipar quais eventos serão localizados e quais se tornarão epidemias ou pandemias. De todo modo, ressaltam que hospedeiros como morcegos, macacos, roedores e aves aquáticas merecem atenção especial. Junto a isso, há que se olhar para os animais domesticados: é que só metade dos vírus que transitam de animais para humanos saem da natureza. Os rebanhos da pecuária em larga escala teriam, assim, que entrar no radar. 

Para o professor de Harvard que coordenou a força-tarefa, Aaron Bernstein, atualmente os esforços se concentram principalmente em tentar frear as epidemias depois que o vírus salta para um humano. Mas, segundo ele, preservar biomas, parar o desmatamento e manter animais em seus habitats seria muito mais econômico e eficiente para enfrentar o problema. 

DIA DE MOBILIZAÇÕES

O dia de hoje foi escolhido pelas centrais sindicais e os servidores públicos federais como uma data unificada de greves e paralisações contra a PEC da Reforma Administrativa. A expectativa é que servidores de todo o país e das esferas municipal, estadual e federal se somem ao 18A, que pretende parar a tramitação da Proposta de Emenda Constitucional 32/2020. 

A pauta, carro-chefe de Paulo Guedes, ministro da Economia, está atualmente na na Câmara e pode ser votada até o final deste mês em comissão especial. Entre as medidas previstas pela reforma, estão a precarização do trabalho dos servidores, com congelamento de salários e corte de licenças historicamente adquiridas; a criação dos chamados “instrumentos de cooperação”, que prevêem o compartilhamento de serviços entre entidades públicas e privadas e são vistos pelas centrais como formas de privatização do serviço público; e o fim da estabilidade dos servidores. 

O diretor-executivo da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Pedro Armengol, declarou ao Brasil de Fato que é importante entender a estabilidade não como proteção individual ao servidor, e sim ao cidadão. Segundo Armengol, é ela que garante a autonomia e isenção ao agente público para prestar serviços à sociedade sem sofrer coações de governos e “sem atender interesses fisiológicos e eleitoreiros”.  o tema vem ganhando destaque durante a CPI da Covid, quando denúncias feitas por servidores públicos que gozam de estabilidade revelaram temas centrais para as investigações. 

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04
Jul21

Grupo evangélico fez oferta paralela de vacinas ao Ministério da Saúde e prefeituras

Talis Andrade

Grupo comandado por pastor foi ao Ministério junto a Dominguetti e ofereceu doses de Astrazeneca e Johnson em parceria com Davati

 

por Alice Maciel e Bruno Fonseca /Agência Pública

Comitiva de pastor, militar da FAB e Dominguetti tentou negociar vacinas +
Grupo evangélico ofereceu doses ao valor de US$ 11 a unidade +
Outro representante da Davati procurou Pazuello para vender Astrazeneca +
 
 

Em março, uma organização evangélica que articulou a aquisição de vacinas com o Ministério da Saúde (MS) ofereceu imunizantes da AstraZeneca e da Johnson para prefeituras e governos estaduais junto à Davati Medical Supply, revela apuração exclusiva da Agência Pública. A reportagem teve acesso à carta encaminhada aos prefeitos e governadores pela Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah) — presidida pelo reverendo Amilton Gomes de Paula — na qual a entidade oferece as doses no valor de US$ 11 a unidade, com prazo de entrega de até 25 dias. O valor seria 3 vezes maior que o fechado pelo Governo Federal para a mesma vacina da AstraZeneca com a Fiocruz, que foi de US$ 3,16, e o dobro do valor do Instituto Sérum, de US$ 5,25.CPI da Pandemia: Grupo evangélico fez oferta paralela de vacinas ao  Ministério da Saúde e prefeituras | Atualidade | EL PAÍS Brasil


Reprodução da carta enviada pela Senah

 

Conforme a apuração, a carta da Senah teria sido enviada a diversas prefeituras da região Sul do país. Uma delas foi parar em Ijuí, município de pouco mais de 80 mil habitantes no noroeste do Rio Grande do Sul. A Agência Pública conversou com Luciana Bohrer (PT), vereadora do gabinete coletivo das Gurias, na cidade. Ela conta que tomou conhecimento da oferta por meio de uma pessoa ligada à Senah e que não teve contato com representantes da Davati.

