Nos tempos de Bolsonaro: casas sem banheiro, sem água potável, ruas sem saneamento, fogo nas florestas, rios envenenados, óleo nas praias, alimentos com agrotóxicos liberados
No governo Bolsonaro 5,5 milhões de pessoas viviam em locais sem um banheiro. E 35 milhões não tinham acesso à água potável e quase 100 milhões sofriam com a ausência de coleta de esgoto
No Brasil, no final do governo militar de Jair Bolsonaro, o número de residências sem acesso a banheiro era de 1,6 milhão, isto é, se considerarmos a média de 3,5 pessoas por residência são mais de 5,5 milhões de pessoas que vivem em locais sem um banheiro. Não obstante, cerca de 35 milhões de brasileiros não têm acesso à água potável e quase 100 milhões sofrem com a ausência de coleta de esgoto – enquanto apenas 50,8% dos esgotos do país são tratados, ou seja, são mais de 5,3 mil piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento despejadas na natureza diariamente.
Apesar desta triste realidade, fanáticos religiosos, candidatos conservadores da extrema direita, deputados e senadores bolsonaristas discutiam e discutem banheiro unissex, isto é, a construção de banheiros masculinos, femininos, trans, homossexuais, bissexuais e de lésbicas.
O ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social, Paulo Pimenta, concedeu entrevista ao programa Bom Dia 247 e repercutiu a ação do ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, que irá enquadrar os deputados Felipe Barros, Nikolas Ferreira, além do senador e ex- juiz suspeito Sergio Moro e o ex-deputado Arthur do Val na Advocacia Geral da União (AGU), por propagação de notícias mentirosas ligadas ao governo sobre a criação de banheiros unissex nas escolas.>>> Silvio Almeida diz que Moro será investigado por espalhar fake news sobre banheiros unissex
“O grande desafio hoje é encontrar um equilíbrio entre a liberdade de expressão e a integridade da informação. No G20, vamos defender que o Brasil lidere um grande esforço internacional pela integridade da informação e da democracia”, iniciou.
“Há determinados temas que indicam desespero da oposição. É o caso do banheiro unissex, que envolveu o ex-juiz Sergio Moro. Isso mostra que a oposição tem grande dificuldade para discutir grandes temas”, notadamente a triste, vergonhosa, anti-higiênica, anti-salutar, doentia, desumana realidade:
Mais de 5 milhões de brasileiros não têm banheiros em suas residências
No sábado, dia 19 de novembro, é celebrado o Dia Mundial do Banheiro. Em 2003, a data foi instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU) com o intuito de colocar em pauta o saneamento, visando estimular o debate e ações efetivas na busca soluções para universalizar os serviços básicos. Na “Agenda 30” criada pela ONU, entre os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), o número 6 da agenda propõe a meta de alcançar o acesso universal e equitativo de água potável e saneamento para todos
No Brasil, o número de residências sem acesso a banheiro são de 1,6 milhão, isto é, se considerarmos a média de 3,5 pessoas por residência no país, são mais de 5,5 milhões de pessoas que vivem em locais sem um banheiro. Não obstante, cerca de 35 milhões de brasileiros não têm acesso à água potável e quase 100 milhões sofrem com a ausência de coleta de esgoto – enquanto apenas 50,8% dos esgotos do país são tratados, ou seja, são mais de 5,3 mil piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento despejadas na natureza diariamente.
Tabela 1 – Indicadores de banheiros no Brasil, ano base 2019
Localidade
Moradias com banheiros (habitações)
Moradias sem banheiro (habitações)
População sem banheiro
Brasil
70.771.763
1.622.965
5.680.377,50
Norte
4.878.186
531.449
1.860.071,50
Nordeste
17.994.415
964.995
3.380.842,50
Sudeste
31.436.466
82.703
289.460,50
Sul
10.920.509
25.041
87.643,50
Centro-Oeste
5.542.187
18.777
65.719,50
Fonte: Painel Saneamento Brasil
Entre as cinco regiões brasileiras que sofrem com a ausência de moradias sem banheiro, a situação mais preocupante é vista no Nordeste do país – cerca de 3,4 milhões dos habitantes não têm vaso sanitário, ou seja, quase 1 milhão de residências. Em seguida, na região Norte aproximadamente 1,2 milhão de moradores sem banheiro; no Sudeste são quase 290 mil nessas condições. Na região Sul a população que sofre com essa ausência é de 87 mil pessoas e no Centro-Oeste são 65 mil habitantes sem banheiros na residência.
A precariedade do saneamento básico vai além de apenas impactar a saúde, a falta do acesso à água e ao atendimento de esgotamento sanitário reforça até mesmo a desigualdade de gênero no país. Segundo um estudo realizado pelo Instituto Trata Brasil, em parceria com a BRK Ambiental, entre 2016 e 2019, o número de mulheres sem banheiro em casa cresceu 56,3% no período, passando de 1,6 milhão para 2,5 milhões. Ademais, a ausência de banheiros reforça a pobreza menstrual, um dos problemas agravados pelas más condições dos serviços básicos.
A Presidente do Instituto Trata Brasil, Luana Siewert Pretto, aponta que o acesso ao banheiro deve estar presente nas políticas públicas, visando zerar o déficit de banheiros com a universalização do saneamento básico. “A partir das metas estabelecidas pelo Marco Legal do Saneamento, o país precisará disponibilizar água potável para 99% da população e 90% dos habitantes devem ter acesso ao esgotamento sanitário até 2033. Durante esse período, a universalização também passa pelo acesso digno aos mais de 5 milhões de habitantes que ainda sofrem com a ausência de banheiros em suas residências.”
Para esconder essa realidade de país do Terceiro Mundo, o Brasil quebrado, o governo militar dos marechais de contracheque, dos coronéis do Ministério da Saúde, do general Braga interventor Militar do Rio de Janeiro, dos pastores do Ministério da Educação, o Brasil da segunda maior concentração de renda espalhava os famosos fake news dos banheiros unissex, da mamadeira de piroca (denúncia da família Bolsonaro presidente, Flávio senador, Eduardo deputado federal, Carlos vereador, Renan lobista palaciano) as cartilhas crack (denunciada por Damares Alves ministra hoje senadora), e gay (denunciada por pastores da igreja de Michelle (rainha Ester) Bolsonaro, presidenta do PL Mulher de Valdemar da Costa Neto.
Após espalhar fake news e ser acionado na AGU, Moro ataca Silvio Almeida
O ministro Silvio Almeida disse que quem espalha desinformação deve sofrer o rigor da lei. “Quem usa a mentira como meio de fazer política, incentiva o ódio contra minorias e não se comporta de modo republicano tem que ser tratado com os rigores da lei. É assim que vai ser”, disse o ministro em uma rede social.
Lugar certo
A notícia falsa começou a circular após a publicação, na sexta-feira (22), de uma resolução tratando de parâmetros para o acesso e permanência de pessoas travestis, mulheres e homens transexuais, além de pessoas transmasculinas e não binárias, nos sistemas e instituições de ensino.A resoluçãoé de autoria do Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+. O texto diz que as instituições de ensino - em qualquer nível - devem garantir, entre outros pontos, o uso do nome social nos formulários de matrícula, registro de frequência, avaliação e similares nos sistemas de informação utilizados pelas escolas. Além disso, a resolução estabelece que deve ser garantido o uso de banheiros, vestiários e demais espaços segregados por gênero, quando houver, de acordo com a identidade e/ou expressão de gênero de cada estudante.
Golpe de estado ameaça uma guerra civil. Tem listas estaduais de presos, e a sangreira de lideranças marcadas para morrer.
Todo golpe cousa de inimigos da claridade, de forças armadas contra a população civil, contra o povo em geral desarmado, vítima de ditadores sanguinários idólatras de - para citar os monstros do Século XX - Hitler, Mussolini, Stalin, Franco, Salazar, Pinochet, Stroessner, Idi Amin e outros cavaleiros montados em suas bestas do Apocalipse.
Bolsonaro, o "mau militar", consultou as Forças Armadas sobre dar um golpe após a vitória de Lula, depois de derrotado nos dois turnos das eleições presidenciais de 2022. A Marinha aceitou. Mas sem o Exército, Bolsonaro recuou, escreve Cintia Alves:
Almirante Garnier, ex-comandante da Marinha, aceitou embarcar no plano de golpe de Jair Bolsonaro contra a posse de Lula, segundo informações de O Globo.
No final de 2022, após a vitória eleitoral de Lula, Jair Bolsonaro teria se reunido com a cúpula das Forças Armadas para discutir um plano de golpe, numa tentativa desesperada de permanecer no poder.
