Agro é golpe - Proprietários de terra devem quase R$ 1 trilhão à União (dívida no governo Temer que se multiplicou no governo corupto militar de Bolsonaro)
Relatório da Oxfam revela dívidas astronômicas, que, se pagas, assentariam 214 mil famílias; e governo Temer quer anistiar setor
O agronegócio leva nas costas, como alegam seus defensores, as contas do Estado brasileiro? Segundo o relatórioTerrenos da desigualdade: terra, agricultura e desigualdade no Brasil rural, publicado pela Oxfam, não. Dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional mostram que 4.013 pessoas físicas e jurídicas detentoras de terra devem R$ 906 bilhões, uma dívida maior que o PIB de 26 estados.
O montante é equivalente ametadedo que todo o estado brasileiro arrecadou em 2015. Ou aproximadamente 22 petrolões.
Cada um dos 4.013 devedores tem dívidas acima de R$ 50 milhões. Segundo dados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), há um grupo ainda mais seleto de 729 proprietários que declararam possuir 4.057 imóveis rurais, somando uma dívida de R$ 200 bilhões. As terras pertencentes a esse grupo abrangem mais de 6,5 milhões de hectares, segundo informações cadastradas no Sistema Nacional de Cadastro Rural.
O Incra estima que com essas terras seria possível assentar 214.827 famílias – considerando o tamanho médio do lote de 30,58 ha/famílias assentadas. Em outras palavras, seria possível atender, com as terras dos maiores devedores do Estado brasileiro, o dobro das 120 mil famílias que estavam acampadas demandando reforma agrária em 2015.
Gráfico: Dívida Ativa da União X Reforma agrária
Em vez de cobrar os débitos, porém, o governo Temer editou em junho a Medida Provisória nº 733, concedendo mais privilégios ao setor. Segundo o relatório da Oxam, a MP permite que produtores rurais inscritos em Dívida Ativa da União e com débitos originários das operações de securitização e Programa Especial de Saneamento de Ativos liquidem o saldo devedor com bônus entre 60% a 95%. Por exemplo, dívidas acima de R$ 1 milhão devem ter descontos de 65%.
INJUSTIÇA FISCAL COM DESONERAÇÃO
O relatório aponta outra peculiaridade: a isenção de diversos impostos. A Lei Kandir, editada em 1996, isentou o pagamento de ICMS aos produtos primários e produtos industrializados e semielaborados destinados à exportação. Segundo o relatório, essa desoneração gera perdas em torno de R$ 22 bilhões por ano aos estados. Com promessa de ressarcimento. Entretanto, só são ressarcidos 12% da isenção. Em 2014, a bancada ruralista emplacou mais uma benesse fiscal para o setor: a isenção de 9,25% na cobrança do PIS e Confins na venda de soja para todos os fins comerciais.
O relatório alerta também para a ineficácia do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR), principal tributo no meio rural brasileiro. Apesar da progressividade do imposto em relação ao tamanho e utilização do terreno, a cobrança é responsável por apenas 0,0887% da carga tributária em 2014, porcentual médio constatado desde os anos 1990.
A injustiça fiscal do ITR fez com que os grandes e médios proprietários passassem a pagar menos imposto por hectare, caindo a média de R$ 1,59 por hectare em 2003 para R$ 1,52 em 2010, segundo os dados das áreas totais cadastradas no SNCR.
Ligada à Universidade de Oxford, a Oxfam está presente em 94 países. Publicado in 30/11/2016.
Para ler mais detalhes do relatórioTerrenos da desigualdade: terra, agricultura e desigualdade no Brasil ruralacesse aqui.
Dois bandidos com dinheiro no exterior (tráfico de moedas)
Publicação da Agência Pública de outubro de 2021 mostra que o atual presidente do Banco Central do Brasil, Roberto Campos Neto, tem empresas em paraíso fiscal e alterou a legislação do banco de forma a beneficiar pessoas com recursos financeiros no exterior, diminuindo a transparência, o que o beneficiou diretamente, visto que os recursos em offshore foram revelados em vazamento de dados. O Banco Central (que agora é independente dos brasileiros) mantém uma das maiores taxas de juros do mundo. Veja trecho do texto de Allan de Abreu, Ana Clara Costa:
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, também consta nos documentos como dono da Cor Assets S.A., uma offshore no Panamá, outro paraíso fiscal, situado na América Central. Campos Neto criou sua offshore em 2004, com um capital de 1,09 milhão de dólares – 3,3 milhões de reais à época, que, se fossem repatriados hoje, equivaleriam a 5,8 milhões de reais – e continuava como controlador quando assumiu o posto no governo em fevereiro de 2019. À diferença de Guedes, ele fechou sua offshore em outubro do ano passado. Ainda assim, durante os 21 meses em que presidiu o BC na condição de dono da Cor Assets, Campos Neto poderia ser enquadrado no artigo 5º do Código de Conduta.
No cargo de presidente do BC, Campos Neto também tem acesso a dados estratégicos, como câmbio e taxas de juros, capazes de afetar seus investimentos lá fora. Em julho do ano passado, por exemplo, ele assinou uma portaria mudando as regras para a declaração de ativos no exterior. Até então, todo brasileiro que tivesse mais de 100 mil dólares lá fora tinha que informar o BC todos os anos. Com a portaria, esse valor subiu para 1 milhão de dólares – uma mudança que, dizem os especialistas, reduziu a transparência dos investimentos de brasileiros no exterior. Não se sabe o volume de recursos que Campos Neto mantinha em sua offshore quando a fechou. Nos Pandora Papers, não aparece essa informação. Consultado pela piauí, ele não quis informar o valor.
O presidente do BC criou sua offshore quando trabalhava no banco Santander e, para tanto, usou os serviços do escritório Mossack Fonseca, o pivô do escândalo mundial dos Panama Papers. Em sua composição original, a Cor Assets tinha dois diretores (Campos Neto e sua mulher, a advogada Adriana Buccolo de Oliveira), um capital subscrito de 10 mil dólares e uma conta corrente no banco Safra em Luxemburgo, um paraíso fiscal na Europa. Num documento do Mossack Fonseca, o casal explicou que o objetivo da Cor Assets era receber “investimentos em ativos financeiros do Santander private bank”. Assim que o escritório no Panamá enviou a Luxemburgo os documentos para abrir a conta no Safra, o funcionário luxemburguês Jost Dex informou a um colega de trabalho: “Nós destruiremos os documentos e você pode encerrar esse caso.” O sigilo sobre os negócios de seus clientes era a regra número um do Mossack Fonseca e, mesmo assim, tornou-se o epicentro do megavazamento de dados em 2016.
Em julho de 2004, dois meses depois de fundar a Cor Assets, Campos Neto transferiu mais 1,08 milhão de dólares para a conta estrangeira e aumentou significativamente o capital da empresa. Ele disse ao Mossack Fonseca que havia declarado o dinheiro transferido à Receita brasileira. Paralelamente, entre janeiro de 2007 e novembro de 2016, o executivo manteve outra offshore, a ROCN Limited, agora nas Ilhas Virgens Britânicas. A empresa foi criada pelo escritório Trident Trust, o mesmo responsável por abrir a firma de Paulo Guedes.
…. Em nota, Campos Neto respondeu o seguinte: “As empresas estão declaradas à Receita Federal e foram constituídas há mais de 14 anos com rendimentos obtidos ao longo de 22 anos de trabalho no mercado financeiro, decorrentes, inclusive, de atuação em funções executivas no exterior. Não houve nenhuma remessa de recursos às empresas após minha nomeação para função pública. Desde então, por questões de compliance, não faço investimentos com recursos das empresas. Questões tributárias não são atribuição da minha função pública.”
