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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

13
Jun22

Ministério da Defesa nunca teve estranhamento sobre eleição, critica Gilmar Mendes

Talis Andrade

TRIBUNA DA INTERNET | Voto consolidado e temor de golpe são obstáculos para  Bolsonaro nas urnas

“As Forças Armadas já participam historicamente do sistema eleitoral. Cerca de R$ 100 milhões são destinados do TSE às Forças Armadas para a questão de logística. Nunca houve essa alienação, esse estranhamento, muito pelo contrário, as Forças Armadas sempre trabalharam em cooperação com o Tribunal Superior Eleitoral”, disse

 

 
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Gilmar Mendes afirmou nesta segunda-feira (13/6) que “nunca houve estranhamento” das Forças Armadas sobre o sistema eleitoral como está sendo visto agora. À coluna, o ministro do STF disse que os militares sempre tiveram participação nas eleições com “espírito de cooperação e nunca com estranhamento”.
 

Gilmar Mendes afirmou que o prestígio pedido pelo Ministério da Defesa ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na última sexta-feira está sendo tratado “com calma e tranquilidade” pelo TSE. O ministro disse também que as Forças Armadas terão o espaço que sempre tiveram nas eleições.

“As Forças Armadas já participam historicamente do sistema eleitoral. Cerca de R$ 100 milhões são destinados do TSE às Forças Armadas para a questão de logística. Nunca houve essa alienação, esse estranhamento, muito pelo contrário, as Forças Armadas sempre trabalharam em cooperação com o Tribunal Superior Eleitoral”, disse.

Na última sexta-feira (10/6), o Ministério da Defesa emitiu um ofício ao TSE alegando que as Forças Armadas “não se sentem devidamente prestigiadas” no sistema eleitoral — ignorando que as pesquisas vêm mostrando que a ampla maioria da sociedade confia nas urnas eletrônicas.“A todos nós não interessa concluir o pleito eleitoral sob a sombra da desconfiança dos eleitores. Eleições transparentes são questões de soberania nacional e de respeito aos eleitores”, afirmou a nota da Defesa.

Bolsonaro comete o mais grave crime de responsabilidade: 'Vou intervir' (v)  - OEstadoAcre.com
22
Abr22

Forças Armadas – degradação e redenção

Talis Andrade

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por Tarso Genro /A Terra É Redonda

O que resta, atualmente, às Forças Armadas brasileiras, é afundar-se no golpismo bolsonarista ou ajustar-se ao projeto democrático da Carta de 1988

A degradação inédita do prestígio das Forças Armadas no Brasil se dá precisamente a partir do momento em que o presumido representante de uma parte da caserna – da extrema direita militar também presente como representação parlamentar – chega ao poder pela via eleitoral. Não é necessário referir que este evento não está fora da curva ascendente das ideologias de extrema direita – fascistas e nazistas – em todo o planeta, com especial evidência no Continente europeu. Pululam Bolsonaros no palco da herança iluminista.

Ali, no berço originário da Revolução Francesa, a democracia social mirou suas baterias contra a época medieval e também firmou – no imaginário civilizatório europeu – o Estado de Direito formalmente garantidor dos Direitos Humanos e a mais organizada democracia política da época moderna. Mas ali, no continente da Revolução, também viceja a extrema direita racista, misógina, nacionalista e conservadora, em todos os seus poros, cortejada pelos empresários de todo o mundo, para ser mobilizada contra o Estado Social, em defesa do empreendedorismo de “si mesmos”.

O processo democrático europeu se deu sob os impulsos da Revolução Francesa em países que mantiveram – inclusive até depois da Segunda Guerra – seus domínios coloniais e que agregaram os recursos provenientes deste sistema de exploração “civilizatória”, ao seu “caixa” e ao caixa do Estado. A construção das maravilhas arquitetônicas, das infraestruturas públicas modernas e abrangentes, das amplas políticas de coesão nacional, inclusive as de natureza social democrata, tem este rastro do legado colonial e neocolonial.

O prestígio das Forças Armadas em boa parte destes países tem a sua memória ancorada na reconstrução do pós-guerra e no seu convívio com a democracia política, só possíveis com a derrota do nazismo. A rápida recuperação no pós-guerra, depois da vitória contra a Alemanha nazista, foi garantida pelo poderio militar e econômico dos EUA e da Inglaterra, agregado ao poderio do Exército Vermelho. Seus 27 milhões de mortos na URSS tingiram de heroísmo e sacrifício patriótico a defesa da Nação, tema também caro à tradição da Revolução Francesa.