O Exército teria negado adesão ao golpe. Não se sabe qual teria sido a conduta da Força Aérea. Mas o almirante Almir Garnier Santos, então comandante da Marinha (que tem cerca de 80 mil homens e mulheres em seu corpo), embarcou prontamente na empreitada golpista.
Os detalhes da reunião teriam sido narrados na delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. O trecho sobre a proposta às Forças Armadas vazou à imprensa nesta quinta (21).
O ministro da Defesa do governo Lula, José Múcio Monteiro, disse que o golpe“não interessou às Forças Armadas”.“Foram atitudes isoladas”, afirmou, reclamando ainda da “suspeição coletiva” em que se encontram os militares hoje.
Quem é Almir Garnier
Não é surpresa nenhuma que Garnier tenha aparecido na delação de Cid como um entusiasta do golpe. Em junho passado, oFinancial Timespublicou reportagem sobre a “discreta campanha” dos Estados Unidos para garantir a posse de Lula.
“Um alto funcionário brasileiro que esteve intimamente envolvido lembra que o ministro da Marinha de Bolsonaro, almirante Almir Garnier Santos, era o mais ‘difícil’ dos chefes militares. ‘Ele ficou realmente tentado por uma ação mais radical’, diz. ‘Então tivemos que fazer muito trabalho de dissuasão, o departamento de estado e o comando militar dos EUA disseram que iriam rasgar os acordos [militares] com o Brasil, desde treinamento até outros tipos de operações conjuntas'”, revelou oFT.
A lealdade a Bolsonaro e o desprezo pelo governo recém eleito já ficara patente quando Garnier decidiu não participar da passagem de bastão para seu substituto, o almirante Marcos Sampaio Olsen.
Em meio a uma transição tensa, duramente marcada pelo 8 de Janeiro, Olsen chegou com as seguintes falas:“Temos um Brasil polarizado, e os militares foram trazidos para esse contexto. Precisamos reforçar que é uma instituição de Estado. (…)É equívoco achar que as Forças Armadas podem ser um poder moderador.”
Em 15 de dezembro de 2022, quando a marcha golpista de Bolsonaro caminhava para o fracasso, Garnier participou da formatura de quase mil novos fuzileiros navais. Na despedida emocionada, fez um discurso dúbio.
“Nem sempre conseguimos fazer tudo que queremos. Muitas vezes queremos navegar em direção ao porto seguro em linha reta, mas a tempestade nos impede, e temos de navegar de acordo com o que aprendemos para contornar furacões, afim de não perder nosso barco e colocar em risco nossa tripulação. Mas saibam os senhores que a manobra de tempestade girará novamente o barco em direção ao porto seguro que queremos. E lá nós chegaremos, pode demorar um pouco mais, mas chegaremos. O importante é que estejamos unidos.”
Garnier disse também que a tropa estava em plena“condições de cumprir missões onde quer que o poder político nos demande.”E finalizou com um chamado:“O Brasil espera que cada um cumpra o seu dever. Tenho tentado cumprir o meu. Cumpram o de vocês”.
A delação de Cid
O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, revelou em delação premiada que presenciou o encontro do ex-presidente com a cúpula das Forças Armadas e aliados militares, para discutir a possibilidade de implementar uma minuta de intervenção militar no país.
O tenente-coronel Mauro César Barbosa Cid. Foto: Agência Senado
De acordo com o jornalista Talento Aguirre, que ouviu fontes que acompanharam as negociações de delação, Cid narrou também os detalhes de um encontro anterior, no qual o ex-assessor especial Filipe Martins entregou a minuta de decreto golpista para Bolsonaro.
O documento previa caminhos para prender o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Morais, e suspender o resultado da eleição vencida por Lula.
Cid também teria presenciado o encontro com as Forças Armadas, quando Garnier teria garantido que sua tropa estaria pronta para aderir a um chamamento, enquanto o comando do Exército teria negado a proposta. Sem o Exército, Bolsonaro não deu seguimento ao plano.
O relato teria caído “como uma bomba entre os militares” e teria gerado uma grande tensão nas Forças, segundo Bela Megale, no O Globo.
Escândalos de corrupção. Gestão nebulosa. Ameaças ao Congresso e STF. CPMI dos atos terroristas de 8 de janeiro. Jandira Feghali aponta nomes de generais golpistas. Aos poucos, a sociedade tem um conhecimento menos idealizado e mais real dos militares. Momento deve ser aproveitado para reafirmar o controle civil e garantir transparência
Ainda não se sabe qual o teor da delação do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, otentente-coronel Mauro Cid, e o grau de comprometimento que seu depoimento pode trazer para alguns generais e oficiais das Forças Armadas tanto no caso das joias como também na preparação para a tentativa de golpe após os resultados das eleições presidenciais de 2022. A Operação Perfídia trouxe ainda um outro dano à imagem de um dos principais nomes do governo anterior, o general Walter Braga Netto, que teve o sigilo telefônico quebrado pela Justiça por conta de uma investigação a respeito de possíveis fraudes no processo de contratação de coletes balísticos.
Os dois casos abalam uma imagem que os militares sempre tentaram cultivar no imaginário popular, a de que, diferentemente dos políticos e civis de uma forma geral, a instituição estaria livre da corrupção, uma praga nacional, zelando sempre pelo interesse público. E podem ainda escancarar a falta de compromisso de parte do generalato com princípios básicos de qualquer regime democrático, como o simples respeito ao resultado eleitoral.
A maior parte dos golpes de Estado no mundo costuma contar com um sentimento antipolítica muito forte em meio à sociedade. Afinal, é necessário ter apoio de segmentos sociais não só para apear quem pode ser tido como adversário do poder, mas também para permanecer nele. E, em geral, desmoralizar o oponente por meio do exaurido lema da luta contra corrupção é uma das principais armas de quem quer usurpar o poder de modo ilegal.
No Brasil, foi assim que o udenismo combateu o segundo governo de Vargas, sem conseguir êxito por conta do suicídio do presidente. Mais adiante, o mesmo segmento se aliou aos integrantes das Forças Armadas – que já ensaiavam o golpe contra o governo getulista – para derrubar João Goulart em 1964, agora investindo pesadamente também em um anticomunismo radical, o que o unia mais ao ideário da caserna. Uma vez no governo, os militares buscaram passar durante boa parte do tempo uma imagem de busca pelo conhecimento técnico para governar, como se fossem quase apolíticos, apoiados em gestores tecnocratas civis para gerir a área econômica.
Em 2018, todos estes elementos que forjaram parte da história do autoritarismo e do golpismo no Brasil estavam presentes nas eleições presidenciais: o anticomunismo, o “técnico” que cuidaria da economia (sempre bem apoiado por parte da mídia tradicional e pelo chamado mercado) e também pelo discurso anticorrupção. Tudo embalado num discurso contrário à política e aos políticos, ainda que capitaneado por alguém que viveu quase três décadas praticamente inerte na Câmara dos Deputados.
Se os nomes dos partidos e das figuras que os representavam mudou nesta linha do tempo, parte dos protagonistas continuou vestindo farda. A falta de uma Justiça de Transição e a estrutura autoritária da sociedade brasileira fez com que durante muito tempo este militares saíssem incólumes, sem responder pelas suas ações como aconteceu nos países vizinhos. Isso os protegeu também de arcarem com os custos simbólicos, já que, para boa parte da população, os integrantes das Forças, uma vez no poder, não teriam praticado atos de corrupção como os presidentes civis.
Nada mais falso. É evidente que qualquer ditadura que se preze não só não tem transparência nos atos administrativos como pratica a censura e controla, por diversos meios, a possível eclosão de escândalos e divulgação de malfeitos.
Como lembrou o professor de História Pedro Henrique Pedreira de Campos, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Pedro Campos,nesta entrevista, “a ditadura militar foi um celeiro de corrupção”. Também autor do livroEstranhas Catedrais(Eduff), lançado em 2014, houve então “um ambiente extremamente propício de escalada dos interesses empresariais e privados sobre o Estado brasileiro, tendo em vista o cerceamento dos mecanismos de fiscalização e o aparelhamento do Estado por agentes do setor empresarial privado”.
“Os militares se locupletaram nesse processo. Eles se favoreceram muito na atuação empresarial naqueles anos. Era uma ditadura empresarial-militar e eles ganharam postos nas empresas e há várias denúncias de que eles recebiam propinas”, pontua.
