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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

18
Nov22

O que fazer com o exército de apaniguados de Bolsonaro pendurados no Governo?

Talis Andrade

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A pergunta que não cala: os militares vão continuar lançando sua sombra sobre a democracia brasileira? A malandragem vai parar?

 

por Jose Cassio /Diário do Centro do Mundo

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva vai precisar de tato para lidar com os militares agarrados em cargos de confiança no Executivo e nas estatais. Mais do que isso. Para o cientista político João Roberto Martins Filho, terá de contar com muita “virtú” – termo usado por Maquiavel, que tem significado de competência, astúcia, poder de efetuar mudanças e controlar eventos.

Doutor em sociologia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e professor titular sênior do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Martins Filho é referência em pesquisas sobre o governo militar. Foi criador do Arquivo de Política Militar Ana Lagôa e o primeiro presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (2006-2008).

Para ele, ainda é difícil prever a forma como se expressará a questão militar no governo Lula. O que se tem por certo é que os chefes militares se associaram intimamente à campanha eleitoral e ao governo de Bolsonaro e é possível que procurem manter as conquistas corporativas.

“Como recompensa, a carreira militar foi excluída da reforma da Previdência e ganhou uma reestruturação que beneficiou significativamente os soldos dos escalões superiores”, comenta.

Conforme o pesquisador, a presença de milhares de oficiais das três forças em cargos de confiança do governo poderia ser facilmente resolvida com a substituição da maioria deles.

O grande entrave, o que realmente seria de mais difícil resolução, é o que o sociólogo chamou, em artigo recente de sua autoria, de “problema militar”, que em sua opinião “continuará lançando sua sombra sobre a democracia brasileira”.

Ele explica que o termo “problema militar” engloba algo mais profundo e complexo. “O que queremos de nossas FFAA? Como afastá-las da política? Como fazê-las obedecer ao poder civil? Esse deve ser o verdadeiro problema a ser resolvido e para isso será necessária muita virtú, engenho e arte.”

Martins Filho afirma que certamente haverá antipatia dos comandos militares ao governo de Lula. Ele acredita que na primeira oportunidade, poderão criar problemas ao presidente. Seria oportuno, segundo o pesquisador, que o petista aproveitasse a trégua da vitória para tomar algumas medidas de imediato.

As relações da caserna com governos do PT, na verdade, nunca teriam se aprofundado. Martins Filho diz que não houve uma política militar no governo Lula, e sim uma postura de evitar conflitos e conceder armamentos.

Não teria ficado claro o que o poder civil queria do instrumento militar – o que teria se evidenciado pela constante troca de ministros da Defesa, ainda que nenhum general tenha sido chamado para comandar a pasta. As relações se azedaram na gestão de Dilma Roussef, com a criação da Comissão da Verdade. Foi o bastante para que os chefes militares declarassem guerra do PT.

“Desta feita, não será possível alegar inocência quanto às ideias e atitudes que predominam na caserna”, considera o sociólogo. “Um dos efeitos negativos da aposta militar em Bolsonaro foi que, com isso, os chefes militares deixaram à vista seu modus operandi. Só não vê quem não quer.”

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31
Mar21

“Cúpula das Forças Armadas havia decidido desembarcar do governo Bolsonaro desde o ano passado”, diz especialista

Talis Andrade

O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, ao lado do então Comandante da Força Aérea Brasileira, Antonio Carlos Moretti Bermudez, do Comandante das Forças Navais do Brasil, Almirante Ilques Barbosa Junior, Fernando Azevedo e Silva, então nomeado Ministro da Defesa,  e do Comandante do Exército Brasileiro Edson Leal Pujol no Comando da Aeronáutica em Brasília.