A reportagem também perguntou a Campos Neto se ele havia informado a Comissão de Ética Pública sobre a existência de sua offshore no Panamá. A resposta foi a seguinte: “A integralidade desse patrimônio, no país e no exterior, está declarada à CEP, à Receita Federal e ao Banco Central, com recolhimento de toda a tributação devida e observância de todas as regras legais e comandos éticos aplicáveis aos agentes públicos.” Nas atas de reuniões da Comissão de Ética Pública, no entanto, não consta nenhum julgamento de processo do presidente do BC. Assim como no caso de Guedes, a comissão recusou-se a dar informações sobre o caso. (Texto integral aqui)
Reportagem especial do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos denuncia que cerca de 330 empresários, artistas, banqueiros, políticos de todo o mundo têm empresas offshore em paraísos fiscais. Os documentos reunidos pelos jornalistas foram chamados de Pandora Papers. Neles, os dados de dois destacados brasileiros. O ex Ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
Em participação no UOL News, o colunista Marco Antonio Villa disse hoje que o ministro da Economia, Paulo Guedes, com contas em paraíso fiscal - como mostrado no caso Pandora Papers - é imoral e conflito de interesse. Para ele, tanto Guedes como o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, "seriam demitidos em país realmente republicano"
Roberto Campos Neto jogou contra o Brasil ao manter a taxa Selic em 13,75% ao ano e deve pedir demissão. A opinião foi dada pela deputada Gleisi Hoffmann ao UOL Entrevista de hoje. Para ela, a divulgação do resultado da manutenção da taxa básica de juros mostra que o presidente do Banco Central "não está nem aí" para o país.
Com alta do dólar, investimentos de Guedes no exterior valem R$ 51 milhões
Também cresceu a fortuna de Roberto Campos Neto que eleva os juros nas alturas para rechear botijas de dólares que enterrou em paraísos fiscais
por Camilla Veras Mota e Mariana Schreiber /BBC
Em quase três anos à frente do Ministério da Economia, Paulo Guedes deu uma coleção de declarações polêmicas — muitas delas envolvendo o dólar, que ficou quase 40% mais caro desde o início do governo de Jair Bolsonaro.
Algumas dessas frases foram relembradas nas redes sociais pelos brasileiros neste domingo (3/10), quando veículos de imprensa mostraram que Guedes mantém US$ 9,55 milhões nas Ilhas Virgens Britânicas, um paraíso fiscal no Caribe.
Os documentos que revelam que o ministro da Economia é dono de uma offshore milionária são parte de um megavazamento de informações que expôs figuras públicas de diversos países, batizado de Pandora Papers.
As reportagens foram feitas no âmbito do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), do qual fazem parte, no Brasil, a revista Piauí, os portais Metrópoles e Poder 360 e a Agência Pública.
Entre as manchetes compartilhadas nas redes sociais, os brasileiros relembraram um episódio de fevereiro de 2020, quando o ministro afirmou que o dólar alto seria positivo porque "empregada doméstica estava indo para a Disney, uma festa danada".
Antes disso, em novembro de 2019, Guedes afirmou, em visita a Washington, que os brasileiros deveriam "se acostumar" com o câmbio mais alto, que seria um reflexo da nova política econômica, com juro de equilíbrio mais baixo. "O dólar está alto? Problema nenhum, zero", disse, na ocasião.
Mais recentemente, em junho, já com o dólar consistentemente acima de R$ 5, o ministro repetiu, em fala na Fiesp, que ele e sua equipe queriam o "juros mais baixos e câmbio de equilíbrio um pouco mais alto".
O dólar hoje representa, indiretamente, uma das principais pressões sobre a inflação, com impacto que vai dos preços de combustíveis aos dos alimentos, passando inclusive pelos produtos fabricados pela indústria nacional, já que muitos usam componentes importados.
A valorização da Dreadnoughts International
Para quem tem investimentos no exterior, contudo, o dólar mais caro tem um efeito positivo, já que faz crescer o equivalente em reais das aplicações.
Foi isso o que aconteceu com os recursos mantidos na Dreadnoughts International, a empresa offshore fundada por Guedes em setembro de 2014 nas Ilhas Virgens Britânicas.
A alta do dólar desde 2019 fez com que o patrimônio valorizasse pelo menos R$ 14 milhões. Hoje, o equivalente em reais dos US$ 9,55 milhões aportados na empresa é de R$ 51 milhões.
Como as decisões e declarações do ministro têm impacto direto sobre o mercado de câmbio, muitos especialistas enxergam um conflito de interesses direto entre o cargo público exercido por Paulo Guedes e seu papel como investidor.
As offshores não são ilegais no Brasil, desde que os recursos sejam declarados à Receita. A diferença, neste caso, é o fato de que Guedes é servidor público. O Código de Conduta da Alta Administração Federal proíbe, em seu Artigo 5º, que funcionários do alto escalão mantenham aplicações financeiras passíveis de serem afetadas por políticas governamentais, no Brasil e lá fora.
Em suas manifestações à imprensa, o ministro tem reiterado que cumpriu o que ordena o código de conduta e que, como manda a norma, informou à Comissão de Ética Pública sobre seus negócios no prazo estipulado, até dez dias após assumir o cargo.
Em 2019, Guedes afirmou que os brasileiros deveriam "se acostumar" com o câmbio mais alto
Nesse aspecto, uma outra questão emergiu por meio do Pandora Papers: o caso só foi julgado no último mês de julho, mais de dois anos e meio depois. A Comissão (???) decidiu arquivar sem divulgar suas razões, sob a justificativa de que o caso seria sigiloso por envolver dados sensíveis.
O advogado Wilton Gomes, mestre e doutor pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), considera "absurdo" o período de dois anos que a comissão levou para avaliar o caso do ministro. Para ele, ainda que exista a questão de sigilo, os motivos que embasaram a decisão são uma questão de interesse público e, por isso, deveriam ser discutidos de forma mais transparente. (Quando Fernando Haddad vai deixar a moleza e quebrar de verdade o sigilo de cem anos na sua pasta, imposto por Paulo Guedes. Idem no Banco Central inimigo do povo e do Brasil).
Sobre o parecer, ele afirma que a redação do Artigo 5º do Código de Conduta é clara para o caso de Guedes.
"O conflito de interesse está instaurado, por mais que não tenha havido ação deliberada para aquela finalidade. Não é preciso comprovar que ele teve alguma atitude que o favorecesse, mas evitar o conflito de interesse."
Assim, para ele, a conduta correta seria que ou o ministro repatriasse os recursos ou, caso decidisse mantê-los no exterior, que se afastasse do cargo.
O potencial conflito de interesses entre o "Paulo Guedes ministro" e o "Paulo Guedes investidor" vai além do câmbio. Uma questão que pode afetar diretamente seus recursos no exterior é a tributação desses valores. Hoje, os rendimentos que pessoas físicas têm com empresas offshore só são taxados quando há saques desses investimentos.
Em uma proposta enviada pelo Ministério da Economia ao Congresso para alterar a tabela do Imposto de Renda e outros tributos estava previsto que essa cobrança sobre ganhos em offshore fosse feita anualmente, em caso de empresas estabelecidas em paraísos fiscais. Depois, porém, isso foi retirado, em comum acordo entre Guedes e o relator da matéria na Câmara, o deputado Celso Sabino (PSDB-PA).
O parlamentar disse no final de julho que pretendia reincluir a mudança, mas projeto de lei foi aprovado no início de setembro na Câmara sem esse ponto e agora está em análise no Senado. A BBC News Brasil tentou ouvir o deputado por telefone em seu gabinete e no celular, mas ninguém atendeu às ligações.
A proposta de taxar anualmente os ganhos em offshore gerou resistência de setores econômicos que mantêm recursos no exterior. Em evento organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Guedes disse em julho que a ideia foi retirada no Congresso para não complicar a tramitação do projeto de lei.
"O que estiver certo, acertamos aqui com a indústria… 'Ah, não, tem que pegar as offshores e não sei quê'. Começou a complicar? Ou tira ou simplifica. Tira. Estamos seguindo essa regra", afirmou.
"Não vamos botar em risco a retomada do crescimento econômico sustentável, que é o que está acontecendo. Então, quero deixar essa mensagem tranquilizadora. Quero agradecer o apoio de todo mundo que está nos ajudando, levando sugestões, dizendo 'ó, cuidado que isso aqui está errado'", continuou o ministro na ocasião.