Sem a União Soviética e a disposição das democracias ocidentais, os Bolsonaros de todos os tipos teriam assumido o poder no mundo a partir dos anos 50. O prestígio das nossas Forças Armadas, no senso comum dos brasileiros, todavia, firmou-se de maneira diferente, pois ele tanto ocorreu pela aceitação parcial das FFAA, do complexo processo democrático instaurado depois da República Velha, como pela defesa da formação do nosso Estado nacional moderno. A estes dois elementos foi agregada a intervenção política, civil-militar, para “defender o país do comunismo”, argumento que a maioria da população civil aceitou, a partir do Golpe de 1964.

Evidentemente isso foi um engodo do Departamento de Estado americano, que propagava a suposta verdade do “perigo vermelho” no cenário mundial, para não permitir ameaças à dominação imperial na América do Sul. Os EUA consideravam a América Latina, por destino mítico, um território a ser “protegido” pelos norte-americanos, para o seu usufruto econômico, previsto na doutrina do presidente James Monroe (1823), adotada por todos presidentes americanos como doutrina de Estado.

O quadro global mudou as práticas de domínio dos grandes países capitalistas, pois hoje todos estão submetidos ao internacionalismo pragmático do capital financeiro, o que alterou os seus conceitos – antes uniformes – de perigo externo. As mudanças alteraram a natureza dos conflitos e as ações “patrióticas” dos países do capitalismo maduro, passaram a ser ditadas pelos endereços difusos – das ruas do mercado mundial – cujo objeto não foi mais a defesa da soberania interna ou a luta contra os avanços do “comunismo”.

Nesta nova etapa a questão da afirmação nacional passa a ser a destruição dos “inimigos externos”, internos ao próprio capitalismo, para aparar as diferenças entre os acionistas dos oligopólios globais, na época do convívio internacional no mundo “pós-comunista”, cuja expressão sobrevivente não é menos pragmática do que a verve do capitalismo universal, cujo polo moderador é a China Popular. Mas ela também busca mercados, não a subversão revolucionária de antigamente.

O Brasil era considerado um “peão” importante, no xadrez geopolítico do Sul do continente na época Guerra Fria, quando as violências inomináveis cometidas pelo regime militar, nos porões da exceção, seriam um sacrifício do precário do Estado de Direito, destinado a “garantir a paz social contra o comunismo”. Esta missão e a missão de defesa do território nacional abrigavam então, à época, um patrimônio político erigido, de uma parte, pela importância das Forças Armadas na formação do nosso Estado Nacional Moderno e, de outra, pela sua responsabilidade com a defesa da nossa integridade territorial, determinada na Constituição. A ideologia justificadora – na época Guerra Fria – era cimentada no anticomunismo visceral da maioria dos seus quadros superiores.

A defesa do país, da sua integridade territorial passa por outras condições tecnológicas, culturais, comunicacionais e educacionais – ambientais e informacionais – que vão muito além da defesa militar do território do Estado, por tropas e material bélico, como ocorria no Século passado. A “agressão comunista”, num mundo integrado pelo mercado e pelo sistema financeiro privado é um blefe sectário da extrema direita. Com isso ela pretende acumpliciar o estamento militar com um presidente perverso (como político) e fracassado (como militar) além de profundamente ignorante das suas funções de Estado.

Qualquer Presidente eleito dentro da democracia tem a obrigação de dialogar com as chefias militares que escolher para, dentro da Constituição, formatar um novo pacto de princípios, visando preencher o vazio que se formou em torno da própria existência das Forças Armadas, num mundo em que a Guerra Fria não mais polariza o mundo, como antes, e em que a defesa do território e da soberania nacional já passa a quilômetros de distância do anticomunismo histórico, que só ameaça o sono dos dinossauros de época longínqua do mundo bipartido.

O que resta, atualmente, às Forças Armadas brasileiras, é afundar-se no golpismo bolsonarista, que será de curta e violenta duração, ou ajustar-se ao projeto democrático da Carta de 1988, saindo do brete do anticomunismo neurótico sem comunismo à vista. E ao sair, como reza a Lei Maior, ampare o país no mundo da cooperação com soberania e proteja o povo, protegendo a democracia e a República. Como manda a lei.