 

Historiador Francisco Teixeira mantém interlocução com oficiais e afirma que demissão de Ministro da Defesa teve a ver com celebrações de 31 de março


por Natalia Viana /Agência Pública


* Recusa de Ministro da Defesa a celebrar golpe de 64 foi elemento para demissão, diz especialista
* “As Forças Armadas não estão com Bolsonaro numa aventura golpista. Mas também não estão disponíveis para dar um golpe contra Bolsonaro”
* Com nomeação de novo comandante, Bolsonaro pode “fazer uma limpeza no Exército”, diz especialista


O historiador Francisco Teixeira dedicou sua vida a ampliar o conhecimento dos militares entre os civis e vice-versa. Foi presidente do Instituto Pandiá Calógeras de Estratégia Internacional do Ministério da Defesa durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, é professor emérito do Programa de Pós-Graduação em Ciências Militares da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME) e professor titular de História Moderna e Contemporânea da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Ele conta, entre seus amigos, com diversos oficiais com quem mantém interlocução. Para ele, o desejo de Bolsonaro de celebrar o 31 de março em grande estilo – motivo pelo qual a AGU (Advocacia Geral da União) foi até a Justiça – é “sem dúvida” um dos elementos que levou à demissão do general Fernando Azevedo do Ministério da Defesa. “Com certeza o Fernando recusou envolver o Exército numa comemoração do Bolsonaro”, diz.

A Ordem do Dia, assinada pelo general Braga Netto, que assumiu o posto no ministério da Defesa, determina que os quartéis “celebrem” o dia 31 de março. “Desde que o Bolsonaro chegou ao poder, ele colocou o 31 de Março de 64 numa vitrine de novo”, diz o professor. “Era algo que estava no passado, meio sepultado. Era um tema pra nós, historiadores e cientistas sociais e o Bolsonaro trouxe tudo isso de volta, e da pior forma possível”.

Segundo ele, “isso era tudo o que o Exército não queria”. “Começou a ser discutido desde tortura até leite condensado”, diz na entrevista a seguir. Francisco garante que não há nenhum elemento para dizer que há ânimos golpistas nas Forças Armadas de hoje, que são muito diferentes das de décadas atrás. Mas avisa: “As Forças Armadas não estão com Bolsonaro, pelo menos os comandos, não estão com  Bolsonaro numa aventura golpista. Mas também não estão disponíveis para dar um golpe contra Bolsonaro”.

Historiador Francisco Teixeira mantém interlocução com oficiais e afirma que demissão de Ministro da Defesa teve a ver com celebrações de 31 de março
Como você interpreta esse movimento inédito de demissão dos 3 comandantes das Forças Armadas? 

Até então não tínhamos claro o quadro de uma crise militar. Mas agora a gente tem. Já vinha se avolumando esse mal-estar entre a cúpula das Forças Armadas – não  seu conjunto, mas a cúpula – com o governo Bolsonaro. 

Não havia exatamente um rompimento. Havia um mal-estar, também não tem uma data ou fato isolado – ao contrário de várias coisas que vêm sendo publicadas – mas era um quadro geral que incluía vários elementos. 

Sem dúvida, a atuação do Pazuello no Ministério da Saúde e a insistência do Bolsonaro em envolver as Forças Armadas no Ministério foi um elemento de profundo desagrado, mas também a forma geral do presidente, a linguagem do presidente sobre a pandemia. Construiu-se uma coisa meio caricata, mas aos poucos se tornou uma coisa muito desagradável para os oficiais superiores das Forças Armadas.

Natalia Viana entrevista historiador Francisco Teixeira

francisco-carlos-teixeira-da-silva.jpgHistoriador Francisco Teixeira mantém interlocução com oficiais e afirma que demissão de Ministro da Defesa teve a ver com celebrações de 31 de março

Como você interpreta esse movimento inédito de demissão dos 3 comandantes das Forças Armadas? 

Até então não tínhamos claro o quadro de uma crise militar. Mas agora a gente tem. Já vinha se avolumando esse mal-estar entre a cúpula das Forças Armadas – não  seu conjunto, mas a cúpula – com o governo Bolsonaro. 

