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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

12
Jun22

PRF-SE, um histórico de violências e violações

Talis Andrade

www.brasil247.com - Genivaldo de Jesus

 

Colunista Marcelo Auler cita o caso Genivaldo e afirma que 'outros moradores de Umbaúba sofreram truculência parecida por motivos idênticos: o uso de motos'

 

 

por Marcelo Auler

A violenta e criminosa abordagem que policiais rodoviários federais promoveram, em 25 de maio, aplicando torturas que levaram ao assassinato de Genivaldo Jesus dos Santos, um sergipano negro, de 38 anos, que vivia sob tratamento de distúrbios mentais, não foi fato isolado. Truculência parecida já tinha sido praticada contra outros moradores da cidade, por motivos idênticos: o uso de motos, transporte utilizado na cidade até mesmo por crianças.

A diferença é que no caso de Genivaldo a abordagem que terminou em um homicídio – provavelmente qualificado – foi registrada em vídeos por transeuntes. Filmagens que viralizaram nas redes sociais e desmontaram a “versão oficial” apresentada no Boletim de Ocorrência, na Delegacia de Polícia Civil de Umbaúba, cidade distante 102 quilômetros da capital sergipana, ao sul do estado. Uma versão prontamente encampada pela administração da Polícia Rodoviária Federal (PRF) que chegou a falar no emprego de “técnicas de imobilização e instrumentos de menor potencial ofensivo” na contenção da vítima. Diante dos vídeos que desmentiam tal afirmativa, a corporação se viu obrigada a recuar.

Quase dois anos antes, por exemplo, em 1 de agosto de 2020, dois dos policiais rodoviários federais que aparecem no Boletim de Ocorrência em torno da prisão de Genivaldo – Paulo Rodolpho Lima Nascimento (matrícula: 1318594) e Clenilson José dos Santos (matrícula: 1510422) – registraram, na PRF, o Boletim de Ocorrência Circunstanciado Nº 1510422200731105030. Nele narram a apreensão da menor M.D.N., então com 17 anos, por trafegar em uma moto sem habilitação para tal.

Seria, aparentemente, um caso corriqueiro, em que a irmã mais velha da detida, E. N. J., proprietária da motocicleta, respondeu ao processo nº 202087001409, no Juizado de Umbaúba, no qual foi condenada a uma multa de um salário mínimo por ter permitido o uso de sua Honda BlZ 110 por uma pessoa não habilitada.

 

Verdade omitida

 

Na realidade, porém, o caso foi bem diferente do relatado pelos policiais rodoviários federais no Boletim de Ocorrência. Deliberadamente omitiram informações importantes e incluíram fatos contestados pelas duas irmãs, como de que a perseguição teve início na rodovia, onde M.D.N. diz não ter passado.

A omissão maior está nas conseqüências daquela abordagem policial, que deixou em M.D.N, uma sequela para o resto da vida. Ela teve uma fratura do fêmur direito, em consequência da queda da motocicleta que, segundo diz, foi provocada pelos próprios PRFs. No BO o fêmur fraturado transformou-se em “dores no joelho direito, não conseguindo movimentá-lo”.

 

O fêmur fraturado de M.D.N. no Boletim de Ocorrência feito pelos PRFs virou uma “dor de joelho”.

 

Na ocorrência os policiais dizem que a queda foi fruto de uma trombada da moto, desgovernada, “contra a parede de uma casa”. Na versão da vítima e seus familiares, o tombo foi provocado pelos próprios policiais, dentro do perímetro urbano da cidade, área que foge à jurisdição da PRF. Por não ter parado diante da sirene das motos dos policiais – segundo diz, achou que não era com ela – os dois a perseguiram e a derrubaram da moto com chutes, provocando o acidente, conforme relatou M.D.N. na entrevista que nos concedeu (vídeo abaixo).

Além de fraturar o fêmur, a menor diz que com a queda quase se sufocou, pois o capacete a apertava ao mesmo tempo em que expelia sangue pela boca. Uma transeunte a salvou, retirando a proteção de sua cabeça, sem respeitar a ordem dos policiais que quiseram impedir tal providência:

“Eu estava meio que agonizando, porque o capacete estava apertando pela boca e uma moça falou ‘vamos retirar o capacete dela’. Os policiais disseram ‘não vai retirar não. Deixa ela assim mesmo’. Aí a moça esperou ele se distrair e puxou o capacete. No que ela puxou o capacete ela disse que eu dei um suspiro”, relata D.N. no depoimento gravado no último dia 3 de junho.

 

 

Também não existe nenhuma referência ao incidente com A.D.N., pai da M.D.N. Como narra no depoimento que nos prestou, ele circulava nas proximidades ao saber que os policiais rodoviários federais estavam “enrabando” (termo usado na região para descrever uma perseguição policial) uma menina.

 

 

A.D.N. não imaginava ser sua filha, mas ao vê-la caída, meio que desmaiada, expelindo sangue pela boca, questionou em voz alta: “É preciso isso?” Foi o suficiente para desagradar um dos policiais que lhe respondeu com spray de pimenta no rosto e na barriga, recomendando que “não colocasse mais suas patas ali”. Embora se calasse, não arredou pé do local até a ambulância do SAMU recolher sua filha, que foi acompanhada da mãe para o hospital. Nada disso, porém, foi levado ao Boletim de Ocorrência que apenas registra a presença do genitor da menor.

 

 

Violência se repetiu

 

Episódio parecido ao de M.D.N – uma queda da moto provocada pela ação policial – foi relatado na Delegacia de Polícia Civil de Umbaúba por outro jovem morador da cidade, no dia 27 de maio, isto é, dois dias após o assassinato de Genivaldo.

Encorajado pela repercussão do assassinato no dia 25, J., de 21 anos, procurou a polícia alegando ter sido perseguido e derrubado da motocicleta, mesmo depois de parar de fugir e se render a dois policiais rodoviários federais. Foi o que narrou com exclusividade a jornalista Thaísa Oliveira, da Folha de S.Paulo, na reportagem Jovens dizem terem sido agredidos por PRFs em Umbaúba dois dias antes da morte de Genivaldo, dando conta do registro tardio do fato ocorrido em 23 de maio:

Nos documentos, um homem de 21 anos e um adolescente de 16 relatam que, mesmo algemados com as mãos para trás, receberam chutes, tapas e pisões no rosto. Segundo os jovens, a abordagem contou com quatro agentes.(…)

Depois, os agentes mandaram que ele ‘ficasse sentado e começaram a lhe dar tapas no rosto’. O homem, então, relata ter pedido para que os policiais não o matassem. ‘Não me mate não, me leve preso’; que um dos policiais disse: ‘Vou te levar pra mata pra você aprender!’, consta em trecho do boletim de ocorrência. Ele diz que ‘sofreu lesões do lado esquerdo do rosto e nos lábios, em decorrência da pressão feita pelos pés do policial no seu rosto, pressionando a sua face contra o chão’.

Em depoimento à TV Sergipe o mesmo jovem, não identificado por questões de segurança, confirmou que ao decidir parar de fugir e se entregar, foi derrubado da moto e sofreu agressões, como reportado no Jornal local do dia 1 passado, pela repórter Lays Rocha, como pode ser visto nesse vídeo:

Quando eu parei a moto, eles vieram e colidiram na minha moto. Bateram no fundo da minha moto e eu caí. Quando eu caí… eu estava com mais um colega meu. Quando eu caí, ele também caiu… com medo ele correu ainda um pouco, aí eu comecei a chamar ele. Ele parou, um policial foi até ele e o outro veio por trás de mim e me deu um golpe e eu caí. Assim que eu caí começaram as agressões. Foi chute, tapa… as agressões que eles fizeram comigo eu não consegui nem perceber tanto pois eu estava tentando proteger meu rosto, tentando proteger o corpo, né?… alguns arranhões.. eu pedia e eles não pararam. Eles não paravam. Achava eu que eles iam me matar de pancada”.