A advogada Bianca Xavier, professora de direito tributário da Fundação Getúlio Vargas (FGV), reforça que não há ilegalidade em possuir recursos em uma offshore, desde que os valores sejam declarados à Receita Federal e ao Banco Central (no caso de superarem US$ 1 milhão) e que os tributos sejam pagos corretamente em caso de saques.
Pandora Papers: o que megavazamento revela sobre riqueza e negócios secretos de líderes mundiais - Época Negócios | Mundo
Segundo a professora, gerir recursos a partir de uma offshore no exterior, em geral, permite ao investidor pagar menos impostos quando se trata das cobranças sobre a empresa.
Já quando a pessoa saca esses recursos, explica Xavier, ela terá que necessariamente pagar imposto sobre todos os ganhos de rendimento do período.
A vantagem da offshore, ressalta, é que o investidor não precisa pagar esse tributo regularmente, como ocorre no Brasil, mas apenas ao final da aplicação, quando saca. É o chamado diferimento de impostos.
Na sua visão, o ministro não parece estar agindo de modo antiético com relação a seus investimentos em offshore, já que partiu do próprio governo a proposta original de incluir na reforma tributária a taxação anual desses rendimentos. Para ela, é inevitável que o ministro lide com políticas que o afetem diretamente.
"Se for considerar um conflito ético, nenhum ministro da Fazenda poderia falar de Imposto de Renda. Todos nós somos contribuintes. Teria, então, que ser um ministro muito pobre para não ter nenhum tipo de renda. Acho que ele tem que seguir pela impossibilidade", afirma a professora.
No entanto, o ministro pode ser beneficiado por outro ponto desse projeto de lei aprovado na Câmara e que ainda está em análise no Senado. O texto que recebeu o aval dos deputados prevê alíquota reduzida de 6% para quem decidir pagar antecipadamente o imposto sobre bens no exterior incluídos na declaração de Imposto de Renda deste ano (ano base 2020).
A alíquota normal no caso de investimentos em offshore varia de 15% a 27,5%. Ou seja, se isso for aprovado também no Senado e Guedes aderir ao pagamento antecipado, poderia economizar parte do tributo devido.
A justificativa apresentada para essa medida é a necessidade do governo aumentar a arrecadação com a antecipação desse e de outros tributos — o projeto de lei também dá desconto para pagamento antecipado sobre ganho de capital com valorização de imóveis.
Bianca Xavier lembra que a gestão Bolsonaro prometeu atualizar a tabela do Imposto de Renda, o que significa aumentar o número de brasileiros isentos da cobrança e reduzir um pouco os impostos pagos pelos demais.
A antecipação de tributos ajudaria a compensar num primeiro momento essa perda de arrecadação — solução considerada controversa por especialistas, já que a receita menor com a atualização da tabela do Imposto de Renda será permanente.
Presidente do BC também enfrenta questionamentos
À questão tributária, Pedro Rossi, professor do Instituto de Economia da Unicamp, acrescenta o âmbito regulatório. Paulo Guedes é, junto do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, membro do Conselho Monetário Nacional (CMN), que tem autonomia para aprovar uma série de medidas infralegais que também têm impacto sobre investimentos no exterior.
Campos Neto também foi citado no Pandora Papers. Sua offshore, a Cor Assets S.A, ficava situada no Panamá. Diferentemente de Guedes, contudo, ele encerrou as operações da empresa em julho do ano passado — mais de um ano depois de assumir a liderança do BC, contudo.
"São dois personagens da alta elite financeira, pessoas com milhões de dólares lá fora, beneficiados pela liberalização que eles mesmo promovem dentro dessa institucionalidade frouxa que alimenta conflito de interesses", diz o economista.
"Ambos têm influência sobre instrumentos de política cambial, fiscal e monetária, e estão conduzindo hoje o maior processo de liberalização financeira desde 1990", completa Rossi, referindo-se à iniciativa de mercados de capitais, conhecida pela sigla IMK, força-tarefa que visa desenvolver o mercado de capitais no Brasil.
Entre as medidas aprovadas pelo CMN no âmbito do IMK ele destaca a ampliação das operações com derivativos no exterior, algo que, na sua avaliação, vai na contramão das discussões sobre redefinição do papel do Estado e estabelecimento de controles sobre o mercado financeiro após a grande crise de 2008.
"A política fiscal, por exemplo, é mais democrática, passa pelo processo orçamentário, pelo legislativo. Já a política monetária e cambial depende de um conselho [CMN] que lhe dá diretrizes e que não tem representatividade, que toma decisões pouco democráticas e que é pouco transparente."
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, diz que não fez nenhuma remessa de recursos ao exterior depois de assumir o cargo atual e que, desde então, não faz parte da gestão das suas empresas. (Dando uma de comunista, entregou as empresas aos empregados...)
Guedes e Campos Neto negam irregularidades
Em nota enviada à BBC News Brasil, a assessoria de Paulo Guedes afirma que as atividades privadas dele anteriores à sua posse como ministro foram informadas aos órgãos competentes.
"Toda a atuação privada do ministro Paulo Guedes, anterior à investidura no cargo de ministro, foi devidamente declarada à Receita Federal, Comissão de Ética Pública e aos demais órgãos competentes, o que inclui a sua participação societária na empresa mencionada", diz trecho da nota enviada. [Quem acredita na Comissão de Ética Pública do governo Bolsonaro? Idem no chefe da Receita Federal que pressionou comandados para liberar contrabando de joias para a primeira-dama Michelle Bolsonaro, hoje no PL Mulher, ao lado de Valdemar da Costa neto?]
A nota disse ainda que a atuação de Guedes "sempre respeitou a legislação aplicável e se pautou pela ética e pela responsabilidade".
Já assessoria de imprensa de Campos Neto enviou nota à BBC News Brasil afirmando que todo o seu patrimônio, no país e no exterior, foi declarado à Comissão de Ética Pública da Presidência da República, Receita Federal e ao Banco Central.[Campos Neto foi indicado presidente do Banco Central por Paulo Guedes, que não tem nada de todo]
A nota diz ainda que Campos Neto não fez nenhuma remessa de recursos ao exterior depois de assumir o Banco Central e que, desde então, não faz parte da gestão das suas empresas. [Publicado in 4 outubro 202.
Roberto Campos Neto uma pedra no meio do caminho do Brasil tinha uma pedra
NPC Mineradora obteve duas licenças em 2019 para pesquisas em Monte Alegre do Piauí, um ano após ser citada na Operação Zelotes; empresa está registrada em nome de um dos denunciados e no da mulher de Augusto Nardes, ministro do TCU, autor de áudio golpista
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PorAlceu Luís Castilho, Tonsk Fialho e Mariana Franco Ramos
A NPC Mineradora e Incorporadora Ltda, ligada à família de João Augusto Ribeiro Nardes, conseguiu quatroautorizaçõespara pesquisar diamantes em uma área de 1.260 hectares na região de Monte Alegre do Piauí (PI), no sul do estado. As duas últimas foram concedidas em 2019, já na gestão de Jair Bolsonaro (PL), de quem o ministro e ex-presidente do Tribunal de Contas da União (TCU) é próximo.
Augusto Nardes e a esposa, Adriane Freder, dona da NPC
Nardes voltou aos holofotes (22/11/2022), após a divulgação, pelaFolha, de um áudio de teor golpista contra o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), no qual dizia a interlocutores do agronegócio haver “movimento forte nas casernas” e que o “desenlace” ocorreria em breve. No dia seguinte aovazamento, ele primeiro tentou se retratar e depois protocolou um pedido de licença médica de suas funções.
Os sócios da NPC são Adriane Beatriz Freder, esposa do ministro, eIgor Alexandre Copetti, réu naOperação Zelotes, que investigou um esquema de corrupção no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Carlos Juliano Nardes, sobrinho do magistrado, também foi denunciado, acusado de corrupção ativa e passiva, além de lavagem de dinheiro.
