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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

13
Out23

Notas sobre a sustentação oral pelas defesas de golpistas do 8 de Janeiro

Talis Andrade
 
 
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Por Fernando Augusto Fernandes

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A Ordem dos Advogados do Brasil tratou, em encontro com o ministro Alexandre de Moraes, da necessidade do julgamento presencial no Supremo Tribunal Federal. Participaram o presidente da OAB, Beto Simonetti, e representantes das ordens estaduais, entre os quais cabe destacar Marcelo Oliveira, representando o presidente Luciano Bandeira, da Seccional do Rio de Janeiro. É notório que o assunto está na ordem do dia, sobretudo em razão dos casos que estão sendo julgados pelo Supremo sobre a tentativa de golpe ocorrida no último dia 8 de janeiro.

Deve-se ao STF, bem como ao Tribunal Superior Eleitoral, a defesa efetiva da democracia ante o cenário de tentativas de erosão do Estado Democrático de Direito. Isso não apaga a necessidade de não repetir erros que levaram aos ataques democráticos e de aperfeiçoar de nossas instituições.

As penas aplicadas pelo Supremo aos golpistas, que à primeira vista parecem severas, na verdade são comedidas, em razão do quantum da pena para cada um dos crimes pelos quais foram condenados os golpistas do 8 de janeiro, quais sejam: abolição violenta do Estado Democrático de Direito (4 a 8 anos), golpe de Estado (4 a 12 anos), dano qualificado (6 meses a 3 anos), destruição de patrimônio (1 a 3 anos), e associação criminosa (1 a 3 anos).

Evidente que críticas doutrinárias podem ser feitas quanto à absorção de crimes, mas essas não mudam muito o resultado e não podem nos levar a ser lenientes quanto à grave tentativa de ruptura do Estado de Direito. Mesmo quanto à própria competência do STF, que se faz em razão de conexão com outros processos, mas que se superada no futuro tal conexão, ao contrário do que muitos esperam, sequer seria um procedimento na Justiça Estadual, isso porque trata-se de processo por crime político, que tem previsão no artigo 102, inciso II, alínea "b", da Constituição Federal, e que segue a regra de julgamento em primeira instância por juízo federal e recurso diretamente ao Supremo Tribunal Federal via recurso ordinário constitucional, como abordei em artigo nesa ConJur.

Quanto às lastimáveis sustentações perante o julgamento no STF, não é possível permitir os desvio da profissão realizados por determinados advogados na tribuna da mais alta corte do país, onde, se utilizando dos poderes de seus clientes, proferiram discursos contra o tribunal; e até mesmo com ataques pessoais a ministros, o que configura uma continuidade dos atos golpistas.

É sabido que o juiz tem poder de polícia nas audiências, para os fins de manter a ordem e decoro nas audiências (artigo 360 CPC), assim como para manter a regularidade do processo (artigo 251, CPP), e especificamente no STF o regimento interno da corte dá ao presidente o poder de dirigir o Plenário (artigo 143).

Em que pese ter sido louvável a paciência dos ministros e da presidência da Suprema Corte, ao permitir as sustentações transcorrerem sem interrupção mesmo diante de desacatos, é necessário que o advogado que deixa de realizar defesa técnica na tribuna seja interrompido pelo presidente da corte e que sua palavra seja cassada. Além disso, que seja, após esses atos, devidamente punido pela Ordem dos Advogados do Brasil. A falta de punição é um desvalor à alta classe da advocacia prestigiada no artigo 133 da Constituição Federal.

O advogado deve ter elegância e ética na militância perante a Suprema Corte. O Código de Ética exige "preservar, em sua conduta, a honra, nobreza e a dignidade da profissão", o dever de "urbanidade" impondo "lhaneza, emprego de linguagem escorreita e polida". Isso para exercer com plena liberdade as imunidades que lhes são conferidas para a independência na tribuna.

Nesse sentido, cabe ao presidente do Supremo Tribunal Federal a interrupção, ou seja, não permitir que se desvie o advogado a sustentar da função de utilizar o tempo para defender seu cliente.

Recentemente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou o fato de os votos dos ministros serem de conhecimento público. Nesse ponto, equivocou-se em uma mera opinião, eis que o artigo 93, inciso IX, da Constituição, garante que as decisões serão fundamentadas e públicas. Nesta ConJur já tratei sobre a inconstitucionalidade do julgamento virtual. Sobre o tema, há relevante artigo no livro em homenagem ao ministro Luiz Fux, da lavra do professor e desembargador José Muiños Piñeiro Filho, intitulado "A Inconstitucionalidade dos Julgamentos Eletrônicos e/ou Virtuais de Apelações Criminais por Afronta ao Princípio da Publicidade" [1]. Mais ainda, em prestação jurisdicional, o mesmo José Muiños entendeu que em matéria penal, e em razão do direito de sustentação oral, são inconstitucionais os chamados julgamentos eletrônicos (TJ-RJ, Ap. 0001378-72.2014.8.19.0041, rel. des. José Muiños Piñero Filho, j. 24/3/2020)

De fato, os julgamentos telepresenciais foram um grande avanço na democratização do acesso ao Poder Judiciário, e é possível admitir-se como razoável a realização de julgamentos virtuais quando com concordância das partes. Estes só são democráticos se tiverem a concordância de todas as defesas. Isso porque o julgamento virtual compromete a sustentação oral, que é, aliás, direito que foi ampliado pelo Estatuto da Ordem dos Advogados, em conformidade com o artigo §2-B do artigo 7ª da Lei 8.906/94, para estabelecer a possibilidade de sustentação inclusive em recurso interposto contra decisão monocrática de relator que julgar o mérito de recursos.

No entanto, não é de se admitir o uso indevido e desviante da sustentação oral, como ocorreu no julgamento de golpistas. Especialmente, é preciso que o Supremo zele para que esses abusos cometidos por advogados não criem precedentes de cerceamento a palavra.

A sustentação faz parte do que a Constituição chama de devido processo legal com todo os "recursos" mencionados no artigo 5º, inciso LV da Constituição, ao afirmar que aos litigantes é assegurado o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerente

Não é à toa que mesmo no tribunal de segurança nacional, em 1937, era garantida a sustentação, e mesmo na ditadura foi garantida a sustentação oral, que foi conduzida por grandes advogados. Vale mencionar, nesse ponto, o projeto Voz Humana (originado do livro Voz Humana), que iniciou se dedicando às sustentações orais dos advogados, mas que hoje acolhe também a íntegra dos julgamentos secretos do Superior Tribunal Militar durante a ditadura de 64, obtidos por meio de decisões obtidas no Supremo Tribunal Federal.

Talvez seja o momento de o Supremo repensar o televisionamento ao vivo de julgamentos na Suprema Corte. O não televisionamento ao vivo dos julgamentos da Suprema Corte não afeta o artigo 93, IX, da Constituição Federal, porque as gravações ficam disponíveis e os votos são publicados. Quanto à preocupação colocada pela presidente da república dos conflitos quanto aos votos dos ministros, é preciso repensar a exposição midiática dos ministros da suprema corte de corrente superexposição. O Direito Penal está no centro da atividade política, seja pela judicialização da política, seja por uma utilização midiática de que o Direito Penal seria a solução para todos os males. Processos vendem notícia em jornal. Há uma utilização da imagem dos ministros pela mídia valorizando o espaço publicitário das notícias.

Portanto, cabe manifestar que o julgamento presencial, com direito a sustentação oral, mas sem a permissão de desvios da atividade da advocacia no exercício do múnus público da defesa, é garantido pela Constituição e deve ser garantido pelo Supremo Tribunal Federal. Isso se torna mais relevante quando o mais novo ministro da Suprema Corte, Cristiano Zanin, advém da advocacia e lá ingressou por sua trajetória na defesa. E, como tenho repetido, os grandes ministros sempre ocuparam as tribunas de defesa, porque são ao fim oriundos da nobre classe da advocacia.

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[1] PIÑERO FILHO, José Muiños. A inconstitucionalidade dos julgamentos eletrônicos e/ou virtuais de apelações criminais por afronta ao princípio da publicidade. In: O novo processo civil brasileiro. Temas relevantes – estudos em homenagem ao professor, jurista e ministro Luiz Fux, vol. 3. ALVIM, Teresa Arruda (et al). São Paulo: Editora G|Z, 2020, p. 155.

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31
Mar23

Manifestação por golpe militar é crime, mesmo desarmada

Talis Andrade

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Por Fernando Augusto Fernandes

 

A democracia fez o novo presidente da República eleito, Lula, por mais de 60 milhões de votos, derrotando Bolsonaro, que obteve pouco mais de 58 milhões de votos. Mas, terminada a eleição, se viu grupos nas ruas pedindo golpe militar.

Tratei, no artigo "Homicídio terrorista: assassinato por ódio de um integrante do PT", da necessidade de aperfeiçoamento da legislação de defesa do Estado democrático de Direito, para inclusão das motivações políticas. Continuo a defender a necessidade de modificação da lei.

Bolsonaro, no seu discurso irônico e perdedor, mantém esse movimento golpista ao assim se manifestar: "Os atuais movimentos populares são fruto de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral. As manifestações pacíficas sempre serão bem-vindas, mas os nossos métodos não podem ser os da esquerda, que sempre prejudicaram a população, como invasão de propriedades, destruição de patrimônio e cerceamento do direito de ir e vir…."

A Lei nº 14.197/21, inclusive aprovada por Bolsonaro, traz definição de crimes contra "o Estado democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais, com emprego de violência ou grave ameaça" — é o que cita o Artigo 359-L, com pena de reclusão de quatro a oito anos, além da pena correspondente à violência. E o Artigo 359-M — tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído — prevê pena de reclusão, de quatro a 12 anos, além da pena correspondente à violência [1].

Atos que não usam a violência, mas ameaçam a democracia com pedidos de uso de violência pelas Forças Armadas, também são crime.

Há previsão legal do crime de "incitação ao crime" do D.L. nº 2.848, e o parágrafo único dos Artigos 286 e 287, que prevê a criação de "animosidade entre as Forças Armadas contra os poderes constitucionais, as instituições civis ou a sociedade", é bem claro e objetivo (2).

Essas "manifestações" se iniciaram bloqueando estradas em todo o país. As manifestações ofenderam o direito de ir de vir constitucionalmente, conforme o inciso XV do Artigo 5 — é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens [3].

Elas se desdobraram, após omissão e participação de agentes do Estado, em frente a quartéis do Exército. Apesar da garantia constitucional de livre reunião do Artigo 5 no termo XVI [4]. Também podemos incluir as práticas do Decreto Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, os Artigos 319 e 320. [5].

De toda forma, o Judiciário precisa ser instado a proibir tais manifestações, que desvirtuam a ordem constitucional. Evidente que elas não estão isentas de proibição, conforme cita o Artigo 5 nos termos constitucionais, XVIII, XIX e XXXV [6].

Para advogados que eventualmente postam, participam ou incentivam, tais atos devem ser punidos. É dever, pelo artigo 2º do Código de Ética: "V – contribuir para o aprimoramento das instituições, do Direito e das leis". O artigo 34 veda advogar contra literal disposição de lei (VI - advogar contra literal disposição de lei, presumindo-se a boa-fé quando fundamentado na inconstitucionalidade, na injustiça da lei ou em pronunciamento judicial anterior) [7].

Aqueles advogados que se referem à decisão do STF no caso Lula — que anulou seus processos — com deselegância e desrespeito, postando, falando em público descumprem o dever de zelar pela justiça (XIII - fazer publicar na imprensa, desnecessária e habitualmente, alegações forenses ou relativas a causas pendentes). Acima de tudo, advogado que incentiva, participa ou divulga atos antidemocráticos mantém atividade incompatível com a advocacia (XXV - manter conduta incompatível com a advocacia).