 

Fraude processual

 

Estes episódios apenas reforçam que a violência com que policiais rodoviários federais atuam naquela região é rotineira e antiga. Demonstram ainda que esses mesmos policiais cometeram, em outras oportunidades, a chamada “fraude processual”, tal como classificou o advogado Ivis Melo de Souza, que representando a mãe, Maria Vicente de Jesus, e as irmãs, Alice e Valdice de Jesus Santos, de Genivaldo atuará como assistente de acusação no processo criminal a ser instaurado em conseqüência do assassinato do sergipano.

Com base no fato de os policiais registrarem um Boletim de Ocorrência, na Delegacia de Polícia Civil de Umbaúba com relato totalmente diferente do que realmente ocorreu na abordagem do dia 25 de maio, Melo de Souza entende que ocorreu a fraude processual. Respaldado nela, ingressou junto à 7ª Vara Federal Criminal de Sergipe, sediada no município de Estância (jurisdição à qual pertence Umbaúba), com o pedido de prisão preventiva dos três agentes que teriam tido relação direta com o homicídio: Kleber Nascimento Freitas, Paulo Rodolpho Lima Nascimento e William de Barros Noia.

 

Apesar de a PRF omitir o nome dos agentes que participaram do homicídio de Genivaldo, a identidade deles foi revelada pelo Fantástico da TV Globo.

 

Rodoviários Federais – Clenilson José dos Santos e Adeilton dos Santos Nunes – também faziam parte da equipe mas o envolvimento deles não está totalmente esclarecido. Clenilson, porém, também esteve envolvido na abordagem da menor M.D.N., em agosto de 2020, juntamente com Paulo Rodolpho o qual, por sua vez, já se envolveu em um caso de injúria com um vizinho,

O advogado entende que tanto o delegado de Polícia Federal responsável pelo caso, Fredson Vital, como os membros do Ministério Público Federal (MPF) erram ao não solicitar a prisão preventiva dos envolvidos. Para ele existe “demonstração cabal de que há clara tentativa de dificultar a livre produção probatória e, portanto, um risco a conveniência da instrução criminal”. Na petição ajuizada ele insiste:

“Diferente do que os Agentes registraram na Comunicação de Ocorrência Policial, a vítima atendeu todos os comandos, inclusive informando que usava medicamentos controlados.” O advogado ainda afirma que os policiais tentaram evitar que o corpo de Genivaldo fosse para o Instituto Médico Legal, onde os exames comprovaram sua morte por asfixia. Teriam tentado levá-lo diretamente à funerária.

Primeira Contradição

Transcreve-se da petição apresentada pelo representante da mãe e das irmãs de Genivaldo ao juiz federal Rafael Soares Souza:

“No registro de ocorrência policial, foi relatado que: ‘foi dado o comando para que o condutor desembarcasse da moto e levantasse a camisa, como medida de segurança, no entanto a ordem foi desobedecida, levantando o nível de suspeita da equipe. Ato contínuo determinou-se que o indivíduo colocasse as mãos na cabeça e abrisse as penas, de modo a possibilitar a busca pessoal, porém esta ordem foi igualmente desobedecida, agravando-se pelo fato de que o abordado a todo o momento passava as mãos pela linha da cintura e pelos bolsos.

DAS IMAGENS CAPTADAS

Link do início da abordagem:

https://www.youtube.com/watch?v=MpwWOIMyiOg

https://www.youtube.com/watch?v=rP_dP8lEbo0

Excelência, o vídeo é claro ao demonstrar que não houve desobediência. A vítima colou as mãos para cima de forma pacífica e EM NENHUM MOMENTO passou as mãos pela linha da cintura, nem pelos bolsos. O VÍDEO NÃO DEIXA NENHUMA DÚVIDA de que o relato de ocorrência não reflete a verdade.

Segunda Contradição

Ainda no registro de ocorrência, consta que a vítima foi algemada e contida, mas que “ao tentar colocá-lo no compartimento de presos da viatura, novamente o abordado resistiu, se debateu e deu chutes a esmo, deixando as pernas do lado de fora, sendo necessário mais uma vez o uso das tecnologias. Em seguida a equipe abriu o compartimento para que o indivíduo se acalmasse e cooperasse com a condução, momento em que a contenção das pernas se tornou possível. Nesse momento, o abordado, plenamente consciente, posicionou-se de forma sentada, sendo conduzido começou a passar mal, sendo socorrido prontamente”

Meritíssimo, o vídeo mostra claramente que a vítima já contida, um dos policiais lança uma granada de gás lacrimogêneo dentro do porta-malas, sendo possível ouvir Genivaldo gritando desesperadamente, enquanto pessoas que presenciavam o fato, diziam aos policiais que eles iriam matar a vítima, mas isso não foi suficiente para sensibilizar os Agentes e fazer cessar a agressão.

Ainda consta do registro de ocorrência, que “o abordado, plenamente consciente, posicionou-se de forma sentada, sendo conduzido começou a passar mal, sendo socorrido prontamente”

Este fato é mais uma inverdade contida na Comunicação de Ocorrência. É possível verificar dos vídeos que a vítima não estava consciente quando os agentes abriram o porta-malas e que não foi posicionado sentado.

Como se pode extrair do vídeo, enquanto inalava o gás, Genivaldo se debatia de desespero eantes mesmo de abrirem a “câmara de gás” a vítima não tinha mais reação, momento em que os policiais pegaram suas pernas e colocaram para dentro e fecharam.

Terceira Contradição

Consta do registro de ocorrência que “imediatamente a equipe seguiu para a delegacia de Polícia Civil da cidade e, durante o trajeto, o conduzido começou a passar mal, sendo socorrido prontamente. A equipe seguiu prontamente para o hospital local, onde foram adotados os procedimentos médicos necessários, porém, possivelmente devido a um mal súbito, a equipe foi informada que o indivíduo veio a óbito.”

Não houve imediato socorro, pelo contrário, há informações de que os policiais ainda demoraram no local, enquanto as pessoas reclamavam que a vítima precisava de atendimento.

Após algum tempo, entraram na viatura e saíram. Ao chegarem na Delegacia e constatarem o óbito, os Agentes quiseram encaminhar o corpo diretamente para funerária, sem que fosse levado para o Instituto Médico Legal, de modo a evitar a realização do exame tanatoscópico, pois sabiam que a causa da morte foi em decorrência da câmara de gás.

Portanto, há clara demonstração de que os Agentes, desde o início, buscaram alterar as informações, prejudicando a livre produção probatória para se chegar à verdade real dos fatos. (grifos do original)

Ao peticionarem ao juízo na segunda-feira (0/06) os representantes da família de Genivaldo ainda desconheciam os detalhes dos outros dois casos narrados nesta reportagem que demonstram a pratica abusiva recorrente dos agentes da Polícia Rodoviária Federal naquela região, ao sul de Sergipe.

Ainda assim, no pedido que fizeram da decretação da prisão preventiva dos três policiais diretamente relacionados ao homicídio qualificado de Genivaldo, eles destacam a periculosidade dos mesmos, a justificar a prisão cautelar deles:

“Excelência, a manutenção da liberdade dos agentes, quando certa a autoria e materialidade, causa descrédito social da Justiça. Não se pretende a prisão para atender o clamor público ou a repercussão social do fato, isoladamente. A periculosidade dos agentes é inerente na própria ação criminosa praticada. Não se trata de presunção de periculosidade dos agentes, a periculosidade decorre da forma como o crime foi praticado (modus operandi)”.

 

Senadores desembarcam em Sergipe

 

Antes de decidir, o juízo pediu a manifestação do Ministério Público Federal, mas os próprios advogados representantes dos familiares de Genivaldo não acreditam que o pedido encontrará respaldo SOS procuradores da República que analisam o caso.

Nesta segunda-feira (12/06) desembarca em Sergipe a Comissão de Direitos Humanos do Senado, capitaneada pelo senador Humberto Costa (PT-PE) autor do requerimento da diligência no estado para verificar o assassinato de Genivaldo. Os senadores estarão, na terça-feira, em Umbaúba. Seria conveniente que além de falarem com os familiares do morto e possíveis testemunhas do ocorrido no dia 25 de maio, eles tratasse de ouvir as vítimas dos outros casos relacionados às ações violentas dos Policiais Rodoviários Federais. Talvez isso, inclusive, atraia novos relatos de outros episódios parecidos que muitos na cidade dizem existir, mas não revelam os detalhes. Esta na hora desses outros casos serem levantados.

