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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

27
Mai22

Auschwitz é aqui. Ou a "abordagem" nazista

Talis Andrade

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por Gilvandro Filho /247

Convenhamos. Mesmo se tratando de um governo de atitudes absurdas e criminosas, algumas de suas ações ultrapassam todos os limites. A forma como a Polícia Rodoviária Federal, órgão da gestão pública, resolveu tratar os seus presos é um desses exemplos macabros que deveriam ser coibidos por qualquer governo que tivesse o mínimo de bom senso, de decência e de humanidade. Deter pessoas, trancá-las em um camburão e jogar dentro uma bomba de gás, provocando morte por asfixia, é de um requinte de maldade que parece mentira.

Infelizmente, a cena mostrada pela mídia é verdadeira e aconteceu em Umbaúba, sul de Sergipe. O homem assassinado, negro e pobre, tem nome e sobrenome: Genivaldo de Jesus Santos. Tinha 38 anos. Sofria de transtornos psíquicos. Sua luta pela vida, se debatendo, chutando o vento e pedindo socorro, está nos vídeos espalhados pela TV e na internet como um libelo acusatório. Não há dúvidas sobre o que houve. Assim como fica clara a frieza dos seus algozes impedindo qualquer possibilidade de livramento.

Foi uma execução, nunca uma “abordagem” como escamoteia a grande mídia, sempre ciosa no tratamento ao opressor. “Abordagem que resultou em morte”, como capricharam na semântica alguns veículos. Tem que se falar claro. Foi uma ação que não fariam de forma mais cruel a SS do Terceiro Heich e os carrascos de Auschwitz, o campo de concentração nazista construído em Oswiecim, Polônia,  onde a Alemanha deu forma definitiva à execução de milhões de judeus, ciganos, comunistas e homossexuais, em câmaras de gás. O mais letal de todos, que funcionou entre 1940 e 1945.

Como se não bastasse a execução em si, os policiais rodoviários federais demonstraram total falta de respeito para com a vítima e com a família dele. Os guardas chegaram a soltar a lorota de que, no camburão e na porta da morte, Genivaldo estava “melhor do que nós”. Imoralidade corroborada pela própria polícia ao classificar como um “mal súbito” a causa da morte. Cinismo, maldade e desfaçatez, não existem outros nomes para isto.

Afastar de suas funções os policiais envolvidos neste assassinato é pouco. As imagens são claras a comprovam o sadismo com que os dois “homens da lei” tratam quem lhes atravessa o caminho. Pouco importa se for uma pessoa com problemas mentais, como foi o caso. Mais ainda se for pobre e preto, o que para algumas autoridades policiais parece ser um agravante.

Que esta ação criminosa e nazista não caia do esquecimento e que os seus autores – e mentores – paguem de maneira exemplar pelo que fizeram. Como em Nuremberg.

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21
Set21

A terceira via e o uso da ideologia, slogans e símbolos de Bolsonaro

Talis Andrade

Bolsonaro mantém no governo o slogan nazista da campanha: "Deus acima de todos. Brasil acima de tudo".

Diante da apologia da violência, do ódio, a divindade de Bolsonaro da Teologia da Prosperidade é bem primitiva, e renovada pela a xenofobia, o racismo, a homofobia, a misoginia nazistas. 

Pela exibição do ministro Marcelo Queiroga, esta semana em Nova Iorque, o deus Priapus, evocado com a apresentação do dedo do meio. 

O gesto de arma com os dedos, símbolo da campanha de Bolsonaro a presidente, outro signo fálico, considerado representativo dos templários, relacionado a BaphometBafomete ou ainda Bafomé, uma representação de satã criada pelo Papa Clemente V na perseguição aos templários. 

Teve propaganda de Bolsonaro em que ele aparece como cruzado no combate "Deus acima de todos" contra o comunismo, a corrupção, religiões indígens e afro-brasileiras, e pecaminosos costumes como o kit gay, a mamadeira de piroca, o aborto. 

Pode ser uma imagem de 1 pessoaBolsonaristas organizam caravanas para ocupar Câmara em Brasília e  pressionar deputados a eleger Lira

Eliminados os templários, o culto a Bafomé passou a ser associado aos judeus, mas recentemente ao ocultismo, à maçonaria, que motivou o ataque de Adelio Bispo de Oliveira a Bolsonaro. 