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09
Ago21

VOTO IMPRESSO Desfile militar para intimidar deputados

Talis Andrade

Reinaldo Azevedo no Twitter
 
Reinaldo Azevedo
Milicada no Planalto na semana da possível votação da PEC do voto impresso é coisa de quem está isolado. É claro q pretende ser ameaça da dupla Bolsonaro - Braga Netto. Deputados vão se intimidar? Lira será sócio do arreganho autoritário?O PREÇO DA RENDIÇÃO DO EXÉRCITO À ESTRATÉGIA GOLPISTA DE BOLSONARO – VISÃO  PLURAL
Preparem as câmeras, coleguinhas fotógrafos. A imagem-símbolo do mandato de Bolsonaro será oferecida na 3ª. Tbem é ícone do papel que as Forças Armadas ainda pretendem ter no país.. Ñ há democracia do mundo em q têm tal presença. E, pois, isso vai ter de mudar. E vai mudar. Marinha? É o canto do cisne.Charge: Bolsonaro e "seu" Exército. Por Miguel Paiva
Jungmann está certo. Bolsonaro e Braga Netto usam Forças Armadas para bravata. De resto, não se ameaça com golpe. Dá-se. Vergonha! Desfile de blindados é sinal de fraqueza e efeito internacional será desastroso, diz Jungmann

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20
Fev21

Manuel Domingos: livro de Villas Boas representa uma geração militar maldita

Talis Andrade

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247 - O professor Manoel Domingos Neto, docente visitante da Universidade Federal do Piauí (UFPI) e um dos maiores especialistas na análise das Forças Armadas no Brasil, falou à TV 247 sobre o livro do general Eduardo Villas Bôas - "General Villas Bôas: conversa com o comandante".

De acordo com Domingos Neto, Villas Bôas faz parte de uma geração podre de militares, a qual classificou como “geração Bolsonaro”, que articula a volta de uma ditadura militar no país. “O que nós estamos vivendo será compreendido a posteriori em toda sua profundidade. O que nós já compreendemos é estarrecedor. Se trata de um plano articulado por uma geração, por uma safra infeliz de oficiais, gerados nos anos 1970 e início dos anos 1980”.

O especialista disse que o general é o líder de tal geração de “subversivos” que colocou o Brasil no colo de Bolsonaro após impor sucessivas e tramadas derrotas à esquerda. “Quem sentou com o Villas Bôas como eu sentei em mais de uma ocasião se impressiona por sua simpatia, seu jogo de cena, e você até se ilude. É um líder. Ele é digno desse Exército, é digno desse presidente. Ele é a fina flor de uma geração de subversivos sem qualquer sensibilidade social, sem qualquer senso de responsabilidade histórica, e jogou o país na situação em que nós estamos, jogou o país na incerteza, ou na certeza de que estamos enfrentando dias ruins e poderemos enfrentar dias catastróficos, mais catastróficos ainda”.

Para Domingos Neto, todo livro citado “é um ataque à esquerda” e atenta contra a democracia. “Esse livro é um livro de um militante político radical e irresponsável. É de um subversivo. Esse livro é o livro da subversão militar. As Forças Armadas estão subvertidas, elas agem como um poder de subversão sem escrúpulos. Essa história de negar a possibilidade da esquerda é a negação da democracia. É isso. Um militar que chega e diz: ‘a esquerda não pode voltar ao poder’, o que ele está dizendo? Ele está dizendo: ‘nós precisamos de ditadura’. Essa geração dos anos 70 é uma geração maldita, está prejudicando muito o Brasil”.

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25
Jan21

Em apoio a Vianna: a história de um Exército que massacra seu povo e não poupa mulheres e crianças

Talis Andrade

Brasil acima de tudo - 20/10/2019 - Opinião - Folha

por Mauro Lopes

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Aviso de gatilho - o artigo a seguir relata a história do Exército e para isso faz descrição de cenas de torturas e massacres em larga escala.