Na época, de acordo com a vereadora, a organização evangélica junto à Davati já haviam tentado “por mais de trinta dias” negociar diretamente em reuniões com o Ministério da Saúde em Brasília, mas não teria obtido sucesso. “Eram 400 milhões de doses, que eu me lembre, ainda seria fechado em quatro pacotes de 100 milhões”, diz Bohrer. A carta da entidade chegou à vereadora de Ijaí no dia 23 de março de 2021 e foi encaminhada ao prefeito Andrei Cossetin, do Progressistas (PP). Segundo Bohrer, a negociação não foi para frente. Procurada pela reportagem, a assessoria do prefeito afirmou que ele estava em viagem e não respondeu até a publicação da reportagem.

O reverendo Amilton Gomes, fundador e presidente da Senah, esteve no Ministério da Saúde, conforme fotos publicadas em suas redes sociais no dia 4 de março de 2021. Na postagem ele afirma que se reuniu com representantes da pasta “para articulação mundial em busca de vacinas”. Na visita, estava ao seu lado o policial militar de Minas Gerais cabo da PM Luiz Paulo Dominguetti, que afirmou à Folha de S. Paulo que o diretor do Departamento de Logística (DLOG) do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias, teria cobrado propina para compra de vacinas . Também esteve na visita o major da Força Aérea Brasileira (FAB) Hardaleson Araújo de Oliveira, antigo conhecido do pastor.

 
Na foto, o pastor Amilton Gomes, da Senah, em visita ao Ministério da Saúde junto a Dominguetti (o primeiro da foto à esquerda), o diretor do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis, Lauricio Monteiro Cruz (ao meio) e major da Força Aérea Hardaleson Araújo de Oliveira (segundo à direita)

Pastor Amilton Gomes no Ministério da Saúde

Pastor Amilton Gomes foi à vigilância sanitária do Ministério da Saúde tentar articular vacinas, junto a major da Força Aérea Brasileira

A carta da Senah encaminhada aos gestores é assinada por Amilton Gomes e indica um e-mail da organização religiosa, da Davati e do empresário Renato Gabbi como contatos para “maiores esclarecimentos”. Gabbi é dono de um bar em Chapecó, em Santa Catarina. A reportagem procurou o empresário, que não respondeu até a publicação.

Roberto Dias, que foi indicado ao cargo pelo líder de governo na Câmara, Ricardo Barros (PP/PR), foi exonerado nesta quarta-feira (30/06), após denúncia do jornal.

Também teriam participado desse encontro, segundo Dominguetti, o tenente-coronel Marcelo Blanco, que era assessor do DLOG na gestão de Roberto Dias, e um empresário de Brasília.

 
Organização evangélica com sede no DF, citada na CPI da Covid, ofereceu  vacinas por US$ 11 para municípios | Distrito Federal | G1
 
Pastor Amilton Gomes ao lado do senador Flávio Bolsonaro
 

Líder da Senah criou frente parlamentar religiosa

 

O reverendo Amilton Gomes parece ter bom trânsito no meio político de Brasília. Em suas redes sociais ele tem fotos com o filho do presidente Jair Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro (Patriota/RJ), como mostra a imagem acima, publicada em junho de 2019. Em uma outra postagem de maio daquele ano, o religioso comemorou receber uma moção de louvor na Câmara dos Deputados. Recentemente, o pastor apareceu na divulgação da “Conferência Nacional de Liderazgo” ao lado da deputada federal bolsonarista Carla Zambelli (PSL/SP).