O incentivo de golpe militar é crime, mesmo sendo desarmado! A tentativa é crime contra o estado democrático. A omissão de atitudes ou a participação prevaricação. Aos advogados, infração ética.

Todos que desrespeitam a constituição devem ser punidos. Se agentes públicos, demitidos ou exonerados. Os demais, impedidos de participar de concurso público. Os advogados, suspensos por processo ético na OAB. Não é possível deixar de aplicar as punições com as leis vigentes

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[1] https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-14.197-de-1-de-setembro-de-2021-342334198

[2] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm

Incitação ao crime

Art. 286 - Incitar, publicamente, a prática de crime: Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem incita, publicamente, animosidade entre as Forças Armadas, ou delas contra os poderes constitucionais, as instituições civis ou a sociedade. Incluído pela Lei nº 14.197, de 2021) (Vigência);

Apologia de crime ou criminoso

Art. 287 - Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime: Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.

[3] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens;

[4] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;

[5] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: (Vide ADPF 881) Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.). Além indulgência criminosa em relação àquele superior hierárquico que não tomar providências quanto aos que praticarem crimes (Condescendência criminosa).

Art. 320 - Deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou, quando lhe falte competência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente: Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.)

[6] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento;

XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado;

XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

[7] https://www.oab.org.br/content/pdf/legislacaooab/codigodeetica.pdf

31
Mar23

Advogado lança site que reúne áudios de sessões secretas do STM na ditadura

Talis Andrade

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Por Sérgio Rodas /ConJur

O advogado Fernando Augusto Fernandes lança, nesta sexta-feira (31/3), aniversário de 59 anos do golpe militar, o portal Voz Humana — os arquivos sonoros de presos políticos. O site disponibiliza mais de 10 mil horas de gravações de julgamentos secretos de presos políticos ocorridos entre 1975 e 1979 no Superior Tribunal Militar.

O objetivo é ajudar os brasileiros a ter um conhecimento mais aprofundado da história do país, disse Fernandes à ConJur. O portal busca facilitar o trabalho de pesquisadores, ao disponibilizar as gravações e arquivos das ações contra presos políticos. E tem um blog com reportagens sobre os processos no STM, voltado a jornalistas e o público em geral.

"É preciso olhar para o passado, para os erros cometidos no passado, para o presente recente e os riscos à democracia, como o ataque de 8 de janeiro, e para o futuro. Temos que pensar na necessidade de manutenção da democracia, de não ampliarmos a competência da Justiça Militar, restringindo-a a crimes exclusivamente entre militares e contra militares, e na modificação das estruturas do Judiciário e do Ministério Público, para que não tenhamos desvios de jurisdição, como ocorreram na "lava jato'", afirma o advogado.

As gravações de julgamentos do STM revelam que os ministros tinham conhecimento das torturas, que eram denunciadas pelos advogados, aponta Fernandes. Mas os magistrados faziam vista grossa para as sevícias, exceto o general Rodrigo Octávio, que tentava tomar providências, diz.

"A tortura sempre existiu no Brasil. Mas a ditadura militar de 1964 institucionalizou a tortura como método de investigação", destaca o advogado.

Na visão dele, a ditadura deixou um legado negativo que engloba execuções nas periferias das cidades, a "lava jato" e o bolsonarismo.

"A operação 'lava jato', com a questão do lawfare, não é nada menos do que a guerra híbrida decorrente da doutrina de segurança nacional, que inverteu a máxima de Clausewitz, tornando a política a guerra por outros meios. A perseguição ao inimigo interno, que deixou de ser mero opositor, é uma decorrência da doutrina. E a 'lava jato' é o desvio da judicialização, tornando o Judiciário parte da guerra política."

De acordo com Fernando Fernandes, o fato de o Brasil não ter julgado e punido militares da ditadura, como fizeram países como Argentina, Uruguai e Chile, contribui para a visão positiva que uma parcela dos brasileiros tem sobre o período. Afinal, muitos desconhecem as torturas e desaparecimentos de presos políticos.

Outra parcela da sociedade, no entanto, é abertamente favorável a um regime que persegue e mata opositores, avalia o advogado. "Quando o ex-presidente Jair Bolsonaro fez uma homenagem ao coronel Carlos Brilhante Ustra, um torturador, qual foi o seu objetivo a não ser o de manifestar uma deliberada opção de apoiar atos desumanos, a tortura e, nos tempos modernos, a eliminação de pessoas pelos assassinatos nas periferias das cidades?"

O portal Voz Humana — os arquivos sonoros de presos políticos será lançado nesta sexta-feira (31/3), às 18h, na sede da seccional do Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil.

Descoberta dos arquivos

Em 1997, Fernandes pesquisava a atuação de advogados em defesa de presos políticos durante a ditadura. Ao conversar com o advogado Lino Machado Filho, ele percebeu que havia fitas de gravações dos julgamentos no STM, que nunca tinham sido descobertas. Fernandes e Machado obtiveram autorização para acessar as fitas. Eles conseguiram copiar algumas sustentações orais de advogados como Sobral Pinto, Antônio Modesto da Silveira e do próprio Lino Machado Filho.

Porém, era evidente que o material iria ser colocado em sigilo, disse Fernandes à ConJur. Dito e feito: bastou a pesquisa chegar a uma sessão secreta em que se debatia caso envolvendo o guerrilheiro Carlos Lamarca para que proibissem o acesso ao arquivo.

Fernandes recorreu ao Supremo Tribunal Federal, e a 2ª Turma da corte, em 2006, liberou o acesso ao material por entender que a Constituição Federal só permite a restrição da publicidade dos atos processuais quando houver a necessidade de defesa da intimidade da pessoa ou no interesse da sociedade e do Estado, o que não seria o caso.

O problema, segundo o advogado, é que o STM só atendeu parcialmente a decisão, apenas disponibilizando áudios sobre sessões públicas. Com isso, ele apresentou reclamação ao Supremo. Em 2017, o Plenário do STF decidiu que o STM havia descumprido ordem da corte ao limitar o acesso às gravações. Dessa maneira, o foi obrigado a fornecer inclusive as falas de ministros e sustentações orais durante sessões secretas.

Com a decisão do STF, o ministro do STM José Coêlho Ferreira entregou a Fernandes um disco rígido externo contendo dez mil horas de gravações dos julgamentos.

Mesmo depois disso, Fernandes localizou diversos casos julgados pelo STM durante a ditadura, dos quais ele encontrou acórdãos e outros documentos, cujos áudios não foram a ele disponibilizados. Por isso, ele pediu ao STF, em janeiro, que o STM forneça acesso a todas as suas gravações de julgamentos desde a década de 1970.

25
Mar23

O bom combate: recordando os advogados que resistiram à ditadura militar

Talis Andrade

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Por Danilo Pereira Lima /ConJur

 

No próximo dia 31 de março, o golpe de 1964 completa 59 anos. É sempre importante recordar que não faltaram juristas que colaboraram com a ditadura militar. Doutrinadores, juízes, OAB etc., exerceram papeis destacados na configuração da legalidade autoritária utilizada na institucionalização da ditadura. Contudo, na outra margem do rio, também é importante recordar que um pequeno número de advogados combateu o bom combate em defesa da vida e da liberdade dos presos políticos. Nas palavras de D. Paulo Evaristo Arns, "um grupo de profissionais do Direito que, naquela época de muitos temores, arriscaram suas próprias vidas e carreiras profissionais para se dedicarem a defender, na grande maioria dos casos gratuitamente, as vítimas da violência política" [1].

Com uma pequena margem de manobra e fazendo uso da interpretação mais liberal possível do aparato jurídico utilizado pela repressão [2], os advogados dos presos políticos conseguiram estabelecer uma forma de resistência.

Desde o golpe, os militares e seus juristas começaram a traçar uma engenharia constitucional que, além de favorecer a repressão, também procurava oferecer ao regime um verniz de Estado de Direito para angariar legitimidade perante a opinião pública, seja internamente ou internacional. Era importante mostrar para as nações ocidentais que o Brasil permitia a existência de dois partidos (governo e oposição); que os Poderes funcionavam normalmente; que os presidentes militares não agiam como os caudilhos existentes na América Latina; que os presos políticos eram devidamente processados na Justiça Militar; e que seus recursos inclusive poderiam chegar até o órgão de cúpula do Poder Judiciário, o Supremo Tribunal Federal.

Isso não quer dizer que a ditadura brasileira deixou de usar a estratégia da guerra suja contra seus opositores. O sequestro, a tortura, o encarceramento, a utilização de sítios clandestinos, o assassinato e o desaparecimento também fizeram parte das engrenagens de seus órgãos de repressão. Em vários casos o regime sequer demonstrou alguma preocupação em formalizar a prisão e abrir um processo na Justiça Militar. Foi o que aconteceu com o comunista David Capistrano da Costa, que, ao tentar retornar para o Brasil em 1974, acabou assassinado num dos principais centros clandestinos de tortura do regime, a conhecida casa da morte de Petrópolis. Ainda segundo relato prestado por um ex-integrante do DOI-Codi, o agente Marival Dias Chaves do Canto, o corpo de Capistrano foi esquartejado e jogado num rio [3].

As prisões muitas vezes aconteciam sem qualquer tipo de controle judicial. Os órgãos de repressão não precisavam pedir autorização ao Judiciário para realizar uma busca e apreensão ou para efetuar uma prisão, pois no momento em que entrava o trabalho da informação e da contrainformação nada podia ser formalizado através de um inquérito. Como muitas vezes a prisão funcionava como um sequestro, os advogados não recebiam qualquer informação sobre a situação de seus clientes. O encontro entre o preso político e seu defensor ocorria somente quando aquele era remetido à Secretaria de Segurança Pública.

De 1964 até o final do ano de 1968 ainda existia uma chance considerável dos presos políticos serem libertados por meio do habeas corpus. Após a suspensão desse remédio constitucional para crimes enquadrados na lei de segurança nacional, os advogados tiveram que buscar outros meios não apenas para defender a liberdade dos presos políticos, como também para levantar informações sobre suas localizações, já que a suspensão do habeas corpus possibilitou a ampliação do número de encarcerados e criou enormes dificuldades para que os advogados localizassem seus clientes.

Foi a partir daí que os advogados passaram a apresentar petições à Justiça Militar que tinham o formato de habeas corpus, mas não podiam ser chamadas de habeas corpus. Eram os chamados habeas corpus de localização [4]. Se a petição não era suficiente para alcançar a liberdade do preso político, pelo menos ela servia para retirá-lo das sombras e forçar um registro formal da sua situação. De acordo com o advogado Mario de Passos Simas, "nós (os advogados) nos valíamos de tudo, de mil requerimentos, de centenas de petições e reclamávamos perícias, invocávamos autoridades estrangeiras, entidades internacionais como a Anistia Internacional. Tudo que era válido era exercido" [5].

Como bem observou D. Paulo Evaristo Arns, "[...] um dos maiores esteios dos presos e de suas famílias eram seus advogados" [6]. Reunindo pessoas de diversas tendências ideológicas, como liberais, conservadores e socialistas, esses advogados estabeleceram uma convergência política e jurídica fundamental para uma resistência não apenas dentro Justiça Militar, mas também por meio do debate feito pela imprensa; das denúncias de tortura feitas em organismos internacionais; da defesa da anistia; e da construção de pontes para a redemocratização. Os advogados da resistência não chegaram a formar uma organização para a defesa dos presos políticos, mas, sem dúvida alguma, ajudaram a movimentar a resistência civil contra a ditadura.

