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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

18
Mai23

Análise: Cassação de Dallagnol é a volta do cipó de aroeira

Talis Andrade

jejum dallagnol santo de pau oco .jpg

 

Ex-chefe da força-tarefa de Curitiba, algoz do presidente Lula, que ousou estender suas investigações contra a corrupção aos tribunais superiores, acabou defenestrado pelo TSE

 

por Luiz Carlos Azedo /Correio Braziliense
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Gravado em 1968, o ano da Passeata dos 100 Mil e do Ato Institucional nº 5, a letra da música Cipó de Aroeira, de Geraldo Vandré, que empresta seus versos à coluna, fez muito sucesso à época. Era uma alusão à Revolta da Chibata (1910) e ao passado escravagista da Colônia e do Império, cujos castigos físicos impostos aos escravos indisciplinados e rebeldes continuaram praticados após a abolição, pela Marinha de Guerra: "Marinheiro, marinheiro/ Quero ver você no mar/ Eu também sou marinheiro/ Eu também sei governar/ Madeira de dar em doido/ Vai descer até quebrar/ É a volta do cipó de aroeira/ No lombo de quem mandou dar/ É a volta do cipó de aroeira/ No lombo de quem mandou dar".
 

Também foi uma espécie de prenúncio da opção pela luta armada que uma parte da oposição ao regime militar viria a adotar, sob a liderança principal do comunista Carlos Marighella. Havia um evidente voluntarismo na ideia de que seria possível combater o regime militar recorrendo à força das armas, o que resultou no fracasso dos grupos guerrilheiros urbanos e rurais constituídos sob a inspiração, principalmente, da Revolução Cubana. Nunca houve a volta do cipó de aroeira. O regime militar seria derrotado nos marcos de suas próprias regras eleitorais.

Os militares se retiraram do poder em ordem. A transição à democracia foi longa e pactuada, os agentes dos órgãos de repressão foram poupados de punições por envolvimento em sequestros, torturas e assassinatos. Por meios pacíficos, o Brasil reconquistou a democracia. Agora, 37 anos após a vitória de Tancredo Neves no colégio eleitoral, os militares novamente se retiraram em ordem do poder, ao frustrar a tentativa de golpe da extrema direita de 8 de janeiro passado. A eleição de Jair Bolsonaro os trouxera de volta ao governo, em 2018, pela força das urnas, fato inédito desde a eleição do marechal Eurico Gaspar Dutra, em 1945.

Magistratura

Os quatro anos de mandato de Bolsonaro foram sombrios. Fora eleito no rastro da Operação Lava-Jato, liderada pelo juiz federal Sergio Moro, de Curitiba, e pelo procurador da República Deltan Dallagnol, entre outros. Nesse ínterim, o Brasil flertou com o autoritarismo, sob a liderança de um ex-capitão que fez carreira no baixo clero da Câmara. Bolsonaro militarizou o governo federal, ao destinar cerca de oito mil cargos aos seus antigos companheiros de caserna, entre os quais, os generais amigos que ocupavam posições-chave no Palácio do Planalto. Dois fatores contribuíram para sua eleição: a cassação dos direitos políticos do líder petista Luiz Inácio Lula da Silva, que passou mais de 500 dias preso em Curitiba, e a desmoralização da política e de seus partidos pela Operação Lava-Jato.

Bolsonaro operou para cooptar os militares, desmoralizar a magistratura, subjugar os diplomatas e escantear a Igreja Católica, os redutos tradicionais da elite liberal do país. As ideias de Oliveira Viana, ideólogo do Estado Novo e autor de Populações Meridionais do Brasil, pareciam saltar das páginas empoeiradas de sua obra para o cotidiano da política atual. No lugar do idealismo constitucional de Rui Barbosa, que inspira nossa República, um projeto autoritário nos moldes de Francisco Campos, o jurista da Constituição de 1937, mais conhecida como "Polaca".