12
Mar21

Comecei a ver e a sentir os abusos da República de Curitiba em 2014. Por Kakay

Talis Andrade
 
Procuradores da Operação Lava Jato: uma gang de caçadores (crédito: divulgação)

Por Antônio Carlos de Almeida Castro (Kakay)

“A história nega as coisas certas. Há períodos de ordem em que tudo é vil e períodos de desordem em que tudo é alto. As decadências são férteis em virilidade mental; as épocas de força em fraqueza de espírito. Tudo se mistura e se cruza, e não há verdade senão no supô-la”. Fernando Pessoa, O Livro do Desassossego

Era uma 2ª feira, 17 de março de 2014, quando o telefone tocou cedo. Uma operação da Polícia Federal. Nesses casos, a gente sempre espera para ver a dimensão da operação antes de aceitar qualquer cliente. Logo em seguida, 3 dias depois, foi preso Alberto Youssef. Mal sabíamos que ali seria o início da operação Lava Jato, importante operação que viria movimentar o país, com resultados surpreendentes até virar uma operação política, conduzida por um juiz determinado a ser presidente da República, instrumentalizando o Poder Judiciário e tendo como pupilo um grupo de procuradores da República que instrumentalizavam o Ministério Público. Tudo isso com apoio da grande mídia e um forte esquema de marketing coordenando as ações e divulgações. Começava ali a maior fraude ao sistema de Justiça do Brasil.

Dos 3 clientes que me procuraram, optei por advogar para Alberto Youssef. Já sabia quem ele era, bem como tinha conhecimento de quem eram Moro e seus pupilos procuradores, pois eu havia atuado na operação Sundown, impingindo ao grupo de Curitiba a maior derrota que eles até então haviam sofrido. Conhecia a indigência intelectual e moral do grupo, que fazia tudo pelo poder. Mas agora a briga seria muito maior. Os caipiras estavam com poder midiático de fogo e queriam ainda mais poder. A qualquer custo.

Não demorou para eu deixar a advocacia de Youssef pois, em setembro daquele ano, os procuradores, com medo de uma derrota, exigiram que Youssef desistisse de um habeas corpus que impetrei para tratar da liberdade. Atitude canalha e covarde dos procuradores que se aproveitaram do momento de fragilidade de um cidadão preso. Ali, comecei a ver e a sentir os abusos daquela República de Curitiba que, cega pela mídia, julgava-se salvadora da pátria. Escândalo anunciado e tragédia certa. Mas ainda não imaginávamos o estrago que seria causado à credibilidade da justiça brasileira. A grande Cecília Meirelles sempre nos salva:

“O rumor do mundo vai perdendo a força

E os rostos e as falas são falsos e avulsos.

O tempo versátil foge por esquinas de vidro, de seda de abraços difusos.”

Sentindo o cheiro dos abusos, vendo e ouvindo os personagens lúgubres que coordenavam o circo, criando fortes laços com a barbárie e com um golpe ao Estado democrático, resolvi resistir. Eram muitos os absurdos: excessos de prisão, estupro das delações premiadas, achaques, juiz com jurisdição nacional, juiz parcial, enfim, o caos.

Um grupo de advogados resolveu debater, questionar, enfrentar o que já se anunciava como um bando de delinquentes. Sem maiores acessos à grande mídia, que até assessorava a gangue, resolvi cair no mundo e, duas ou 3 vezes ao mês, ao longo dos últimos 5 anos, corri o Brasil de Norte a Sul para discutir o Direito, a Constituição, as garantias, sempre recitando poesia depois dos debates para ridicularizar os bárbaros. Eles têm medo da literatura. Tive plateias de 4.000 pessoas, outras de 200, pouco importava. Sem ser dono da verdade, seguia falando e desmontando esse grupo de golpistas, incultos, banais. Em cada cidade, após as palestras, sempre surgia um convite para entrevistas nos jornais locais, rádios, programas de TVs. Se era para apontar o esquema criminoso engendrado pela “gangue de Curitiba”, eu aceitava o convite.

E o bando se especializou em fraudar não só o sistema de Justiça, mas em vender uma imagem de salvadores da pátria. Em 9 de setembro de 2015, escrevi um artigo na Folha de S.Paulo, “QUE PAÍS QUEREMOS?”. Já em 2015, afirmei que não admitia que absolutamente ninguém, juiz, procurador ou policial, pudesse dizer que quer o combate à corrupção mais do que eu, mais do que qualquer cidadão sério. Mas, repetia eu um conceito que se transformaria num mantra: esse combate tem que ser dentro das garantias constitucionais, do devido processo legal e com a ampla defesa assegurada. A resposta a essa pergunta está no voto do ministro Gilmar Mendes, proferido no julgamento da última 3ª feira (9.mar.2021).

Muitas vezes, sentia o peso avassalador dos grandes interesses querendo nos esmagar. A verdadeira guerra travada na discussão que levou à vitória da presunção de inocência, no Supremo Tribunal Federal, mostrou que o Brasil não é um país para amadores.

A força econômica, a grande mídia, o punitivismo exacerbado, a criminalização da política, a substituição de parte da política por uma proposta de não políticos, o controle da narrativa por parte dos medíocres de Curitiba, a falsa crença de que nós éramos contra o combate à corrupção e a favor da impunidade fizeram com que andássemos pelo país em busca de um sonho que a realidade insistia em negar.

Mas o debate e a palavra têm uma força devastadora quando nós sentimos a Justiça do nosso lado, mesmo que grupelhos se apoderem inescrupulosamente da narrativa simbólica entre os “maus e os homens de bem”. Bando de medíocres que não se vexaram em brincar e zombar com a liberdade e as garantias constitucionais em nome de um projeto de poder. Lembro-me de Mário de Sá-Carneiro, no poema A Queda:

“E eu que sou o rei de toda esta incoerência,

Eu próprio turbilhão, anseio por fixá-la

Peneiro-me nas sombras- em nada me condenso…

Agonias de luz eu vivo ainda entanto.

Não me pude vencer

mas posso me esmagar.

– Vencer as vezes é o mesmo que tombar-

Tombei…

E fico só esmagado sobre mim.”

Na sina, na busca incessante por um mundo mais livre, mais justo e igual, começamos a ver cair os pilares de um projeto hipócrita, com viés fascista e demolidor, de um direito que representa a dominação e o obscurantismo. No julgamento da parcialidade do juiz e da força-tarefa de Curitiba, parecia que passava um filme dos melhores momentos dos últimos anos. Algumas frases dos votos nos remetiam a plateias espalhadas, ao longo de 5 anos, pelo imenso Brasil. Eu me reconheci ali naquelas frases, naqueles votos.

A decisão do ministro Fachin anulando os processos por uma chapada incompetência do juiz nos remete às centenas de críticas feitas à jurisdição nacional ou universal de Curitiba. Nunca o óbvio demorou tanto a vir à tona. Mas veio, e lembrei-me do poeta: “É tarde, mas ainda é tempo”.

Agora, o projeto de poder desse grupo que procurou deslegitimar a política, que criminalizou os políticos e a advocacia, que corrompeu o sistema de Justiça e abalou a crença em um Poder Judiciário justo, começa a ser realmente desnudado. O juiz e seus asseclas, os procuradores, delegados e advogados de araque que lhe eram submissos, devem também ser responsabilizados.

Não é hora de comemorar, pois estamos no pior momento deste horror da crise sanitária. O grupo fascista e orientado pela necropolítica, que cultua a morte, foi eleito e é filho legítimo da gangue de Curitiba, responsável pela dimensão da catástrofe. A visão covarde, canalha e negacionista levou o país a inacreditáveis 2.349 mortos em um só dia. Números oficiais, pois a subnotificação é brutal. Mais de 270 mil mortos. A banalização da morte, a ridicularização da dor da perda dos que sofrem, o sadismo e falta de empatia são a marca desses desalmados. Uma enorme e densa nuvem cegou a todos os que queriam ver. Uma nuvem que nos abraça, não o abraço da solidariedade, mas o que nos imobiliza e nos sufoca. Que tira nosso ar. Que, de tão densa, esmaga-nos e não permite que a esperança saia e respire.