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[1] ARNS, Paulo Evaristo. Prefácio. In: SÁ, Fernando; MUNTEAL, Oswaldo; MARTINS, Paulo Emílio. Os advogados e a ditadura de 1964: a defesa dos perseguidos políticos no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Vozes e PUC Rio, 2010, p. 8.

[2] Foi nessa conjuntura autoritária que o uso alternativo do direito surgiu como um meio de resistência dos juristas contra a ditadura. De acordo com Lenio Streck, "o movimento do direito alternativo se colocava, então, como uma alternativa contra o status quo. Era a sociedade contra o Estado. Por isso, em termos teóricos, era uma mistura de marxistas, positivistas fáticos, jusnaturalistas de combate, todos comungando de uma luta em comum: mesmo que o direito fosse autoritário, ainda assim se lutava contra a ditadura buscando 'brechas da lei', buscando atuar naquilo que se chamam de 'lacunas' para conquistar uma espécie de 'legitimidade fática'". Para mais detalhes, ver sua entrevista concedida para o Instituto Humanitas Unisinos: Uma análise sociológica do direito. Disponível em: http://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2758&secao=305. Acessado em: 24/03/2023.

[3] Sobre o brutal assassinato de David Capistrano, ver: Comissão da Verdade do estado de São Paulo. Disponível em: http://comissaodaverdade.al.sp.gov.br/mortos-desaparecidos/david-capistrano-da-costa. Acessado em: 24/3/2023.

[4] FERNANDES, Fernando Augusto Henriques. Voz humana: a defesa perante os tribunais da República. Rio de Janeiro: Revan, 2004, p. 224. De acordo com Nilo Batista, "O habeas corpus, depois do AI-5, se converteu num macabro teste de sobrevivência dos presos. Você requeria um habeas corpus e indicava como autoridades coatoras o Cenimar, o CISA, o DOI-Codi e o Dops. Quando algum deles dizia que o paciente estava preso, significava que estava vivo. Quando a resposta vinha negativa, como no caso do Stuart (Angel Jones), era um mau presságio porque a pessoa tinha sido morta, tinha sido executada, morrido na tortura". SPIELER, Paula. Entrevista com Nilo Batista. In: SPIELER, Paula; QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo (coord.). Advocacia em tempos difíceis: ditadura militar 1964-1985. Curitiba: Edição do autor, 2013, p. 653. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/13745/Advocacia%20em%20tempos%20dif%C3%ADceis.pdf?sequence=1. Acessado em: 24/3/2023.

[5] MOURA, Ana Maria Straube de Assis; GONZAGA, Tahirá Endo. Mario de Passos Simas: mais que um advogado, um patrono. In: SÁ, Fernando; MUNTEAL, Oswaldo; MARTINS, Paulo Emílio. Os advogados e a ditadura de 1964: a defesa dos perseguidos políticos no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Vozes e PUC Rio, 2010, p. 80.

[6] ARNS, Paulo Evaristo. Prefácio. In: SÁ, Fernando; MUNTEAL, Oswaldo; MARTINS, Paulo Emílio. Os advogados e a ditadura de 1964: a defesa dos perseguidos políticos no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Vozes e PUC Rio, 2010, p. 8.

04
Nov22

Manifestação por golpe militar é crime, mesmo desarmada

Talis Andrade

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A tentativa é crime contra o estado democrático

 

por Fernando Augusto Fernandes

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A democracia fez o novo presidente da República eleito, Lula, por mais de 60 milhões de votos, derrotando Bolsonaro, que obteve pouco mais de 58 milhões de votos. Mas, terminada a eleição, se viu grupos nas ruas pedindo golpe militar.

Tratei, no artigo "Homicídio terrorista: assassinato por ódio de um integrante do PT", da necessidade de aperfeiçoamento da legislação de defesa do Estado democrático de Direito, para inclusão das motivações políticas. Continuo a defender a necessidade de modificação da lei.
 

Bolsonaro, no seu discurso irônico e perdedor, mantém esse movimento golpista ao assim se manifestar: "Os atuais movimentos populares são fruto de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral. As manifestações pacíficas sempre serão bem-vindas, mas os nossos métodos não podem ser os da esquerda, que sempre prejudicaram a população, como invasão de propriedades, destruição de patrimônio e cerceamento do direito de ir e vir…."

A Lei nº 14.197/21, inclusive aprovada por Bolsonaro, traz definição de crimes contra "o Estado democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais, com emprego de violência ou grave ameaça" — é o que cita o Artigo 359-L, com pena de reclusão de quatro a oito anos, além da pena correspondente à violência. E o Artigo 359-M — tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído — prevê pena de reclusão, de quatro a 12 anos, além da pena correspondente à violência [1].

Atos que não usam a violência, mas ameaçam a democracia com pedidos de uso de violência pelas Forças Armadas, também são crime.

Há previsão legal do crime de "incitação ao crime" do D.L. nº 2.848, e o parágrafo único dos Artigos 286 e 287, que prevê a criação de "animosidade entre as Forças Armadas contra os poderes constitucionais, as instituições civis ou a sociedade", é bem claro e objetivo (2).

Essas "manifestações" se iniciaram bloqueando estradas em todo o país. As manifestações ofenderam o direito de ir de vir constitucionalmente, conforme o inciso XV do Artigo 5 — é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens [3].

Elas se desdobraram, após omissão e participação de agentes do Estado, em frente a quartéis do Exército. Apesar da garantia constitucional de livre reunião do Artigo 5 no termo XVI [4]. Também podemos incluir as práticas do Decreto Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, os Artigos 319 e 320. [5].

De toda forma, o Judiciário precisa ser instado a proibir tais manifestações, que desvirtuam a ordem constitucional. Evidente que elas não estão isentas de proibição, conforme cita o Artigo 5 nos termos constitucionais, XVIII, XIX e XXXV [6].

Para advogados que eventualmente postam, participam ou incentivam, tais atos devem ser punidos. É dever, pelo artigo 2º do Código de Ética: "V – contribuir para o aprimoramento das instituições, do Direito e das leis". O artigo 34 veda advogar contra literal disposição de lei (VI - advogar contra literal disposição de lei, presumindo-se a boa-fé quando fundamentado na inconstitucionalidade, na injustiça da lei ou em pronunciamento judicial anterior) [7].

Aqueles advogados que se referem à decisão do STF no caso Lula — que anulou seus processos — com deselegância e desrespeito, postando, falando em público descumprem o dever de zelar pela justiça (XIII - fazer publicar na imprensa, desnecessária e habitualmente, alegações forenses ou relativas a causas pendentes). Acima de tudo, advogado que incentiva, participa ou divulga atos antidemocráticos mantém atividade incompatível com a advocacia (XXV - manter conduta incompatível com a advocacia).

O incentivo de golpe militar é crime, mesmo sendo desarmado! A tentativa é crime contra o estado democrático. A omissão de atitudes ou a participação prevaricação. Aos advogados, infração ética.

Todos que desrespeitam a constituição devem ser punidos. Se agentes públicos, demitidos ou exonerados. Os demais, impedidos de participar de concurso público. Os advogados, suspensos por processo ético na OAB. Não é possível deixar de aplicar as punições com as leis vigentes

_____________________________________

[1] https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-14.197-de-1-de-setembro-de-2021-342334198

[2] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm

Incitação ao crime
Art. 286 - Incitar, publicamente, a prática de crime: Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem incita, publicamente, animosidade entre as Forças Armadas, ou delas contra os poderes constitucionais, as instituições civis ou a sociedade. Incluído pela Lei nº 14.197, de 2021) (Vigência);
Apologia de crime ou criminoso
Art. 287 - Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime: Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.

[3] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens;

[4] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;

[5] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm

Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal: (Vide ADPF 881) Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.). Além indulgência criminosa em relação àquele superior hierárquico que não tomar providências quanto aos que praticarem crimes (Condescendência criminosa).

Art. 320 - Deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou, quando lhe falte competência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente: Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.)

[6] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento;

XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado;

XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

[7] https://www.oab.org.br/content/pdf/legislacaooab/codigodeetica.pdf

 

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Golpe 1964

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06
Jul22

Gravações relatam tortura à mulheres grávidas na ditadura; veja transcrição e áudio

Talis Andrade

Miriam Leitão relata torturas sofridas durante a ditadura militar | Rio de  Janeiro | G1APÓS AMEAÇA DE ESTUPRO, FUI COLOCADA NUA, NUMA CELA ESCURA QUE TINHA UMA  COBRA JIBOIA", RELATA MIRIAM LEITÃO -

Ficha Miriam Leitão 

 

Tortura à mulheres grávidas na ditadura 

 

A jornalista Miriam Leitão publicou em seu blog em O Globo uma série de relatos em que juízes e advogados falam abertamente sobre torturas cometidas pela ditadura militar brasileira (1964-1985), inclusive cometidas contra mulheres grávidas.

Durante 10 anos as sessões do Superior Tribunal Militar (STM) foram gravadas, inclusive as secretas, as quais o historiador titular de História do Brasil da UFRJ, Carlos Fico, teve acesso.

São 10 mil horas de gravações.

“O Superior Tribunal Militar passou a gravar as sessões a partir de 1975, mesmo as secretas. Até 1985 são 10 mil horas. Em 2006, o advogado Fernando Augusto Fernandes pediu acesso. Não conseguiu. Foi ao Supremo, que mandou liberar. O STM não obedeceu. Em 2011, a ministra Cármen Lúcia determinou o acesso irrestrito aos autos. O plenário acompanhou a ministra. Em 2015, as centenas de fitas de rolo foram digitalizadas. Fernandes analisou apenas 54 sessões. Em 2017 consegui copiar a totalidade das sessões. Aprimorei o áudio e passei a ouvir”, explica o professor.

O general Rodrigo Octávio continua, no mesmo dia, a falar de torturas em grávidas.

“Lícia Lúcia Duarte da Silveira desejava acrescentar que quando esteve presa na Oban foi torturada, apesar de grávida, física e psicologicamente, tendo que presenciar as torturas infligidas a seu marido”.

Ouça aqui trechos das sessões que ocorreram entre 1975 e 1985.

Leia abaixo as transcrições publicadas por Miriam Leitão:

 

TranscriçõesÁudios de relatos de tortura na ditadura militar - YouTube

1) Voz do general Rodrigo Octávio, em 24/6/77. Apelação 41.048 (tempo do áudio: 3:48)

Tenham pacientes, isto me deu muito trabalho. Fato mais grave talvez suscita exame da presente apelação, quando alguns réus trazem aos autos acusações referentes à tortura e sevícias das mais requintadas, inclusive provocando que uma das acusadas, Nádia Lúcia do Nascimento, abortasse após sofrer castigos físicos no Codi-Doi. Em síntese, os relatos são esses: José Roberto Monteiro, folha 419, que tem uma única declaração a fazer, com pesar, no sentido de deixar claro perante esse conselho que aqui negou muitas das suas afirmativas feitas durante a fase iniciária porque naquela ocasião fora torturado, o mesmo ocorrendo com a sua mulher, o qual inclusive sofreu um aborto no próprio Codi-Doi em virtude de choques elétricos em seu aparelho genital, fato ocorrido no dia 8 de abril de 1974.