Entretanto, como diria Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, o compositor Tom Jobim, o Brasil não é para principiantes. Que ironia, a onda reacionária que se apropriou da bandeira da ética e promoveu um tsunami na política brasileira esbarrou no Supremo Tribunal Federal (STF), um dos pilares do Estado nacional, enraizado historicamente desde o Império, que até recentemente parecia ser o principal instrumento de criminalização da atividade política no Brasil, com o apoio da mídia e da opinião pública. Como após o Período Regencial (1831-1840), com suas rebeliões que colocavam em risco a integridade nacional, a magistratura federal teve um papel decisivo na defesa da ordem, contra uma extrema direita golpista e reacionária, liderada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.

A cassação do mandato do deputado Deltan Dallagnol (Podemos-PR), eleito no ano passado, ocorre nesse contexto histórico. O ex-chefe da força-tarefa de Curitiba, algoz do presidente Lula, que ousou estender suas investigações contra a corrupção aos tribunais superiores, foi defenestrado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na terça-feira, por unanimidade, após julgamento de pedido de impugnação de sua candidatura. Eleito com mais de 345 mil votos, o mais votado do Paraná, "Dallagnol antecipou sua exoneração em fraude à lei. Ele se utilizou de subterfúgios para se esquivar de PADs ou outros casos envolvendo suposta improbidade administrativa e lesão aos cofres públicos. Tudo isso porque a gravidade dos fatos poderia levá-lo à demissão", resumiu o relator do processo no TSE, ministro Benedito Gonçalves, ao defender a cassação. Quem maneja o cipó de aroeira é a alta magistratura.

22
Jan23

O golpe em dois atos

Talis Andrade
 
 
 
 
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O golpe foi abortado, mas a rede fascista, em especial o seu cérebro, continua intacta

 

17
Dez21

Peça 2 – o Supremo e o caminho para o arbítrio

Talis Andrade

 

XADREZ DO CASO CANCELLIER E DA MARCHA NÃO INTERROMPIDA PARA A DITADURA

por Luis Nassif

Sobre todos esses atos, paira a sombra de um Ministro de modos afáveis, que sonhava ser um continuador dos grandes juristas liberais – Joaquim Nabuco, Ruy Barbosa e San Tiago Dantas – e passou a ser parte integrante da pior memória autoritária da Justiça brasileira, ao lado de Vicente Rao, Gama Filho, Francisco Campos, consumando seu ato mais ignominioso: a invasão da esfera do Executivo para suspender um ato de indulto natalino, já no governo Temer.

No início de sua carreira como Ministro, Luís Roberto Barroso colocou-se, até, como profeta do Novo Iluminismo e, no final do julgamento do “mensalão”, tomou algumas decisões que o habilitavam a ser um campeão dos direitos civis.

A grande onda da Lava Jato despertou seu senso de marketing pessoal. Tornou-se o principal defensor do estado de exceção, da abolição dos direitos individuais e porta-voz do ultra liberalism.

No fragor da Lava Jato, acadêmicos foram perseguidos, universidades ocupadas, censuradas, pesquisas sobre drogas foram criminalizadas, políticos foram presos e humilhados e o Supremo interferiu diretamente nas eleições presidenciais que levaram ao poder Jair Bolsonaro.

Em 2018, no jornal Zero Hora, Barroso disse o seguinte:

“Há visões como a minha, que essa é uma oportunidade que não se pode desperdiçar para mudar o patamar ético do país, e há uma visão – que tem sido apelidada de garantista – que é mais tolerante, digamos assim, como esse quadro geral que nos trouxe até aqui”.

Em outra entrevista, declarou que “os garantistas se apaixonaram por provas ilícitas”.

Ou, então, em O Globo, com a retórica da equivalência: se pobre não tem direitos, a maneira de igualar com os ricos é tirar o direito de ambos.

“Então, essa história de punitivismo é balela de quem está tendo que reaprender a trabalhar. Porque o sistema era feito para proteger essas pessoas — avaliou Barroso. — As pessoas estavam acostumadas com um sistema penal que não funcionava, sobretudo para o colarinho branco. Ninguém que ganhasse mais de cinco salários mínimos era condenado no Brasil por coisa alguma. Você tinha uma cultura nessa área em que ninguém jamais era punido”.