Longe e perto dos holofotes
Após o fim da ditadura, os militares continuaram atuando no cenário político, mas de forma muito mais discreta, em especial para defender a história da própria instituição e, principalmente, seus generais. Nem mesmo os ex-políticos que haviam feito parte do regime defendiam publicamente as supostas virtudes do regime que se encerrava. A ausência na transição do trabalho de memória e justiça fez com que, décadas depois, o panorama mudasse e o regime autoritário passou a ser exaltado por parte da classe política e, obviamente, pelos integrantes das Forças Armadas abertamente. Mesmo a tortura, antes negada ou tratada dentro da seara de fatos isolados, agora era assumida orgulhosamente por muitos, com torturadores sendo elogiados inclusive por aquele que viria a se eleger presidente em 2018.
Mas é a eleição de 2018 que traz a farda de novo ao centro do palco.Relatório elaborado em 2021pelo Tribunal de Contas da União (TCU) apontou que na gestão Bolsonaro o governo federal mais que dobrou o número de militares em cargos antes ocupados por civis. No último ano do governo Temer, 2.765 militares ocupavam cargos do governo federal e, em 2021, chegavam a 6.175.
Se havia ocupação na máquina do Estado, isto era ainda mais pronunciado em postos-chave da administração do Executivo. Em fevereiro de 2020, os militares controlavam oito dos 22 ministérios, proporção maior que a de alguns presidentes da ditadura.
No Planalto, o círculo de confiança do presidente era verde-oliva. Um levantamento feito pelo The Intercept e divulgado em agosto mostra ainda que Bolsonaro trouxe nada menos que 79 alunos da sua turma, graduados no mesmo ano ou que conviveram com ele nos quatro anos de curso na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), para seu governo. No rol, nomes como o do próprio Braga Neto, e o de Luiz Eduardo Ramos, ex-ministro da Casa Civil, das Secretarias Geral e de Governo, um dos articuladores da criação domalfadado orçamento secreto, talvez o mais emblemático retrocesso institucional ocorrido durante aquela gestão.
Com tal exposição e graças a mecanismos de transparência, fiscalização e controle que foram construídos e consolidados após o fim da ditadura, os militares passaram a se ver envolvidos de forma direta ou indireta em diversos casos de denúncias de corrupção ou similares, que envolviam desde episódios de negociações de compra de vacina com preços1.000% maioresdo que os anunciados pelo fabricante,uso irregular de recursos voltados ao combate da pandemiaecompra superfaturada de Viagra. Agora, sem possibilidade de o Executivo barrar investigações e com atentativa de golpe do 8 de janeiro sendo apurada, mais nomes vêm à tona.
Transparência e isonomia
Se o envolvimento de militares no governo Bolsonaro traz para a sociedade uma imagem menos idealizada e mais real de que disciplina, hierarquia e uma dita tradição não impedem corrupção, o verdadeiro remédio que a combate precisa ser também aplicado à caserna. E aqui não se trata especificamente de punição, também necessária quando prevista em lei, e sim de prevenção.
Relatório produzido pelogrupo de transição do atual governoresponsabilizou as Forças Armadas pelo que considerou um verdadeiro apagão da transparência no governo federal durante a gestão Bolsonaro, com casos reiterados de descumprimento da Lei de Acesso à Informação. De acordo com o documento, houve uma “forte tendência de sempre ou quase sempre se considerar ‘pessoais’ informações sobre integrantes do Exército que não seriam informações pessoais para servidores civis”. Isso envolve o impedimento de se acessar, por exemplo, notas fiscais de compras públicas, documentos de pregões eletrônicos, empresas que firmaram contratos com a Força, e negativa de acesso à lista de passageiros e a custo de voos oficiais feitos pela Aeronáutica.
Por isso, mas não só, o controle civil sobre as Forças Armadas, como preconiza a Constituição, é essencial. Para garantir tratamento isonômico em relação ao resto da estrutura do Estado e garantir transparência nos atos. E, ainda mais fundamental, para não ter a democracia formal sob ameaça constante de um poder armado.
Ainda hoje existe uma tolerância muito grande à intromissão fardada em assuntos que não seriam do seu escopo. A interferência na vida pública talvez tenha tido uma de suas ilustrações mais vivas em um episódio de julho de 2021, da CPI da Covid, quando o então presidente do colegiado, senador Omar Aziz (PSD-AM), afirmou que “os bons das Forças Armadas devem estar muito envergonhados com algumas pessoas que hoje estão na mídia, porque fazia muito tempo, fazia muitos anos que o Brasil não via membros do lado podre das Forças Armadas envolvidos com falcatrua dentro do governo”.
Em seguida, o Ministério da Defesa chefiado por Braga Netto e os comandantes das Forças Armadas divulgaram nota oficial apontando que Aziz teria dado declarações “desrespeitando as Forcas Amadas e generalizando esquemas de corrupção”. “As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro”, dizia ainda o documento.
Mesmo com Aziz destacando que havia “bons” e separando uma “banda podre”, a reação institucional foi desproporcional e em tom intimidatório. O presidente da CPI cobrou uma posição do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que no mesmo dia da nota prestou homenagem às Forças Armadas, sem citar o episódio. Aziz reagiu: “Pode fazer 50 notas contra mim, só não me intimidem. Porque quando estão me intimidando, Vossa Excelência não falou isso, estão intimidando essa Casa aqui também. Vossa Excelência não se referiu à intimidação que foi feita pela nota das Forças Armadas.”
Generais também ameaçaram outras instituições, como à época em que o general Villas-Bôas, então comandante do Exército mandou recado ao Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o julgamento da prisão após condenação em segunda instância. O fato de, em ambos os casos, a resposta ter sido tímida ou nula do ponto de vista institucional, evidencia o tamanho da ingerência militar e a dimensão do problema que o Brasil ainda não resolveu.
A desconstrução da imagem de um poder infalível que a participação da caserna no governo Bolsonaro trouxe para muitos é positiva, apontando que militares, em especial os de alta patente, não podem estar acima da lei. A mudança de parte da opinião pública pode ser uma oportunidade para iniciar, ao menos, um outro tipo de cenário em que cumpra simplesmente o que se prevê na Constituição, onde o papel das Forças é desenhado. Sem isso, a tutela que nasceu já na construção da própria República seguirá como fardo que impede a construção de uma real democracia.
GENERAIS GOLPISTAS ENVERGONHAM AS FORÇAS ARMADAS General Dutra era o comandante militar do Distrito Federal. Permitiu o acampamento golpista em frente ao QG do Exército em Brasília. Não adianta agora negar. O que não falta são provas. Está claro que houve cumplicidade de parte do Exército com os terroristas que vandalizaram o Planalto, o Congresso e o STF no 8 de Janeiro. Esse desvio de conduta é o que investigamos na CPMI. Tenho total repulsa e indignação por todas as vezes que as Forças Armadas se desviaram de sua função. No governo Bolsonaro, isso aconteceu aos montes. Havia militares como Heleno, Braga Netto e tantos outros generais que ajudaram a construir, insuflar e, alguns, até a participar da tentativa de golpe. Este, definitivamente, não é o papel das Forças Armadas.
O GOLPISMO VEM DE LONGE Quando foi interventor militar no Rio de Janeiro, em 2018, o general Braga Netto - ex-chefe da Casa Civil, ex-ministro da Defesa e ex-candidato a vice na chapa do Inelegível - fechou 22 contratos sem licitação, cinco deles milionários! Braga Netto teve o sigilo telefônico quebrado e está também na mira de outra investigação, a dos atos golpistas: ele deve ser um dos generais que entrarão na aguardada delação de Mauro Cid. Não perde por esperar.
No domingo 13 de agosto, ocorreram as primárias no país. Por meses se especulou sobre os índices que o candidato alcançaria. Para muitos, sua participação seria quase simbólica, no entanto, em diferentes lugares, era comum ouvir que o candidato era o único que apresentava propostas, um plano de governo que traria um novo momento para a história política da Argentina, varrendo o que ele denomina de casta, marcada quase integralmente pelo peronismo.
Embora seu nome circulasse com frequência, poucos esperavam que Javier Milei seria o mais votado, com 30% do total. O resultado nas urnas gerou uma grande movimentação dos outros candidatos, analistas políticos e jornalistas. O que antes era uma possibilidade mínima é agora uma realidade que precisa ser enfrentada. Desde o domingo, os jornais não param de anunciar as inúmeras propostas do candidato e seu conhecido plano motosierra, que inclui corte de diversos ministérios, plebiscito sobre a lei do aborto, e mudança no código 14 da Constituição, em que constam os direitos trabalhistas, a venda de órgãos, o fechamento do Banco Central, educação paga e opcional, e a dolarização, tudo isso mesclado com doses de falácia sobre corte de relações com países que Milei considera comunistas, como China e Brasil, além da proposta de dissolução do Mercosur. Em 2022 a Argentina fez um pacto bilateral com a China para receber fundos para obras de infraestrutura.