De Nádia Lúcia do Nascimento, verso, folha 445: na verdade não participou de qualquer ação delituosa, nem mesmo estava ligada ao MR8, e que se por acaso for considerada responsável por aquilo que disse, pede que seja tomada em consideração o fato, como salientou, não aguentava mais a pressão à qual fora submetida e até mesmo coação. Deseja ainda esclarecer suas atitudes, pois estava grávida de três meses ao ser presa, tinha receio de perder o filho, o que veio a acontecer no dia 7 de abril nas dependências da Oban. Licia Lucia Duarte da Silveira folhas 442 verso que desejava ainda acrescentar que quando esteve presa na Oban foi torturada apesar de grávida, física e psicologicamente, tendo inclusive que presenciar as torturas inflingidas a seu marido, razão porque se viu obrigada a assinar todo o interrogatório, sem reagir. Norma Sá Pereira, diz que foi seviciada no Doi durante um mês, tendo recebido ameaça de morte por parte de policiais. Flora Neide Pavanelli, testemunha, que sofreu maus-tratos físicos, testemunha, hein, tomando choques e ouvindo palavrões que ocorrem no Doi, que Nádia Lucia do Nascimento também recebeu maus-tratos quando esteve presa, que foi constatada pela depoente porque ambas estavam presas na mesma cela e que, segundo a depoente, na ocasião Nádia estava grávida.

Segundo a depoente, Nádia terminou perdendo o filho, abortando. Na defesa das salvaguardas dos direitos e garantias individuais, expresso no artigo 153, parágrafo 14 da emenda constitucional 69, como consequência não só de nossa evolução política, lastreada em secular vocação democrática e formação humanística, espírito cristão, com o compromisso assumido na Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovado pela Assembleia das Nações Unidas, tais acusações, a meu ver, devem ser devidamente apuradas através de competente inquérito, determinado com base no inciso 21 do artigo 40, da lei judiciária militar, Decreto Lei 1003 de 69.

É preciso que se evidencia de maneira clara e insofismável que o governo, as Forças Armadas e os órgãos de segurança não podem responder pelo abuso e a ignorância e a maldade de irresponsáveis que usam torturas e sevícias para obtenção de pretensas provas comprometedoras na fase investigatória, pensando, em sua limitação cerebral, que estão bem servindo a estrutura política e jurídica, quando na realidade concorrem apenas na prática desumana, ilegal em denegrir a revolução retratando a sua configuração jurídica do Estado de Direito e abalando a confiança nacional pelo crime de terror e insegurança criados na consecução dos objetivos revolucionários.

 

2) Voz do advogado Sobral Pinto, em 20/6/1977. Apelação 41.301 feita por Marco Antonio Tavares Coelho, que havia sido condenado a cinco anos

Os senhores ministros não acreditam na tortura. É pena que não possam acompanhar os processos como um advogado da minha categoria acompanha para ver como essa tortura se realiza permanentemente. E nesse processo senhores juízes há prova documental da tortura que sofreu Marco Antonio. Há um laudo firmado por médicos militares atestando essa tortura. O ilustre eminente advogado de Marco Antonio, doutor Mario Simas vai mostrar aos senhores ministros esse documento.

 

3) Voz do general Augusto Fragoso, em 9/6/1978. Apelação 41.593  (Tempo de áudio: 1:53)

Eu queria fazer uma ponderação, uma referência, que já tinha escrito aqui no início da sessão quando estava ausente o ministro Reinaldo e os primeiros advogados começaram a falar no Doi- Codi, Doi-Codi, Doi-Codi. De maneira que, eu como único representante do Exército na hora aqui presente, eu experimentei um grande constrangimento em ver essas organizações do Exército tão acusadas, e como mostrou o relator, elas não foram apuradas devidamente. De maneira que como foi um pronunciamento público, não vou ler agora pelo adiantar da hora, mas vou inserir na ata publicamente esta ponderação sobre as acusações ao Doi-Codi que vêm se repetindo.  E eu, nesses 50 e tantos anos de serviço, vivendo crises militares de 30, 32 e 35, nunca vi, nunca ouvi, acusações desse jaez feitas a órgãos do Exército. Acho que nosso Exército, seguindo exemplo das forças irmãs, devia rapidamente ser recolher aos afazeres profissionais, como então recomendou no discurso de 31 de março o presidente da República. Não posso deixar assim passar em brancas nuvens essas acusações que foram feitas na tribuna contra esses órgãos do Exército. E sabemos que muitas delas são destituídas completamente de fundamento, mas algumas delas têm aparência de veracidade. Pelo menos aparência de veracidade. Vou fazer constar na ata relativamente a esse processo essa declaração. Depois o farei por escrito.

 

4) Voz do ministro togado Waldemar Torres da Costa, em 13/10/1976. Apelação 41.229. (Tempo de áudio: 3:50)

Eu não ponho em dúvidas, senhores ministros, e aqui eu começo a pedir a atenção dos meus eminentes pares para as apurações que estão realizadas por oficiais das Forças Armadas. Quando as torturas são alegadas e as vezes impossíveis de ser provadas, mas atribuídas a autoridades policiais, eu confesso que começo a acreditar nessas torturas porque já há precedente.  Mas eu fico nessa preocupação de atribuir o que constituiria uma desmoralização a prática de tortura por oficiais do Exército que estão apurando crimes contra a segurança nacional. Eu não me recuso a me convencer dessas torturas, mas exijo que essa torturas tragam uma prova e não fiquem apenas no terreno da alegação. Reconheço, senhores ministros, que também é difícil o indivíduo provar as torturas pela maneira como é feita. Ele próprio não conhece, não tem elementos para a individualizar e ele sofre, presume-se que sofre, as torturas.

Mas como juiz a proferir um voto no tribunal e com responsabilidade de afirmar através de um acórdão que houve torturas, criando-se a obrigação de propor aos meus pares apurar essas violências. Porque como juiz eu não posso reconhecer torturas individualizadas e comprovadas sem que consequentemente eu determine, eu vote, no sentido de ser apurado, porque isso é crime também. Então, nesse inquérito que ensejam que eu examine em primeira mão a acusação do Dalton Godinho, cuja as declarações são longas, me parece que com 14 folhas relatando com pormenores. E é por causa desses pormenores essas particulares é que me custa a acreditar que tenha sido um trabalho, uma farsa, da autoridade investigante. Porque dentro da lógica, todos nós lemos uma determinada confissão no inquérito, e encontramos dentro da lógica a aceitação ou não de tais declarações.

 

5) Voz do Almirante Julio de Sá Bierrenbach, em 19/10/1976. Apelação 41.264. (Tempo do áudio 4:34)

Como ministro do STM, entretanto, nessa elevada instância, onde não temos contato com os indiciados, antes de julgar os homens, devemos julgar os papéis, isto é, a procedência dos autos do processo. E é esta é a nossa maior dificuldade. Muito se tem falado em direitos humanos. Com profunda tristeza tenho tomado conhecimento da repercussão no exterior de fatos que se passam no Brasil. Fatos esses que também ocorrem em todos os demais países civilizados do mundo. Quando aqui vem à baila um caso de sevícias, esse se constitui um verdadeiro prato para os inimigos do regime e para a oposição ao governo. Imediatamente as agências telegráficas e os correspondentes os jornais estrangeiros, com a liberdade que aqui lhes é assegurada, disseminam a notícia e a imprensa internacional em poucas horas publicam os atos de crueldade e desumanidade que se passam no Brasil, generalizando e dando a entender que constituímos uma nação de selvagens. Evidentemente essa não é a realidade, o brasileiro de um modo geral não admite a violência. Por isso mesmo há tremenda exploração quando surge um desses lamentáveis casos. É possível que isso venha a ocorrer em torno da presente apelação em que sou revisor. Paciência. É o preço que pagaremos no esforço de por cobro aquilo que todos nós repudiamos. Devo lembrar, entretanto, para livrar qualquer mal-entendido que continuo intransigente no combate à subversão e a corrupção. Rendo minhas homenagens a todos os que participaram da Operação Bandeirantes em São Paulo ao fim da década de 60. Naquela oportunidade, tombaram em ação membros das Forças Armadas, da Polícia Civil e da Polícia Militar, mas a guerrilha urbana foi extinta. Morreram também subversivos, defendendo seus pontos de vista, mas também tombaram em ação. O que não podemos admitir é que o homem, depois de preso, tenha a sua integridade física atingida por indivíduos covardes, na maioria das vezes, de pior caráter que o encarcerado. Senhores ministros, já é tempo de acabarmos de uma vez por todas com os métodos adotados por certos setores policiais de fabricarem indiciados, extraindo-lhes depoimentos perversamente pelos meios mais torpes, fazendo com que eles declarem delitos que nunca cometeram, obrigando-os a assinar declarações que nunca prestaram e tudo isso é realizado por policiais sádicos, a fim de manterem elevadas as suas estatísticas de eficiência no esclarecimento de crimes. Longe de contribuírem para a elucidação dos delitos invalidam processos, trazendo para os tribunais a incerteza sobre o crime e a certeza sobre a violência. A ação nefasta de uns tantos policiais estende a toda a classe, sem dúvida, na grande maioria, honesta, útil e laboriosa, um manto de suspeita no modo de proceder. Essa ação sinistra de poucos é que extravasa além das nossas fronteiras repercutindo no exterior, como se todos nós fôssemos uns infratores dos direitos humanos, sei o que pensa o nosso preclaro presidente da República sobre o assunto. Tenho contatos com os oficiais generais das três forças Armadas que em sua totalidade deploram tais fatos. Diariamente vejo o cuidado com que vossas excelências examinam os processos em julgamento. É quase sistemática a pergunta: essas declarações foram prestadas em juízo ou na polícia? Também já se tornou um hábito as defesas apelarem, generalizando, que as declarações prestadas na polícia foram feitas sob maus tratos, dando a entender que nos organismos policiais não se salva mais ninguém. Se o Executivo e o Legislativo não se conformam com essas ocorrências, é claro que o Judiciário não as admite e nós, autoridades da organização judiciária militar, temos o dever de propugnar pela extinção desses cancros, as sevícias.

 

6) Voz do brigadeiro Deoclécio Lima de Siqueira. Sessão de 19/10/1977. (Tempo do áudio: 1:03)

Senhor presidente, senhores ministros, nós estamos discutindo o voto da turma. E eu desejava dar a minha opinião sobre esse voto e uma dúvida que eu tenho. Me impressionou muito os fundamentos do voto do relator, sobretudo na parte em que ele se refere ao fato de que nós não podemos receber aqui indiscriminadamente toda e qualquer suspeita de sevícia, sob pena de nós podermos comprometer aqueles que, de boa fé, com idealismo e patriotismo, se contrapõem à subversão e com isso matarmos e até esmorecer o entusiasmo com que essas forças anti subversivas têm agido no Brasil, no anonimato, no sacrifício, nas perdas de vida e em outras contribuições extraordinárias que não se reconhecem em determinadas horas.

 

7) Voz do ministro togado Amarílio Lopes Salgado, em 15/6/1976, Apelação:41.027 (Tempo do áudio: 2:33)

(Assaltos a bancos também eram julgados pelo STM mesmo quando eram crimes comuns, não políticos.)

Senhor presidente, recapitulando rapidamente, Documento de Folha 192, é um ofício firmado pelo diretor do presídio, e de Folha 203 é assinado pelo diretor da divisão jurídica. Abri inquérito contra esses dois, acho uma barbaridade. Apenas no meu acórdão se vossas excelências tiverem de acordo e revisor também. É o seguinte é que ele alega que para fazer essa confissão na polícia – ele assaltou dois bancos – mas eu esse ele não podia porque estava preso. “Eu tô preso, estava preso na Ilha Grande”. Faz uma diligência e vem isso aí. Vou dar uma cópia para o procurador geral porque esse moço apanhou um bocado, baixou hospital, e citou o nome das duas pessoas que martelaram ele. Estou inteiramente com o ministro Rodrigo Octávio, às vezes discordo de sua excelência, quando é difícil apurar. Eles podem negar, mas que os nomes dos dois estão aí estão. É fulano e beltrano. Martelaram esse moço, daí a confissão dele. Em juízo, ele confessa que não podia “eu estava lá na Ilha Grande” no dia 26. No dia 30 eu fugi e assaltei o banco tal no dia 31 e no dia 4 assaltei outro banco, mas no dia 26 não. As declarações dele são longas, acho que no acórdão devia ser feito menção a isso.