Não havia exatamente um rompimento. Havia um mal-estar, também não tem uma data ou fato isolado – ao contrário de várias coisas que vêm sendo publicadas – mas era um quadro geral que incluía vários elementos. 

Sem dúvida, a atuação do Pazuello no Ministério da Saúde e a insistência do Bolsonaro em envolver as Forças Armadas no Ministério foi um elemento de profundo desagrado, mas também a forma geral do presidente, a linguagem do presidente sobre a pandemia. Construiu-se uma coisa meio caricata, mas aos poucos se tornou uma coisa muito desagradável para os oficiais superiores das Forças Armadas.

Além disso, contribuiu também a falta de uma política para a pandemia e o acúmulo de mortos, já que as forças têm uma tradição cientificista, positivista, muito grande. Isso que as pessoas normalmente fazem piada, de que os soldados ficam pintando quartel, pintando árvores, pintando calçada, na verdade, é um conjunto muito grande de normas de higiene, de saúde, de limpeza.  

Então, quando o presidente fez piadinhas sobre a pandemia isso se chocou muito com esse ethos das Forças Armadas. O presidente desconhece esse perfil, essa característica das forças. 

Também, ele optou por falar insistentemente pelo Exército, tentou trazer a instituição para o campo pessoal, uma instituição que serve à nação, uma instituição de Estado, querendo transformá-la numa milícia, numa instituição dele. 

 

Mas houve também uma aliança com o Exército em relação ao combate à Covid, expressa no fato, por exemplo, que o general Pazuello continuou na ativa – dizem que com apoio de Pujol – e na fabricação de milhares de comprimidos de cloroquina…  

Olha, o Bolsonaro pode ter ordenado alguma unidade do Exército a fabricar cloroquina, mas em relação à tropa eles continuaram tomando todas as medidas sanitárias. O Exército nunca aceitou essas práticas que ele pregava, inclusive o uso de máscaras e todas essas medidas sempre foram usadas pelo Exército, inclusive num encontro pessoal em maio de 2020, o general Pujol se negou a apertar a mão de Bolsonaro.

O Exército se distinguiu também na questão da política externa. As Forças Armadas sempre foram muito cuidadosas, elas são como um duplo do Itamaraty, porque são responsáveis pela defesa nacional, então elas sempre tiveram muitos seminários, simpósios, sobre política externa. E desde o início os oficiais ficaram horrorizados com a condução do Ernesto Araújo.  

Acho que não é à toa que no dia em que ele demite o Ernesto Araújo, ele tenha demitido também o general Fernando Azevedo. É como se ele dissesse, estou demitindo quem eu gosto, mas demito o general Fernando também. 

 

O senhor falava sobre o modo de falar de Bolsonaro, como ele é rechaçado pelos militares… 

Tem uma grande diferença aí entre o Comando do Exército, o Comando da Marinha e da Aeronáutica com os praças e sargentos. A fala de Bolsonaro para esses últimos sempre pareceu muito sedutora, e ele permanece como um “mito” para esses elementos mais subalternos das Forças Armadas.  Como também para PMs, para guardas municipais, para guardas de vigilância, para os quais ele continua falando de forma muito sedutora. 

E isso, inclusive, incomoda profundamente os altos oficiais das Forças Armadas. Eles já tinham tomado a decisão, desde o final do ano passado, de desembarcar do governo Bolsonaro. Mas essa decisão não era espalhafatosa, não seria uma declaração pública. Era algo que ia ser feito e estava sendo feito de uma forma bastante discreta.

 

Como? 

Principalmente, com a decisão de não participar de atos políticos e não endossar declarações do presidente da República. E parece que essa cisão se deu muito claramente no final do ano passado. O general Fernando Azevedo, ex-ministro da Defesa, é uma pessoa muito despolitizada, ao contrário do Pujol, que tem uma formação política importante. E o Bolsonaro, sem dúvida nenhuma queria declarações políticas, principalmente numa semana que é o aniversário do 31 de março. Ele estava procurando isso, foi até a Justiça para poder comemorar o golpe. 