Quanto ao Brasil, Milei pensa em cortar vínculos com o país vizinho de forma imediata, e chegou a chamar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de zurdo salvaje. O Brasil é historicamente um dos parceiros comerciais mais importantes da Argentina.
Com o apoio de Diana Mondino, uma economista famosa que possivelmente será ministra das Relações Internacionais caso ocorra sua vitória, e de sua vice, Victoria Villarruel, reconhecida pela negação da ditadura e das cifras de desaparecidos, Milei forma um time com bases duras, que põe em xeque a constituição moral e ética da sociedade argentina. Do outro lado, Sergio Massa (Unión por la Patria), representante da ala peronista, encara a difícil tarefa de reverter os índices dentro dos próximos 60 dias, tendo como os seus principais opositores o próprio Javier Milei (Libertad Avanza) e Patricia Bullrich (Juntos por el Cambio), representante da ala macrista. De maneira geral, tanto Milei como Bullrich representam alas conservadoras, políticas neoliberais. A diferença é que Patrícia busca manter certo verniz social, foca seu discurso nos aspectos econômicos e mantém um perfil discreto. A candidata é avessa a temas polêmicos.
O que esperar dos próximos 60 dias?
Os próximos 60 dias serão determinantes para alterar o atual cenário. A vitória de Javier Milei nas primárias “assustou” a todos. Sem dúvida, o maior desafio de Sergio Massa é mostrar sua capacidade de reinventar o peronismo e reorganizar a sociedade argentina. O que joga contra o candidato é precisamente seu cargo de ministro da Economia e suas decisões pouco acertadas nos últimos anos, o que gerou um estado de hiperinflação e grande descontentamento social. Na próxima semana, o ministro se reunirá com técnicos do FMI numa tentativa de melhorar sua imagem e mostrar certo controle sobre a atual situação econômica do país.
O acordo “dará à Argentina acesso a cerca de US$ 7,5 bilhões”, mas está sujeito à aplicação das medidas acordadas pelo governo e à aprovação do conselho de administração, que se reunirá na segunda quinzena de agosto, informou em comunicado. Os pagamentos serão realizados em dois momentos: um na terceira semana de agosto e o outro na primeira de novembro, declarou à imprensa o ministro da Economia argentino, Sergio Massa, que é candidato à presidência do país pela coalizão peronista de centro-esquerda no poder. Esses fundos são um alívio para Massa, que acusa a oposição de tentar “travar o acordo”, alcançado após semanas árduas de negociações. “Foi acordado um pacote de políticas.”
“Estamos vendo candidatos que fazem vídeos com frases fáceis que viralizam entre pessoas que estão preocupadas com o seu dia a dia. Esses slogans aparentam ser uma solução para os problemas, mas necessitamos de um programa de desenvolvimento exportador”, afirmou Massa. E agregou: “Há um caminho a percorrer. Temos uma tormenta e precisamos administrá-la”. O peronismo enfrenta uma das maiores crises da sua história recente, uma turbulência que está só no começo. Ainda não sabemos o que virá, mas o rumo da história do país já mudou radicalmente.
Invadida por garimpeiros e madereiros e abandonada pelo governo Bolsonaro, Terra Indígena Yanomami sofre com malária, contaminação por mercúrio e desnutrição severa
Estudo confirma que pelo menos 692 crianças de até 9 anos morreram no período
por Rubens Valente
Agência Pública
Um relatório produzido pelo projeto “Achados e Pedidos” revelou “o estrangulamento” da aplicação de recursos do órgão do governo federal responsável por cuidar da saúde de 28 mil indígenas Yanomami e Ye’kwana, em Roraima e Amazonas, durante os quatro anos do governo de Jair Bolsonaro (2019-2022). Em janeiro de 2023, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva declarou emergência sanitária e deflagrou uma operação para retirada dos invasores da terra indígena, ao denunciar uma grave crise de fome, malária e altos índices de mortalidade no território.
“A redução orçamentária da saúde indígena Yanomami desembocou na tragédia humanitária. […] Os dados oficiais são precários, incongruentes, subnotificados e parciais, mas ao menos 692 crianças Yanomami com até 9 anos morreram de 2019 a 2022”, apontou o relatório.
O “Achados e Pedidos”, projeto realizado pela Transparência Brasil e pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), examinou o orçamento executado de 2019 a 2022 pelo Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (Dsei-Y), sediado em Boa Vista (RR), vinculado ao Ministério da Saúde. Foram ministros da Saúde no período Luiz Mandetta (2019-abril de 2020), Nelson Teich (abril e maio de 2020), Eduardo Pazuello (2020-2021) e Marcelo Queiroga (2021-2022).
O relatório lembra que em janeiro de 2018, quando Bolsonaro assumiu a Presidência, “o sinal de alerta já estava aceso no DSEI-Y”. Em 2018, segundo o estudo, “ao menos 119 bebês haviam morrido antes de completar um ano”, “cerca de 2,5 mil crianças com menos de cinco anos apresentavam peso baixo ou muito baixo e outras mil sequer eram monitoradas” e havia pelo menos 10 mil casos de malária, “uma alta de 26% em relação ao ano anterior [2017]”.
Um estudo conduzido pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), segundo o relatório, constatou que “a situação nutricional das crianças Yanomami é a mais delicada já reportada em toda a literatura científica nacional e uma das maiores em escala mundial”.
“Fica evidente que o governo Bolsonaro sucateou o distrito sanitário”
Apesar de todos esses alertas, “o volume de recursos federais aportados no DSEI-Y em 2019 foi o menor desde 2013”. Aplicando a correção inflacionária, “houve um corte de 26% nas liquidações em relação ao ano anterior e de 48% se comparado a 2016”.
A política adotada nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro teve impacto profundo na saúde Yanomami. “Em 2019, os casos de malária dobraram. Os dados oficiais apontam, incluindo todas as causas, a morte de 190 crianças e jovens com menos de 20 anos – 14% superior a 2018.”
No mesmo ano, a taxa de liquidação dos empenhos para a saúde Yanomami “foi de apenas 79%, a mais baixa desde 2013”. Em 2019, cerca de R$ 10,8 milhões, em valores corrigidos pela inflação, “tiveram o empenho emitido, mas não foram liquidados”, ou seja, “houve reserva de recursos, mas não ocorreram contratações ou entrega dos produtos e serviços correspondentes eventualmente contratados”.
“No comparativo com anos anteriores, fica evidente que o governo Bolsonaro sucateou o DSEI-Y. Em 2018, foram empenhados R$ 7,1 milhões na categoria investimento em valores correntes. Em 2019, apenas R$ 96,3 mil. No ano seguinte, nada foi lançado nessa classificação. Os investimentos, em geral, significam aquisições de equipamentos de longa duração e obras, ou seja, melhorias estruturais.”
O relatório cita algumas despesas realizadas pelo Dsei-Y antes de Bolsonaro chegar à Presidência. No final de 2018, durante o governo de Michel Temer (2016-2018), por exemplo, o distrito sanitário comprou 50 refrigeradores para armazenamento de vacinas e medicamentos, ao custo de R$ 5,8 milhões. Em 2016, os investimentos somaram R$ 2,96 milhões. Durante os quatro anos do governo Bolsonaro, contudo, foi empenhado apenas R$ 1,3 milhão em investimentos no Dsei-Y.
O maior empenho individual, diz o relatório, foi para a compra de 30 botes de alumínio no padrão “‘embarcação patrulha’, com capacidade para transportar de 8 a 12 homens armados, e com ‘padronização de pintura do Exército brasileiro’, ao custo de R$ 367 mil”. (continua)
Sargento Luis Marcos dos Reis: envolvido numa série de escândalos ligados a Bolsonaro, a quem serviu como ajudante de ordens
Segundo o deputado Rubens Pereira Júnior, militares que assessoravam Bolsonaro ajudaram o ex-presidente a cometer crimes. "Todos são iguais perante a lei". Parlamentares do PT pedem punição aos golpistas das Forças Armadas
Como disse o deputado federal Rogério Correia (PT-MG), o sargento Luis Marcos dos Reis, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, “contribuiu pouco e mentiu muito” ao depor nesta quinta-feira (24) na CPMI do Golpe. A estratégia, no entanto, não impediu que a verdade aparecesse mais uma vez.