 

8) Voz do Brigadeiro Faber Cintra, em 15/2/1978. Apelação: 41.648 (tempo do áudio: 5:47)

As lesões sofridas, caso acontecessem, seriam facilmente constatadas através do exame de corpo e delito ou mesmo laudo médico particular, posto que nenhum dos acusados foi mantido preso por prazo superior ao previsto em lei. As alegações dos acusados em juízo, no sentido de que sofreram coações morais e físicas, não podem ser consideradas, pois desprovidas de qualquer elemento probatório por mais simplório que fosse um laudo médico particular que à época constatasse qualquer lesão, mesmo superficial do acusado.

Reforça o nosso argumento o fato de que os acusados, na ânsia de elidir as confissões feitas, prestam depoimentos os mais dispares possíveis senão vejamos: Orlando Magalhães e Francisco Carcará afirmam que foram bem tratados na Vila Militar, local de suas prisões posteriores. Ana Maria Mandim afirma que sofreu coações na Vila Militar, ao tempo que acrescenta que pôde ver seu pai após dez dias de presa. Francisco Carcará que não pode fazer exame de corpo de delito, diz ele, porque esteve preso incomunicável. Esse acusado ficou preso 40 dias. Sergio (…) Simões prestou depoimento na Vila Militar, sofrera muitas sevícias e coações. Newton Medeiros que estava preso em local ignorado e posteriormente na Vila Militar prestou declarações que esteve preso em local ignorado. Antonio Alberto Souza ficou preso 55 dias. Não concide muito com as datas de prisão e soltura. Antonio Viana Sad que saiu da prisão vertendo sangue pelo nariz, problema que perdura até hoje. Há três ou quatro anos está botando sangue pelo nariz. Antonio Forges que esteve preso que esteve preso em 40 dias em local ignorado. Romeiro Passos que ficou oito dias sem comer na Vila Militar ratificou suas declarações. Antonio Botelho que prestou declarações sob coação e que seu advogado vai provar as suas afirmativas.

Isso tudo porque todos confessaram minuciosamente no inquérito e em juízo negaram tudo aquilo que disse (sic) e até negaram que se conheciam entre si. Inicialmente, manifesto a minha discordância com um dos argumentos contidos na sentença, que passo a transcrever, aspas, tais declarações na fase inquisitória foram prestados dos próprios acusados em seus interrogatórios em juízo sob violenta coação, após haverem permanecido preso cada qual cerca de 30 dias em unidades militares, locais que não puderem identificar pelo fato de terem sido aquinhoados entre aspas com um capuz na cabeça e assim levados para prestar depoimento. Entendo que opiniões dessa espécie inseridos na sentença aviltam de modo geral o interesse da justiça em termos de credibilidade da prova colhida no inquérito, ao tempo que ocasiona efeitos perniciosos na repressão policial exigida e efetuada tão somente no interesse do estado e da sociedade. Essa egrégia corte, recentemente, através de pronunciamento ministro Almirante Bierrenbach já expressou seu repúdio aos maus tratos ocasionados às pessoas que se encontram sob custódia de órgãos policiais, na oportunidade, entretanto as provas da coação física eram inequívocas.

Tais exemplos, mercê de sua autonomia e excepcionalidade, não podem ser erigidos em respaldo generalizado para que a autoridade judicante, sem o menor resquício de elemento probatório, confiando pura e simplesmente na palavra dos acusados, invista contra a dignidade das funções policiais, exercidas por oficial superior do nosso Exército, no caso o coronel Iris Lustosa, agravado pelo fato do uso de expressões pejorativas, como entre aspas aquinhoadas, inaceitáveis frente à seriedade como deve ser encarada a prestação jurisdicional. Compreende-se que por parte dos réus, na falta de outras alegações, seja usado esse meio indireto de defesa, cuja finalidade sabemos é elidir a prova consignada na fase inquisitorial, inquisitória, principalmente a autoria. No entanto, o agasalho indireto de tais afirmativas por parte de autoridades judicantes, tem servido de incentivo a que todos os indiciados em juízo, através de voz uníssona, deixam de se defender, oferecendo apenas alegações de maus tratos, como se tais afirmativas, sem qualquer elemento de convicção, se prestassem a anular autos de apreensão, laudos de avaliação, e todos os outros atos processuais que, na forma da lei, são efetuados obrigatoriamente na instrução provisória e algumas vezes com total independência em relação ao depoimento dos indiciados.

As acusações de sevícias praticadas por autoridades militares, desde que procedentes, devem ser apuradas. Simples alegações além de não merecerem qualquer crédito, visam denegrir a prova colhida e afrontar autoridade constituída, pois em última análise trata-se de palavra contra palavra e nesse aspecto endosso do digno procurador Oswaldo Lima Rodrigues que disse “sinto-me em melhor companhia confiando na palavra do encarregado do inquérito”.

 

9) Vozes do ministro general Rodrigo Octávio e do ministro general  Augusto Fragoso  no julgamento de Marcio Moreira Alves no STM na sessão 98ª Secreta, em 15/12/1976 (Tempo de áudio 11:14)

Ministro general Rodrigo Octávio

Acredito que devíamos ter feito juridicamente era ter feito de acordo com o artigo 5º da Lei de Segurança Nacional, feito um novo processo desse moço, tendo em vista as publicações que ele fez no estrangeiro. Um desserviço que ele está prestando à Pátria.

Agora condená-lo em bases jurídicas é completamente inexequível. Agora nós vamos tomar e eu vou tomar também uma decisão revolucionária. Porque em 1968, solicitei ao ministro do Exército de então que se tomasse uma providência drástica contra ele, inclusive a cassação. (…) De maneira, eu vou tomar uma decisão revolucionária que vou deixar de lado a lei, porque pela lei não se pode condená-lo de maneira nenhuma. Ele é inviolável. E só se pode condenar algum deputado, pela Constituição de 1967, se a Câmara tivesse dado licença. E ela não deu e desencadeou esse processo. Desde 1968, eu era comandante militar na Amazonas. De maneira que hoje estamos preservando o regime revolucionário, e a irreversibilidade dos objetivos revolucionários, não podemos deixar de maneira nenhuma deixar de fazer isso. Não estamos julgando aqui como verdadeiro Tribunal da Justiça, estamos julgando como tribunal de segurança. Essa é a realidade dos fatos.

Tudo que a procuradora disse é uma inverdade dentro dos fatos e realidades jurídicas apontada pelos mestres de Pontes de Miranda e outros e no interessante parecer do doutor Djalma Marinho, que explicita isso muito bem. Tanto que pediu imediatamente a demissão da Comissão de Constituição e Justiça, que foi toda substituída para poder conseguir a licença.

Agora a licença é um ato técnico, jurídico, da Comissão de Constituição e Justiça. Não tendo aprovado, eu, representando, o Amazonas e todos os meus comandados, passei um rádio para o ministro do exército pedindo uma providência enérgica dos fatos, que não era possível proceder dessa forma. Compete às Forças Armadas a preservação da política nacional, da organização nacional, da sobrevivência do país. Por isso proclamou o AI-5.

Agora querer julgar no Tribunal de Justiça baseado em lei e fatos, na minha opinião, é um completo absurdo. Vamos condená-lo nas mesmas penas. Mas ainda: proponho que se faça outro processo tendo em vista estes sucessivos livros que ele mandou publicar no estrangeiro.

Ministro general Augusto Fragoso

Também queria acrescentar um comentário, sobretudo depois das declarações do ministro Rodrigo Octavio. Os relatórios que se ouviram aqui foram minuciosos demais. E ficou uma certa difusão sobre o que estamos julgando. Estamos julgando, segundo os estudos feitos à margem desse processo, a incitação talvez contida em muitos pronunciamentos do acusado, visando despertar animosidade entre as Forças Armadas, como diz o 33 paragrafo 3º, mas no exercício do mandato de deputado.

Negada a licença para o processo, ele foi imediatamente cassado e saiu do Brasil. A denúncia diz respeito apenas aos pronunciamentos dele como deputado. E a constituição de 67, repetindo ipsis litteris o texto da constituição de 46, não deixava dúvidas: os deputados e senadores são invioláveis no exercício do mandato por suas opiniões, palavras e votos.

Ouviu-se aqui também certas invocações do processo do deputado Francisco Pinto. Mas é um processo completamente diferente. Porque a Emenda Constitucional 69 alterou esse dispositivo da Constituição de 67.  Manteve aquela redação e acrescentou “salvo nos casos de injúria, difamação ou calúnia ou previstos na Lei de Segurança”. Então, a primeira conclusão que se tira, nós estamos analisando a atitude  deste deputado nos pronunciamentos que ele fez no exercício do mandato. A Constituição não diz no recinto da Câmara e sim no exercício do mandato, ou seja, onde quer que seja. E figuras insuspeitas da revolução como Cordeiro de Farias e Daniel Krieger mostraram que havia nesta representação do ministro da Justiça injuridicidade. Isso é claro. Mas é como diz o eminente ministro Rodrigo Octávio, nós temos que encaminhar para um outro sentido. Mas daí eu discordo do eminente companheiro em considerar que o tribunal, nessa votação, iria funcionar como tribunal de segurança e não como Tribunal de Justiça.

Eu não acho. Se ele for condenado, estaremos agindo como um Tribunal de Justiça. Porque a questão é controversa. Basta ler a mensagem que o presidente Costa e Silva respondendo a carta do Daniel Krieger e que cita os argumentos dele, baseado no parecer do ministro de então, o veemente, o radical Gama e Silva. Não vou ler porque estamos cansados, mas para mostrar que podemos agir como um tribunal de Justiça, basta dizer o seguinte, houve controvérsia na questão. A própria Câmara dos Deputados através do parecer da Comissão de Justiça, toda ela reformulada, mas afinal de contas funcionou como comissão de justiça. A comissão de justiça diz que poderia ser processado pelos discursos que fez. E no plenário, embora a maioria de 216 votos negasse a licença, 141 congressistas, ou seja, 34% dos que votaram, acharam que ele podia ser processado. Eu não quero discutir o mérito desses homens. Então acho que pelo que ele fez, ele pode ser processado. E podendo ser processado pode ser condenado.

Tudo que ele fez, ele fez como deputado. Agora a lei não pode retroagir.  Que se processe, como lembrou muito bem o ministro Rodrigo Octávio, o cidadão Márcio Moreira Alves, inclusive pelos livros, como esse outro que o general Reinaldo me cedeu por empréstimo, “O despertar da revolução brasileira”, em que ele é veemente. A gente analisando o caso, vê que a própria representação que deu origem a isso, assinada pelo general Lira Tavares apenas dizia que o Exército estava sentido com aquilo e pedia ao presidente as providências que ele julgasse necessárias.

Sabemos que o Congresso ofereceu suspender o mandato do deputado. E o governo, naturalmente alimentado pelos radicais do tempo, não aceitou, dizendo que era tarde. E há um depoimento do general Cordeiro de Farias, que era ministro do Castelo, mostrando que o governo não se conduziu ali com, a juízo dele, com o equilíbrio e habilidade que eram necessários.

Estamos julgando o acusado pelo discurso que ele pronunciou como deputado. Como diz a sentença ‘amparada pelas imunidades parlamentares agasalhadas no artigo 34’.

Não há dúvida. Agora é uma questão controvertida e ele pode ser processado ou não? Uns acham que pode. Outros acham que não pode. Nós podemos achar que pode e condená-lo. Acho que deve ficar bem claro isso porque  houve muita difusão, muita coisa que nem precisamos ouvir. Todos somos alfabetizados, lemos, os pareceres forçam um pouco.  Ele foi absolvido por prescrição, passou em julgado nas acusações do artigo 14. Estamos o 33, parágrafo 3º e, como sabemos, o decreto de lei 314 dizia “incitar publicamente”. O item terceiro diz “a animosidade entre Forças Armadas ou contra estas e as classes sociais”. O decreto de lei 510 alterou esse artigo, ficou só incitando a administração, detenção de um a três anos.