Bolsonarista ferrenho, Copetti é uma espécie de operador das propinas recebidas no âmbito da Zelotes, conforme a denúncia do Ministério Público Federal (MPF). Ele compõe o quadro societário de diversas empresas ligadas ao clã, como a Administradora de Bens Ltda, compartilhada com o ex-deputado federal Cajar Onesimo Ribeiro Nardes (Pode-RS), irmão mais novo do ex-presidente do TCU.
Cajar chegou a ocupar, a convite do sojeiro e ex-ministro da Agricultura Blairo Maggi (PP-MT), a Secretaria do Meio Ambiente do Mato Grosso, onde João Augusto possui umafazendanão produtiva. Na ocasião, o caçula dos irmãos Nardes foi responsável pelo recadastramento de todo o setor madeireiro do estado e por implantar o projeto-piloto que originou o Cadastro Ambiental Rural (CAR).
EMPRESA RECEBEU CINCO MULTAS ANTES DE OBTER NOVOS ALVARÁS DA ANM
A NPC está registrada no mesmo escritório da Progresso Participações, em Brasília, cujo sócio majoritário é o próprio ministro do TCU, egresso de um clã gaúcho que cresceu a partir do agronegócio. Segundo as investigações da Zelotes, as empresas eram utilizadas por ele para lavar valores recebidos ilegalmente quando se deu a sua participação no esquema de corrupção.
De acordo com a denúncia, a mineradora foi usada como intermediária para o repasse depropina do Grupo RBS, filiado à Rede Globo no Rio Grande do Sul, terra natal de Augusto Nardes, em troca da atuação do ministro a favor da anulação de dívidas tributárias.
O alvará não foi o primeiro concedido à NPC. Em janeiro de 2015, dois meses antes do início da operação, a Agência Nacional de Mineração (ANM) já havia autorizado a empresa a pesquisar diamantes por três anos na mesma área de 1.260 hectares e em outracomplementar, de 468 hectares, também em Monte Alegre.
Desde então, a NPC passou a colecionar multas pelo não pagamento da Taxa Anual por Hectare (TAH) – que incide sobre os requerimentos de pesquisa mineral – e por problemas na apresentação do relatório de pesquisa. Segundo o Diário Oficial da União (DOU), a companhia foi autuada cinco vezes de agosto de 2017 a setembro de 2021.
Nardes com o presidente do TJMG, Gilson Lemes, na inauguração do Espaço Lapidar (Foto: Mirna de Moura/TJMG)
MINISTRO DEFENDE GARIMPO E PEDE PRESSSA PARA REGULARIZAÇÕES NO TCU
Filiado ao Partido Progressista, que integra a base aliada de Bolsonaro no Congresso, Augusto Nardes iniciou sua carreira política em 1970, na Arena, legenda de sustentação da ditadura iniciada em 1964. Ele foi vereador em Santo Ângelo (RS), entre 1973 e 1977.
Antes de entrar no TCU, em 2005, exerceu dois mandatos de deputado estadual e três de deputado federal. Em 1998, recebeu do então presidente Fernando Henrique Cardoso a Ordem do Mérito Militar no grau de Comendador especial. Anos depois, em 2007, foi condecorado pelo Exército Brasileiro, em Brasília, com a Medalha do Pacificador.
A relação do ex-parlamentar com a mineração de pedras preciosas vai além da NPC. Ele apresentou cinco emendas à medida provisória 125/2003, que institui no Brasil o sistema de Certificação do Processo Kemberley (SCPK), relativo à exportação e à importação de diamantes brutos. Foi o segundo deputado que mais interveio no processo, à época.
As propostas modificam a Lei 10.684/2003, que altera a legislação tributária e dispõe sobre parcelamento de débitos junto à Secretaria da Receita Federal, à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Ele é autor, ainda, de uma série de projetos que beneficiam militares, como as Propostas de Emenda à Constituição (PEC) 580/2006 e 378/2005. A primeira permite a eles se afastar para concorrer a cargos eletivos, independentemente do tempo de serviço, podendo retornar caso não sejam eleitos. A segunda, de teor parecido, garante o retorno também ao fim do mandato.
No TCU, Nardes sucedeu outro arenista, Humberto Souto, e rejeitou as contas de Dilma Rousseff (PT) por “pedaladas fiscais”. Cinco anos mais tarde, em 2020, voltou a “advogar em causa própria”, ao pressionar por menos morosidade nas autorizações para mineração, conforme o próprioportal do Tribunal.
Ex-presidente do TCU atuou a favor de garimpeiros de Roraima. (Foto: Divulgação/TCU)
Ele mencionou notícias veiculadas na grande imprensa sobre o garimpo ilegal em Roraima, em especial em Terras Indígenas (TI’s). E argumentou que, embora o estado possua “conhecidas reservas de minerais valiosos e úteis para diversos segmentos”, essa riqueza seria “pouco explorada legalmente, não trazendo benefícios à população”.
Na realidade, o estado tem sido palco de uma explosão de crimes cometidos contra comunidades indígenas, sobretudo durante os anos de governo Bolsonaro. No comunicado ao plenário, porém, o ministro destacou o fato de que quase metade do território de Roraima está demarcada como reserva. E justificou que a atuação do TCU seria relevante porque, “segundo estimativas da Polícia Federal, movimenta R$ 1 bilhão (garimpos ilegais), sem considerar os prejuízos ambientais”.
IRMÃO DESMATOU ÁREA INDÍGENA NO MATO GROSSO
Em 2013, Nardes escreveu um livro contando a saga do trisavô, o bandeirante Pedro Ribeiro Nardes, que no século 19 “guerreou” contra indígenas na região que hoje abrange o município de Bauru (SP). Em entrevista ao jornal JCNet, quando do lançamento da publicação, o ex-arenista defendeu o legado controverso de seu antepassado: “Ele foi dado como morto, inclusive em uma carta destinada ao então governador, porque sumiu depois do confronto com os indígenas”, afirmou.
Livro narra a trajetória bandeirante dos antepassados de Nardes
A tendência ao conflito com os povos originários continua no DNA da família. Nardes é irmão do produtor de soja José Otaviano Ribeiro Nardes, um dos principais líderes ruralistas de Primavera do Leste (MT). Ex-presidente do Sindicato Rural da região, ele encabeçou um plano prevendo o desmatamento de 11 mil hectares de cerrado na TI Sangradouro, em Poxoréu (MT).
O “projeto”, como denomina, teve apoio de Bolsonaro e do presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Marcelo Xavier. “Sem o apoio do presidente da República e da Funai, nós não teríamos conseguido”, disse José Nardes à coluna de Rubens Valente, então no UOL. “A Funai em Brasília é uma extensão do nosso projeto”. O fazendeiro pretendia plantar soja, arroz e milho no local.
Ainda assim, o ex-presidente do TCU foi uma das personalidades anti-indígenas homenageadas em março pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, por supostamente atuar em defesa dos povos originários. Bolsonaro foi outro homenageado. A portaria nº 47 concedeu ainda a “medalha ao mérito indigenista” a dez ministros e a outras catorze pessoas, entre servidores da Funai, da Polícia Federal e de outros órgãos públicos: “Não é só Bolsonaro: veja o histórico de outros homenageados por “mérito indigenista”“.
NARDES ALEGA QUE EMPRESA, ATIVA, NUNCA TEVE MOVIMENTAÇÃO
O observatório entrou em contato com o ministro nesta segunda-feira (21), por meio da assessoria de imprensa do TCU, para questionar possíveis conflitos de interesse envolvendo as empresas da família e sua atuação no Tribunal. A reportagem recebeu como resposta que a NPC “consta como ativa, mas nunca teve movimentação desde que foi constituída”.
Mais tarde, o ministro pediulicença médicado TCU. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) pede oafastamentodo ministro e sua convocação para depor nas comissões de Direitos Humanos e de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor.
Nardes enviou também a nota na qual “lamenta profundamente” a interpretação que foi dada sobre o que chamou de “áudio despretensioso, gravado apressadamente e dirigido a um grupo de amigos”. Ele acrescentou que “repudia peremptoriamente manifestações de natureza antidemocrática e golpistas” e reiterou sua “defesa da legalidade e das Instituições republicanas”.