O discurso reiterado de Barroso alimentou a sanha dos policiais e procuradores que promoveram o linchamento de Cancelier. E espalhou por todos os poros do Judiciário a luta feroz contra direitos básicos. Em nome do Iluminismo, Barroso liderou o processo de desmanche das garantias fundamentais. O “in dubio pro reo” foi trocado pelo “in dubio pro socoietá”. E Barroso se tornou o líder inconteste 

 

24
Out20

"Não é preciso tanque nas ruas quando é possível ter uma ditadura do Judiciário"

Talis Andrade

Lançamento do livro "Geopolítica da intervenção: A verdadeira história da  Lava Jato" de Fernando Fernandes | Grupo Prerrogativas

II - “A PF, em larga escala, é comandada pelos EUA”, diz autor de livro sobre a Lava Jato

Daniel Giovanaz entrevista Fernando Augusto Fernandes
 
 
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Brasil de Fato: Depois de atuar em vários processos no âmbito da Lava Jato, você aproveitou a quarentena para refletir sobre a operação e contrapor a narrativa construída pela mídia hegemônica. Como articula o ofício de advogado ao trabalho de escritor? As relações e os abusos que você descreve no livro eram perceptíveis no cotidiano da Lava Jato?

Fernando Augusto Fenanders: No dia a dia, não é possível compreender o que está acontecendo. No início da Lava Jato, por exemplo, não se conhecia o texto do Sergio Moro chamado “Considerações sobre a operação Mani Pulite” [sobre a Mãos Limpas, investigação realizada na Itália na década de 1990].

Historicamente, nós costumamos dizer que é preciso um distanciamento para compreender a fase em que estamos vivendo. E esse distanciamento foi possível, de certa maneira, em razão da minha experiência anterior.

Em 1997, eu descobri arquivos secretos do regime militar – gravações do julgamento de presos políticos. Isso gerou a apreensão do meu material de pesquisa e resultou no livro Voz Humana: A defesa perante os tribunais da República.Voz Humana: A Defesa Perante Os Tribunais Da Republica nas americanas

Também tive a experiência do doutorado em Ciência Política, em que analisei a formação ideológica dos advogados. O livro é Poder e saber: ideologia e campo jurídico, e ambos me deram instrumentos, para além da advocacia na qual labuto, para compreender a Lava Jato de forma mais ampla.

A Lava Jato e a intervenção americana pertencem à mesma sequência de fatos

Os dois primeiros capítulos do livro trazem debates anteriores à Lava Jato: a doutrina de segurança nacional e a guerra às drogas. Logo, fica claro que a Polícia Federal, por exemplo, sofre interferências significativas dos Estados Unidos.

Não é possível compreender o momento que estamos vivendo, e muito menos a operação Lava Jato, sem nos aprofundarmos historicamente. Ou seja, entendermos que a Lava Jato e a intervenção americana pertencem à mesma sequência de fatos.

Começa com a doutrina de segurança nacional, pós-2ª Guerra, que passa a influenciar os nossos militares. Os Estados Unidos renovam suas estruturas de intervenção para um novo inimigo interno, que deixa de ser o comunista e passa a ser o traficante, com o fim da Guerra Fria.

Em um primeiro momento, temos golpes militares na América Latina. Num segundo, temos a intervenção dos Estados Unidos na Colômbia e na Bolívia, e uma clara influência sobre os nossos policiais federais. Eles gastam milhões para levar policiais e doutriná-los.

Várias vezes, já dissemos sobre essa nova fase de intervenção: não é preciso tanque nas ruas quando é possível ter uma ditadura do Judiciário. 

Primeiro, é preciso compreender que naquele lindo momento da promulgação da Constituição de 1988, de oxigenação, de nascimento da nossa República, tivemos um poder que se estruturou para não se democratizar: o Poder Judiciário – aí, acoplado, o Ministério Público.

Esses poderes se tornam – e continuam sendo – altamente elitistas. Eles vivem como se fossem donos de fazenda, com salários que extrapolam o teto e chegam a mais de R$ 100 mil.