 

Ou seja, um dos elementos da demissão teria sido por que o general Fernando negou-se a celebrar de maneira enfática o Golpe de 64? 

Isso foi um elemento, sem dúvida. O Bolsonaro foi à Justiça pedir o direito de comemorar o 31 de março, e de forma absurda a justiça concedeu esse direito. Com certeza o Fernando recusou envolver o Exército numa comemoração do Bolsonaro. Agora veja uma coisa: desde que o Bolsonaro chegou ao poder, ele colocou o 31 de março de 64 numa vitrine de novo.

O 31 de março sempre tem a Ordem do Dia que é lida pelas Forças. Mas é algo discreto. Era um comandante, às vezes nem um comandante, um oficial de dia lendo uma ordem do dia dentro de um quartel para recrutas. 

Era algo que estava no passado, meio sepultado. Era um tema pra nós, historiadores e cientistas sociais. A maioria das pessoas não tinha nem ideia do que era o AI-5 e o que aconteceu exatamente no dia 31 de março. O Bolsonaro trouxe tudo isso de volta, e da pior forma possível. 

Colocou isso na vitrine, e ao colocar na vitrine, ele trouxe de volta os relatos, os torturados, e as memórias. Eu mesmo acabei publicando um livro sobre isso com o professor João Roberto Martins, outros livros e depoimentos foram publicados. 

Ele, o filho dele, o general Heleno, trouxeram isso de volta e criaram uma polêmica histórica e política, principalmente em torno do AI-5. 

E isso era tudo o que o Exército não queria. Começou a ser discutido desde tortura até leite condensado. Que ganho o Exército tem com isso?

O que as Forças Armadas ganharam com Bolsonaro trazendo o 31 de Março, fazendo um escândalo, desafiando pessoas? Pessoas que foram torturadas, desde Miriam Leitão, Vitória Grabois, pessoas que foram presas como eu. Quando ele diz que não houve nada, aí nos obriga a dizer: houve. 

Quando ele vira para o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz e diz, “eu sei como seu pai desapareceu e onde ele está enterrado”… Foi um inferno para as Forças Armadas. Uma provocação. 

Quer dizer, quem provocou todo esse debate de novo foi o próprio presidente da República. Na maioria dos países civilizados, defender tortura, ditadura, Golpe de Estado, é crime.

Se fosse num país como a Alemanha, ele teria sido preso. Em um país como a Espanha, que tem uma Lei da Memória Histórica, que leva a multas altíssimas apologia a Franco [general], ele teria sido afastado do cargo. [Continua]

 

30
Mar21

Troca na Defesa denuncia crise militar e marca divisão entre generais sobre radicalismo de Bolsonaro

Talis Andrade

Saída de ministro e comandantes das Forças Armadas pega o país de surpresa e abre incógnita sobre as apostas do presidente, pressionado pelo Centrão e o setor econômico

 

 
- - -

A segunda-feira parecia agitada pela notícia da saída do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. Mas foi a carta de demissão do ministro da Defesa, Fernando Azevedo, que revelou o tamanho do caos no Governo Bolsonaro. Num momento de turbulências em Brasília com a pressão pela gestão pífia da pandemia de covid-19, a saída de Azevedo, amigo de longa data do presidente Jair Bolsonaro, mostrou que a estabilidade do Governo está cambaleante neste final de março. A leitura é clara: quando o ministro que dirige as Forças Armadas pede para sair de um Governo dominado por militares há uma discrepância maior do que parecia sobre os rumos da instituição. O anúncio de última hora de uma reunião dos três comandantes das Forças Armadas aumentaria a tensão. Nesta terça, confirmou-se que o trio desembarca do Governo Bolsonaro. “O Ministério da Defesa (MD) informa que os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica serão substituídos. A decisão foi comunicada em reunião realizada nesta terça-feira (30), com presença do Ministro da Defesa nomeado, Braga Netto, do ex-ministro, Fernando Azevedo, e dos Comandantes das Forças”, avisou o comunicado.