Isso que estamos julgando. A sentença absolveu por maioria contra o voto de um capitão, que condenava a um ano, absolveu por maioria o acusado por entender que os fatos foram praticados no exercício de mandato de deputado federal e amparado pelas imunidades parlamentares. Eram essas observações que eu gostaria de fazer até mesmo por desencargo de consciência. Estamos julgando  pelo pronunciamento dele como deputado.  Agora, podemos agir não com o Tribunal de Segurança, longe disso, um tribunal de justiça.

 

10) Voz não confirmada. O historiador avalia que pode ser o Almirante Sampaio Ferraz que faz um aparte no voto do ministro togado Amarílio Lopes Salgado. Apelação 41.027. Data: 16/6/1976. Logo após o ministro dar o voto há um aparte. Tempo do aúdio: 1:22

Eu sou revisor de um processo que aparece…que eram quatro indiciados no inquérito, todos eles confessaram direitinho na Polícia, que tinham tomado parte, uns acusaram os outros, mas na ocasião do sumário ficou provado que um deles não tinha nada a ver com a história. Esse trabalhava direitinho. Por que razão ele havia confessado e ele disse: “ou a gente confessa ou entra no pau”. E é o que está acontecendo. Entrou dessa vez e muita gente tem entrado, por isso que muitas vezes a gente acha que o inquérito na Polícia não tem valor por causa desses casos, desses casos. Eles apanham mesmo. Por isso, quando vejo um inquérito na polícia eu fico logo com um pé atrás. Como revisor, eu tomo muito cuidado, examinando isso, porque o que se sente é que na polícia, no Dops, eles entram no pau. Ou confessam ou então apanham. Então não tem valor quase esse inquérito policial, a não ser um inquérito policial militar. Então estou de pleno acordo que é preciso acabar com isso.

Fonte: O Globo

Foto: Reprodução

 

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17
Jun22

Documentário mostra como "lava jato" cometeu abusos e ajudou a eleger Bolsonaro

Talis Andrade

Amigo Secreto, o filme sobre a Vaza Jato | Prerrogativas - YouTube

 

por Sérgio Rodas /ConJur

 

Luís Roberto Barroso: "Vossa excelência acha que o problema foi o enfrentamento da corrupção, e não a corrupção?"

Ricardo Lewandowski: "Nós estamos concordes, ministro. Vossa excelência quer trazer à baila aqui o assunto da corrupção, como se aqueles que estivessem contra o modus operandi da 'lava jato' fossem favoráveis à corrupção. E quero dizer mais, ministro Barroso. Não concordo com vossa excelência que as mensagens que foram veiculadas a partir do material arrecadado na operação spoofing — e, diga-se, periciado pela Polícia Federal, que foi utilizado para oferecer denúncia contra os hackers — não constituíram 'meros pecadilhos'. Porque um juiz indicar testemunhas para a acusação não me parece um mero pecadilho. O que dizem as mensagens? Que os procuradores de Curitiba estavam acertando clandestinamente negociações com autoridades estrangeiras. Combinação do momento do oferecimento da denúncia e outras questões não me parecem pecadilhos".

Barroso: "Eu pensei que fosse vossa excelência fosse garantista. Essa é uma prova ilícita, colhida mediante um crime."

Lewandowski: "Pode ser ilícita. Mas enfim, foi amplamente veiculada e não foi adequadamente, a meu ver, contestada."

Barroso: "A Polícia Federal não atestou a autenticidade dessas provas."

Lewandowski: "Atestou a integridade da cadeia de custódia e só não pode completar a perícia porque os procuradores e o juiz destruíram as provas, deletaram as mensagens."

Barroso: "Mas é produto de crime, ministro. Então o crime compensa para vossa excelência?"

Lewandowski: "Existe outro provérbio latino que ninguém pode alegar a própria torpeza em benefício seu. Mas eu não quero me aprofundar nisso. Eu quero apenas dizer que existem visões contrapostas. O que nós temos que combater aqui são modus operandi por parte seja do Ministério Público, seja do Poder Judiciário, incompatíveis com Estado Democrático de Direito. Historiadores haverão de avaliar qual foi o resultado prático em termos da economia brasileira a médio e longo prazo. O que eu posso dizer desde logo a vossa excelência é que nós retrocedemos da posição de oitava economia do mundo para 14ª. Então, data vênia, não concordo que estamos tratando de 'pecadilhos'. Estamos tratando não de pecados proverbiais veniais, mas talvez de pecados mortais, que constituem, dentre outras coisas, em colaboração à margem da lei brasileira com autoridades estrangeiras."

A discussão entre os ministros Ricardo Lewandowski e Luís Roberto Barroso, ocorrida na sessão em que o Supremo Tribunal Federal declarou a suspeição do ex-juiz Sergio Moro para julgar o ex-presidente Lula, é reproduzida no documentário Amigo secreto, de Maria Augusta Ramos, que estreia nesta quinta-feira (16/6), como exemplo da maneira com que as mensagens reveladas pela Vaza Jato geraram polêmica, mas ajudaram a reverter abusos da operação "lava jato".

Amigo Secreto – Vitrine Filmes

O filme mostra como as mensagens entre procuradores de Curitiba e Moro, reveladas pela Vaza Jato, explicitaram a parcialidades dos agentes da Justiça em relação a Lula e o PT. Para isso, a película acompanha os jornalistas Leandro Demori, ex-editor do The Intercept Brasil — que recebeu os arquivos —, Carla Jimenez, Marina Rossi e Regiane Oliveira, todas do El País Brasil, que encerrou as operações em dezembro, na análise do material, entrevistas com advogados e redação de reportagens.

"Amigo secreto" era o nome do grupo de mensagens de procuradores da "lava jato" no Telegram. Em uma cena, Demori discute com Paula Bianchi, sua colega de Intercept, conversa dos integrantes do Ministério Público Federal em março de 2016, após a busca a apreensão na casa de Lula.

Na época, circulava na internet uma montagem com fotos contrapostas do ex-presidente Itamar Franco e de Lula em uma sala do Palácio do Planalto com um crucifixo, que seria obra do escultor barroco Aleijadinho, na parede. A escultura sumiu do recinto depois que o petista deixou a presidência. A suspeita dos procuradores era de que Lula tinha roubado o crucifixo após encerrar o seu mandato. A expectativa era encontrar o objeto na casa de Lula e o denunciar por peculato.

Um decepcionado Deltan Dallagnol, ex-chefe da "lava jato" em Curitiba, informa ao procurador Orlando Martello que o crucifixo era um presente pessoal dado a Lula e que eles haviam caído em fake news. Por causa disso, Moro lhe pediu para tomar cuidado com a história.

"Essa matéria é o resumo da 'lava jato'", diz Paula Bianchi. "É o resumo de tudo. Incompetência misturada com desejo", complementa Demori.

 

Atuação parcial

 

Amigo secreto mostra como a "lava jato", especialmente Sergio Moro, quebrou a economia, tirou Lula ilegalmente das eleições de 2018 e contribuiu para a ascensão de Jair Bolsonaro — cujo governo, por sua vez, gerou aumento da pobreza, devastação ambiental e quase 670 mil mortos por Covid-19 (até 15/6).

A cena de abertura já explicita a parcialidade de Moro para julgar Lula. Em sessão de 10 de maio de 2017, o juiz faz perguntas ao ex-presidente sobre o tríplex no Guarujá (SP). O petista explica que sua ex-mulher, Marisa Letícia, comprou cota de apartamento no prédio em 2005. Só em 2013 ele foi ver o tríplex e disse que não gostou do imóvel, considerando que ele tinha vários defeitos. Moro insiste em saber o porquê de Lula não ter optado por ficar com o imóvel. "Eu não fiquei porque não tinha como ficar", diz Lula. "E esse foi o motivo também que influiu na decisão? Ou não?", questiona o julgador. "O motivo foi que eu não tinha solicitado e não quis o apartamento."

Cristiano Zanin Martins, advogado de Lula, é forçado a intervir. "Excelência, eu sei que o senhor tem um relatório de questões previamente formuladas, mas eu pediria a vossa excelência que adaptasse esse rol de perguntas formuladas a respostas já dadas pelo ex-presidente Lula. Porque vossa excelência está repetindo muitas questões que, em respostas anteriores, ele já respondeu."

Em outra parte do depoimento, Moro pergunta se Lula não tinha conhecimento dos crimes na Petrobras, uma vez que indicou os ex-diretores Paulo Roberto Costa, Renato Duque e Jorge Luiz Zelada, condenados na "lava jato".

"Nem eu [sabia], nem o senhor, nem o Ministério Público, nem a Petrobras, nem a imprensa, nem a Polícia Federal. Todos nós só soubemos quando houve o grampo da conversa do [doleiro Alberto] Youssef com o Paulo Roberto [Costa]", responde o ex-presidente.

O juiz então retruca que "indagou" sobre o assunto porque Lula havia indicado nomes ao comando da Petrobras. "Eu não tenho nada a ver com isso, eu não participei dessas indicações. O senhor soltou o Youssef e mandou grampear. O senhor poderia saber mais do que eu", rebate Lula.

Como suposto indício de que o ex-presidente tinha ciência de irregularidades na estatal, Moro menciona que ele participou do lançamento da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, e acompanhou obras de terraplanagem no empreendimento. Lula então se irrita e diz que tais questões não tem nada a ver com a acusação.

"Quem está sendo julgado é um estilo de governar. É um jeito de governar. Se as pessoas que estão fazendo essa denúncia querem saber como se governa, elas têm que sair do Ministério Público, entrar em um partido político, disputar as eleições, ganhar, para elas saberem como se governa. Governar democraticamente, com oposição da imprensa, oposição do sindicato, com direito de greve, fortalecendo o Ministério Público, fortalecendo a Polícia Federal, fortalecendo todas as instituições de fiscalização nesse país. Então essas perguntas todas, na verdade elas estão questionando é um jeito de governar", aponta o petista.

O filme narra como Lula foi condenado, preso e proibido de participar das eleições de 2018, das quais era favorito. E destaca como Moro agiu sem imparcialidade nesse processo — tanto que deixou a magistratura para ser ministro da Justiça do governo Bolsonaro e, posteriormente, disse que iria se candidatar no pleito de 2022 — embora ainda não se saiba a que cargo.

O clímax do documentário é o julgamento da suspeição do ex-juiz pelo STF. Na sessão, o ministro Gilmar Mendes afirma que já elogiou a "lava jato", mas que mudou de ideia com a revelação dos abusos da operação. "Não se combate corrupção cometendo crimes", diz o magistrado.

Para ilustrar a proximidade indevida entre o juiz e procuradores, Gilmar cita mensagens em que Dallagnol, após a condução coercitiva de Lula, sugere aos colegas divulgar nota em apoio a Moro. O procurador Carlos Fernando dos Santos Lima apoia a ideia. "Por mim, soltamos pq não deixo amigo apanhando sozinho rs. Independentemente de resultado, soltaria por solidariedade ao Moro" (sic).

Além disso, o ministro menciona a interceptação do ramal central do escritório Teixeira, Martins e Advogados, hoje conhecido como Teixeira Zanin Martins Advogados, que conduzia a defesa de Lula. "Grampo de ramal de escritório é coisa de regime totalitário, pois desaparece o direito de defesa", analisa.