Em 17 de janeiro, o jornalista  Luiz Fernando Vianna publicou na revista Época um artigo sob o título “Na pandemia, Exército volta a matar brasileiros”. O texto provocou reação imediata do Exército Brasileiro. Sob ordem direta do comandante do Exército, general Edson Leal Pujol, o também general Richard Fernandez Nunes, chefe de comunicação da Força, enviou uma carta à revista em tons jamais vistos desde o fim da ditadura, com ordem explícita de retratação. Você pode ler a carta aqui e avaliar a dimensão das agressões e ameaças do Exército contra o jornalista, a revista e a liberdade de imprensa no país.

O que escreveu Vianna que provocou a ira verde-oliva?

Nada demais. Uma expressão tímida e parcial do caráter do Exército Brasileiro. O jornalista registrou o massacre de Canudos, em 1897, quando “nem as crianças foram poupadas” pelos militares brasileiros - o que é pura expressão da verdade. Depois, mencionou a Comissão Nacional da Verdade, que apontou as centenas de mortos durante a ditadura militar, “quando as Forças Armadas se uniram às polícias para torturar e assassinar”. Aqui há uma imprecisão histórica de Vianna. Não foram as Forças Armadas que se uniram às polícias na missão de tortura e assassinatos em série. Elas foram as líderes do morticínio, com o apoio das polícias. 

Uma das mortes mais emblemáticas do período ditatorial, do jornalista Vladimir Herzog, aconteceu nas dependências do DOI-Codi do II Exército, no que parecia ser um bucólico bairro de classe média paulistana em 1975, significativamente com o nome de Paraíso. Milhares de homens e mulheres e várias crianças foram torturadas em dependências oficiais ou clandestinas das Forças Armadas durante a ditadura e centenas deles morreram - não há registro da morte de crianças. O irmão da jornalista Hildegard Angel, hoje colunista da rede Jornalistas pela Democracia, cujos artigos são veiculados no 247, o jovem Stuart Angel Jones, foi sequestrado por militares, torturado por eles na Base Aérea do Galeão e assassinado de maneira quase indescritível. Stuart foi amarrado a um carro e arrastado por todo o pátio do quartel. Para se divertirem, os militares colocavam a boca do jovem de 25 anos no escapamento do veículo fazendo com que ele aspirasse todos os gases tóxicos. Após ser desamarrado, Stuart foi abandonado no chão, com o corpo  bastante esfolado e seguiu clamando por água noite adentro. Até hoje não se sabe se morreu naquela noite ou em novas sessões de tortura executadas pelos militares da Aeronáutica.

Em seu artigo, Vianna salta aos dias de hoje para falar do papel dos militares na pandemia do coronavírus. Digitou o jornalista que o ministro-general Eduardo Pazuello, que ele qualifica de “lambe-botas do presidente”, soube “com dias de antecedência que os hospitais de Manaus entrariam em colapso por falta de oxigênio para os pacientes. Nada fez, a não ser prescrever a inútil cloroquina” e o comprovadamente ineficaz “tratamento precoce” . A afirmativa é tão veraz que o procurador-geral da República, Augusto Aras, enviou neste sábado (23) ao Supremo Tribunal Federal um pedido de abertura de inquérito para apurar a conduta do general Pazuello durante a crise em Manaus. A seguir, o jornalista afirma que “os generais de Brasília (Mourão, Augusto Heleno, Braga Netto, Azevedo e Silva) pouco fazem além de inscrever seus nomes na história como operadores de um morticínio – não se pode usar a palavra genocídio porque algumas damas da intelectualidade ruborizam”.

Morticínio e genocídio, por sinal, são duas palavras correntes nos fóruns internacionais a respeito de Jair Bolsonaro - ele foi denunciado por esses dois motivos ao Tribunal Penal de Haia.

O que então incomodou tanto o Exército?

Sabemos a razão, quem não sabe? 

O que incomoda é o fato de Vianna ter levantado ainda que de maneira parcial e tímida, o manto sobre o qual o Exército procura esconder sua história. 

Vamos a ela que é este, afinal, o motivo deste artigo: apresentar a você, que talvez ainda não conheça, a história do Exército Brasileiro.

A história do Exército Brasileiro

Na verdade, talvez seja mais apropriado falar em história das forças armadas a serviço da elite, constituídas sob diversas denominações desde a ocupação colonial do território que viria a ser chamado de Brasil a partir do século 16.

Toda a constituição destas forças levaram, ao fim e ao cabo, à criação do Exército Imperial Brasileiro em 1822.