E a verdade é que a Ajudância de Ordens, cuja função é assessorar diretamente o presidente da República, se transformou, no governo de Jair Bolsonaro, em um verdadeiro escritório de ilegalidades.
“Infelizmente, a Ajudância de Ordens se transformou em Ajudância de Crimes”, resumiu o deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA). “Em todos os crimes que estamos investigando nesta CPMI, a Ajudância de Ordens está no meio. Todos: minuta golpista, fraude de vacinas, dinheiro vivo, invasão dos Três Poderes”, completou.
E Reis é uma prova disso. O nome do militar aparece tanto na fraude dos cartões de vacinação quanto nos ataques do 8 de Janeiro e nas transações suspeitas que beneficiaram Bolsonaro e sua esposa, Michelle (leia mais sobre as suspeitas que recaem sobre o sargento).
Desmascarado, optou pelo silêncio
Ao iniciar seu depoimento, Reis tentou negar a prática de qualquer crime. Disse que os 3,3 milhões movimentados em sua conta eram fruto de um consórcio informal que fazia com colegas militares, história taxada de “difícil de acreditar” por Rubens Pereira Júnior.
Acabou desmascarado por Rogério Correia, que mostrou evidências da amizade entre os dois, a ponto de Reis chamar Vanderlei carinhosamente de Derlei e trocar com ele diversas mensagens de WhatsApp.
Depois disso, o sargento Reis preferiu ficar em silêncio sempre que questionado sobre pagamentos feitos para Michelle ou Bolsonaro. “O seu silêncio fala demais”, ressaltou Pereira Júnior, que listou uma série de perguntas que precisam ser respondidas:
1) Como se davam os pagamentos de contas pessoais de Bolsonaro e Michelle?
2) Qual era o volume em espécie que circulava dentro da Ajudância de Ordens?
3) De onde vinha o dinheiro em espécie, ou seja, quem repassava esses montantes?
Para o senador Rogério Carvalho (PT-SE), fica claro que, além de apoiar um golpe de Estado, militares da Ajudância de Ordens e outros contribuíram para o que se parece muito com um esquema de rachadinha no interior do Palácio do Planalto.
“Pelo que estamos vendo, é o coronel, é o general, é o cabo, é o soldado, uma trupe inteira envolvida na lavagem de dinheiro, que é o que estamos neste momento identificando”, ressaltou, lembrando aindao esquema de venda ilegal de joias da União.
“Um dos militares golpistas”
Outra versão que o sargento Reis tentou contar foi a de que esteve na Esplanada dos Ministérios, em 8 de janeiro, apenas como um cidadão curioso. Também acabou desmentido, poisas mensagens descobertas pela PF em seu celularevidenciaram seu entusiasmo e apoio aos atentados terroristas daquele dia.
“O senhor estava ali engajado no golpe. O senhor é um dos militares golpistas”, acusou Rogério Correia, defendendo a punição de todos os membros das Forças Armadas que atentaram contra a democracia, seja qual for suas patentes.
“Se as Forças Armadas estão incomodadas de serem chamadas de golpistas, que eles assumam aqueles elementos que estavam no golpe, como é o caso do senhor, doLawand, doMauro Cid, dogeneral Dutra. E nós vamos ter que escutar também o ministro da Defesa de Bolsonaro, que permitiu, a mando de Bolsonaro, que um hacker entrasse no ministério para falar de urnas eletrônicas”, defendeu o deputado.
O senador Rogério Carvalho fez uma fala semelhante: “A democracia venceu aqueles que acreditavam na ditadura, no autoritarismo, no Exército como instrumento de morte contra o povo brasileiro, contra a democracia e contra a sociedade brasileira. Eu quero aqui dizer, àqueles que resistiram no Exército contra o golpe, meu respeito. E àqueles que se colocaram junto dessa aventura golpista, meu desprezo. E que a punição seja exemplar. Sem anistia para aqueles que traíram a democracia e o Brasil.”
Rogério Correia: "O senhor não estava passeando e sim engajado no golpe"
Também presente na audiência, o líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (ES), ressaltou que figuras como a do sargento Reis mostram bem do que se trata o bolsonarismo: “O encontro do negacionismo com o golpismo”.
“Bolsonarismo é isso: nega a ciência, ovaciona torturador, fala que é a favor da liberdade de expressão, mas apoia ditadura, a censura na ditadura. Isso é o bolsonarismo, que nega que a Terra é plana, que nega vacina para a população, que matou 700 mil pessoas, que enfia ivermectina na população. Isso não é comportamento de um integrante das Forças Armadas”, afirmou o senador.
Rubens Pereira: "A oposição está, arrependida de ter convocado essa CPI"
Reinaldo: Mais joias no avião? O sargento “coach” e o tenente-coronel mágico
(continuação) No Forte Apache, a sede do comando em Brasília, o mantra é de que“qualquer um que tenha mostrado desvio no comportamento de retidão e legalidade será punido”.
Oficiais dizem que o objetivo é mostrar que a instituição não vai “passar pano” para os ilícitos de ex-membros. Inclusive, eventualmente, de Lourena Cid, que já estava “aposentado” desde 2019.
O atual comandante, generalTomás Paiva, quer antes de mais nada “virar a página” dos problemas que Bolsonaro causou. Para isso, no dia 13, ogeneral publicou uma ordem interna estipulando que o Exército deve pautar suas ações pela “legalidade e legitimidade”.
No documento, ele reforça o caráter do Exército como “instituição de Estado, apartidária, coesa e integrada à sociedade”. Trata-se da ordem fragmentária nº 1, que procura, nas suas palavras, fortalecer a imagem e a reputação da corporação, evitando-se “a desinformação”.
Na sede da Força, o que se diz é que esse documento já estava em elaboração desde a gestão do generalJúlio César Arruda, que foi indicado no final do ano passado para o posto e acabou demitido por Lula em janeiro após os ataques de 8 de janeiro.
Mais do que isso, a demissão teria sido motivada pela insistência de Arruda em efetivar justamente Mauro Cid em um importante comando de tropas em Brasília, a chefia do 1º Batalhão de Ações de Comando do Exército em Goiânia.
Fato é queesse documento divulgado pelo novo comandante é mais uma tentativa de pacificar a caserna.Para isso, Paiva criou um grupo de trabalho, assim como uma associação nacional de Amigos do Exército.
Mas isso será suficiente para capturar corações e mentes das tropas, familiares e oficiais reformados?Um dos objetivosdo atual comando é aproximar a instituição dos veteranos, mas não será tarefa fácil despolitizar clubes militares e associações que embarcaram no radicalismo golpista de forma escancarada.
Outra estratégiado comandante é pacificar o público interno combenesses para a corporação, como: * reforço em salários, * assistência social, * sistema de saúde, * colégios militares * e moradias.
Essa foi uma das estratégias de Bolsonaro para atrair os oficiais de patentes inferiores.
Mas há dúvidas se a ofensiva corporativista será suficiente para debelar o encanto extremista. Uma forma mais eficiente seria provar que a Força está “cortando na carne” para apurar responsabilidades.
Mas o Inquérito Policial Militar que foi aberto para investigar os atos golpistas, concluído em julho,livrou as tropas de culpae apontou indícios de responsabilidade daSecretaria de Segurança e Coordenação Presidencial, que integra oGabinete de Segurança Institucional.
Ou seja, atribuiu ao próprio governo Lula, no oitavo dia de gestão, a responsabilidade por falhas em prevenir atos de insurreição.
Porta dos fundos
O constrangimento recente não foi apenas com o clã Mauro Cid. Em depoimento à PF, o hackerWalter Delgattidisse que participou de reuniões no Ministério da Defesa em tentativas de desacreditar as urnas.
Ele teria entrado cinco vezes pela porta dos fundos do Ministério para que sua presença não fosse registrada. Pior:afirmou que “orientou” o conteúdo do relatório do Ministério da Defesa sobre as urnas eletrônicas entregue ao TSE em novembro de 2022.
Nessa ocasião, o Ministério era chefiado pelo generalPaulo Sérgio Nogueira. Delgatti, que está preso, evidentemente é uma testemunha suspeita. Acaba de ser condenado a 20 anos de prisão no caso da Vaza Jato. Mas suas afirmações trouxeram grande preocupação ao comando do Exército.
O ministro da Defesa,José Múcio, pediu à PF a lista de militares que teriam se encontrado com Delgatti. A PF não liberou, alegando que o inquérito é sigiloso, mas o ministro espera liberar essa informação com o STF. É uma boa forma de se conhecer os membros da corporação que teriam agido contra a Justiça Eleitoral.