Amilton Gomes participou ainda da criação da Frente Parlamentar Mista Internacional Humanitária pela Paz Mundial (FremhPaz) junto ao pastor Laurindo Shalom, da Associação Internacional Cristã Amigos Brasil-Israel, e do deputado federal Fausto Pinato (PP/SP), em 17 de setembro de 2019.

No estatuto da frente, a Senah aparece com a missão de dar apoio jurídico “para pessoas e comunidades em situações de guerras, calamidades, e aos refugiados, em ajudas humanitárias nacionais e internacionais”. No mesmo artigo do estatuto, que trata da cooperação interdisciplinar, diz que a frente irá “fomentar e financiar cursos de formação na temática da proteção à liberdade religiosa e aos refugiados, especialmente por meio da Senar [atual Senah], promovendo o intercâmbio de experiências nacionais e internacionais”. A entidade também integra o conselho consultivo da frente.

A Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários, que até o ano passado se chamava Secretaria Nacional de Assuntos Religiosos, foi fundada por Amilton Gomes em 1999. “Hoje nosso DNA está na cultura pela paz mundial, na fomentação de apoio ao meio ambiente, sempre buscando meios sustentáveis para o desenvolvimento da sociedade harmonizando Homem e Meio Ambiente”, informa em sua página na internet a entidade que tem sede em Brasília.

Líder da Igreja Batista Ministério da Nova Vista, Amilton Gomes também foi cabo do Exército, na década de 1990. Ele publicou imagens do Movimento Cristão Conservador Brasileiro com sua assinatura e sua foto e se apresenta como reitor da Faculdade Batista do Brasil, além de participar da direção de entidades de psicologia, como, por exemplo, a Sociedade de Psicologia do Centro-Oeste.

Procurado, Amilton Gomes confirmou as negociações e a visita ao Ministério da Saúde.

 
 
Amilton Gomes, foi homenageado no Congresso e participou de criação de Frente Parlamentar 
 

Davati procurou Pazuello para vender vacinas

 

Também em março, um representante oficial da Davati Medical Supply procurou o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello enquanto ele chefiava o ministério para negociar a venda de vacinas, revelam documentos que Pública acessou via consulta de Acesso à Informação do governo federal.

De acordo com a troca de emails, o advogado Julio Adriano de Oliveira Caron e Silva procurou Pazuello no seu email oficial da pasta no dia 9 de março deste ano. Na mensagem ele oferecia 300 milhões de doses da vacina AZD1222, da Astrazeneca, para compra imediata pelo Ministério da Saúde. O advogado informou que representava a empresa Davati Medical Supply LLC.

Em entrevista à reportagem, Adriano Caron confirmou representar a Davati. Documento da empresa também o confirma como representante no Brasil. Não há menção a outros representantes, como Luiz Paulo Dominguetti Pereira.

O advogado disse não conhecer Dominguetti. “Como a empresa me deu uma autorização de apenas representá-la aqui e oferecer as vacinas, eu não sei se ela fez isso com outras pessoas. Talvez tenha feito, mas eu não conheço essa pessoa, não sei das relações dele com o governo”, disse.

Caron também disse desconhecer qualquer operação da empresa e de que a Davatti estaria ofertando a vacina da Johson.

O email enviado por Caron ao Ministério da Saúde foi respondido no dia seguinte, 10 de março, pelo chefe de Gabinete do Ministro de Estado da Saúde, o capitão Paulo César Ferreira Junior. O militar está à frente do gabinete desde maio de 2020, quando Pazuello se tornou ministro. Homem de confiança de Pazuello, ambos estiveram na intervenção federal em Roraima, em 2018, e receberam a Ordem do Mérito Forte São Joaquim.

Em resposta ao advogado, o capitão pediu uma carta de autorização da Astrazeneca que concordasse com a intermediação da Davati. Caron disse à Pública que as negociações não avançaram porque a empresa não o retornou com os documentos solicitados pelo Ministério da Saúde.