Mas, muito antes disso as forças armadas (com letras minúsculas) das elites conformaram-se como atos preparatórios para a formação do Exército. O que importa reter aqui é que ao longo de toda esta história, até hoje, essas forças armadas cultivaram a doutrina do “inimigo interno”, que foi crescentemente explicitada a partir de 1935 (no levante alcunhado de Intentona Comunista pela liderança militar) e formalizada depois do golpe militar de 1964.

Este espírito presidiu a “guerra aos bárbaros”, que dizimou os povos originários na segunda metade do século 17 no Nordeste e no massacre do Quilombo dos Palmares, complexa organização de comunidades de negros e negras rebeldes fundadas a partir de 1580 e que chegaram a ter 20 mil pessoas e foram também dizimadas em 1710.

Eram os primórdios do que viria a ser o Exército Brasileiro.

Caxias, o carniceiro

Hoje já é atestado de maneira inequívoca que Luís Alves de Lima e Silva, patrono reverenciado pelo Exército Brasileiro, referência militar no Brasil, foi um carniceiro. Ele mesmo, o Duque de Caxias, que recebeu este título de Barão de Caxias de Dom Pedro II em 1841 por ter massacrado impiedosamente a revolta popular da Balaiada no Maranhão - foi promovido a conde e depois marquês conforme crescia a pilha de cadáveres em sua trajetória, até chegar a duque em retribuição pelo massacre do povo paraguaio - incluindo mulheres e crianças, como sempre.

Um ano antes de ser barão, ainda como Luís Alves, Caxias projetou-se no cenário imperial brasileiro por ter liderado o massacre ao quilombo de Manuel Congo e Mariana Crioula, em Vassouras (RJ). 

No Maranhão, Luís Alves, futuro Caxias, foi o líder das tropas a serviço dos grandes proprietários de terra e de escravos. A rebelião foi articulada por uma ampla unidade popular entre diversos segmentos que ficaram conhecidos como balaios, apelido de um dos líderes do movimento: uniram-se vaqueiros, artesãos, lavradores, escravos, sertanejos, índios e negros libertos, sem direito à cidadania e nem ao acesso à propriedade da terra - eles lutaram de 1838 até 1841.

A repressão foi um massacre em larga escala. Um ano antes do morticínio, Luís Alves foi nomeado presidente da Província do Maranhão, com esta missão: o massacre. E ele a cumpriu. Matou 12 mil pessoas. Milhares de participantes sobreviventes foram exilados, expulsos do Maranhão e do Piauí.

Engana-se quem pensa que foram apenas esses os dois massacres perpetrados por Caxias. 

Três anos depois, na Guerra dos Farrapos, 1845, Caxias foi o grande articulador do Massacre de Porongos, o último conflito da guerra, uma emboscada aos Lanceiros Negros, o corpo de negros libertos e escravos que lutaram sob promessa de liberdade e paz. Em 14 de novembro de 1844, praticamente desarmados, mais de 100 lanceiros negros foram assassinados e os que sobreviveram foram enviados à corte brasileira. 

Veio depois a Guerra do Paraguai, celebrada com toda pompa pelo Exército Brasileiro. Morreram 50 mil brasileiros no conflito, no qual Caxias assumiu o comando da segunda etapa da guerra, de 1866 a 1869. O Paraguai foi dizimado: estima-se em mais de 300 mil mortes, mais da metade da população do país, e 80% da população masculina e masculina-jovem,  com milhares de crianças assassinadas nos combates.

O massacre de Canudos

O Exército Brasileiro não precisou de Caxias para seus massacres. O Duque morreu em 1880, mas os massacres continuaram e o Exército, que se tornou uma força política decisiva no Império, deu o golpe que derrubou o sistema e instituiu a República dos Marechais, em 1889.

E estreou em “grande estilo” como força armada do novo regime na repressão ao Belo Monte de Antônio Conselheiro, uma experiência comunitária popular original, que terminou no massacre conhecido como Guerra de Canudos (1896-97).

As duas primeiras expedições conduzidas pelo governo baiano fracassaram, derrotadas pelo povo organizado ao redor de Conselheiro, composto por sertanejos e sertanejas miseráveis, negros e negras libertos e lançados igualmente à miserabilidade, bem como indígenas do povo Kaimbé - a primeira indígena vacinada contra a Covid no Brasil, em São Paulo, Vanuzia Costa Santos, presidente do Conselho do Povo Kaimbé, nasceu na região do massacre.  