Na prática, com o depoimento de Delgatti, os militares passaram a ser mais visados. E a situação pode se complicar ainda mais após a apreensão dos celulares do general Lourena Cid e do advogadoFrederick Wassef, cujas senhas já foram quebradas e que estão sob análise da PF.
Um dos aparelhos de Wassef era usado exclusivamente para a comunicação com Bolsonaro. E oseu celular já teria indicado que o ex-presidente tinha conhecimento das negociatas com joias.
7 de setembro
Enquanto os militares tentam pacificar a família castrense e pisam em ovos com as revelações que ainda surgirão, o governo vive o dilema de como agir com os militares.
Se Lula atuar de forma persecutória, arrisca-se a colocar a instituição contra o governo. Se não agir com firmeza, o ovo da serpente se desenvolve.
Com a elevação da temperatura nos inquéritos da PF e a aproximação das comemorações do 7 de setembro, o presidente resolveu agir.
Chamou os três comandantes militares para o Palácio da Alvorada fora da agenda no sábado, dia 19. O ministro da Defesa,José Múcio, levou os comandantes doExército, daMarinhae daAeronáutica.
Oficialmente, trataram dos investimentos na Defesa anunciados no lançamento do Novo PAC, de nada menos que R$ 52,8 bilhões.
Na prática, o petista cobrou rigor contra os comportamentos desviantes.A ideia é que nenhum fardado seja perseguido, mas que nenhum também deixe de ser punido se for comprovada sua participação em ilícitos.
Lula deseja se aproximar da categoria e diminuir a tensão. A estratégia, aparentemente, é conquistar a caserna com recursos e benefícios sociais, enquanto se cobra disciplina e o respeito à Constituição.
O presidente Lula recebeu comandantes do Exército, Marinha, Aeronáutica e cobrou penas devidas aos militares envolvidos em ilegalidades (Crédito:Ricardo Stuckert)
Trata-se de um equilíbrio delicado em meio a uma relação ainda conturbada. No Congresso, houve um aperitivo da dificuldade. Uma sessão daComissão de Constituição e Justiça (CCJ)da Câmara voltou a debater o papel dos militares e o artigo 142 da Constituição, que foi indevidamente invocado por Bolsonaro e seus seguidores como se ele estabelecesse um “poder moderador” das Forças Armadas.
A tese de alterar esse dispositivo constitucional é abraçada especialmente porparlamentares petistas, o que promete jogargasolina da fogueirada insatisfação das alas mais conservadoras dos quartéis.
Enquanto a esquerda quer aproveitar o acerto de contas com as atitudes golpistas, o comando tem a difícil missão de despolitizar e profissionalizar as forças.
As principais bolhas da internet – a da esquerda e a da direita – se uniram para criticar a Força.Enquanto a esquerda critica a ação antidemocrática, os radicais bolsonaristas atacam os “generais melancia” (verdes por fora, vermelhos por dentro), que teriam “aderido” ao governo.
O Exército, por exemplo, não sabe se mantém os seus canais nas redes sociais abertos para comentários ou não, já que as críticas vêm dos dois lados.
Sigilos desfeitos
Depois do depoimento do hacker, a CPMI passou a ser o maior foco de preocupação para os militares. A relatora, senadoraEliziane Gama(PSD), quer aprovar a quebra de sigilo telefônico e telemático do generalPaulo Sergio Nogueira, ex-comandante do Exército e ex-ministro da Defesa de Bolsonaro, para depois avaliar sua convocação.
Nogueira foi acusado por Delgatti de ter se encontrado com ele para falar sobre urnas eletrônicas. Isso ampliaria a tensão no Alto-Comando.
Mas o presidente da comissão,Arthur Maia, sinalizou que vai aliviar a pressão para os militares.Na manhã de quarta-feira, 23, ele teve um encontro com a cúpula do Exército e em seguida blindou os generais ao definir a pauta da comissão.
Com o isso, não foram marcados os depoimentos deAugusto Heleno(ex-chefe do GSI) e deGustavo Henrique Dutra de Menezes(ex-chefe do Comando Militar do Planalto).
ApenasG.Dias(ex-ministro do GSI de Lula, que foi demitido em abril após aparecer em um vídeo circulando entre os vândalos no dia 8 de janeiro) será ouvido na próxima quinta-feira.
Isso irritou a relatora, senadora Eliziane Gama, que desejava fechar o cerco ao oficiais.“O coronel Mauro Cid tinha armazenado no seu celular um roteiro de um golpe, uma minuta de GLO, e várias conversas de militares que chegavam a ele na tentativa de levar ao presidente um estímulo para a intervenção militar, ao mesmo tempo em que fazia movimentações financeiras muito significativas. Há uma necessidade de ampliar essa investigação. Ver a participação do pai, o general Lourena Cid, do advogado Wassef. Não dá para considerar o caso das joias como um caso isolado. Não vamos investigar o caminho das joias, isso é trabalho para a PF. Mas queremos saber se houve trânsito desse dinheiro para o 8 de janeiro”, diz Eliziane.
Mas tudo indica, até o momento, que os generais terão vida dura apenas nos inquéritos da PF.
O ministro da Defesa, José Múcio (à esq.), quer saber pelo STF quais militares encontraram o hacker Walter Delgatti durante campanha (Crédito:Antônio Oliveira)
Enquanto os militares tentam driblar o crivo pela eventual participação em malfeitos,a confiança dos brasileiros nas Forças Armadas registrou queda desde o fim do ano passado, segundopesquisa Genial/Quaestdivulgada no dia 21.
Em dezembro de 2023, 43% dos entrevistados diziam “confiar muito” nas Forças Armadas. Esse índice teve queda de 10 pontos percentuais e chegou a 33% em agosto deste ano.
Parte dessa queda se deve aos eleitores de Bolsonaro, que se sentiram “traídos” pela não adesão ao golpe. Mas o resultado mostra odilema da caserna.
Como diz o dito popular, quando a política entra nos quartéis por uma porta, a disciplina sai pela outra. Por trás da crise está o papel hipertrofiado e indevido conquistado pelos militares no governo Bolsonaro.
Resta ao governo Lula o dever (e a habilidade) de recolocar as Forças Armadas no trilho institucional, no respeito à democracia e na profissionalização no seu papel de Defesa, como estabelece a Constituição.
Os militares que são tão ciosos com o respeito às regras deveriam ser os primeiros interessados em acertar contas com a sociedade.
Os Cid: pai e filho protagonizam novela que envolve a alta cúpula do Exército e compromete a credibilidade das Forças Armadas sobre participação em ilicitudes políticas como poucas vezes na história (Crédito:Fátima Meira/Futura Press/Folhapress; Fernando Souza/AFP) Tal pai, tal filhote que chama Bolsonaro de tio
Marechal de contracheque embolsa salário de contrabandista de joia, de latifundiário grileiro de terras, de empresário minerador de ouro e pedras preciosas na Amazônia, de militar chefe de embaixada nos Estados Unidos e Europa, e de leiloeiro de empresas estatais do Brasil sem lei. Publica Istoé:
É até surpreendente a facilidade com que o capitãoJair Bolsonaroconseguiu cooptar setores militares para seu movimento golpista. Ele precisou demitir a cúpula das Forças Armadas em março de 2021 na maior crise na caserna desde a redemocratização, mas em seguida conseguiu um comando mais dócil noMinistério da Defesa, que inclusive o ajudou a questionar a integridade das urnas eletrônicas. O festival de acampamentos golpistas em frente aos quartéis até janeiro mostrou que a adesão não era limitada e nem silenciosa.
Os ataques de 8 de janeiro colocaram em xeque a adesão dos fardados ao golpe. Oito meses depois, porém, a despolitização da caserna ainda é um sonho distante e asrevelações da PF comprometem cada vez mais militares na miríade de ilicitudes do ex-presidente.
O mais recente constrangimentocaiu como uma bomba no Alto-Comando do Exército:a revelação de que o general reformado Mauro Lourena Cid participou da venda nos EUA de joias recebidas por Bolsonaro.
Antigo colega de Bolsonaro naAcademia Militar das Agulhas Negras, Lourena Cid foi escolhido pelo então presidente para chefiar o escritório daApexem Miami. Seu filho, o tenente-coronel Mauro Cid, é o notório ex-ajudante de ordens do capitão.
Essa família castrense mergulhou a instituição numa crise que parece não ter fim.