 

A nossa autonomia mostrou-se muito curta e altamente manipulada por poderes externos que os próprios membros do Judiciário não compreendem

 

Tem outro ponto importante, que na Lava Jato fica muito claro, que são as relações familiares. Ministro casa com desembargadora, promotor casa com procuradora, que casa com juiz. Ou seja, forma-se uma rede de conexões internas e mantém-se uma visão de mundo absolutamente distante dos movimentos sociais.

São raros os juízes com uma noção clara de direito social. No livro Poder e saber, eu demonstro como a reforma universitária de 1930, feita pelo Francisco Campos – primeiro ministro da Educação do Getúlio Vargas, que seria ministro da Justiça no Estado Novo e redigiria o Ato Institucional nº 1 após o golpe de 1964 –, retirou as ciências sociais de dentro do Direito.

Desde então, temos quadros formados por uma ideologia clara, para exercer um papel de poder. E aí, vem a descoberta americana de que, para gerar uma nova fase de intervenção, era preciso doutrinar os nossos juízes e procuradores – como já haviam feito com os militares e policiais federais. É nesse contexto que vem o Projeto Pontes, os documentos vazados pelo WikiLeaks...

Então, autonomia é algo ilusório. É tal qual falar de liberdade de imprensa sem entender que ela é um mito quando se trata do poder dos anunciantes e dos donos dos veículos de comunicação. A nossa autonomia mostrou-se muito curta e altamente manipulada por poderes externos que os próprios membros do Judiciário não compreendem.

 

Podemos considerar que a Lava Jato é a radicalização desse processo, ou a comprovação da falta de autonomia das instituições?

Eu não diria que a Lava Jato não representa uma radicalização, mas um aperfeiçoamento ou rebuscamento das formas de intervenção.

O que acontece com determinados povos que não têm condições de reagir à intervenção, como ocorreu com os incas ou os maias? É preciso refletir sobre essa insuficiência para entender o nosso Judiciário.

Quando o Marcelo Bretas [juiz da Lava Jato] vai interrogar o ex-presidente Lula, em determinado momento ele diz: “Presidente, eu votei em você. Eu estive na campanha.”

De fato, ele é o mesmo. Mas, em certo momento, determinada visão da esquerda se aproximou da direita quando o assunto é Direito Penal. Agora que a esquerda começou a despertar, porque viu o ex-presidente Lula ser preso, viu os movimentos sociais serem criminalizados. Porém, a Lei Antiterrorismo e toda legislação que levou Lula para a cadeia foram aprovadas durante os governos PT.

 

O discurso anticorrupção não pode ser o mesmo do Jânio Quadros, da “vassourinha”, ou do [Fernando] Collor, “caçador de marajás

É importante ter essa compreensão do Direito Penal radical, baseado no discurso de “anticorrupção”, na qual o PT caiu. Na campanha de 2014, os discursos da Dilma [Rousseff] e do Aécio [Neves], nesse ponto, são iguais. Não havia uma compreensão de que eram aquelas estruturas que levariam à prisão do Lula.

O PT deveria ter noção de que o que vale para os outros não valeria para ele. Era preciso entender a criminalização secundária, como diz o [Eugenio Raúl] Zaffaroni [jurista argentino], que a lei é uma coisa, mas a efetividade dela é seletiva. Ou seja, selecionaram o PT da mesma forma que a Lei Antiterrorismo seleciona os movimentos sociais.

Precisamos desmontar as estruturas radicais do Direito Penal e criar um Direito Penal garantista, que sirva para a direita e para a esquerda. O discurso anticorrupção não pode ser o mesmo do Jânio Quadros, da “vassourinha”, ou do [Fernando] Collor, “caçador de marajás”. (Continua)

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Nota deste correspondente: Sergio Moro saiu do governo atirando. Deixou os ministérios da Justiça e da Segurança Pública reclamando da pretendida interferência do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal. Abuso em julgamento no STF. 

Moro jamais reclamou da interferência dos Estados. Até facilitou... e muito. 

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