O Exército assumiu a repressão na terceira expedição, que fracassou igualmente. A quarta expedição foi comandada por dois generais e os militares quase foram derrotados, mais uma vez. Foi preciso que o Ministro da Guerra, marechal Carlos Bittencourt, levando mais três mil soldados, fosse em socorro dos generais, para finalmente derrotar a comunidade de Conselheiro, que sempre fora pacífica. 

O marechal Carlos Bittencourt é outro carniceiro considerado herói do Exército Brasileiro. Sob sua ordem direta foram assassinados centenas de prisioneiros de guerra, entre homens, mulheres e crianças, inclusive pessoas que haviam se rendido com bandeira branca e que haviam recebido promessas de proteção em nome da República. Alvim Martins Horcades, médico do Exército e testemunha ocular, escreveu sobre a ação do marechal: "Com sinceridade o digo: em Canudos foram degolados quase todos os prisioneiros. (…) Assassinar-se uma mulher (…) é o auge da miséria! Arrancar-se a vida a criancinhas (…) é o maior dos barbarismos e dos crimes monstruosos que o homem pode praticar!" Pode parecer exagero afirmar que o assassino Bittencourt seja herói do Exército. Não é. Em vez de apurar as centenas de denúncias contra ele, o Exército, em 1940, proclamou-o oficialmente "herói de guerra e mártir do dever, que sublimou as Virtudes Militares de Bravura e Coragem". Não bastante, o marechal degolador de mulheres e crianças foi consagrado como Patrono do Serviço de Intendência do Exército Brasileiro.

Guerra do Contestado: outro massacre

A série de massacres perpetrados pelo Exército Brasileiro adentrou o século 20 - e prossegue no 21. 

No início do século 20, o Exército perpetrou outro brutal massacre que ficou conhecido como Guerra do Contestado, entre 1912 e 1916 em Santa Catarina e Paraná. Os líderes militares designados para o morticínio foram o general Carlos Frederico de Mesquita, veterano do massacre de Canudos, e o general Setembrino de Carvalho, que se tornaria ministro da Guerra de um dos presidentes mais repressivos da história, Arthur Bernardes (1922-26). O episódio mais marcante da campanha militar foi o massacre de Taquaruçu. O vilarejo, uma das sedes dos seguidores do monge José Maria e de Maria Rosa, foi cercado pelos militares brasileiros com apoio de tropas locais. O povoado foi bombardeado por canhões e granadas que atingiram principalmente mulheres, crianças e idosos, pois a maior parte dos homens havia partido para formar outro reduto, o de Caraguatá. Como em Canudos, um médico militar deixou o registro da ação do Exército Brasileiro para a história. Seu nome era Cerqueira César, e ele relatou o que viu:

“O estrago da artilharia sobre o povoado de Taquaruçu era tremendo: grande número de cadáveres (…); pernas, braços, cabeças juncavam o chão; casas queimadas ruíam por toda parte. Fazia pavor e pena o espetáculo que então se desdobrava aos olhos do espectador: pavor de destroços humanos; pena das mulheres e crianças que jaziam inertes por todos os cantos do reduto. De nada lhes serviram as trincheiras feitas de pinheiro, nem as 105 cavidades quadradas que fizeram no chão onde se metiam para se abrigarem da metralha.”

Depois de derrotar a rebelião popular, com um saldo estimado em 20 mil mortos, o Exército entregou armas e munições para que as elites locais “terminassem o serviço”.

Menos de 10 anos depois, o Exército bombardeou São Paulo em 1924, no contexto da segunda revolta tenentista. As cenas lembravam as da Primeira Guerra Mundial. Mas era o Exército Brasileiro, sob a Presidência de Bernardes e tendo o mesmo Setembrino de Carvalho do massacre de Contestado como ministro da Guerra, destruindo parcialmente São Paulo no maior conflito bélico urbano da história do Brasil e da América Latina no século 20.

Estima-se em 800 mortos, boa parte civis, pelo menos 1.500 edificações em toda a capital destruídas, o comércio saqueado, os hospitais sem dar conta de tantos feridos.