Mas, o enfrentamento dos abusos dessa operação fajuta e criminosa, que é o que se tornou a Lava Jato, há de ser um alento para o cidadão que viu a liberdade ser manietada, a dignidade ser usurpada e sentiu que um Judiciário corrompido politicamente consegue uma morte da cidadania tão angustiante como a morte física pela falta de ar. A irresponsabilidade que fez faltar o ar nos hospitais e nos pulmões é irmã siamesa da irresponsabilidade que sufocou o sistema de Justiça. Escondo-me em T.S. Eliot:

“Súbito num dardo de luz solar

Enquanto a poeira se move

Aflora o riso oculto

Das crianças na folhagem

Depressa agora, aqui, agora, sempre

-Ridículo o sombrio tempo devastado

Que se estende antes e depois.”

comprida lei moro.jpeg

 

23
Fev21

Delegada da Polícia Federal e lavajatistas podem responder por diversos crimes

Talis Andrade

Delegada da Lava Jato ligada à morte de reitor da UFSC perde ação contra  blogue - Blog da Cidadania

 

A LEI É PARA TODOS?

ConJur - A revelação de que ao menos uma delegada teria forjado e assinado depoimentos que nunca ocorreram, com a anuência de procuradores da autoproclamada operação "lava jato", pode ter desdobramentos graves para os envolvidos.

Os diálogos foram enviados pelos advogados do ex-presidente Lula ao Supremo Tribunal Federal e foram apreendidos no curso de investigação contra hackers que invadiram os telefones de autoridades.

Na conversa revelada pela ConJur, os procuradores Deltan Dallagnol e Orlando Martello Júnior relatam o que contou uma delegada da Polícia Federal chamada Erika — provavelmente a delegada Erika Marena, que era a responsável pelos casos do consórcio de Curitiba.

"Como expõe a Erika: ela entendeu que era pedido nosso e lavrou termo de depoimento como se tivesse ouvido o cara, com escrivão e tudo, quando não ouviu nada... Dá no mínimo uma falsidade... DPFs são facilmente expostos a problemas administrativos", disse Deltan.

Figura destacada no grupo de Curitiba, Marena foi interpretada pela atriz Flávia Alessandra no filme "Polícia Federal — A lei é para todos". Ela também tem um episódio trágico no currículo. Após sair da capital do Paraná e da "lava jato", foi para Santa Catarina. Lá, comandou uma operação que investigava uma suposta corrupção no núcleo de ensino à distância da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), que resultou na prisão preventiva do reitor Luiz Carlos Cancellier.

O professor foi solto, mas sem o direito de pisar na universidade durante o inquérito. Ele cometeu suicídio logo em seguida, em outubro de 2017. O inquérito, por outro lado, não apresentou qualquer prova até o momento.

Erika Marena foi interpretada pela atriz Flávia Alessandra em filme que exaltava a autuação do consórcio de Curitiba

 

Para advogados constitucionalistas e criminalistas, os fatos narrados são gravíssimos e, caso confirmados, podem configurar crimes como falsidade ideológica, prevaricação e fraude processual.

"Há a possível falsidade ideológica do documento público, uma vez que teria sido fabricado um termo de depoimento com informações que não refletiam a realidade. Há a prevaricação dos agentes públicos que tomaram ciência do fato e nada fizeram. Em suma, o caso é gravíssimo e requer apurações para a eventual responsabilização dos culpados", explica Conrado Gontijo, advogado criminalista, doutor em Direito Penal pela USP.

Adib Abdouni, advogado criminalista e constitucionalista, defende uma investigação imediata contra a delegada. "O crime consiste em materializar declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. No caso da delegada, tal conduta agrava-se por ter sido cometida por funcionária pública, prevalecendo-se do cargo", diz.

Almino Afonso Fernandes, advogado constitucionalista e sócio do escritório Almino Afonso & Lisboa Advogados Associados, afirma que "é simplesmente inimaginável que alguém, a pretexto de combater a corrupção, possa utilizar-se de expediente tão abominável e criminoso, como se os fins pudessem justificar os meios".

Para Almino, "mais lamentável, ainda, é saber que tais práticas tenham contado com a concordância de alguns poucos procuradores da República que, a rigor, deveriam defender a ordem jurídica e o Estado de Direito".

Para David Metzker, advogado criminalista e sócio da Metzker Advocacia, a "conduta extremamente grave e que precisa ser investigada". "Não há como admitir que depoimentos sejam criados. São demonstrações de ilegalidades que precisam ser analisadas com urgência."

O advogado Willer Tomaz, sócio do escritório Willer Tomaz Advogados Associados, vai além. "São bem conhecidos na comunidade jurídica os graves abusos e arbitrariedades perpetrados na "lava jato" em face dos réus, e este fato envolvendo uma possível falsificação do depoimento de uma testemunha por parte de uma delegada da Polícia Federal, para prejudicar um ou mais acusados, poderá  configurar, se comprovado, diversos crimes passíveis de prisão e representará um dos maiores escândalos já vistos na história da justiça criminal brasileira, que jamais deveria se prestar a tamanho papelão. É do interesse de toda a sociedade que o caso seja investigado rigorosamente."

De acordo com o advogado criminalista Daniel Bialski, mestre em Processo Penal pela PUC-SP e membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), "caso o STF entenda pela validade das provas obtidas, a delegada federal e demais envolvidos poderão e deverão ser investigados por diversos crimes. Entre eles, falsidade ideológica e/ou documental e fraude processual majorada, além das cominações administrativas até demissão do serviço público", opina.

Por fim, o advogado Luis Felipe D´Aloia, criminalista do escritório Bialski Advogados, entende que, "se confirmada, tendo em vista que eram cientes e nenhuma providência tomaram, os procuradores, que têm o dever de ofício em coibir tais condutas, poderão responder por prevaricação ou até mesmo como partícipes das supostas condutas que teriam sido adotadas pela agente policial".

06
Dez20

MORO Mentiras, farsas e trapaças - 8

Talis Andrade

pinoquio moro russo.jpg

 

 

Julgamento feito por juiz parcial é inexistente, explica Pedro Serrano

Estudioso da nova natureza do Estado de exceção, o advogado, professor de Direito Constitucional e integrante da ABJD, Pedro Serrano, analisa a conduta de Sergio Moro na Lava Jato e define: “Um julgamento realizado por um juiz parcial não é apenas nulo, é inexistente”. Assista. 

Para o jurista, as revelações da #VazaJato mostram que juiz e acusação articularam um conjunto de atos que pretendiam a condenação, agiam de forma política e não jurídica. “Não se trata apenas de inobservância de princípios constitucionais e de legalidade. Lula hoje é vítima da violência pura do Estado. De fato, sem nenhum julgamento, sem nenhum processo, o ex-presidente é vítima de uma medida de exceção”, explica. 

Segundo Serrano, as medidas tomadas pelo ex-juiz Moro têm uma aparência de cumprimento da democracia, parece um processo penal, mas na verdade é uma fraude. “As ações dos integrantes da Lava Jato têm um conteúdo político tirânico de persecução ao inimigo. O réu não é tratado como cidadão que eventualmente errou, mas como inimigo do Estado. Não podemos aceitar isso, trata-se de uma violenta agressão aos direitos, à Constituição e à democracia”, finaliza. 

#MoroMente 

Pedro Serrano participa da Campanha #MoroMente lançada pela ABJD (Associação Brasileira de Juristas pela Democracia) para denunciar as ilegalidades cometidas pelo ex-juiz Sergio Moro na Lava Jato e cobrar uma investigação urgente, séria e rigorosa.
05
Set20

Jurista denuncia: Moro cometeu fraude processual e obstrução de Justiça

Talis Andrade

Advogado Cezar Bitencourt e Sergio Moro

247 - O advogado e procurador de Justiça aposentado Cezar Bitencourt fez neste sábado (5) duas denúncias graves contra o ex-juiz e ex-ministro da Justiça Sergio Moro. Durante participação na live do Grupo Prerrogativas, transmitida pela TV 247 (assista abaixo), ele acusou Moro de cometer fraude processual durante sua atuação como magistrado, no âmbito da Lava Jato, e ainda de obstrução de Justiça quando depôs na Procuradoria-Geral da República em maio, logo após deixar o governo de Jair Bolsonaro. 