Anderson Bahia escreveu em 13 de outubro de 2018: Muita gente anda espantada como a representação de algumas ideias, consideradas toscas, ganharam tanta força recentemente. Que a maioria da população concorda com a frase “bandido bom é bandido morto”, já se sabe há algum tempo. Mas daí a arma feita com os gestos das mãos virar uma onda no país e, pior, ser um dos principais símbolos do candidato que lidera as pesquisas para a Presidência da República parece um absurdo para alguns.

No esforço de entender como isso se deu, algumas respostas vão surgindo. Uma delas é dizer que há uma ascensão das ideias fascistas na sociedade. Sugere que a violência se legitima como prática social e se apoia na ampliação do clima de intolerância que insiste ganhar o tom de “novo normal” do Brasil. Fatos recentes como o assassinato de Moa do Katendê e da jovem que teve uma suástica marcada por canivete em seu corpo parecem corroborar essa compreensão.

Não se pode negar o crescimento do fascismo, mas também não é possível atribuir a ele a resposta única ou principal para o fato da arma ter se tornado um símbolo na proporção que virou. Acreditar nisso é deixar de considerar outros fatores.

Em 3 de setembro de 2017, quase um ano antes da campanha eleitoral para presidente, Kiko Nogueira observava o "drama das pistolinhas de Eduardo Bolsonaro", o filho 03 de Jair Bolsonaro: 

Em suas “Conferências Introdutórias sobre Psicanálise”, Sigmund Freud incluiu em suas interpretações dos sonhos as armas como símbolos da genitália e, em particular, do pênis.

“Todas as armas e ferramentas são símbolos do órgão masculino: por exemplo, martelo, arma, revólver, punhal, espada, etc”, escreveu.

Abaixo, o desabafo que o deputado Eduardo Bolsonaro fez no Facebook relatando seu drama com seus chaverinhos nos aeroportos:

PRECONCEITO CONTRA CHAVEIROS!!!

Preciso falar com vocês algo que tem me incomodado. Não será uma confissão tipo Sandy e Júnior, mas foi algo que me atingiu profundamente. Em minhas andanças por aí passei por um aeroporto em que a funcionária do raio-x quis encrencar com meus chaveiros de arminhas pendurados em minha mochila. Um revolverzinho de ferro e uma pistolinha de borracha (foto) , ambas com alguns centímetros de comprimento. Sem a minha permissão ela saiu abrindo o zíper da minha mochila e tratando de esconder os chaveiros dentro da mochila. Perguntei o porquê daquilo e ela disse ser uma norma que era proibido ter no aeroporto qualquer coisa que lembrasse uma arma. Eu falei algo que na minha cabeça era óbvio – mas talvez para ela não fosse – disse que aqueles chaveirinhos não atiravam, que ninguém acharia que era um objeto ameaçador.

Ela insistiu, disse que poderia sujar para ela caso alguém visse e etc. Vendo tamanho abismo decidi ser impossível seguir numa argumentação, falei que aquilo estava ferindo meus princípios, minha pessoa, minha moral, tudo – falei isso para evitar de falar outras coisas – tirei os chaveiros escondidos de dentro da mochila, deixo-os a mostra novamente e simplesmente saí dali. Não xinguei, não resmunguei, não fiz cara feia, não queria estressar a menina, apenas saí. Mas saí com vontade de sair do Brasil também. Ridículo uma pessoa se prestar àquilo. Se fosse um chaveiro de metal imitando folha de maconha ou uma genitália de borracha certamente eu não teria tido esse problema…Líder evangélico critica silêncio após Bolsonaro imitar arma em ato cristão  - UOL Notícias

O sinal dos dois dedos eram usados antes das armas de fogo, do descobrimento da pólvora. Antecede ao deísmo judaico, ao surgimento do cristianismo e do islamismo. Impressionantemente chefes de igrejas, beatas e crianças passaram a exibir o sinal dos dois dedos que, na Idade Média, os tribunais religiososos puniriam com as torturas de Ustra, as fogueiras da Santa Inquisição. 