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“Esta é uma crise militar séria”, diz João Roberto Martins Filho, estudioso das Forças Armadas no Brasil, organizador do livro recém lançado Os militares e a crise brasileira (Alameda Editorial), comentando sobre a então possível renúncia conjunta dos chefes das três armas, que pode acontecer já na manhã desta terça-feira, segundo o jornal Folha de S.Paulo. “É a primeira vez desde a redemocratização que acontece isso. O que falta desvendar é o que Bolsonaro vai fazer”, diz Martins Filho. Ao que tudo indica, a falta de posicionamento diante de anúncios radicais do Governo Bolsonaro estaria cobrando seu preço, culminando na saída de Azevedo

Em meio ao anúncio de saída de outros ministros, foi a queda do ministro da Defesa a que mais deixou atônitos os brasileiros. Três generais de reserva ouvidos pela reportagem nesta segunda souberam pela imprensa que ele estava saindo e se disseram surpreendidos. Dois preferiram não comentar até se inteirar melhor dos detalhes. As versões e especulações se multiplicaram com o passar das horas logo após a divulgação da carta de demissão por volta das 16h. De certo, o consenso de que algum limite foi ultrapassado para as forças militares, que já vinham desgastadas pelos erros no Ministério da Saúde e na gestão da proteção à Amazônia.

Desde o início do seu mandato, Bolsonaro abusou de impulsos autoritários, como falar no emprego do artigo 142, que supostamente daria poderes às Forças Armadas de intervir em outros poderes, assim como insuflou protestos contra o Supremo Tribunal Federal. Embora tenha sido brecado pela Corte, manteve sua postura de radicalismo para agradar sua base de eleitores. No dia 8 deste mês disse que “meu Exército não vai obrigar o povo a ficar em casa”, confrontando o lockdown proposto por governadores para estancar as mortes pela pandemia. “Este é um Governo disposto a qualquer coisa, não tem limites”, diz Martins Filho. “A questão agora é saber por que a instituição se afasta dele. Precisam se distinguir?”, questiona.

A crise militar chega num momento péssimo para o Brasil que já prevê uma terceira onda da pandemia. Péssimo também para o Governo Bolsonaro, que entregou a cabeça do ministro Ernesto Araújo depois de uma briga escancarada do diplomata com o Congresso e forçou uma reforma ministerial com troca em outras cinco pastas, além da Defesa. Por trás dessa troca açodada, está o papel do Centrão, o grupo de partidos que prometeu sustentação a Bolsonaro desde que a presidência do Congresso foi renovada.

O general da reserva Paulo Chagas acredita que a saída de Azevedo passa pelos acordos políticos do Governo. “A minha leitura pessoal é que o presidente quer mexer no time de ministros, mais fácil tratar com um contemporâneo seu”, diz Chagas, lembrando que a relação do ministro demissionário com Bolsonaro é de décadas e sempre foi muito boa, tanto do ponto de vista pessoal como profissional.

08
Jun20

General não político passou a ser uma exceção

Talis Andrade

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IV - "Militares não mudaram modo de pensar depois da ditadura"

Bruno Lupion entrevista João Roberto Martins Filho

 

Existe diferença de orientação política entre o Alto Comando e os oficiais de baixa patente?

Conforme vai baixando na hierarquia militar, há ainda mais apoio e identificação com Bolsonaro. Não por acaso, porque ele tem o ethos de capitão, e não o de general. O Alto Comando, muito sutilmente, já expressou uma insatisfação com a demissão do general Santos Cruz e com o fato de que há um general da ativa na Secretaria de Governo, o general Ramos. Há uma certa sensibilidade com atitudes do general Ramos, que está negociando com o Centrão cargos em troca de apoio para impedir o impeachment. Também pegou mal uma fala do Bolsonaro de que se ele mandasse os generais irem com ele a uma manifestação, eles teriam que ir. Mas foi isso mesmo que aconteceu, na manifestação do último domingo (02/06) ele exibiu, dentro do helicóptero em que estava, o ministro da Defesa [general Fernando Azevedo]. Filmaram a presença dele e usaram como propaganda.