Após a declaração da suspeição de Moro, o documentário perde um pouco o fôlego e passa a se concentrar na destruição causada por Bolsonaro e nos ataques dele ao STF, especialmente ao ministro Alexandre de Moraes.

 

Delações questionáveis

 

A operação "lava jato" foi alicerçada em delações premiadas. De acordo com entrevistados do filme, o instrumento foi usado de forma seletiva para perseguir determinadas pessoas, como Lula.

 

86 charges sobre o escândalo da #VazaJato (para compartilhar com aquele tio  reaça que adorava o Sergio Moro) – blog da kikacastro

Filme mostra parcialidade de Sergio Moro em casos envolvendo Lula

 

O advogado Marco Aurélio de Carvalho ressalta que o delator Pedro Corrêa, ex-deputado federal, disse que o esquema na Petrobras começou bem antes dos governos do PT, mas a informação foi ignorada pelos operadores da "lava jato".

Já o criminalista Fábio Tofic Simantob lembra que houve uma "indústria de delações". Segundo o advogado, ela funcionava da seguinte forma: o interessado se oferecia ao MPF para firmar acordo. Procuradores informavam que, para fechar a colaboração, seria preciso que entregasse tal e tal pessoa. E, uma vez assinada a delação, Moro revogava a prisão preventiva no dia seguinte, de forma a passar um recado para os potenciais colaboradores.

A principal revelação do filme é feita por Alexandrino Alencar, ex-executivo da Odebrecht que entrou na delação premiada da empreiteira. Ele conta que foi pressionado por procuradores a fazer acusações contra Lula.

"Fizeram uma pressão em cima da gente". Era uma questão com o Lula. Ele queria saber o que o irmão do Lula [fez], o filho do Lula, não sei o quê do Lula, as palestras do Lula", declara Alencar.

O depoimento coincide com reportagens publicadas pelo jornal Folha de S.Paulo que disseram que o MPF resistia em aceitar a delação de Alencar, uma vez que ele não citava Lula ou outros políticos. Depois de alterar sua narrativa, ele celebrou acordo e contou que a empreiteira bancou a reforma do sítio usado pelo petista em Atibaia (SP). O depoimento foi fundamental para a condenação do ex-presidente a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro no caso. A sentença foi posteriormente anulada pelo STF.

O ex-executivo da Odebrecht ainda declara saber de gente que foi dispensada de depor após citar o ex-governador de Minas Gerais Aécio Neves (PSDB), o que indicaria proteção de procuradores a ele.

"Não vou dizer o nome do santo. Mas tem colega meu que foi preso em Curitiba, chegou lá, o pessoal [investigadores] começou a perguntar sobre caixa dois [recursos doados para políticos sem registro na contabilidade oficial]. Ele [colega de Alexandrino] falou: 'Isso aqui é para o Aécio Neves'. Na hora em que ele falou, eles [interrogadores] se levantaram e soltaram ele. Isso é 'lava jato'? Isso é um sistema anticorrupção? Ou é uma questão direcionada?".

 

Entrevistas com advogados

 

O filme tem entrevistas com diversos advogados. Além de Marco Aurélio Carvalho e Fábio Tofic Simantob, dão depoimentos Cristiano Zanin Martins, Fernando Augusto Fernandes, Walfrido Warde, Carol Proner e Pedro Estevam Serrano.

Zanin lembra que o eixo central da denúncia do tríplex era de que Lula integrava uma organização criminosa que promovia desvios na Petrobras. Contudo, Lula foi absolvido dessa acusação, e o MPF nem recorreu. "Então como condenar pelo tríplex?", questiona o advogado do petista.

O criminalista Fernando Fernandes explica que houve lawfare na "lava jato", embora diga não gostar do termo em inglês. "Membros do Judiciário, que não podem atuar politicamente, usaram seus cargos para atacar a política. Ao atacarem Lula, atacaram a esquerda a qualquer custo e fizeram surgir o bolsonarismo."

Warde, autor do livro O espetáculo da corrupção: como um sistema corrupto e o modo de combatê-lo estão destruindo o país (Leya), ressalta que a "lava jato" não fez distinção entre empresas e empresários. Em vez de punir apenas as pessoas responsáveis por crimes, também penalizou as companhias, afetando a economia e gerando perda de empregos, declara.

Professora de Direito Internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Carol Proner explica como, por meio do Foreign Corrupt Practices Act, os EUA passaram a promover seus interesses no mundo por meios jurídicos e geopolíticos, e não mais pela guerra.

Pedro Serrano, professor de Direito Constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, diz que a indignação contra a corrupção é seletiva. Afinal, o governo Bolsonaro destinou R$ 1,3 bilhão a bancos no começo da epidemia de Covid-19, e ninguém reclamou. O dinheiro foi para o setor mais corrupto, aponta Serrano, quando poderia ter sido usado para manter as pessoas em casa e frear a disseminação do coronavírus.

Além disso, o filme apresenta criminalistas como Geraldo Prado e Miguel Pereira Neto debatendo no Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil às vésperas do julgamento, pelo STF, que voltou a estabelecer que só é possível executar a pena após o trânsito em julgado da condenação.

A sustentação oral feita na ocasião pelo advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, tem destaque na película. Em sua fala, ele apontou que o caso não dizia respeito apenas a Lula, uma vez que as ações foram propostas em 2016, antes de o petista ser denunciado. Kakay também ressaltou que a prisão após segunda instância puniu mais severamente os pobres e negros.

 

Cenas jornalistas

 

O documentário também tem reflexões sobre a atuação da imprensa na "lava jato". Leandro Demori explica a integrantes da Federação Única dos Petroleiros como era o modus operandi dos procuradores de Curitiba.

Eles convocavam coletiva de imprensa de manhã, liberavam o acesso a diversos documentos e entregavam um release com o resumo das informações que queriam destacar. Não dava tempo de os repórteres conferirem os arquivos, fazerem investigações paralelas. Então, acabavam reproduzindo a versão do MPF.

No fim do filme, Carla Jimenez afirma que, depois da Vaza Jato, "nunca mais vai olhar para o MP do mesmo jeito". Os jornalistas lembram de entrevista concedida ao Intercept por Christianne Machiavelli, ex-assessora de imprensa da Justiça Federal em Curitiba.

Ela afirmou que, na efervescência dos processos da "lava jato", os jornalistas abandonaram qualquer distanciamento e senso crítico para apresentar à população meras suspeitas ou suposições como verdades absolutas. A pressa, a competição pelo "furo" e a necessidade de cativar as fontes — a polícia, o Ministério Público Federal e o juiz Sergio Moro — levaram repórteres e editores a abdicar de seu papel para se tornar integrantes da chamada "força-tarefa".

"Talvez tenha faltado crítica da imprensa. Era tudo divulgado do jeito como era citado pelos órgãos da operação. A imprensa comprava tudo. Não digo que o trabalho não foi correto, ela se serviu do que tinha de informação. Mas as críticas à operação só vieram de modo contundente nos últimos dois anos [a partir de 2016]. Antes praticamente não existia. Algumas vezes, integrantes da PF e do MPF se sentiam até melindrados porque foram criticados pela imprensa", disse Christianne Machiavelli.

Arquivos da Vaza Jato já estão no STF - O Cafezinho

24
Mai22

Sérgio Moro vira réu em ação que pede ressarcimento por prejuízos da "lava jato"

Talis Andrade

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Redação Consultor Jurídico

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O juízo da 2ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal recebeu a ação popular que pede que Sergio Moro seja responsabilizado pelos prejuízos causados pela "lava jato" no país, tornando réu o ex-juiz.

A ação foi apresentada por cinco deputados federais, com fundamento no fato de que a lei prevê reparação por atos de agente público que afronta a normalidade institucional em proveito próprio, abrindo mão dos deveres funcionais inerentes ao cargo que ocupa.

Pelo Twitter, o ex-juiz comentou a decisão, afirmando que se trata de uma completa "inversão de valores". Ele escreveu: "Em 2022, o PT quer, como disse Geraldo Alckmin, não só voltar à cena do crime, mas também culpar aqueles que se opuseram aos esquemas de corrupção da era petista. A ação popular proposta por membros do PT contra mim é risível. Assim que citado, me defenderei. A decisão do juiz de citar-me não envolve qualquer juízo de valor sobre a ação. Todo mundo sabe que o que prejudica a economia é a corrupção e não o combate a ela. Todos que lutaram contra a corrupção serão perseguidos na 'democracia petista'."

A ação popular apresenta uma lista das condutas de Moro que feriram o respeito aos limites legais e afrontaram o princípio da imparcialidade. Para começar, o então juiz autorizou a interceptação e monitorou conversas telefônicas de um escritório de advocacia, com o claro objetivo de "bisbilhotar" e saber antecipadamente a estratégia defensiva.

Além disso, determinou uma "espetaculosa" condição coercitiva de alguém que jamais deixou de atender às intimações judiciais, mediante o uso de um "aparato militar cinematográfico" e com a evidente finalidade de abalar a imagem do réu e sua presunção de inocência.

O então juiz ainda deu publicidade a conversas telefônicas com o nítido fim de convulsionar a sociedade e as instituições em favor do impeachment de uma Presidenta legitimamente eleita, e contra o partido então governista.

A peça ainda lembra o episódio em que Moro, sem jurisdição e de férias, atuou para manter preso o ex-presidente Lula, cuja soltura havia sido determinada por órgão jurisdicional hierarquicamente superior.

Ao mesmo tempo em que perseguia Lula, narram os deputados, Moro recebeu convite para integrar o governo de Jair Bolsonaro, seu antagonista político; deu publicidade a anexos de delação premiada para prejudicar Lula; e, logo depois, aceitou convite para chefiar o Ministério da Justiça no governo de Bolsonaro.

Depois de ter deixado o governo, prossegue a inicial, Moro foi contratado para trabalhar em empresa de consultoria responsável, dentre outros, pela recuperação judicial de empresas direta e indiretamente prejudicadas por atos que praticou enquanto juiz.

Além disso, lançou-se como candidato à Presidência da República "com base na fama e no capital político adquirido por sua atuação enquanto magistrado". Tudo isso, finaliza o pedido, praticado em manifesta contrariedade às balizas normativas e jurisprudenciais que delineiam a garantia constitucional do juiz natural.

A ação popular é assinada pelos advogados Marco Aurélio de Carvalho, Fabiano da Silva Santos, Lenio Luiz Streck, Weida Zancaner, Caroline Proner, Pedro Estevam Serrano, Gisele Guimarães Cittadino, Juvelino Strozake, Luciano Rollo Duarte, Larissa Ramina Reinaldo Santos de Almeida, Maíra Calidone Recchia Bayod, Álvaro Luiz Travassos de Azevedo Gonzaga, Marco Antônio Riechelmann Júnior, Luis Henrique Pichini Santos, Lucas Bortolozzo Clemente, Matheus Rodrigues Correa da Silva, Alfredo Ermírio de Araújo AndradeFernando Augusto Fernandes e Guilherme Marchioni.

Ação Popular 1025482-78.2022.4.01.3400

Brasil moro levi piratas corsários traidores .jp

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23
Abr22

Presidente do Clube Militar ataca ministros do STF: 'togas não serviriam nem como pano de chão, pelo cheiro de podre que exalam'

Talis Andrade

Por 364 votos: Câmara derrota os ratos fascistas nesta sexta -  OEstadoAcre.com

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Daniel Silveira, soldado pm como qualquer outro soldado raso do Exército, da Marinha, da Aeronáutica, não pode frequentar os luxuosos e elitistas e segregadores e discriminadores e separados e distanciados clubes militares. Nem soldado, nem cabo, nem sargento, nem subtenente. São clubes restritos, privativos para os limpos de sangue. Exclusivamente para oficiais, a farda - que um dia servirá de mortalha - recheada de medalhas de guerras jamais acontecidas, travadas com inimigos imaginários, torturados na ditadura militar de Castelo Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel e Figueiredo. Tempos de chumbo, de paus-de-arara, de cadeiras do dragão. De porões comandados por serie killers de nomes conhecidos: coronel Ustra, coronel Paulo Manhães e outras e outras altas patentes, os nomes citados nos áudios das sessões do Superior Tribunal MIlitar - STM. 