Vídeo mostra na porta de quartel a saudação nazista em ato golpista bolsonarista em São Miguel do Oeste (SC) em 2 de novembro
Comissão de Direitos Humanos do Senado também solicita que corporação 'assegure integridade física' de Maria Capra, parlamentar em São Miguel do Oeste
Por Joana Caldas e John Pacheco, g1 SC
A Comissão dos Direitos Humanos do Senado Federal enviou um ofício ao diretor-geral da Polícia Federal, Márcio Nunes de Oliveira, pedindo que a corporação responsabilize os autores de ameaças a vereadora Maria Tereza Capra (PT), que atua emSão Miguel do Oeste, no Oeste catarinense. O documento também solicita à PF "providências para assegurar a integridade física" da parlamentar.
A vereadora começou a ser ameaçada após se posicionar contra umato antidemocrático na cidade, ocorrido em 2 de novembro, em que manifestantes questionaram o resultado do segundo turno das eleições, bloquearam uma rodovia e fizeram um gesto suspeito de ser uma saudação nazista. O gesto é alvo de investigação pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC).
O ofício foi enviado à PF na quarta-feira (9). Og1entrou em contato com a Polícia Federal em Santa Catarina e não havia obtido retorno até a última atualização desta reportagem.
No mesmo dia, o Senado enviou um documento com os mesmos pedidos ao Subprocurador-Geral da República dos Direitos do Cidadão, Carlos Alberto Vilhena. A Subprocuradoria informou em 18 de novembro que o ofício está sob análise.
Os documentos são assinados pelo presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, senador Humberto Costa (PT).
A 40ª Promotoria de Justiça da Capital, que trata dos crimes de ódio em Santa Catarina, informou que recebeu cópia do boletim de ocorrência registrado pela vereadora. Também disse que o caso é investigado pela Polícia Civil.
O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) também informou que a vereadora será ouvida no procedimento investigatório criminal que apura a suspeita de atos de apologia ao nazismo ocorridos em um ato em São Miguel do Oeste em 2 de novembro (veja mais informações abaixo).
O que diz a vereadora
Maria Capra contou que, após o ato de 2 de novembro, fez um vídeo e o publicou em uma rede social. Depois, começou a receber ameaças e tirou o post do ar.
"Insurgi-me contra aquela situação na frente do quartel", afirmou a vereadora. Capra disse se preocupar, já que um homem foi preso em São Miguel do Oeste combandeiras neonazistas. "Indignei-me e pedi que as autoridades tomassem providências", declarou.
Capra afirmou que foi atacada nas redes sociais. No dia seguinte ao ato em São Miguel do Oeste, a Câmara de Vereadores apresentou uma moção de repúdio contra ela. Além disso, uma pessoa entrou com um pedido de cassação do mandato dela. Og1não conseguiu contato com a Câmara de Vereadores de São Miguel do Oeste.
"Pediam minha retratação, que eu pedisse desculpas. Como não falei nada, começaram as ameaças na rede social e também nos grupos bolsonaristas, fizemos print, e no meu carro". No veículo da parlamentar, foram escritos xingamentos.
Capra decidiu sair da cidade após as ameaças. "Tem todo um contexto. Além dessas ameaças nas redes sociais, falavam [nos grupos bolsonaristas] 'eu vi ela na padaria'. Eles queriam me pegar na Câmara. Disseram 'não basta cassação, tem que ter eliminação'", relatou a vereadora.
Ela afirmou que fez um boletim de ocorrência (B.O.) na Delegacia de Polícia de São Miguel do Oeste.
Ato em 2 de novembro
O ato ocorreu em frente ao 14º Regimento de Cavalaria Mecanizado, base do Exército na cidade. Em investigação preliminar, o MPSC apontou quenão houve intenção de apologia ao nazismono gesto e que não há evidências de prática de crime.
MP apura gesto semelhante ao nazista feito por bolsonaristas em ato em Santa Catarina
O relatório com a apuração preliminar sobre o gesto chegou à 40ª Promotoria de Justiça de Florianópolis no dia seguinte. Essa promotoria é especializada no combate aos crimes de racismo, ódio, intolerância, preconceito e discriminação, com atribuição estadual, e vaicontinuar a investigação.
Nesta sexta (11), o MPSC informou que a 40ª Promotoria de Justiça pediu uma série de diligências relacionadas ao caso, entre elas, a busca de imagens e tomada de depoimentos de pessoas que estavam no ato.
Nas redes sociais, a Confederação Israelita do Brasil (Conib) reproduziu nota oficial repudiando os atos nazistas em São Miguel do Oeste e pedindo investigação sobre o caso.
"A sociedade brasileira não pode tolerar posturas como essa. Fazer esse gesto vestindo camisa da seleção brasileira é também uma ofensa às nossas Forças Armadas, que lutaram bravamente contra as forças nazistas na Europa durante a Segunda Guerra Mundial", diz o comunicado.
O governo da Alemanha emitiu uma declaração de repúdio diante das cenas de gestos nazistas por parte de manifestantes bolsonaristas. A suposta saudação foi identificada em um ato em São Miguel do Oeste, contra a derrota de Jair Bolsonaro
Família do general se envolve na política há quase um século e agiu contra a soberania popular em vários momentos
por Joaquim de Carvalho /Portal 247
O general Sérgio Westphalen Etchegoyen deu uma entrevista esta semana à rádio Gaúcha em que demonstrou desrespeito ao comandante supremo das forças armadas e, em razão disso, uma visão deturpada do papel das Forças Armadas em uma república.
Lula disse que perdeu a confiança em parte das Forças Armadas, depois dos atos terroristas de 8 de janeiro. E ele tem motivo para externar esse sentimento.
Afinal, o Palácio do Planalto foi invadido e vandalizado por militantes de extrema direita que se encontravam acampados em área do Exército. A invasão ocorreu apesar de existir o Batalhão da Guarda Presidencial, desmobilizado antes dos atos terroristas e, durante estes, seu comandante, o coronel do Exército Paulo Jorge da Hora, foi gravado em vídeo sendo advertido por policiais militares, aparentemente porque tentava interferir em favor dos invasores. “Está doido, coronel?”, disse um oficial da PM, segurando-o pelos ombros.
À rádio Gaúcha, Etchegoyen disse: “Um presidente da República, comandante supremo das Forças Armadas, que vai à imprensa dizer que não confia nas suas Forças Armadas, sabe desde já que nenhum general vai convocar uma coletiva para responder à ofensa. Então, isso é um ato de profunda covardia, porque ele sabe que ninguém vai responder”.
Na cabeça de Etchegoyen, os militares estão em pé de igualdade com o comandante supremo das Forças Armadas, e não são subordinados. Sendo subordinado, nenhum integrante das Forças Armadas tem o direito de responder ao presidente da República, sob pena de incorrer em grave ato de indisciplina.
Sem obedecer aos princípios de hierarquia e indisciplina, uma Força Armada deixa de ser instituição de Estado, e passa a ser uma milícia ou gangue.
A posição de Etchegoyen segue um padrão da família, segundo registros históricos. Seu avô, Alcides, era tenente do Exército em Cruz Alta, Rio Grande do Sul, quando, ao lado do irmão, liderou motim para impedir a posse do presidente Washington Luiz.
Eles eram do movimento tenentista da época, do qual fazia parte também Luiz Carlos Prestes, na época já comandando a coluna que, pela definição de hoje, poderia ser considerada de caráter progressista.
Alcides e o irmão, no entanto, logo se revelaram com uma visão bem diferente da de Prestes, quando Alcides, no complexo governo de Getúlio Vargas, assumiu a chefia da polícia no Distrito Federal, então no Rio de Janeiro, em substituição a Felinto Muller.
Nos anos 50, ele já era oposição a Getúlio Vargas, e encabeçou a chapa “Cruzada Democrática” para o Clube Militar, e derrotou o general nacionalista Newton Estilac Leal. Em agosto de 1954, Alcides assinou o manifesto que exigia a renúncia de Getúlio Vargas, a quem havia servido, num ato que agravou a crise política e levou ao suicídio do então presidente.