“Dando seguimento com a Davati, pedindo maiores informações sobre as vacinas, eles não conseguiram me confirmar a disponibilidade do estoque e nem de que eles estavam autorizados pela empresa de vender vacinas aqui no Brasil, então o negócio não seguiu em frente”, justificou Caron. “Não marquei reunião nenhuma e a conversa não seguiu em frente”, acrescentou. Ainda segundo o advogado, “a Davati deixou bem claro que iria buscar junto à fabricante das vacinas toda a documentação necessária para vender”. “Se ela estava tentando negociar com a Astrazeneca a possibilidade de oferecer essas vacinas para o Brasil, ou qualquer outro país, e ela não conseguiu por algum motivo, talvez seja esse o motivo de que ela não me mandou a informação porque o negócio seria fechado com a Astrazeneca, a Astrazeneca que iria fornecer a vacina. Se ela não conseguiu autorização da Astrazeneca para vender, parou de me mandar informação e eu não poderia vender um produto que ela não tinha”.

 

Linha do tempo

 

25 de fevereiro — segundo Dominguetti, diretor de logística do MS pediu propina para oferta de vacinas feita em nome da Davati 4 de março — pastor Amilton Gomes da Senah posta foto no MS e anuncia articulação para vacinas 23 de março — carta da Senah assinada por Amilton Gomes chega a Ijaí oferecendo vacinas da Davati

4 de março —  pastor Amilton Gomes da Senah posta foto no MS e anuncia articulação para vacinas

23 de março — carta da Senah assinada por Amilton Gomes chega a Ijaí oferecendo vacinas da Davati

 

Colaborou Bianca Muniz

28
Jun21

A duradoura e livre sabotagem a vacinas não veio (só) do negacionismo

Talis Andrade

 

por Janio de Freitas

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É bandidagem muito lucrativa, para a qual o autoritarismo e a intimidação servem, além do que lhes é próprio, de instrumento múltiplo

Na Folha

Por trás dos milhões de mortes, o desespero brasileiro pelas vacinas sabotadas. Por trás das duas imposições trágicas, uma fortíssima ação quadrilheira a causá-las e explorá-las. Jair Bolsonaro está em fuga, como o Lázaro nas matas de Goiás. Com a diferença de que centenas de policiais caçam um serial killer, e o outro tem a Polícia Federal sob controle e a favor também dos comparsas.

Aconteciam coisas nos três dias anteriores ao vazamento do tumor lancetado pelos irmãos Miranda. Atitudes disfarçadas, fora de sintonia com as circunstâncias e, no entanto, sugestivas de serem assim por intenção. Nenhuma resposta do vice Hamilton Mourão a Roberto D’Ávila, por exemplo, dispensou uma mensagem inexplícita, mas inequívoca. O homem calmo, “de direita em economia”, mas “não na vida em geral”, ao lado de Bolsonaro por lealdade. E “se o substituir” —o restante nem importa.

No mesmo dia, Arthur Lira, presidente da Câmara no velho estilo, saía dizendo a Evandro Éboli e Thiago Bronzatto patatices ostensivas, mas não gratuitas. “A CPI é um erro”, “não vai trazer efeito algum”, “falta circunstância” para impeachment, “não houve demora para compra de vacinas”. “Não sou governo”, mas age para e com Bolsonaro. Nada firme, tudo maleável, lá e cá. Assim, nessa hora, nada é de graça em quem ocupa posto de observação privilegiada. Como dizendo vários “olha, eu não estou na armação do que está vindo aí”.