Bitencourt, que atuou no Ministério Público do Rio Grande do Sul, afirmou ter orgulho de ter servido na instituição, que chamou de “uma das mais respeitadas no País”, mas que hoje, “infelizmente, nos tempos modernos, desconhece a sua função, a sua obrigação”. Ele então denunciou práticas de fraude processual cometidas na história recente do MP, crime previsto no artigo 347 do Código Penal, que consiste em modificar características do crime a fim de induzir o magistrado ou o perito ao erro. 

Segundo ele, em ‘seu tempo’ de Ministério Público, isso não acontecia. “Na época, a gente analisava se podia, como promotor, agir. Se tinha legitimidade. Hoje não é nada incomum fraudar essa expectativa, esse dever legal, constitucional. Então a gente trabalha com uma dificuldade imensa com a defesa. A gente tem uma dificuldade imensa para trabalhar por falta de lealdade processual. Por trazer por exemplo um processo com uma denúncia que tem três mil páginas, e eu tenho dez dias para me manifestar, e tem que criar na seara criminal a obrigação de especificar a prova, como tem no processo civil”, explicou. 

“Então o Ministério Público te manda lá três mil páginas, tu não sabe onde tem, não sabe onde pode ter, muitas vezes a prova tá escondida. Muitas vezes lá no processo de distribuição eu tive que indagar onde estavam os anexos, porque vieram juntos distribuídos e eu não tinha acesso. Então essas coisas que não aconteciam naqueles tempos, hoje eu tive que recuperar, porque para mim, o MP é uma das mais importantes e mais poderosas instituições públicas desse País. Mas tem que merecê-la. Os seus integrantes têm que respeitá-la, respeitar a paridade de armas”, detalhou ainda o advogado.

O ex-procurador também denunciou que Moro cometeu crime de obstrução de Justiça no dia em que foi ser ouvido na PGR em Curitiba por conta da denúncia de interferência no comando da PF que fez contra o governo Bolsonaro quando pediu demissão do Ministério da Justiça. “Ele cometeu um crime de obstrução de Justiça no dia em que ele foi dar depoimento à PGR, lá em Curitiba, lembram? Quando foi ser ouvido na representação criminal do PGR”, denunciou Bitencourt.

“Tinham juízes presentes, tinham procuradores, tinham policiais federais, tinha tudo. Tinham oito advogados do Moro, e ele pediu paridade de armas, coisa que ele nunca ofereceu para ninguém. Ao entregar seu celular para ser averiguado, ele disse assim: ‘eu suprimi algumas mensagens que não era importantes. Ora, desde quando investigado decide o que é e o que não é importante no seu celular? Desde quando investigado pode obstruir a Justiça da forma como ele fez impunemente? E o mais interessante é que ninguém, nem a juíza, nem o procurador, nem os auxiliares, todo mundo ficou calado até agora. Isso é obstrução de Justiça. O Moro cansou de dar prisão preventiva por muito menos que isso. Estão devendo ainda investigação sobre essa conduta do Moro”, relatou e cobrou o jurista. 

29
Ago20

Há sempre uma carta na manga da lava jato!

Talis Andrade

O jogo da Katchanga Real!

Jogadas como esta, recorrentes em especial nos processos que envolvem o ex-presidente Lula – mas não só dele, bastando ver o imbróglio da “delação Batalha do Itararé” de Palloci – , comprometem a credibilidade de parte de nosso sistema de justiça.

Há muitos anos o professor Luís Alberto Warat (re)construiu uma estorinha sobre o direito e seus truques. Chamou de “o jogo da katchanga”. Um sujeito desafia o dono de um cassino a jogar katchanga. Este não sabe o que é, mas pensa que aprenderá durante o jogo. E, a cada jogada, o desafiante inventava novas regras. Ao final, jogava as cartas na mesa e dizia: “Katchanga”. E recolhia o dinheiro.

Depois de perder uma fortuna, o dono do cassino se deu conta de que a regra do jogo era não ter regra alguma. Era só dizer primeiro a palavra “katchanga”. Fizeram a partida definitiva. Tudo ou nada. Quando o desafiante estava prestes a “bater” de novo, o dono do cassino abriu um sorriso e disse: “katchanga”. Ao que o desafiante fez um olhar blasé e, depois de uma onomatopeia (tsk, tsk, tsk colocando a língua entre os lábios), disse: “Katchanga Real”. E pegou todo o dinheiro.

Pois depois que a defesa do ex-presidente Lula conseguiu autorização do STF para acessar o acordo de leniência da Odebrecht, o juiz Luiz Antônio Bonat, responsável pela Operação Lava-Jato na 13ª Vara Federal de Curitiba, fez uma jogada magistral, uma verdadeira katchanga real, determinando que o acordo passe, primeiro, pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela própria empreiteira antes de chegar à defesa.
 

Os advogados do ex-presidente, que obtiveram do Supremo Tribunal Federal (STF) autorização para acessar o material, recorreram para que o acordo lhes seja remetido diretamente, para com isso evitar “controle prévio” das informações. O magistrado respondeu dizendo tratar-se de “atitude cautelosa para bem cumprir” a ordem da Corte.

Veja-se que nem mesmo Marcelo Odebrecht teve acesso. Em meio a uma disputa familiar, o herdeiro acusa o pai, Emílio, dono do conglomerado, de “fabricar” demandas que o filho sustenta nunca ter feito.

Já Lula teve direito ao acesso, porém via a Suprema Corte. Quer dizer, teve autorização para acesso, só que o juiz fez uma interpretação cautelosa da decisão do STF.

Algo como : “o STF não entende bem dessas coisas e por isso vou acautelar”. A defesa do ex-Presidente, no dia em que foi autorizada a entrar na sala-cofre da Polícia Federal (PF), diz ter vasculhado não os arquivos originais, oriundos da Suíça, onde estavam hospedados os servidores dos sistemas da Odebrecht, mas uma mera cópia. Segundo a defesa, ao longo das investigações, esse material não teve seu código de integridade comparado com o que veio do país europeu, o que abre margem para fraude.

Em síntese, diz a defesa que houve uma quebra daquilo que em processo penal de chama “cadeia de custódia da prova”.

O que parece ter acontecido é que o juiz Bonat, em vez de diretamente cumprir a ordem do Supremo Tribunal, passou a bola, primeiro, para o MP e para a empreiteira.

De todo modo, isso é mérito do processo e não somos os advogados da causa. Apenas trazemos aqui o episódio da katchanga, para mostrar que, quando a defesa criminal acha que venceu uma, lá vem a jogada final: a katchanga real. Assim, a defesa não tem chance nunca. Quando ela acha que aprendeu a regra, o crupiê muda a regra. E assim se vai em um moto contínuo.

E olha que isso não ocorre só na lava jato. Por exemplo, quando se instalou, agora durante a pandemia, o modelo de audiências virtuais (sessões virtuais), alguns tribunais fizeram a katchanga real, determinando que os advogados remetessem suas sustentações por vídeo. Quem sabe os causídicos contratam o Thiago Lacerda e fazem a sustentação com fundo musical?

Katchanga. Mas não basta. Tem de ser a katchanga real!

Jogadas como esta, recorrentes em especial nos processos que envolvem o ex-presidente Lula – mas não só dele, bastando ver o imbróglio da “delação Batalha do Itararé” de Palloci – , comprometem a credibilidade de parte de nosso sistema de justiça.

Uma vez mais recorre-se ao chamado efeito “target”, tão frequentemente utilizado pelo ex-juiz Sérgio Moro, de triste memória. Atira-se a flecha e, logo depois, pinta-se o alvo.

O desafio, agora, é combater a seletividade da persecução penal estatal e as armadilhas que ela coloca à manutenção do nosso já tão comprometido Estado Democrático de Direito.

Reconhecer, enfrentar e corrigir estas mazelas pode ser um bom começo.

Sem katchangas!