Lourena Cid não era um general qualquer. Quatro estrelas, integrou o Alto-Comando do Exército. Nos últimos meses, vinha exercendo sua influência em uma peregrinação junto a integrantes da cúpula do Exército para interceder pelo filho preso.
O fato de ele próprio ter sido enredado no escândalo (com foto e tudo dele segurando um kit de joias para ser negociado) escandalizou os colegas e trouxe inquietação.
Um militar ligado ao Alto-Comando diz que o sentimento é detraição.
“Ele era recebido e ouvido sempre que nos procurava. Mas o fato de ter omitido que tinha emprestado a conta bancária lhe fechou as portas. O sentimento é de quebra de confiança. Pior: já não sabemos mais o que esperar. Pode ser que ele esteja ainda mais envolvido do que sabemos até o momento”, afirmou.
E acrescentou: “Estamos com opé atrás. Seguimos respeitando o posto do general Lourena Cid. Isso não dá para deixar de ter.Mas ele está sozinho”.
Esse oficial defende o “expurgo” para quem fere a “honra militar” e diz queé dado como certo que Mauro Cid deve perder a patente após a condenação na Justiça. “A probabilidade é gigantesca”, afirma.
Mesmo encarcerado, o tenente-coronel mantém corrida e exercícios diários, sempre sob vigilância de policial do Exército (Crédito:Cristiano Mariz)
Encarcerados civis amontoados sem banho de sol e sem banho de lua e sem banho de chuva e chuveiro
Mauro Cidestá preso no Batalhão de Polícia do Exército de Brasília desde o dia 3 de maio, onde segue uma rotina de exercícios físicos diários e leituras, inclusive dosseis inquéritos em que é investigado.
A primeira dor de cabeça do tenente-coronel veio com sua participação na divulgação ilegal de uma investigação sigilosa da PF sobre um ataque hacker ao TSE.Bolsonarousou os documentos em uma live para tentar desacreditar as urnas.
O inquérito vazado havia sido divulgado em um site bolsonarista por outro membro do clã, o irmão de Mauro,Daniel Cid. Daniel atua na área de segurança digital na Califórnia, onde comprou uma mansão avaliada em mais de R$ 8,5 milhões.
A família tem uma empresa registrada no país, aCid Family Trust. ACPMI dos Atos Golpistas já aprovou requerimentos para investigar quais empresas o pai e os dois filhos têm no exterior.
Mas essa pista ainda está travada. O presidente da comissão,Arthur Maia, não permitiu a votação do requerimento que estenderia essa apuração àmulher de Mauro Cid,Gabriela Santiago Ribeiro Cid, além de outros membros da família.
Sobre as volumosas movimentações bancárias de Mauro Cid depois de sua prisão, elas teriam sido realizadas por Gabriela, pois trata-se decontas conjuntas.
Walter Delgatti teve o sigilo quebrado a pedido da CPI dos Atos Golpistas, que em ato contínuo reconvocou Mauro Cid (Crédito:Mateus Bonomi )
Visitas
O dia a dia de Mauro Cid no Batalhão não é exatamente espartano. Tem um quarto com TV e frigobar. Chegou a receber 73 visitas até junho, boa parte de apoiadores do ex-presidente, como os generaisEduardo PazuelloeHamilton Mourão.
Mas os negócios com joias e Rolex complicaram tudo. Ele agora só pode receber parentes.O pai, general Mauro Lourena Cid, perdeu o direito de visitar o filho.
Esse último desdobramento também fez Mauro Cid trocar o defensor. Seu novo advogado,Cezar Bitencourt, chegou a sugerir que o cliente iria fazer uma confissão e apontar Bolsonaro como mandante do esquema de venda de joias. Depois, se desdisse e passou a dar versões contraditórias.
Agora, planeja uma audiência com o ministroAlexandre de Moraes, relator dos inquéritos no STF, para tentar melhorar a situação do cliente.
À ISTOÉ, ele disse que só tinha tido duas conversas com o cliente até a última segunda-feira, em que sequer o tema da confissão foi tratado.
Também afirmou que fará a defesa do pai de Mauro Cid, caso seja aberto alguma ação contra ele.
Militares apontam que o general Lourena Cid pode até mesmo ter sua aposentadoria cassada pelo Superior Tribunal Militar (STM). E a mesma corte pode cassar o posto e a patente de Mauro Cid.
Mas, para os militares, essapenalização na esfera militardepende primeiro da condenação naJustiça criminal.
O generalCarlos Alberto dos Santos Cruz, ex-ministro da Secretaria de Governo, diz que nunca trabalhou diretamente com Lourena Cid, mas elogia o companheiro de farda. “Sempre foi um militar com boa performance profissional. Em processos de merecimento e escolha percorreu todos os postos da carreira.”
Já o filho, para ele, “é um rapaz de conduta profissional de destaque. Como Ajudante de Ordens, sempre se mostrou um rapaz educado, atencioso.”
Sobre o argumento de que Mauro Cid teria apenas cumprido ordens, Santos Cruz, um dos fardados que romperam com Bolsonaro, é bastante crítico.“Acho os fatos lamentáveis. Se o presidente sabia ou não das iniciativas dos seus subordinados diretos, é necessário uma conclusão das investigações. Mesmo que se considere difícil ou improvável um subordinado tomar certas iniciativas sem o conhecimento do seu chefe, isso precisa ser esclarecido e comprovado”, afirma.
Como os colegas, ele tentaseparar a instituição dos elementos que mancharam a Força. “É importante separar as coisas. Os fatos são de responsabilidade individual e não de responsabilidade institucional.”
Outro oficial que atua com o Alto-Comando cerra fileiras com o mesmo argumento:“Ordem ilegal ou absurda não se cumpre”.
Para esse militar, “a forma como Mauro Cid agiu na Ajudância de Ordens não é adequada,aquela subserviência toda não é papel de militar, não nos serve.” (continua)
O tempo presente vem desnudar o véu da persistente e violenta estrutura escravista brasileira, viva e atual, dispondo de métodos mais sutis de construção de golpes civil-militares híbridos
por Alexandre Aragão de Albuquerque
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Braço forte, mão leve, cara lisa. Em 11 de julho o tenente-coronel do Exército brasileiro, Mauro Cesar Barbosa Cid (Mauro Cid), ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro e filho do general Mauro Cesar Lourena Cid, preso desde maio por ser objeto de oito investigações pelo Supremo Tribunal Federal (STF), apresentou-se fardado para prestar depoimento na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), que apura o atentado golpista de Estado perpetrado no dia 08 de janeiro contra a democracia brasileira.
Esse evento, denominado pelos arruaceiros criminosos de “Festa da Selma”, ocupando e depredando os prédios dos Três Poderes, uma turba coordenada e alimentada ao redor dos quartéis em diversas partes do Brasil, desde o final do pleito de outubro de 2022, demonstrava publicamente o grau de comprometimento daquela força militar com a quadra tenebrosa vigente com a chegada do bolsofascismo ao poder executivo central. Fardado naquela sessão da CPMI, o tenente-coronel Mauro Cid apresentava-se não como uma pessoa individual, mas como uma pessoa coletiva, um representante da instituição.
Para ajudar na compreensão da enorme assimilação de Jair Bolsonaro no Exército, é preciso olhar para a Academia Militar Agulhas Negras (Aman), principalmente para a turma de 1977. Se sua reabilitação naquela força terrestre já havia ocorrido exemplarmente na formatura dos cadetes em 2014, ou seja, bem antes das eleições de 2018, esse processo foi coroado com a chegada, ao topo do poder militar, de seus contemporâneos da Aman. Quando assumiu a presidência do Brasil, quatro dos seus colegas de turma exerciam o posto máximo da carreira: os generais Mauro Cesar Lourena Cid (pai do tenente-coronel Mauro Cid), Carlos Alberto Neiva Barcellos, Paulo Humberto Cesar de Oliveira e Edson Leal Pujol haviam sido promovidos a generais de exército (quatro estrelas).
Edson Leal Pujol, como se sabe, foi nomeado comandante do Exército. Lourena Cid foi nomeado Chefe do Escritório da Agência Brasileira de Promoção de Exportações (Apex), em Miami – EUA. Paulo Humberto virou presidente da Postalis, fundo de pensão dos funcionários dos Correios. E Neiva Barcellos assumiu, em Genebra – Suíça, o posto de conselheiro militar junto à representação do Brasil na Conferência do Desarmamento na ONU.