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Daniel Silveira soldado pode entrar para realizar os serviços considerados humilhantes: de cozinheiro, confeiteiro, servente, copeiro, garçom,  camareiro, carregador de mala, cabeleireiro, enfermeiro, costureiro, diferentes profissões a serviço de oficiais e familiares, notadamente as parasitas filhas solteiras, que recebem do Governo Civil ricas pensões vitalícias para a vida maneira dos gigolôs e filhos.

O presidente do Clube Militar, o general Eduardo José Barbosa, publicou nesta sexta-feira (22) no site da entidade um texto de apoio ao decreto de Jair Bolsonaro que deu indulto a Daniel Silveira.  

O baboso general aposentado repete o tom de desprezo aos ministros do Supremo, usado pelo ex-capitão que hoje ocupa a presidência da República.

Escreveu Barbosa: "Lamentável termos, no Brasil, ministros cujas togas não serviriam nem para ser usadas como pano de chão, pelo cheiro de podre que exalam".Image

 

ImageGilmar Fraga / Agencia RBS

Esse general tem a boca suja de arruaceiro. Tem a boca do protegido soldado pm Daniel Silveira, que possui mais grandeza, desde que conseguiu se eleger deputado federal. 

 

Nem técnicos, nem neutros: os militares na história recente brasileira |  Jornalistas Livres

08
Fev22

TRAIDORES DA PÁTRIA ENTERRAM O PROGRAMA NUCLEAR E O FUTURO DO BRASIL

Talis Andrade

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LAVA JATO PRENDEU ALMIRANTE OTHON A SERVICO DOS INTERESSES DOS EUA  (Entreguismo, parte 2)

 

Por Miguel do Rosário

Voltemos ao caso do almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, herói nacional transformado em bandido pelos espiões dos Estados Unidos e traidores do Brasil.

Após o seu caso ser distribuído para o Rio de Janeiro, o almirante Othon seria condenado pelo juiz Marcelo Bretas, em sentença assinada no dia 3 de agosto de 2016, a 43 anos em regime fechado. Ainda naquele fatídico agosto, no dia 31, o Senado decidiu, por 61 votos X 20, pelo afastamento definitivo da então presidenta Dilma Rousseff. Tristes anos, em que só ouvíamos falar de prisão, destituição, paralisação. Os improdutivos, que não inventam nada, que não ganham eleições, que apenas se regozijam diante da tragédia alheia, haviam vencido.  

Na sentença que o condenou, página 44, Marcelo Bretas nos informa que, após uma minuciosa devassa na vida bancária do Almirante Othon Pinheiro, os investigadores concluíram que ele recebeu exatamente R$ 3,4 milhões de “propina”, pagos pela empreiteira Andrade Gutierrez, entre os anos de 2007 a 2015. 

A versão do almirante era de que se tratava de um acordo firmado entre ele e a empresa em 2004, um ano antes dele assumir a presidência da Eletronuclear, para a prestação de um serviço de consultoria sobre o futuro da energia nuclear no Brasil. 

Segundo o almirante, ele procurou mostrar à empresa que o modelo energético brasileiro estava obsoleto, pois desde os anos 80 o país mantinha o mesmo volume de água em seus reservatórios, ao passo que a demanda havia se multiplicado várias vezes. 

A solução que vinha sendo aplicada, de uso de termoelétricas movidas a diesel, carvão ou gás natural, acarretava em custo muito alto ao contribuinte e às indústrias nacionais, além de extremamente poluente. 

Como o Brasil possui grandes reservas de urânio, a resposta mais inteligente aos riscos de desabastecimento seria ampliar o uso da energia nuclear como o principal complemento às hidrelétricas. Quando faltasse chuva, ligava-se as termonucleares.  Enquanto isso, o Brasil poderia seguir investindo em energias ainda mais seguras e limpas que a nuclear. Ele mesmo, Othon, tinha uma ideia: o desenvolvimento de micro-hidrelétricas, que poderiam ser instaladas em pequenas quedas de água em todo país. 

Um dos pontos realmente grotescos da acusação do Ministério Público contra o almirante, e que também consta na sentença de condenação de Bretas, é o desprezo pelos conhecimentos de Othon Pinheiro enquanto engenheiro nuclear. Os procuradores declaram, e Bretas chancela, que a consultoria de Othon é superficial, inútil, e que não vale os R$ 3 milhões pagos ao longo de 11 anos!

Em 28 de janeiro de 2022, Sergio Moro, agora ex-juiz e ex-ministro, declara que ganhou o equivalente a R$ 3,5 milhões por 11 meses de trabalho para a empresa americana Alvarez & Marsal.

Diante das acusações, vindas de diversas partes, incluindo o TCU, de que esse valor poderia ser visto como uma espécie de propina, Deltan Dallagnol, que também desistiu do serviço público, o mesmo Dallagnol que outrora se mostrara tão duro com o almirante Othon, veio a público defender Sergio Moro e dizer que a Lava Jato estaria sendo “perseguida”. 

Moro pode ganhar R$ 3,5 milhões em 11 meses, sabe-se lá por que serviço, e o almirante Othon, o maior engenheiro nuclear da história brasileira, não pode auferir R$ 3,4 milhões em 11 anos?

Em 25 de setembro de 2017, a Reuters informa que, segundo publicado no Diário Oficial da União, a Eletronuclear assina o seu primeiro contrato com a Alvarez & Marsal, no valor de R$ 3,86 milhões…

Desde então, tem sido difícil seguir o quanto a Alvarez recebeu da Eletronuclear, porque novos contratos e aditamentos se sucedem frequentemente. Encontrei notícia de aditamento de R$ 503 mil, assinado em 13/09/2019, e de um novo contrato de 25 de maio de 2020, de R$ 1 milhão. Sempre com a Alvarez & Marsal. 

Além disso, as relações entre essas grandes firmas americanas de advogacia, especializadas em processos de corrupção de alcance internacional, e a comunidade de inteligência dos Estados Unidos, são profundas. 

Nossa conhecida Hogan Lovells, por exemplo, que espetou recentemente uma conta de R$ 400 milhões na Eletrobras, para “ajudar” a estatal a enfrentar os problemas que a Lava Jato gerou junto a Justiça americana, tem entre seus quadros o advogado Timothy S.Bergerer, que foi o último diretor de equipe do Comitê de Inteligência do Congresso, órgão responsável por supervisionar todos os serviços de inteligência ligados ao governo.

Bergerer foi também, durante doze anos, o chefe de gabinete do deputado democrata Adam Schiff, presidente do mesmo Comitê desde janeiro de 2019.

No dia 2 de fevereiro de 2022, 1ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2a Região (TRF-2) formou maioria em favor de uma brutal redução na pena de Othon Pinheiro. 

Ao invés de 43 anos, o desembargador Antonio Ivan Athié, relator da apelação, sugeriu 4 anos e 10 meses. 

Ele foi seguido pela desembargadora Simone Schreiber. A turma tem apenas três nomes. O desembargador Flávio Lucas, o terceiro voto, pediu vistas. O julgamento deverá ser finalizado em menos de 30 dias. Procurado, o advogado Fernando Augusto Fernandes, responsável atual pela defesa do almirante, explicou que não pode se manifestar antes do resultado final. Mas apuramos junto a outras fontes que é certo que a defesa deverá pedir a anulação do processo junto ao STJ.

O argumento principal da defesa é que as acusações contra o almirante são exclusivamente baseadas em delações de empresários intimidados pelos procuradores. 

Além disso, numa outra reviravolta, o próprio juiz que condenou Bretas também foi citado por um delator, o advogado Nythalmar Dias Ferreira Filho, que revelou diálogos que manteve com Bretas. Num dos diálogos, Bretas dá a entender que a severidade na condenação do almirante Othon, 43 anos em regime fechado, teria a função de assustar outros réus, para fazê-los pagar propina ao juiz, em troca de “alívio” na sentença. 

Uma outra mutreta descoberta pela defesa do almirante envolve a cooperação internacional “selvagem” entre a Lava Jato e órgãos de investigação de outros países.  Numa das denúncias contra Othon, os procuradores revelam saber o valor exato da quantia que ele mantinha numa conta no exterior, US$ 185 mil, antes mesmo de obterem autorização judicial para quebrarem o sigilo bancário do réu em eventuais contas que possuísse no estrangeiro. 

Bretas também ignorou o fato de que a referida conta foi devidamente informada ao Banco Central e à Receita Federal em agosto de 2015, antes que a denúncia fosse aceita pela justiça brasileira. 

Entretanto, o mais chocante, em todo o processo envolvendo o almirante Othon é o ódio, o desprezo, e mesmo a crueldade com que procuradores e juízes do caso tratam um cientista com um tal histórico de serviços prestados ao país.

Esse ódio ao Brasil que produz, que inventa, que desafia o mundo, é impressionante. 

A postura de tratar o almirante como inimigo público nacional é visível tanto no despacho de prisão de Sergio Moro, em julho de 2015, quanto na coletiva dos procuradores da Lava Jato, dada no mesmo dia da prisão. 

O procurador Athayde Ribeiro Costa é a voz mais estridente dessa coletiva, que recebe uma cobertura totalmente sensacionalista da grande mídia, a começar pela Globo

Costa solta frases de efeito, como a de que a corrupção no Brasil tinha se tornado uma “metástase”, ou seja, associando o almirante Othon Pinheiro a um câncer. Detalhe, naquele momento a denúncia não havia sido sequer recebida. Não havia ainda nenhuma condenação objetiva, jurídica, do almirante. Mas a condenação midiática já era definitiva, mortal. 

GDPAPE: Notícias

 

Quando o caso é distribuído ao juiz Marcelo Bretas, no Rio de Janeiro, esse ódio ao almirante é ainda mais explícito. Mesmo sabendo que o almirante era um idoso com quase 80 anos, que cuidava da esposa doente (mal de Parkison), Bretas mandou que o cientista saísse de sua prisão domiciliar e fosse conduzido a uma unidade militar, na Base de Fuzileiros Navais, em Duque de Caxias. 

Neste local, o almirante pedia para ligar para sua esposa diariamente, para saber se ela estava bem, usando um telefone da unidade. Bretas, informado disso, reagiu furiosamente, e ordenou que o almirante fosse levado a um presídio comum, Bangu 8, zona oeste do Rio. 

Para Bretas, o vice-almirante desfrutou de regalias “absolutamente incompatíveis com a custódia preventiva”. Algum tempo depois, a defesa conseguiu transferi-lo novamente para uma prisão militar. 

Em todas essas ocasiões, o Ministério Público e o juízo de primeira instância, sempre tentou, a todo o custo, manter o almirante nas piores condições possíveis. A transferência de Bangu 8 para uma unidade militar só ocorreu por decisão da segunda instância. 

O almirante então tentou o sucídio, por enforcamento, mas foi impedido por uma das oficiais de plantão na unidade militar. 

Em algum momento, a justiça será feita para o almirante Othon Pinheiro. Espera-se que isso se dê ainda em seu tempo de vida. A truculência com que ele foi tratado nos últimos anos, por servidores públicos desprovidos de qualquer senso de soberania nacional, de sensibilidade humana, e que pelo jeito sequer conhecem o Direito, não poderá ser apagada. Por isso mesmo, essa história deve ser contada e recontada, para que, no futuro, não venha a se repetir. 

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