Não precisariam estar. As revelações enfim encontraram o caminho certo. O governo de Bolsonaro não é só um bando de saudosistas da ditadura a empurrar a democracia de volta ao abismo. Ligações com milicianos, compras sucessivas de imóveis, facilidades ao desmatamento ilegal e ao contrabando de madeira, como ao garimpo ilegal e ao contrabando de ouro, negócios com cloroquina aqui e no exterior, desvio de dinheiro público em Câmaras, todas as medidas necessárias para bloquear a ação legal das polícias, e mais e mais. Nada disso vem da índole autoritária: é bandidagem muito lucrativa. Para a qual o autoritarismo e a intimidação servem, além do que lhes é próprio, de instrumento múltiplo.

Avançar no caminho certo será descobrir que a duradoura e livre sabotagem a vacinas não veio (só) do negacionismo. Foi, também ou sobretudo, tática de negócio sujo. Pfizer, Oxford-Astrazeneca, Johnson & Johnson, Moderna, Sputnik V e Covax têm em comum a negociação direta com o governo: sem intermediários, pois. Só a Covaxin teve intermediação. De trapaceiros, empresas de fachada, fraudadores de dados contratuais e já autores de um golpe de R$ 20 milhões no Brasil. E cheios de conexões entre políticos e empresários.

“O rolo é coisa do Ricardo Barros” —Bolsonaro tenta lavar as mãos em resposta aos Miranda denunciantes do golpe agora de R$ 1,61 bilhão (cada dose ao preço de quatro da Astrazeneca). Ricardo Barros era o ministro da Saúde no governo Temer e operador do desvio impune dos R$ 20 milhões. Mas Bolsonaro mente. O rolo não é só do deputado por ele designado, vê-se que em escolha precisa, para líder do governo na Câmara. Ou representante maior do próprio Bolsonaro entre os deputados.

O general Eduardo Pazuello, os coronéis Alex Lial Marinho, Elcio Franco e Marcelo Bento Pires, da tropa posta no Ministério da Saúde, e integrantes da atividade para apressar (caso único) o negócio com a Covaxin, são parte do grosso rolo. Arthur Lira foi informado pelo deputado Luis Miranda da tramoia em curso no Ministério da Saúde, mas se recusou a tratar do assunto e não cumpriu o dever funcional e indispensável de acionar a Polícia Federal. Bolsonaro nem precisaria envolver-se com a tramoia para se tornar mais vulnerável ao Código Penal do que qualquer dos outros. Uma fala do seu diálogo com os Miranda é suficiente: “Vocês sabem quem é, né? Se eu mexo nisso aí você já viu a m. que vai dar, né?”.

Deixa correr, é o que diz a melhor linguagem de Bolsonaro, na qual reduzi uma palavra. Mais de um crime em uma só frase. E ainda a mentirosa afirmação de recurso à Polícia Federal —se feito, foi para determinar ao diretor da PF o desconhecimento do caso.

Da dispensa de Ricardo Salles, planejada entre eles para emergências, ao que fizer agora, Bolsonaro está em fuga. Porque, em dois meses a CPI da Covid deu ao Brasil, e aos cidadãos responsáveis, o que o restante do país lhes negou, por interesse e covardia, durante dois anos e meio.Image

Janio de Freitas: Os críticos do ódio vigente são, muitos deles, produtores do ódio

Tudo o que se refere a Lula é uma comprovação dessa deformidade difundida também na chamada mídia

Na Folha

Os críticos do ódio vigente são, muitos deles, produtores do ódio. Tudo o que se refere a Lula é uma comprovação dessa deformidade difundida também na chamada mídia. O reconhecimento, pela maioria do Supremo, da parcialidade persecutória de Sergio Moro a Lula foi tratado por uma comentarista de TV, no seu estilo conversa de comadre, nestes termos: o Supremo “vai passando a boiada”. Cada ministro igualado ao boiadeiro Ricardo Salles, candidato às grades.

Logo um comentarista fez sua reflexão do decidido pelo Supremo: “Destruiu todo o sistema de combate à corrupção”. Se existisse, o sistema não teria permitido a corrupção que a CPI da Covid o levou a comentar, logo em seguida.

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Transcrito do Combate

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