Mas, além disso, as boas relações dos integrantes da turma da Aman 1977 com o Executivo Federal (Jair Bolsonaro) se estenderam para além do seleto grupo de generais quatro estrelas. Para ficar num único exemplo, o general de brigada (duas estrelas) da reserva Cláudio Barroso Magno Filho atuou como lobista ativo de mineradoras brasileiras e canadenses com interesses em exploração em áreas indígenas, tendo sido recebido pelo menos dezoito vezes no Planalto. (Cf. VICTOR, Fábio.Poder camuflado, Companhia das Letras).
Visando mensurar a dimensão do fenômeno de cessão de integrantes das Forças Armadas para exercer funções de natureza civil no governo Bolsonaro, entre 2019 e 2022 foram produzidos inúmeros levantamentos. Coube ao Tribunal de Contas da União (TCU), a pedido do ministro Bruno Dantas, uma dessas investigações, identificando a presença de 6.157 (seis mil, cento e cinquenta) militares exercendo funções civis na administração pública federal em 2020.
Como atesta o pesquisador Fábio Victor, os benefícios, privilégios e agrados dos mais variados a integrantes das Forças Armadas foram um dos fortes sintomas da militarização da gestão pública federal sob o bastão de Bolsonaro, mostrando abertamente que não se tratava apenas de um governo de militares, mas também para militares. Um dos fortes sinais desta situação pode ser facilmente constatado pela manobra autorizada pelo ministério da Economia de Paulo Guedes, garantindo supersalários para vários militares em altos postos na Esplanada. Generais palacianos como Augusto Heleno (o pequeno), Braga Netto e Luís Eduardo Ramos começaram a ganhar R$60 mil por mês, acima do teto máximo constitucionalmente permitido equivalente ao vencimento dos ministros do STF (op. cit.).
Voltando um pouco na história, importante relembrar que, na véspera do julgamento doHabeas corpusem 04 de abril de 2018, para garantir liberdade ao então ex-presidente Lula, autorizando-o a concorrer à eleição presidencial daquele ano, o general quatro estrelas, da reserva, Luís Gonzaga Schroeder Lessa, que fora comandante militar do Leste e da Amazônia, rosnou numa entrevista concedida ao jornal golpista O Estado de São Paulo: “Se acontecer [o habeas corpus], aí eu não tenho dúvida de que só resta o recurso à reação armada. Aí é dever da Força Armada restaurar a ordem” (Supremo pode ser indutor da violência.O Estado de S. Paulo,03 de abril de 2018).
Às 20h39, do mesmo dia 03 de abril, o general três estrelas Otávio Rego Barros (que viria a ser porta-voz da presidência na gestão Bolsonaro), auxiliar direto de Eduardo Villas Bôas, disparou o tuíte, na página oficial do seu superior, a ameaça do então comandante do exército ao Supremo Tribunal Federal: “Asseguro à Nação que o exército brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social, à Democracia,bem como se mantém atento às suas missões institucionais”. Resultado já sabido, no dia seguinte, o STF negou oHabeas corpusao então ex-presidente Lula. Jair Bolsonaro chegou ao poder executivo central com sua companhia de militares, a partir do histórico emparedamento do Supremo por generais do exército. O autoritarismo seria o traço desta gestão presidencial.
No dia 02 de janeiro de 2019, na cerimônia de posse de cargo do ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, o já presidente Bolsonaro discursou:“General Villas Bôas, o que já conversamos morrerá entre nós. O senhor é um dos responsáveis por eu estar aqui”.Em resposta a Jair Bolsonaro, no dia 11 de janeiro, na transmissão do comando do exército para Pujol, Villas Bôas disse:“A nação brasileira festeja os sentimentos coletivos que se desencadearam a partir da eleição de Bolsonaro”.
Pergunta-se: que sentimentos seriam? A exacerbação da violência social e estatal, da discriminação, da elevação do autoritarismo, da subserviência ao poder estadunidense, da perda da credibilidade internacional do Brasil, do desmonte e entrega do patrimônio público ao capital privado, da propagação indiscriminada defake news, do ataque sistemáticos às urnas eletrônicas e aos Tribunais Superiores, do descaso pelas pautas populares, da insensibilidade diante da miséria a que o povo brasileiro esteve submetido durante os quatro anos do governo passado? Este foi o projeto militar bolsonarista?
O tempo presente, depois do retorno à democracia com a reeleição do Presidente Lula em 2022, vem desnudar o véu da persistente e violenta estrutura escravista brasileira, viva e atual, dispondo de métodos mais sutis de construção de golpes civil-militares híbridos, cínicos, como ocorreu em 2016 e aprofundou-se em 2019, com o objetivo de manter a concentração de renda e poder nas mãos de pouquíssimos privilegiados, avessa a qualquer horizonte democrático alicerçado na liberdade e na igualdade substantivas, bem como na justa distribuição dos bens produzidos socialmente.
Mas agora o ditador está nu e precisa ser combatido tenazmente por toda a sociedade democrática. A nudez do ditador faz lembrar aquele conhecido poema colegial: “Um coleguinha me deu a cola / Eu a distribuí com a tropa / Dos mais argutos aos mais carolas / Todos chafurdaram gatunamente nas pedrarias / A farsa repetindo-se pela histórica e reincidente malandragem da companhia”.
O senador Eduardo Girão foi surpreendido pela mãe do estudante brasileiro madalhista de ouro nas Olimpíadas Internacionais de Matemática. Meu filho "jamais apoiaria um governo teocrático e anticiência". (crédito: Ed Alves/CB/DA.Press)
O estudante recebeu os parabéns por meio do perfil oficial do parlamentar.
"Um jovem brasileiro ganhou medalha de ouro na Olimpíada Internacional de Matemática (IMO), que aconteceu no último dia 13 em Shiba, Japão. Era a primeira vez dele no torneio! Matheus Alencar de Moraes, de 16 anos, é o responsável pelo feito. Ele foi o primeiro cearense a ser contemplado com a premiação no evento, e a rotina até o prêmio envolveu longas horas de estudo e preparação. O garoto, que estuda no Colégio Farias Brito (CE), viajou acompanhado de amigos, que também participaram da competição. Além dele, mais dois alunos conquistaram medalhas. Rodrigo Salgado, ganhou medalha de prata, e Luiz Felipe Giglio, ficou com o bronze", escreveu Girão.
A alegação foi o suficiente para que a mãe de Matheus, Marcela Alencar, comentasse o post. Ela criticou o recorte da foto e o comentário feito pelo parlamentar. Marcela também afirmou que seu filho "jamais apoiaria um governo teocrático e anticiência".
“A imagem mostra a camisa que ele estava usando, a qual homenageia grandes nomes da MPB. Além disso, informo a todos os seguidores do ilustre senador que esse menino prodígio foi muito bem educado social e politicamente e, portanto, jamais apoiaria um governo militarizado, teocrático e anticiência. Lamento ver uma notícia tão feliz sendo usada de forma equivocada e politizada pelos seguidores”, escreveu Marcela.
De forma equivocada e politizada, Girão reuniu no Senado, no dia 30 novembro, um bando de golpistas, inclusive os terroristas que participaram da noite de terror do dia 12 de dezembro, e pretendiam explodir o Aeroporto de Brasília na Noite de Natal.
De forma politizada e enganosa, Girão foi para os Estados Unidos levar manifesto bolsonarista que considera vítimas os golpistas e terroristas presos pelos ataques 'as sedes dos Três Poderes, em 8 de janeiro. O mentiroso documento era endereçado ao Comitê de Direitos Humanos da ONU — cuja sede é em Genebra. Um bando de giras e Girão:
TURISTAS DO GOLPE. Portinho, Van Hatten, Girão e Malta com Danese (C). Documento que levaram aos Estados Unidos deveria ser entregue em Genebra (crédito: Reprodução/Redes sociais)
Os terroristas e parceiros George Washington de Oliveira Sousa e Alan Diego Rodrigues, estranha e misteriosamente estiveram presentes em uma reunião no Senado Federal, que ocorreu em 30 de novembro, e discutiu as denúncias de Bolsonaro, que afirmou que faltou isonomia nas inserções nas rádios durante o período eleitoral.
Sentados no plenário, a parelha esteve junto de nomes importantes do bolsonarismo, como o senador eleito Magno Malta (PL-ES) e o deputado cassado Daniel Silveira (PTB-RJ).
A derrota de Bolsonaro, nos dois turnos das eleições presidenciais, motivou a esdrúxula reunião de senadores e deputados golpistas na Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor, para discutir a fiscalização das inserções de propagandas políticas eleitorais. O requerimento foi do senador Eduardo Girão (PODEMOS/CE) orientado pelo jurista Ives Gandra.