 

O ministro da Defesa estava no helicóptero por um dever de obediência ao seu chefe ou por comungar da pauta da manifestação?

Os militares têm usado esse argumento de que, uma vez no governo, são obedientes, têm o dever de obedecer. Mas isso é falacioso, porque durante o governo da Dilma eles realizaram uma série de atos de insubordinação, inclusive do Mourão, mas também do general [Augusto] Heleno. Se o ministro da Defesa tivesse outra posição, ele poderia ter dito ao presidente que não ficaria bem para ele ir a uma manifestação dessas. Aí o Bolsonaro poderia demiti-lo, mas ele teria que arriscar.

 

O atual comandante do Exército, general Pujol, tem sinalizado algum distanciamento do presidente. Ele se diferencia dos demais generais do governo?

O general Pujol é um general profissional, é considerado um general não político. Isso até espanta, porque hoje em dia passou a ser uma exceção o general não político. Ele tem procurado manter uma certa distância. O Bolsonaro ameaçou tirar o Pujol e colocar o Ramos em seu lugar, mas pegou tão mal dentro da Força que ele continua lá. O Pujol representa talvez a mais leve esperança de profissionalismo diante de uma situação como essa. (Continua)

07
Jun20

Mourão é um lobo em pele de cordeiro

Talis Andrade

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III - "Militares não mudaram modo de pensar depois da ditadura"

Bruno Lupion entrevista João Roberto Martins Filho

E o general Santos Cruz, que foi ministro da Secretaria de Governo e saiu em junho de 2019, após virar alvo de ataques virtuais de apoiadores de Bolsonaro, e vem fazendo críticas ao governo? Ele também é alinhado a esse pensamento?

Tem dois generais, o general [Sérgio] Etchegoyen, que foi chefe do Gabinete de Segurança Institucional no governo Temer, e o general Santos Cruz, que têm dado entrevistas. Se você analisar as entrevistas, vai perceber que o que unifica o discurso deles é o antiesquerdismo, mesmo considerando que a centro-esquerda ficou no poder por 13 anos e não representou nenhuma ameaça concreta à democracia. O Santos Cruz tem uma mágoa profunda do entorno do governo, dos filhos do presidente, e você encontra críticas dele ao governo, mas não uma recusa ao governo em si e ao Bolsonaro. O presidente é poupado, porque no fundo para eles é um governo de direita e conservador que tem que ser apoiado, apesar dos seus problemas. Tanto o Etchegoyen quanto Santos Cruz falaram quase a mesma frase: o governo tem alguns erros, mas o tem mais acertos. É como se falassem: esse governo é ruim, mas é o nosso governo.

 

Como o senhor interpreta o vice-presidente Hamilton Mourão, que também tem publicado artigos e dado entrevistas com frequência?

O general Mourão foi um dos generais mais insubordinados durante a democracia. Inclusive pelas manifestações que fez, e que não poderia ter feito porque estava na ativa. Ele até prejudicou sua carreira por causa disso e foi sutilmente punido com perda de comando no Exército [em 2015, Mourão fez críticas à classe política e ao governo e convocou oficiais da reserva a um "despertar de uma luta patriótica", e em seguida perdeu o comando Militar do Sul e foi transferido a um cargo burocrático].