Charge – Jogo de Poder – Fantástico Mundo de Sunça

Artigo publicado originalmente no Jornal GGN/ Grupo Prerrogativas

 

 

 
05
Ago20

Fachin é tão suspeito quanto Moro para julgar Lula

Talis Andrade

 

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por Jeferson Miola

- - -

A turma da Lava Jato tem motivos de sobra para exaltar que “Aha, Uhu, o Fachin é nosso!”. O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF, regressou das férias de inverno do judiciário fazendo jus à gratidão da República de Curitiba.

Já no primeiro dia de trabalho [3/8], Fachin derrubou a liminar de Dias Toffoli que mandava a Lava Jato abrir a “caixa de segredos” de 350 terabytes para o acesso do Procurador-geral. Augusto Aras denunciou ilegalidades, desvios e excessos da Operação; e, também, possível espionagem clandestina de 38 mil pessoas.

Com a decisão, Fachin advogou a favor da continuidade da Lava Jato como sociedade secreta; como um poder paralelo dentro do Estado de Direito. A exaltação lavajatista, como se percebe, é justificável. Afinal, o Fachin é deles. Aha, uhu!

No segundo dia de trabalho depois do recesso, em 4/8, Fachin deu novas provas de fidelidade e devoção à Lava Jato – sempre com prejuízo à Constituição e ao devido processo legal.

O julgamento de 2 recursos da defesa do ex-presidente Lula pela 2ª turma do STF evidenciou o contraste escandaloso entre os votos dos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, amparados na Constituição e nas regras do Estado de Direito, em comparação com o voto do Fachin, inspirado no direito penal do inimigo praticado pela organização criminosa de Curitiba, como Gilmar chama a Lava Jato.

Na discussão sobre o pedido de acesso da defesa do Lula aos sistemas da Odebrecht [Drousys  e MyWebDay], Fachin foi contra. Ele se opôs, portanto, ao direito elementar do Lula, como réu, conhecer as provas da acusação produzida por Moro e Dallagnol para, assim, poder se defender conhecendo os fundamentos da acusação imputada pelos justiceiros de Curitiba.

ministro Lewandowski divergiu duramente de Fachin e, inclusive, destacou a existência de sérios indícios de fraude planejada para incriminar Lula. Lewandowski entende que “No caso concreto, os discos rígidos contendo as cópias dos sistemas MyWebDay e Drousys foram disponibilizadas ao MPF nos autos do referido acordo de leniência, existindo sérios indícios de inidoneidade desse material, não apenas apontados em parecer técnico divergente produzido pela defesa (documento eletrônico 8), mas também constantes de outras elementos, como a Informação Técnica 30/2018, fornecida pela Polícia Federal, na qual se afirma que ‘foram identificadas não conformidades em relação à integridade e autenticidade dos dados examinados no referido laudo’ (fl. 3 do documento eletrônico 15)”.

Não bastasse isso, também o Centro Brasileiro de Perícia – CBP (documento eletrônico 23) e o CCL Group (documento eletrônico 24), em seus respectivos pareceres técnicos, descrevem a existência de supostas inconsistências que podem ter resultado em quebra de fidedignidade”, afirmou Lewandowski.

Em vista dos autos do processo [e não de meras convicções ou de algum power-point], Lewandowski concluiu: “Ora, tratando-se de imputação de responsabilidade criminal, não pode haver qualquer incerteza sobre a fidedignidade das provas que deram suporte à acusação, sob pena de graves prejuízos às garantias processuais do cidadão em juízo, abrigadas no texto constitucional”.

Ora, Fachin não analisou os documentos eletrônicos 8, 15, 23 e 24 citados por Lewandowski? Como pode um ministro da Suprema Corte não levar em consideração perícias técnicas que apontam sérios indícios de fraude judicial para perseguir e incriminar um inimigo político?

No outro julgamento do dia, a 2ª turma anulou o uso eleitoral que o então juiz fez da delação de Palocci para ajudar Bolsonaro. Em que pese a notória evidência de ilícito do Moro, Fachin outra vez escolheu o lado das ilegalidades da Lava Jato. Aha, uhu!

Lewandowski anotou que Moro “aguardou mais de 3 meses da homologação da delação de Antônio Palocci, para, na semana do 1º turno das eleições de 2018, determinar, sem prévio requerimento do órgão acusatório, a efetiva juntada no citado processo criminal”.

Mas não é só”, advertiu Lewandowski. “Apesar de ter consignado que a medida era necessária para ‘instruir esta ação penal’, o aludido juiz assentou, de modo completamente extravagante, que levaria em consideração, quanto aos coacusados, ‘apenas o depoimento prestado por Antônio Palocci Filho sob contraditório na presente ação penal’. Ora, se o referido acordo de colaboração não poderia ser utilizado quando da prolação da sentença naquele feito, por que o magistrado determinou, de ofício, e após o encerramento da instrução processual, seu encarte nos autos da ação penal e o levantamento do sigilo, precisamente na semana que antecedeu o primeiro turno da disputa eleitoral?”, questionou o ministro.

Para Lewandowski, “Com essas e outras atitudes […], o referido magistrado – para além de influenciar, de forma direta e relevante, o resultado da disputa eleitoral, conforme asseveram inúmeros analistas políticos, desvelando um comportamento, no mínimo, heterodoxo no julgamento dos processos criminais instaurados contra o ex-Presidente Lula –, violou o sistema acusatório, bem como as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV, da CF)”.

Na visão de Lewandowski, a postura do então juiz Sérgio Moro “[…] consubstancia, quando menos, inequívoca quebra da imparcialidade […] com o intuito de gerar, ao que tudo indica, um fato político, em descompasso com o ordenamento constitucional vigente”.

O ministro Gilmar Mendes foi na mesma linha. Para ele, a demora para juntar a delação do Palocci à ação penal “foi cuidadosamente planejada por Moro”; “[…] são vetores possivelmente indicativos da quebra da imparcialidade por parte do magistrado, matéria essa que se encontra pendente de apreciação”.

Para Gilmar, “Resta claro que as circunstâncias que permeiam a juntada do acordo de delação de Antônio Palocci no sexto dia anterior à realização do primeiro turno das eleições presidenciais de 2018 não deixam dúvidas de que o ato judicial encontrasse acoimado de grave e irreparável ilicitude”.

Os argumentos dos ministros Lewandowski e Gilmar, assim como as provas periciais expostas, comprovam cabalmente a atuação política e eleitoral do então juiz Sérgio Moro, e colocam em xeque as decisões do Fachin.

A suspeição do Moro na farsa para condenar e prender Lula é consenso nos meios jurídicos do Brasil e do mundo inteiro. Mas, a despeito das evidências e das provas contundentes que embasam este amplo consenso nacional e internacional, Fachin renega a realidade.

Além de seqüestrar os direitos fundamentais do ex-presidente Lula como réu, Fachin também se recusa a reconhecer até mesmo as perícias técnicas que provam a parcialidade do Moro.

A participação do ministro Fachin nos julgamentos do ex-presidente Lula está comprometida; com seus juízos pré-concebidos, Fachin é tão suspeito quanto Moro.

O relator da Lava Jato no STF não serve à Constituição, mas se serve do papel de presumível “guarda da Constituição” para beneficiar a facção que praticou a maior de todas as corrupções – a corrupção do sistema de justiça e do Estado de Direito. “Aha, uhu, o Fachin é nosso!”.

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05
Ago20

Fachin é tão suspeito quanto Moro para julgar Lula

Talis Andrade

 

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por Jeferson Miola

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A turma da Lava Jato tem motivos de sobra para exaltar que “Aha, Uhu, o Fachin é nosso!”. O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF, regressou das férias de inverno do judiciário fazendo jus à gratidão da República de Curitiba.

Já no primeiro dia de trabalho [3/8], Fachin derrubou a liminar de Dias Toffoli que mandava a Lava Jato abrir a “caixa de segredos” de 350 terabytes para o acesso do Procurador-geral. Augusto Aras denunciou ilegalidades, desvios e excessos da Operação; e, também, possível espionagem clandestina de 38 mil pessoas.