Em uma imagem recente, vide os códigos ocultos de polêmica escultura de Bafomé nos Estados Unidos.(AP)

O crescimento da ultra direita como política ou religião, que apela para os mais baixos instintos inconscientes, não é só um fenômeno do bolsonarismo, realisticamente um movimento internacional pela presença dos propagandistas de Trump, viagens internacionais de Bolsonaro a países governados por ditadores ou pela extrema direita, visitas de lideranças alemãs ao Palácio do Planalto, a supremacia branca e a multiplicação de cédulas nazistas, principalmente no Sul e Suldeste, a transformação das escolas do Paraná em miniquartéis. 

Steve Bannon participou da campanha presidencial. Outros agitadores da extrema direita estiveram no Brasil, nas semanas que antecederam as manifestações golpistas de 7 de Setembro: Jair Bolsonaro se reuniu com dois membros da cena conspiracionista e negacionista da pandemia na Alemanha. Vicky Richter e Markus Haintz, ligados ao Querdenken ("pensamento lateral" em alemão), movimento que organizou no último ano protestos contra as medidas do governo alemão para frear a pandemia de covid-19. Em abril, o serviço de inteligência interno alemão colocou setores do movimento sob vigilância nacional por suspeita de "hostilidade à democracia e/ou deslegitimação do Estado que oferece riscos à segurança".

Em julho, o presidente recebeu no Planalto a deputada alemã de ultradireita Beatrix von Storch. Filiada à AfD, Von Storch é uma figura influente da ala arquiconservadora e cristã do partido Alternativa para a Alemanha (AfD), que tem membros acusados de ligações com neonazistas. Uma organização ligada ao partido também chegou a ser colocada sob vigilância dos serviços de inteligência alemães no início do ano. Neta do antigo ministro das Finanças de Adolf Hitler, Von Storch ficou conhecida na Alemanha por publicações e afirmações xenófobas.

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Deus Priapus exibindo o dedo do meio

Em 2 de junho de 2019, a Folha de S. Paulo publica reportagem sobre a "obsessão fálica" do presidente. Uma impetuosidade que atinge os quatro filhos e membros do governo. 

Em 17 de junho de 2020, a secretária de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, tinha a visão de que a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) tinha um pênis na porta.Internet especula o que seria o "pênis" da Fiocruz, dito por Mayra Pinheiro  na CPI da Covid | Lu Lacerda | iG

"É um órgão que tem um poder imenso, porque durante anos eles controlaram, através do movimento sanitarista, que foi todo construído pela esquerda, a saúde do país”, disse a capitã Cloroquina. 

A imprensa da Espanha publicou. Eliane Brum, em 19 de junho de 2019, no El País, alertou: "Ei, Bolsonaro, até o pênis está diminuindo". A excelente jornalista pretendeu chamar a atenção dos bolsonaristas: "as liberar agrotóxicos numa velocida inédita, o governo envenena o Brasil". 

Escreveu Eliane Brum:

"Pesquisa feita com jovens da bucólica região do Vêneto, na Itália, foi publicada no The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism, em novembro de 2018. Mas só ganhou repercussão no último fim de semana nas redes sociais no Brasil. Os cientistas analisaram 212 jovens expostos ao veneno, comparando-os a um grupo de controle, de não expostos, de 171. A média de idade era de 18 anos. Embora seja um grupo pequeno, a investigação foi conduzida dentro dos critérios corretos, por uma equipe respeitável. O trabalho aprofunda aspectos que já vinham sendo investigados por outros cientistas. Os jovens expostos aos produtos tinham pênis menores, menor contagem de espermatozoides, menor mobilidade dos espermatozoides e uma redução da “distância anogenital” (distância entre o ânus e a base dos testículos), uma medida que os cientistas consideram uma marca de saúde reprodutiva. A porcentagem de espermatozoides de formato normal no grupo exposto era pouco mais da metade comparada ao grupo de controle. Como os produtos químicos são transferidos das mães para os bebês, é provável que os jovens tenham sido contaminados antes do nascimento.

Como se sabe, a palavra “pênis” é poderosa. Atrai especial atenção nos dias atuais por conta da obsessão de Bolsonaro, que não para de criar oportunidades para falar de pinto e de tamanho de pinto. Os japoneses que o digam. Em 15 de maio, Bolsonaro foi abordado por um homem com traços asiáticos no aeroporto de Manaus. O estrangeiro disse duas palavras: “Brasil” e “gostoso”. O antipresidente reagiu com “Opa!”, levantou os braços, aproximou o polegar do dedo indicador e perguntou: “Tudo pequenininho aí?”.