Quando o general Alcides morreu, em 1956, dois filhos já estavam no Exército, Cyro e Leo, este pai de Sergio Etchegoyen. Em 1964, eles participaram do golpe contra Goulart. Leo seria nomeado, um ano depois, secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, e o irmão, Cyro, assessoraria o general Milton Tavares, chefe do Centro de Informações do Exército, o poderoso CIE.
O jornalista Marcelo Godoy registrou em artigo no jornal O Estado de S. Paulo que Léo dizia, talvez justificando a tortura, que "quem enfrenta a guerra suja tem de usar métodos semelhantes ao do inimigo, sob a pena de ser derrotado”.
Em 1979, segundo Godoy, o pai de Sergio Etchegoyen elogiou o tenente-coronel Dalmo Lúcio Muniz Cyrillo, chefe do DOI-Codi em São Paulo, pela atuação dele na prisão coletiva de sindicalistas e líderes metalúrgicos do ABC paulista, entre estes Lula.
Durante o governo de Dilma Rousseff, Sergio Etchegoyen era chefe do Departamento Geral do Pessoal do Exército e atacou o relatório da Comissão Nacional da Verdade, que citava o pai dele como comandante de unidades onde ocorreram violações de direitos humanos.
Etchegoyen disse que o trabalho, criado por lei proposta pelo Executivo e aprovada no Congresso Nacional, era “leviano”. Não foi punido, porque o governo Dilma considerou que a manifestação dele se dava em caráter familiar. O general tentou retirar o nome do pai no relatório da Comissão Nacional da Verdade com ação na Justiça, mas perdeu.
É nessa época que generais, conspirando contra Dilma, se aproximaram de Jair Bolsonaro, para que ele representasse os militares nas eleições de 2018. Justamente Bolsonaro, que havia sido condenado em Conselho de Justificação do Exército, por mentir e ser indisciplinado, considerado sem vocação para a carreira militar, entre outros motivos pelo desejo de enriquecer rapidamente
Depois do golpe contra de Dilma, Etchegoyen assume o Gabinete de Segurança Institucional, a que está subordinada a Abin, e se destaca como homem forte de Michel Temer. Ao mesmo tempo em que a presença militar volta à rotina da vida civil no país, é mantido um acampamento em frente ao Comando Militar do Sudeste, que, em 2016, já pedia intervenção militar.
Antes disso, o ativista Jair Krischke participou de um projeto regional que pretendia instalar pedras memoriais em frente a estabelecimentos do Rio Grande do Sul onde, durante a ditadura, houve violação de direitos humanos, a exemplo do que existe na Alemanha (nazismo) e Argentina (ditadura militar).
Etchegoyen convidou Krischke para uma conversa, e os dois se falaram, durante horas. A certa altura, Etchegoyen perguntou a Krischke: “Você está querendo colocar pedras em frente a meus quartéis?”. Krischke respondeu: “Pensei que os quartéis fossem do Estado brasileiro”. A conversa terminou, e o projeto não foi adiante.
Na eleição de 2022, os militares foram derrotados juntamente com Bolsonaro. Sim, os militares estavam na disputa, direta e indiretamente.
Com o resultado das urnas, o país tem agora a oportunidade de superar esse longo período em que generais como Etchgoyen se colocam em pé de igualdade com o presidente da República, detentor do mandato que reflete a soberania popular e lhe confere o lugar constitucional de comandante supremo das Forças Armadas.
O Parlamento Europeu condenou nesta quinta-feira (19) os ataques às instituições democráticas no Brasil, em 8 de janeiro, em uma resolução. Apesar de não ter poder de lei, o documento, que pede punição para os envolvidos, é um instrumento de pressão, especialmente para isolar ainda mais o ex-presidente Jair Bolsonaro.
A resolução, aprovada por 319 votos a favor, 46 contra e 74 abstenções, destaca que “milhares de militantes da extrema direita e apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro invadiram e vandalizaram o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Palácio da Alvorada em Brasília, pedindo uma intervenção militar para derrubar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.”
De acordo com o documento, todos envolvidos nas “ações criminosas perpetradas por apoiadores do ex-presidente Bolsonaro”devem ser identificados, processados e responsabilizados,incluindo os instigadores, organizadores e financiadores, bem como as instituições do Estado que falharam em prevenir esses ataques.
No documento, o Legislativo europeu lamenta as tentativas do ex-presidente Bolsonaro e de alguns de seus apoiadores políticos em “desacreditar o sistema de votação e as autoridades eleitorais, apesar de não haver indícios de fraude eleitoral”, e os insta a aceitar o resultado democrático das eleições.
Manifestantes, partidários do ex-presidente Jair Bolsonaro no prédio do Congresso Nacional, em 8 de janeiro de 2023. AP - Eraldo Peres
O texto ainda destaca a aprovação pelo STF de um pedido do Ministério Público Federal para investigar o ex-presidente Bolsonaro, pois ele “pode ter contribuído, de maneira muito relevante, para a ocorrência de atos criminosos e terroristas”.
Preocupação com omissões
Os parlamentares europeus também manifestaram preocupação com “atos e omissões de agentes públicos”, em especial do ex-governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, que foi afastado do cargo, e do ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Torres, que está preso.
A resolução aprovada pelo Parlamento Europeu reconhece “a conexão entre o crescente fascismo transnacional, racismo, extremismo e os eventos em Brasília, e o ocorrido no Capitólio dos EUA, em janeiro de 2021.”
Dois atos muito representativos do 8 de janeiro, que ocorreram com uma diferença de tempo menor que quatro horas e em palcos distantes 7,9 km entre si, fizeram parte do mesmo teatro da conspiração das cúpulas militares contra a democracia.
Um deles, o primeiro, foi contracenado no Palácio do Planalto. O segundo, no Quartel-General do Exército brasileiro – ou “Exército fascio-bolsonarista”, se se preferir.
O primeiro ato
Por volta das 18 horas de 8 de janeiro, no interior do Palácio do Planalto, ninguém menos que o próprio comandante do Batalhão da Guarda Presidencial, coronel Paulo Jorge Fernandes da Hora, protegia terroristas que momentos antes haviam barbarizado e destruído as instalações do Palácio.
Enquanto um oficial da PM/DF bradava que “estão todos presos, coronel”, o oficial-comandante da Guarda Presidencial impedia a prisão dos criminosos e agia pessoalmente para liberá-los e, assim, deixá-los fugir impunemente.
O Batalhão da Guarda Presidencial é a unidade do Exército subordinada ao Comando Militar do Planalto que tem como missão proteger os palácios e residências presidenciais.
No dia 8 de janeiro, no entanto, o comando do Batalhão agiu em sentido diametralmente oposto ao seu dever institucional. Cumprindo ordens, naturalmente – não do GSI, mas do Exército.
Primeiro, o Batalhão da Guarda Presidencial retirou as tropas regulares e desguarneceu o Palácio, facilitando a ação dos criminosos, que encontraram as portas do Palácio destravadas para poderem invadir com inaudita facilidade.
O coronel do Exército Paulo Jorge da Hora, comandante do Batalhão da Guarda Presidencial. Fotomontagem: Metrópoles
E, depois da bárbara destruição, o comandante do Batalhão e seus comandados prevaricaram, traíram a Constituição e agiram com cumplicidade para liberar os terroristas – dentre eles, inclusive militares.
O segundo ato
Por volta das 22 horas daquele 8 de janeiro, o Exército posicionou blindados e formou um denso cordão de soldados no acesso ao Quartel General do Exército.
A primeira e falsa informação, plantada na imprensa pelo próprio Exército, foi de que a barreira seria para impedir o regresso dos criminosos “ao lar” – ou seja, ao acampamento no pátio do QG.
“Agora ninguém mais entra; só sai”, diziam emoffà imprensa.
Mas, na realidade, a fortaleza militar foi uma trincheira erguida para impedir que a PM do DF entrasse naquele território sem lei para cumprir o mandado de prisão de criminosos e terroristas ali amotinados.