Com a decisão, Fachin advogou a favor da continuidade da Lava Jato como sociedade secreta; como um poder paralelo dentro do Estado de Direito. A exaltação lavajatista, como se percebe, é justificável. Afinal, o Fachin é deles. Aha, uhu!

No segundo dia de trabalho depois do recesso, em 4/8, Fachin deu novas provas de fidelidade e devoção à Lava Jato – sempre com prejuízo à Constituição e ao devido processo legal.

O julgamento de 2 recursos da defesa do ex-presidente Lula pela 2ª turma do STF evidenciou o contraste escandaloso entre os votos dos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, amparados na Constituição e nas regras do Estado de Direito, em comparação com o voto do Fachin, inspirado no direito penal do inimigo praticado pela organização criminosa de Curitiba, como Gilmar chama a Lava Jato.

Na discussão sobre o pedido de acesso da defesa do Lula aos sistemas da Odebrecht [Drousys  e MyWebDay], Fachin foi contra. Ele se opôs, portanto, ao direito elementar do Lula, como réu, conhecer as provas da acusação produzida por Moro e Dallagnol para, assim, poder se defender conhecendo os fundamentos da acusação imputada pelos justiceiros de Curitiba.

ministro Lewandowski divergiu duramente de Fachin e, inclusive, destacou a existência de sérios indícios de fraude planejada para incriminar Lula. Lewandowski entende que “No caso concreto, os discos rígidos contendo as cópias dos sistemas MyWebDay e Drousys foram disponibilizadas ao MPF nos autos do referido acordo de leniência, existindo sérios indícios de inidoneidade desse material, não apenas apontados em parecer técnico divergente produzido pela defesa (documento eletrônico 8), mas também constantes de outras elementos, como a Informação Técnica 30/2018, fornecida pela Polícia Federal, na qual se afirma que ‘foram identificadas não conformidades em relação à integridade e autenticidade dos dados examinados no referido laudo’ (fl. 3 do documento eletrônico 15)”.

Não bastasse isso, também o Centro Brasileiro de Perícia – CBP (documento eletrônico 23) e o CCL Group (documento eletrônico 24), em seus respectivos pareceres técnicos, descrevem a existência de supostas inconsistências que podem ter resultado em quebra de fidedignidade”, afirmou Lewandowski.

Em vista dos autos do processo [e não de meras convicções ou de algum power-point], Lewandowski concluiu: “Ora, tratando-se de imputação de responsabilidade criminal, não pode haver qualquer incerteza sobre a fidedignidade das provas que deram suporte à acusação, sob pena de graves prejuízos às garantias processuais do cidadão em juízo, abrigadas no texto constitucional”.

Ora, Fachin não analisou os documentos eletrônicos 8, 15, 23 e 24 citados por Lewandowski? Como pode um ministro da Suprema Corte não levar em consideração perícias técnicas que apontam sérios indícios de fraude judicial para perseguir e incriminar um inimigo político?

No outro julgamento do dia, a 2ª turma anulou o uso eleitoral que o então juiz fez da delação de Palocci para ajudar Bolsonaro. Em que pese a notória evidência de ilícito do Moro, Fachin outra vez escolheu o lado das ilegalidades da Lava Jato. Aha, uhu!

Lewandowski anotou que Moro “aguardou mais de 3 meses da homologação da delação de Antônio Palocci, para, na semana do 1º turno das eleições de 2018, determinar, sem prévio requerimento do órgão acusatório, a efetiva juntada no citado processo criminal”.

Mas não é só”, advertiu Lewandowski. “Apesar de ter consignado que a medida era necessária para ‘instruir esta ação penal’, o aludido juiz assentou, de modo completamente extravagante, que levaria em consideração, quanto aos coacusados, ‘apenas o depoimento prestado por Antônio Palocci Filho sob contraditório na presente ação penal’. Ora, se o referido acordo de colaboração não poderia ser utilizado quando da prolação da sentença naquele feito, por que o magistrado determinou, de ofício, e após o encerramento da instrução processual, seu encarte nos autos da ação penal e o levantamento do sigilo, precisamente na semana que antecedeu o primeiro turno da disputa eleitoral?”, questionou o ministro.

Para Lewandowski, “Com essas e outras atitudes […], o referido magistrado – para além de influenciar, de forma direta e relevante, o resultado da disputa eleitoral, conforme asseveram inúmeros analistas políticos, desvelando um comportamento, no mínimo, heterodoxo no julgamento dos processos criminais instaurados contra o ex-Presidente Lula –, violou o sistema acusatório, bem como as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV, da CF)”.

Na visão de Lewandowski, a postura do então juiz Sérgio Moro “[…] consubstancia, quando menos, inequívoca quebra da imparcialidade […] com o intuito de gerar, ao que tudo indica, um fato político, em descompasso com o ordenamento constitucional vigente”.

O ministro Gilmar Mendes foi na mesma linha. Para ele, a demora para juntar a delação do Palocci à ação penal “foi cuidadosamente planejada por Moro”; “[…] são vetores possivelmente indicativos da quebra da imparcialidade por parte do magistrado, matéria essa que se encontra pendente de apreciação”.

Para Gilmar, “Resta claro que as circunstâncias que permeiam a juntada do acordo de delação de Antônio Palocci no sexto dia anterior à realização do primeiro turno das eleições presidenciais de 2018 não deixam dúvidas de que o ato judicial encontrasse acoimado de grave e irreparável ilicitude”.

Os argumentos dos ministros Lewandowski e Gilmar, assim como as provas periciais expostas, comprovam cabalmente a atuação política e eleitoral do então juiz Sérgio Moro, e colocam em xeque as decisões do Fachin.

A suspeição do Moro na farsa para condenar e prender Lula é consenso nos meios jurídicos do Brasil e do mundo inteiro. Mas, a despeito das evidências e das provas contundentes que embasam este amplo consenso nacional e internacional, Fachin renega a realidade.

Além de seqüestrar os direitos fundamentais do ex-presidente Lula como réu, Fachin também se recusa a reconhecer até mesmo as perícias técnicas que provam a parcialidade do Moro.

A participação do ministro Fachin nos julgamentos do ex-presidente Lula está comprometida; com seus juízos pré-concebidos, Fachin é tão suspeito quanto Moro.

O relator da Lava Jato no STF não serve à Constituição, mas se serve do papel de presumível “guarda da Constituição” para beneficiar a facção que praticou a maior de todas as corrupções – a corrupção do sistema de justiça e do Estado de Direito. “Aha, uhu, o Fachin é nosso!”.

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11
Jul20

Só uma CPI para investigar as ligações perigosas da Lava Jato

Talis Andrade

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por Ribamar Fonseca

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Um sopro de justiça já começa a varrer o país, reacendendo as esperanças de que em breve injustiças cometidas ao longo do tempo, inclusive pela própria Justiça, poderão ser  corrigidas. Os sinais de que os ventos estão mudando são visíveis no atual comportamento do Supremo Tribunal Federal, bem diferente dos tempos da gestão da ministra Carmem Lucia, sobretudo pela corajosa atuação do ministro Alexandre de Moraes, e por decisões de alguns juízes em vários pontos do território nacional.  Na verdade, é fácil perceber que o clima existente hoje no país, especialmente em relação à Lava-Jato, difere bastante da época em que a força-tarefa de Curitiba, mesmo cometendo abusos escandalosos, tinha a aprovação da Procuradoria Geral da República, das instâncias superiores da Justiça e até do próprio STF, além dos Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério Público, que se transformaram, vergonhosamente, em organismos corporativos.

A Lava-Jato, que durante um bom tempo se tornou um poder paralelo no país, ao ponto de questionar até decisões da Corte Suprema, surgiu com o objetivo de investigar as denúncias de corrupção na Petrobrás mas, ao ganhar projeção internacional, transformou-se em instrumento político, com forte influência na politica e na economia, inclusive sendo a principal responsável pela eleição de Jair Bolsonaro para a Presidência da República.   O então juiz Sergio Moro, comandante da força-tarefa, usando de uma farsa jurídica afastou o ex-presidente Lula da disputa eleitoral e, com isso, abriu caminho para a ascensão do capitão. Por isso foi recompensado com a nomeação para o Ministério da Justiça, além da promessa de nomeação para o Supremo Tribunal Federal, mas seu projeto de poder foi frustrado pelo próprio Presidente, de quem se tornara papagaio de pirata.  E hoje caminha para o ostracismo ou para a prisão, se for investigada a sua ligação com os Estados Unidos e a sua traição ao nosso país. 