Não existe diferença nenhuma entre o que pensa o bolsonarismo e o que pensa o general Mourão. O Mourão é um lobo em pele de cordeiro. Ele não representa nenhuma garantia de que, se vier a ocupar a Presidência, o governo será diferente. Ele é um dos porta-vozes desse conservadorismo militar que venho definindo. (Continua)

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05
Jun20

"Militares não mudaram modo de pensar depois da ditadura"

Talis Andrade

 

bolsonaro revista.jpg"Quanto mais baixa a hierarquia militar, mais apoio a Bolsonaro"

 

Estudioso das Forças Armadas afirma que militares ainda estão presos na lógica da Guerra Fria e creem na ameaça de um "marxismo cultural". Mourão, porta-voz desse conservadorismo, é "lobo em pele de cordeiro"

 

Bruno Lupion entrevista João Roberto Martins Filho

A maioria dos militares brasileiros, de alta e baixa patentes, está hoje engajada numa versão renovada da luta contra o comunismo que guiava a ditadura militar (1964-1985). Em vez de defender o país da influência da União Soviética, extinta em 1991, caberia agora às Forças Armadas proteger a nação do marxismo cultural, que seria uma nova forma de ação do comunismo, expressa em movimentos por direito de minorias, contra o racismo e em defesa das mulheres. É o que aponta o sociólogo João Roberto Martins Filho, professor da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) que pesquisa as Forças Armadas há quatro décadas.

Essa ideologia começou a fazer a cabeça de militares nos anos 1990, mas eles se mantiveram relativamente silenciosos até o governo Dilma Rousseff, enquanto aparentavam se adaptar aos novos limites da democracia. Quando veio a crise de 2015, porém, "começou a brotar aquilo que estava recalcado", e em 2018 os militares aproveitaram a vitória de Jair Bolsonaro para voltar ao poder e implementar seu projeto, afirma Martins Filho em entrevista à DW Brasil.

O sociólogo aponta que um dos maiores porta-vozes desse novo conservadorismo militar é o vice-presidente, general Hamilton Mourão, que, na visão do pesquisador é "um lobo em pele de cordeiro" e não representa garantia de que, se vier a ocupar a Presidência da República, fará um governo diferente do de Bolsonaro.

Martin Filho cita um artigo do vice-presidente publicado nesta quarta-feira (03/06) no jornal O Estado de S. Paulo, no qual Mourão afirma que as manifestações do último fim de semana contra o governo não eram democráticas, mas compostas por "deliquentes" ligados ao "extremismo internacional" que deveriam ser reprimidos pelas polícias.

A tese bolsonarista de que o Supremo Tribunal Federal (STF) estaria realizando uma intervenção indevida no Poder Executivo tem apoio "quase unânime" nas Forças Armadas, diz Martins Filho. E há entre os militares simpatia à interpretação do presidente sobre o artigo 142 da Constituição, que o autorizaria a usar as Forças Armadas para "restabelecer a ordem" no país, inclusive contra o Poder Judiciário – tese rechaçada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e em um manifesto assinado por cerca de 700 juristas e advogados.

Com cerca de 3 mil militares cedidos ao governo federal e generais ocupando cinco cargos de primeiro escalão da gestão Bolsonaro (Secretaria de Governo, Gabinete de Segurança Institucional e ministérios da Casa Civil, Defesa e Saúde), os integrantes das Forças Armadas costumam dizer que foram convocados para uma missão e, por sua formação militar, devem obediência ao seu chefe, o presidente da República. Esse argumento é falacioso, e oculta uma identidade de propósito entre a caserna e Bolsonaro, diz Martins Filho.

Ele lembra que, no governo Dilma, houve casos de insubordinação à presidente, como do próprio Mourão – que na época era comandante militar do Sul e fez críticas ao governo e convocou oficiais da reserva a um "despertar de uma luta patriótica", sendo em seguida punido com a transferência para um cargo burocrático.

Questionado sobre os protestos de rua contrários ao governo convocados para o próximo final de semana, o professor da Ufscar diz ver risco de que as polícias militares – consideradas forças auxiliares das Forças Armadas, mas com um maior efetivo e ainda mais bolsonaristas – ajam com violência desproporcional contra os manifestantes. (Continua)

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