É de conhecimento público que militares da reserva e da ativa, assim como integrantes da chamada família militar, se aboletavam no QG do Exército ao lado de terroristas do estilo daqueles que barbarizaram Brasília em 12 e 24 de dezembro com atos de terror.
A ordem do STF de desmontagem do acampamento e de prisão dos criminosos amotinados no QG só foi efetivamente cumprida na manhã de 9 de janeiro, depois do Exército providenciar a fuga de militares e de integrantes da família militar do local – dentre eles, segundo noticiou a imprensa, Dona Cida, a esposa do general-conspirador Villas Bôas.
As negociações dos ministros civis do governo – Justiça, Casa Civil e Defesa – com os comandantes militares, que se comportaram como chefes da conspiração e verdadeiros representantes dos amotinados, atravessaram a madrugada.
Um clima ríspido e tenso, na percepção de quem testemunhou a reunião. Com direito a temor de que um ministro civil pudesse receber voz de prisão de um atrevido general sedicioso que deveria ter sido exonerado e preso.
O 8 de janeiro foi uma operação orquestrada que envolveu múltiplos atores que devem ser identificados, responsabilizados e condenados.
Os atos terroristas em Brasília no dia 08/01 deixaram perplexo o especialista em Forças Armadas Manuel Domingos Neto, professor da Universidade Federal Fluminense e doutor em história pela Universidade de Paris.
“É duro, eu conheço as Forças Armadas há 50 anos, na condição de oficial da reserva, de preso na ditadura quando fui torturado nos quartéis, mas isso eu não esperava, agasalhar vandalismo, isso exorbita qualquer projeção, foi além da conta”, lamentou.
Para ele “as Forças Armas estão ensandecidas e Lula deve substituir imediatamente o comandante do Exército”.
O especialista garante que as Forças Armadas acompanharam tudo de perto: “Eles sabiam o que aconteceria”.
E disse também que a esposa do general Villas Bôas tem contas a prestar à Polícia. Ela foi filmada nos acampamentos, pontos de articulação dos movimentos terroristas e de vandalismo. “Ela deve ser chamada a prestar contas. Maria Aparecida Villas Boas é simbólica, é tomada como a mãe dessas coisas. Tá na hora de verificar a responsabilidade dela nesses atos criminosos, assim as instituições mostrarão de fato poder”, concluiu. Entrevista à jornalista Marilu Cabañas. Veja o vídeo.
UM LEVANTAMENTOfeito peloInterceptidentificou 46 deputados federais eleitos em 2022 que defenderam, incentivaram ou ao menos tentaram justificar de alguma forma os ataques terroristas do último domingo. Dez deles apoiaram abertamente os golpistas, como se eles se manifestassem por causas legítimas; 24 procuraram disfarçar o apoio, minimizando os protestos, desviando o foco das acusações ou culpando “infiltrados de esquerda”; e outros 12 foram contrários às prisões dos terroristas, chegando a alegar a ocorrência de violações – não comprovadas – de direitos humanos.
UM LEVANTAMENTOfeito peloInterceptidentificou 46 deputados federais eleitos em 2022 que defenderam, incentivaram ou ao menos tentaram justificar de alguma forma os ataques terroristas do último domingo. Dez deles apoiaram abertamente os golpistas, como se eles se manifestassem por causas legítimas; 24 procuraram disfarçar o apoio, minimizando os protestos, desviando o foco das acusações ou culpando “infiltrados de esquerda”; e outros 12 foram contrários às prisões dos terroristas, chegando a alegar a ocorrência de violações – não comprovadas – de direitos humanos.
A lista poderia ser bem maior, pois vários parlamentares endossaram um tuíte de Jair Bolsonaro relativizando os atos. Destacamos, no entanto, apenas os casos mais expressivos, como os deputados que, mesmo tendo repudiado os atos oficialmente, divulgaram mensagens que colocam em dúvida se o repúdio foi genuíno.
Gráfico: The Intercept Brasil
Independentemente da estratégia utilizada no momento de se pronunciarem publicamente sobre o terrorismo, todos os deputados citados deixaram de lado a defesa irrestrita da democracia. Boa parte dos parlamentares bolsonaristas que criticaram os atos de domingo só o fizeram por causa do vandalismo e da violência. No entanto, mesmo que o protesto tivesse sido pacífico, ainda seria antidemocrático, assim como eram os acampamentos na frente dos quartéis. Afinal, a motivação dos golpistas sempre foi contrariar o resultado de uma eleição e impor sua vontade contra a da maioria dos brasileiros.
Entre os defensores do terrorismo, está o deputado Sargento Gonçalves, do PL do Rio Grande do Norte. Em um vídeo publicado em suas redes sociais, elemandou uma mensagempara os “policiais militares de todo o Brasil, em especial aos policiais integrantes das forças de segurança pública do Distrito Federal”, pedindo que eles tivessem “muita sabedoria e serenidade, muita cautela na hora de agir contra os cidadãos que invadiram o Congresso Nacional”. O deputado que incentiva os policiais a serem coniventes com a depredação dos prédios públicos dos Três Poderes defendeu que os invasores “não são bandidos”. O Sargento Gonçalves tambémpostou um vídeodo momento em que a multidão invadia o Congresso Nacional e escreveu na legenda que “todo poder emana do povo”.
Gráfico: The Intercept Brasil
Outro defensor dos atos golpistas foi o cearense André Fernandes, do PL. Pouco antes da meia-noite de sábado para domingo, ele postou no Twitter que ia acontecer, na Praça dos Três Poderes,“o primeiro ato contra o governo Lula”e avisou que estaria lá. Depois,publicou uma fotoda porta do gabinete do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, que foi arrancada pelos terroristas, e escreveu na legenda: “quem rir vai preso”. Após a má repercussão, o deputado negou que estivesse no protesto e excluiu as postagens.
Quem também está no grupo dos defensores é a deputada bolsonarista Silvia Waiãpi, do PL do Amapá. Ela publicou ao menos três vídeos mostrando os golpistas em ação. Um deles é do momento em que umpolicial da cavalaria é derrubadoe seu cavalo é ferido com barras de ferro.
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Outros deputados federais que defenderam abertamente o terrorismo de domingo foram o monarquista Luiz Philippe de Orleans e Bragança e o delegado Paulo Bilynskyj, ambos do PL de São Paulo. De Pernambuco, temos a deputada Clarissa Tércio, do PP, e o Coronel Meira, do PL. Bia Kicis e José Medeiros, respectivamente do PL do Distrito Federal e do Mato Grosso, também estão na lista, assim como Ricardo Barros, ex-ministro da Saúde de Michel Temer e ex-líder do governo Bolsonaro na Câmara, do PP do Paraná. Em umaentrevista para a CNN, Barros apoiou a ação dos terroristas. “As pessoas estão aí de cara limpa, não estão encapuzadas. Por que isso? Porque elas acham que a eleição foi roubada”, disse.
Muitos deputados federais publicaram notas de repúdio contra os protestos violentos, mas várias de suas postagens nas redes sociais revelam que eles são, na verdade, simpatizantes disfarçados do terrorismo. Eduardo Bolsonaro, por exemplo,postou no Instagramo print de um tuíte do pai. O ex-presidente Jair Bolsonaro, que fugiu para os Estados Unidos às vésperas da posse de Lula, criticou as “depredações e invasões de prédios públicos”, comparando manifestações legítimas da esquerda com os atos golpistas de domingo. A postagem também foi reproduzida por vários deputados bolsonaristas.
Gráfico: The Intercept Brasil
Dos 24 simpatizantes disfarçados, 17 são do PL, partido que falhou em reeleger Bolsonaro em outubro. Um desses parlamentares é o mineiro Nikolas Ferreira, deputado mais votado do Brasil. Os demais são do PSDB, Novo, MDB, União Brasil, PP, Avante e Republicanos. Entre eles, estão os que culparam o Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes ou o próprio Congresso pelos atos violentos. Um exemplo de apoio disfarçado é o do deputado federal Vicentinho Júnior, do PP de Tocantins. Ele gravou um vídeo se colocando contra as depredações, mas afirmou: “Não posso dizer aqui que não é de direito do cidadão reivindicar o seu direito à transparência, à lisura de um processo eleitoral”. Em seguida, diz que o código fonte das urnas devia ter sido aberto – embora o TSE afirmeque abriu o código por um ano e que ele foi inspecionado pelas Forças Armadas.