 Ninguém mais tem dúvidas de que a Lava-Jato foi conduzida pelo Departamento de Justiça norte-americano, conforme velhas suspeitas que se confirmaram com as recentes revelações do The Intercept.  Sergio Moro e Deltan Dallagnol, os dois comandantes da operação, mantinham estreitos laços com o serviço secreto americano, fornecendo a eles informações sigilosas sobre nosso país, mesmas informações que hoje se negam a compartilhar com seus superiores hierárquicos na Procuradoria Geral da República. Com a colaboração de agentes do FBI, que atuaram à vontade aqui no Brasil sem conhecimento do governo brasileiro, acobertados pelo pessoal da força-tarefa, Moro e Dallagnol destruíram as maiores empresas nacionais de engenharia e provocaram o desemprego de milhares de trabalhadores para atender os interesses do Tio Sam. E os espaços internacionais da construção civil deixados pelas empresas brasileiras foram imediatamente ocupados pelas suas congêneres norte-americanas.    

Além disso, os traíras da Lava-Jato fragilizaram a Petrobrás, para permitir a sua privatização e a entrega do pré-sal às multinacionais americanas, com a valiosa ajuda do conhecido entreguista José Serra que, com a participação dos seus colegas do Senado, retirou da estatal brasileira a prioridade na exploração das reservas petrolíferas nacionais. Isso explica a blindagem dos tucanos pela força-tarefa para, segundo recomendação de Moro, “não melindrá-los”. O desmonte da Petrobrás e a entrega de nossas reservas de petróleo, um antigo sonho dos norte-americanos, foram planejados no Departamento de Justiça dos Estados Unidos a partir das informações colhidas na espionagem que vinha sendo realizada na estatal, conforme revelou o wikileaks de Assange. Para o sucesso da empreitada, porém, era preciso também a derrubada do governo de Dilma Roussef e o banimento do PT da vida politica nacional e, consequentemente, o impedimento de Lula voltar ao poder.  

A condenação e prisão do ex-presidente  pelo então juiz Sergio Moro, uma farsa jurídica reconhecida por juristas dentro e fora do país, que garantiu a eleição de Bolsonaro, foi uma operação concebida e coordenada pelos norte-americanos, com a cumplicidade de procuradores, policiais e juiz da Lava-Jato, segundo revelações da Vaza-Jato. Embora a Policia Federal, em mais de dois anos de devassa na vida de Lula  não tenha encontrado o desvio de um único centavo, ainda assim o líder petista  foi condenado, acusado de beneficiário de obras realizadas num apartamento que nunca foi dele, conforme atestado pela própria Justiça. Mesmo sabendo disso, as instâncias superiores da Justiça, em especial os juízes do Tribunal Regional Federal da 4ª. Região,  endossaram a decisão de Moro que, recentemente, admitiu ter julgado Lula como adversário num ringue. Como não havia nenhuma prova contra o ex-presidente, seu julgamento foi escandalosamente político, com todo mundo fazendo vista grossa aos abusos da força-tarefa, que não respeitou sequer a Constituição Federal. 

 Os delitos praticados pela Lava-Jato foram denunciados, em ação contra a União,  pelo delegado Mário Renato Castanheira Fanton, da Policia Federal, que durante algum tempo integrou aquela operação.  Entre outras coisas, ele acusou os integrantes da Lava-Jato de falsa perícia, fraude processual, prevaricação, condescendência criminosa, falso testemunho, denunciação caluniosa e associação criminosa.  Como os tempos hoje são outros, tudo indica que, finalmente, o Supremo Tribunal Federal fará justiça e aprovará a suspeição de Moro, o que implicará na anulação de todo o processo viciado por ele conduzido contra Lula na Vara de Curitiba. Ninguém entende porque até agora esse processo vem se arrastando na Corte Suprema, com os frequentes adiamentos do seu julgamento. E se esse julgamento não for concluído até o final de agosto próximo, não será surpresa se ele for adiado para o próximo ano, pois em setembro o ministro Luiz Fux, homem de confiança da Lava-Jato, conforme o próprio Dallagnol revelou em conversa vazada pelo The Intercept, assume a presidência da Corte.  Na verdade, não basta a suspeição de Moro: a atuação da Lava-Jato, em especial suas ligações com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, precisa ser investigada a fundo por uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Além dos abusos cometidos é preciso esclarecer, entre outras coisas, de onde a força-tarefa tirou tanto dinheiro (R$ 500 milhões) para oferecer ao governo federal, pois ela não tem receita. Multas? Se é o produto de multas esse dinheiro deveria estar nos cofres públicos, não na força-tarefa que, legalmente, não rem atribuições para gerir esses recursos. É preciso esclarecer, também, por que se recusam a compartilhar seus dados com a Procuradoria Geral da República, sua superiora hierárquica. 

Na verdade, é vergonhoso que o PGR Augusto Aras tenha de recorrer ao STF para ser obedecido pelos seus subordinados. E o CNMP, que preside, ainda adia o julgamento de ações contra Dallagnol que, pelo visto, continua intimidando, sem freio,  quem atravessa no seu caminho.  Uma vergonha!

10
Jul20

Terrorismo policial na Lava Jato

Talis Andrade

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III - Delegado da PF processa União por ter sofrido perseguição da "lava jato"

Por Rafa Santos

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Inquéritos sensíveisA primeira grande tarefa de Fanton em Curitiba foi presidir o Inquérito 136/2015, que investigava fiscais do Ministério da Agricultura suspeitos de aceitarem propinas de frigoríficos e revendedores de carnes.

O caso acabou sendo assumido posteriormente pelo delegado Maurício Moscardi Grillo e acabou culminando na operação que se tornou conhecida como "carne fraca", e abalou a economia brasileira. Levantamentos do setor apontaram perdas na sequência pela queda nos embarques para o exterior em US$ 2,74 bilhões, cerca de R$ 14 bilhões pelo câmbio desta terça-feira (7/7). Uma das mais atingidas foi a gigante BRF, conglomerado que abriga as marcas Sadia e Perdigão.

Também foi designado para chefiar todas as equipes de execução de mandado de prisão e busca e apreensão nos alvos da operação "lava jato". Posteriormente  recebeu a tarefa de liderar investigações sensíveis como o Inquérito 768/2014, que apurava o uso de telefones celulares por presos na carceragem da PF de Curitiba, e o 737/2015, que visava levantar informações sobre a suposta confecção de dossiês por servidores públicos em "conluio" com advogados para anular os processos relacionados a "lava jato".

As novas atribuições o fizeram entrar em rota de colisão com o consórcio de Curitiba. Fanton alega que, ao avançar nas investigações do Inquérito 737, identificou que a tese dos dossiês produzidos por servidores públicos para anular o trabalho da "lava jato" não passou de uma fraude.

A farsa teria sido criada por outros cinco delegados, com a participação dos procuradores atuantes na operação.

Segundo ele, o procedimento investigativo teria sido instaurado com a finalidade de incriminar servidores que testemunharam que os membros da "lava jato" mandaram instalar uma interceptação ambiental na carceragem da PF de Curitiba.

No processo que move contra a União, Fanton cita que, durante a investigação do inquérito da escuta ambiental, foi pressionado por parte dos delegados para destruir provas, que foram posteriormente periciadas e anexadas em processo administrativo.  

Outras irregularidades foram encontradas por Fanton no Inquérito 768/2014. Afirma que um casal de delegados forjaram o inquérito policial e o conduziram pessoalmente para paralisar a investigação sobre o fornecimento e uso de telefones celulares pelos presos na carceragem da PF em Curitiba.

Tanto a suposta fabricação de dossiês, como o uso de escutas ilegais e telefones celulares foram amplamente divulgados pela imprensa. As informações sobre uso ilegal de escutas e de celulares produziram o primeiro arranhão na imagem pública do consórcio. (Continua)

 

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