Bombas contra os herdeiros de Padre Cícero

Em 1937, o Exército Brasileiro encerrou, com outro massacre, uma das mais belas experiências de vida comunitária da história brasileira, na fazenda Caldeirão de Santa Cruz do Deserto. Onze anos antes, o Padre Cícero havia alojado o líder betado João Lourenço e sua comunidade em uma grande fazenda denominada Caldeirão dos Jesuítas, situada no Crato, no Ceará. A base do movimento era o trabalho comunitário inspirado pela religiosidade popular. Era uma sociedade igualitária. Toda a produção do Caldeirão era dividida igualmente, o excedente era vendido e, com o lucro, investia-se em remédios e querosene.

A elite local identificou a iniciativa como uma ameaça a seus negócios, pois os sertanejos de toda região começaram a mudar-se para a fazenda, e denunciaram a experiência como “comunismo”. Em 1937, sem a proteção de Padre Cícero, que falecera em 1934, a comunidade foi massacrada pelo Exército, com ataque de artilharia e bombardeio por aviões. Foram mais de mil mortos, dentre eles centenas de mulheres e crianças. Até hoje o Exército Brasileiro não informa onde enterrou os mortos em vala comum. Todos eram seguidoras e  seguidores do beato José Lourenço, que buscavam retomar a tradição cristã original de vida em comunidade.

O massacre dos waimiri atroari

Na ditadura militar, além da mobilização do Exército (com apoio da Aeronáutica e Marinha) nas cidades para prisão, tortura e morte dos opositores, houve os massacres nos campos e especialmente dos povos originários.  

Bombardeios em ataques aéreos, chacinas a tiros, esfaqueamentos, decapitações de homens, mulheres e crianças e destruição de locais sagrados foram as ações do Exército Brasileiro contra o povo waimiri atroari a partir de 1974 para a construção da rodovia BR-174 (Manaus-Boa Vista), feita pelos militares. De acordo com a Funai, a população dos waimiri atroari era de 3 mil pessoas em 1972. Em 1983, depois do tratamento dispensado pelo Exército Brasileiro ao povo, apenas 350 haviam sobrevivido aos massacres.

A desfaçatez militar não teve limites em relação ao povo waimiri atroari.

O general de brigada Gentil Paes assinou o seguinte ofício em 1974: “Esse Comando, caso haja visitas dos índios, realiza pequenas demonstrações de força, mostrando aos mesmos os efeitos de uma rajada de metralhadora, de granadas defensivas e da destruição pelo uso de dinamite”. 

Já o coronel Arruda, comandante do 6º Batalhão de Engenharia e Construção, disse em 1975 que “a estrada é irreversível como é a integração da Amazônia ao país. A estrada é importante e tem que ser construída, custe o que custar. Não vamos mudar o seu traçado, que seria oneroso para o Batalhão apenas para pacificarmos primeiro os índios. […] Não vamos parar os trabalhos apenas para que a Funai complete a atração dos índios”.

São incontáveis os massacres perpetrados contra o povo brasileiro pelo Exército. Eles são o fio que amarra as contas da história militar no Brasil. A lista acima está longe de esgotar os episódios em que, ao longo da história, os militares massacraram parcelas expressivas do povo brasileiro.

Diante das críticas, os militares levantam rapidamente a bandeira das “tropas brasileiras na II Guerra” para afirmar uma farsesca tradição de luta em defesa do país e da democracia, mas a participação nos campos da Europa contra o nazi-fascismo foi apenas a exceção que confirma a regra. A respeito deste episódio, os militares comportam-se como Bolsonaro o fez com o auxílio emergencial: eram contra e tentam faturar depois que a ação foi bem sucedida. Sobre isso escreve o mestre Roberto Amaral: “Fomos à guerra contra a insistente resistência dos generais Eurico Gaspar Dutra, Ministro do Exército, e do todo poderoso general Góes Monteiro, chefe do estado maior da força, como está fartamente documentado. Aliás, na reunião do ministério 27 de janeiro de 1942) que decidiu pela beligerância, a proposta foi apresentada pelo civil Getúlio Vargas, contra o parecer do ministro da Guerra”.O Exército Brasileiro, como afirmou corretamente o jornalista Luiz Fernando Vianna, sabe muito bem matar brasileiros: homens, mulheres e crianças.

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