O levantamento identificou também 12 deputados federais que defendem impunidade para terroristas e quem atenta contra a democracia, principalmente os que estavam acampados no Quartel-General do Exército em Brasília e foram levados para a Academia Nacional da Polícia Federal. Eles alegam que os direitos humanos dessas pessoas estão sendo desrespeitados e chegam ao cúmulo de comparar o local para onde elas foram conduzidas a“campos de concentração”nazistas.
Gráfico: The Intercept Brasil
O deputado Osmar Terra, do MDB do Rio Grande do Sul, chegou a divulgar afalsa informaçãode que uma idosa havia morrido. Terra é ex-ministro do Desenvolvimento Social de Temer e ex-ministro da Cidadania de Bolsonaro. Já o deputado Carlos Jordy, do PL do Rio de Janeiro,acusouo presidente Lula, o ministro da Justiça Flávio Dino e o “Xerife” – apelido que bolsonaristas deram a Alexandre de Moraes – de “abuso de autoridade”.
A Polícia Militar do Distrito Federal conduziu mais de 1,5 mil pessoas suspeitas de envolvimento no terrorismo protagonizado por bolsonaristas no último domingo. De acordo com a Polícia Federal, todos os detidos receberam “alimentação regular (café da manhã, almoço, lanche e jantar), hidratação e atendimento médico quando necessário”. Várias entidades, como a Ordem dos Advogados do Brasil, acompanham os procedimentos.
Após os trâmites realizados pela Polícia Federal, os presos foram apresentados à Polícia Civil e encaminhados ao Instituto Médico Legal. Segundo balanço divulgado na tarde de terça-feira, dia 10, 527 pessoas foram presas e 599 foram liberadas por questões humanitárias, “em geral idosos, pessoas com problemas de saúde, em situação de rua e mães acompanhadas de crianças”.
Ainda na tarde de terça, políticos do PSOL pediram ao ministro Alexandre de Moraes a inclusão de 11 parlamentares no inquérito do STF que investiga os atos antidemocráticos. Seis deputados federais denunciados estão no levantamento feito pelo Intercept – André Fernandes, Ricardo Barros, Carlos Jordy, Silvia Waiãpi, Clarissa Tércio e José Medeiros. Os demais são o senador Magno Malta, do PL do Espírito Santos, e os deputados estaduais Júnior Tércio, do PP de Pernambuco, e Sargento Rodrigues, Coronel Tadeu e Ana Campagnolo, respectivamente do PL de Minas Gerais, de São Paulo e de Santa Catarina. Todos são acusados de estimular o golpismo e o terrorismo nas redes sociais.
Quem foi além e chegou amarcar presençanos atos terroristas foi a suplente de deputado federal Pâmela Bório, do PSC da Paraíba. Imagens divulgadas no seu próprio Instagram, depois apagadas, mostram que ela subiu no telhado do Congresso. A ex-esposa do ex-governador Ricardo Coutinho, do PT, aparece nos vídeos acompanhada do filho, que é menor de idade.
Mapa: The Intercept Brasil
Segundo João Paulo Martinelli, advogado e doutor em Direito pela USP, os parlamentares que estimularam abertamente a participação em atos terroristas podem ser responsabilizados, mas o processo até a punição é longo. “Em âmbito criminal, o uso da violência ou grave ameaça com intuito de abolir o estado democrático de direito e depor o governo legitimamente constituído é considerado crime contra as instituições democráticas, previsto no artigo 359 do Código Penal. Já o artigo 287 trata da apologia ao crime ou ao criminoso”, explicou o jurista. Nesse caso, a denúncia teria que ser oferecida ao STF pelo procurador-geral da República, o bolsonarista Augusto Aras.
Já na esfera administrativa, a denúncia pode se dar por quebra de decoro parlamentar, ou seja, pelo comportamento inadequado de um deputado. Qualquer cidadão tem o direito de fazer uma denúncia ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados, desde que um partido político assine a representação. Depois disso, há um trâmite interno que pode culminar na votação em plenário pela cassação do parlamentar. Para isso, é preciso que ao menos 257 deputados votem pela perda do mandato.
Na quarta-feira, dia 11, a Procuradoria-Geral da República solicitou ao STF aabertura de inquéritocontra os deputados federais Clarissa Tércio, André Fernandes e Silvia Waiãpi, devido às postagens feitas por eles nas redes sociais. No mesmo dia, advogados que fazem parte do Grupo Prerrogativas solicitaram ao ministro Alexandre de Moraes uma medida cautelar para impedir a posse dos deputados federais Carlos Jordy, Silvia Waiãpi, André Fernandes e Nikolas Ferreira, prevista para 1º de fevereiro. O pedido se estende aos deputados estaduais Sargento Rodrigues, do PL de Minas Gerais, e Walber Virgolino, do PL da Paraíba. O documento pede, ainda, a instauração de inquérito policial para apurar a responsabilidade penal dos parlamentares.
ANTES QUE VOCÊ SAIA…Quando Jair Bolsonaro foi eleito, sabíamos que seria preciso ampliar nossa cobertura, fazer reportagens ainda mais contundentes e financiar investigações mais profundas. Essa foi a missão que abraçamos com o objetivo de enfrentar esse período marcado por constantes ameaças à liberdade de imprensa e à democracia. Para isso, fizemos um chamado aos nossos leitores e a resposta foi imediata. Se você acompanha a cobertura do TIB, sabe o que conseguimos publicar graças à incrível generosidade de mais de 11 mil apoiadores. Sem a ajuda deles não teríamos investigado o governo ou exposto a corrupção do judiciário. Quantas práticas ilegais, injustas e violentas permaneceriam ocultas sem o trabalho dos nossos jornalistas? Este é um agradecimento à comunidade do Intercept Brasil e um convite para que você se junte a ela hoje. Seu apoio é muito importante neste momento crítico. Nós precisamos fazer ainda mais e prometemos não te decepcionar.Faça parte do TIB
O ministro do TCU Augusto Nardes tomou chá de sumiço, valendo-se de conveniente licença médica depois do vazamento de sua conversa de teor golpista com interlocutor do “time do agro”.
É esse “time” que tem financiado os bloqueios em rodovias que contestam a vitória de Lula. O site “De Olho nos Ruralistas” levantou a ficha de Nardes e de parentes dele, conectados em intrincada rede de empresas.
A esposa do ministro, Adriana Beatriz Freder, é sócia da NPC Mineradora e Incorporadora Ltda. A empresa conseguiu quatro autorizações para pesquisar diamantes no Piauí, duas delas no governo Bolsonaro. No mesmo endereço da NPC, em Brasília, funciona a Progresso Participações, que tem como sócio o próprio Nardes.
O sócio de Adriana, Igor Copetti, tem encrencas na justiça por conta de investigação sobre corrupção no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais). Um sobrinho de Nardes aparece no mesmo caso. Em uma terceira empresa, Copetti é sócio de um irmão de Nardes. A família também atua no agronegócio.
Tudo muito nebuloso para o currículo de um ministro do TCU que, não custa lembrar, reprovou as contas de Dilma Rousseff por “pedaladas fiscais”, engodo que serviu ao golpe de 2016 e do qual ele se gaba no áudio.
O TCU é órgão assessor do Legislativo numa das tarefas mais importantes dos congressistas: a fiscalização do uso do dinheiro público pela administração federal. O áudio elimina qualquer vestígio de independência e impessoalidade de Nardes para julgar as contas de quem quer que seja.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) pediu o afastamento do ministro e o convocou para depor no Senado. Nardes, porém, conhece o modus operandi das instituições e aposta que a licença e uma nota fajuta serão suficientes até a poeira baixar e não se fala mais nisso. Sua impunidade seria um insulto a todos os que lutaram para que o Brasil superasse a infelicidade desses últimos quatro anos de afronta à democracia.