Dias depois, ao comentar a reforma da Previdência, apresentada ao país como a cura para todos os males da terra com todos os males, afirmou: “Se for uma reforma de japonês, ele (o ministro da Economia Paulo Guedes) vai embora. Lá (no Japão), tudo é miniatura”. No Carnaval, o antipresidente postou no Twitterum vídeo de dois homens fazendo “golden shower” (modalidade sexual em que um urina no outro), para tentar provar que a festa mais popular do Brasil – e que satirizou todas as trapalhadas do seu governo – era uma versão contemporânea de Sodoma e Gomorra. Não colou – e Bolsonaro passou (mais uma) vergonha.

A recorrente referência a pintos segue por mais episódios do que há espaço em um artigo sobre o risco dos agrotóxicos. A inclinação foi amplamente analisada pelo jornalista Naief Haddad, na Folha de S. Paulo de 2 de junho: “De ‘golden shower’; a piada com japoneses, obsessão fálica marca Bolsonaro. Especialistas comentam fixação do presidente com genitais e sexualidade”.

Quando a notícia de que havia um agrotóxico relacionado a redução do tamanho e da largura do pênis repercutiu no Twitter, criou-se a expectativa de que talvez fosse possível chamar a atenção antipresidencial para o que seu governo anda fazendo. Afinal, nada poderia ser mais promissor: pinto e Twitter, duas obsessões de Bolsonaro finalmente juntas. Aparentemente, porém, não completou-se a sinapse no cérebro antipresidencial. Informações que atrapalham as conveniências da família e os lucros dos aliados funcionam como uma espécie de criptonita. Se forem científicas, pior ainda. O fato de jovens poderem estar sofrendo alterações no pênis e na fertilidade já antes do nascimento não parece ser um assunto capaz de interessar Bolsonaro. Importante mesmo é “golden shower” e “piada” com japoneses.

Eliane colocou o título certo, por vários motivos. Em 25 de abril de 2019, Bolsonaro alertava sobre o risco de homens terem pênis amputado por falta de higiene. Falou o presidente:

"Uma coisa muito importante, para complementar aqui. Dia a dia, né, a gente vai ficando velho e vai aprendendo as coisas. Tomei conhecimento uma vez que certos homens ao ir para o banheiro, eles só ocupavam o banheiro para fazer o número 1 no reservado", afirmou o presidente, que em seguida citou um "dado alarmante": mil amputações de pênis por ano no Brasil "por falta de água e sabão".

"Quando se chega a um ponto desses, a gente vê que nós estamos realmente no fundo do poço. Nós temos que buscar uma maneira de sair do fundo do poço ajudando essas pessoas, conscientizando-as, mostrando realmente o que eles têm que fazer, o que é bom para eles, é bom para o futuro deles, e evitar que se chegue nesse ponto ridículo, triste para nós, dessa quantidade de amputações que nós temos por ano", declarou. 

Fazer o numero 1, o numero 2 são eufemismos da nossa língua para ir ao banheiro (fazer as necessidades fisiológicas).
Fazer o numero 1= urinar. Fazer o numero 2= defecar.

Bolsonaro esqueceu que milhões de brasileiros são miseráveis (vide tag) moradores de favelas, de áreas de risco. Residem em casebres sem banheiro, sem água encanada, e não possuem dinheiro para comprar sabão ou sabonete.

Temos os moradores de rua. De acordo com a representante do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Tatiana Dias, a estimativa entre fevereiro e março do ano passado, momento de eclosão da pandemia, era de 221 mil pessoas. Tudo indica que o número aumentou, como reforça Veridiana Machado, representante do Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política Nacional para a População em Situação de Rua (Ciamp-Rua). “Não sabemos quantas pessoas estão em situação de rua, mas com a pandemia, é algo que nos salta os olhos. O número é expressivo, inclusive de crianças nos sinais pedindo dinheiro. Basta ir à rua e ver”, destacou.

O vereador do Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro (Republicanos), compartilhou nas suas redes sociais um vídeo ironizando as convocações de panelaço contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na noite desta sexta-feira, 15 de janeiro último. Nas imagens, um homem aparece batendo panela com um pênis de plástico enquanto grita "Fora, Bolsonaro".

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) atacou as parlamentares mulheres da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), nesta quinta-feira (8), dizendo que elas são “portadoras de vagina”. 

A deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) vai protocolar uma representação contra o filho 03 do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e, segundo ela, deputadas de todos os partidos devem endossar o documento.

“Ele agrediu todas as parlamentares, inclusive as do partido dele”, disse Joice.

Eduardo Bolsonaro tuitou: "MENINOS TEM PÊNIS, MENINAS TEM VAGINA". A frase é d um menininho no filme "Um tira no jardim de infância" (Arnold Schwarzenegger, anos 90). Mas se passar hoje na tv causará alvoroço na esquerda que acusaria o guri de transfóbico ou algo do gênero.

Interessante memória cinematográfica juvenil. Transcrevo dois trechos de entrevista de Eduardo Bolsonaro à Thais Bilenky da revista Piauí:

“Ai, meu Deus! Eu escondo esse álbum dele! Deus me livre!” Heloísa Wolf Bolsonaro, mulher de Eduardo, o filho Zero Três do presidente da República, está zangada com o marido. Ele acaba de pegar o book de fotos que fez quando tentou ser modelo na adolescência para mostrá-las à piauí. “Tu vai vazar?”, ela questiona, insistindo que não quer ver as imagens publicadas na imprensa. Nelas, Eduardo aparece com a pele bronzeada e o cabelo loiro em formato tigela, à la Nick Carter, o integrante bonitinho dos Backstreet Boys. Em uma das fotos, está apenas de sunga vermelha, recostado em uma mureta com as pernas cruzadas, em pose insinuante. “Coisa brega!”, reclama Heloísa. Eduardo olha para o seu segurança e dá um sorrisinho, como quem se diverte com o incômodo da mulher. Conta que nunca mostrou à imprensa o álbum de modelo. “Não me chama de homofóbico, mas nessa época sempre tinham uns caras que queriam ou me comer ou dar para mim”, diz ele. Vigilante, Heloísa observa: “Essa tua frasezinha foi anotada, Eduardo.”

Duda, como Eduardo Bolsonaro era chamado na infância e adolescência, cresceu na Tijuca, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Embora o bairro fosse longe da praia, ele vivia pegando onda. Subiu numa prancha de body-board aos 12 anos, inspirado por Flavio, o primogênito. Um ano depois, interrompeu a prática do novo hobby para ser submetido a uma cirurgia para corrigir uma ginecomastia, que é o crescimento excessivo das mamas em homens. Sofreu na mão dos colegas de escola. Seu apelido virou Buba, o nome de uma personagem intersexual na novela Renascer, exibida pela Rede Globo, em 1993. “Falavam que eu tinha vagina e pênis”, diz. “Eu dava risada. Às vezes caía na porrada.”Vídeo Show | Novelão: Buba guarda um grande segredo em Renascer, de 1993  Assista online | Globoplay

Curioso que numa família racista, homofóbica e sexista, o filho 04, Renan Bolsonaro postou um vídeo em suas redes sociais onde afirma que tem um pai de criação homossexual e negro.

“Domingo é aniversário do meu pai de criação. Ele é homossexual negro. Meu pai botou dentro da minha casa, da nossa casa pra cuidar de mim. No domingo é aniversário dele e vocês vão saber”, disse Renan.

No domingo (20), o filho de Bolsonaro postou a homenagem em seu Instagram: “Marcelo, ao longo desses anos todos, você tem sido um grande amigo para mim. Você me ensinou muito, especialmente a como me tornar uma boa pessoa. Sua empatia e seu carinho são contagiantes, e eu serei eternamente grato a Deus por tê-lo colocado em nosso caminho. Que neste aniversário seu coração possa transbordar com o dobro da felicidade que você trouxe para nossa família! Obrigado por tudo! Parabéns! Felicidades…”, escreveu.

Eliane Brum em outra reportagem explica "Por que Bolsonaro tem problemas com furos":

Em 18 de fevereiro, o antipresidente Jair Bolsonaroprecisava tirar o foco da morte do miliciano Adriano da Nóbrega, pessoa-chave para esclarecer o esquema de “rachadinhas” no gabinete de Flávio Bolsonaro, a relação da família Bolsonaro com as milícias que atuam no Rio de Janeiro e também quem mandou matar Marielle Franco – e por quê. A eliminação de Nóbrega, com vários indícios de execução, voltava a colocar em destaque as relações dos Bolsonaros com as milícias. Era preciso desviar a atenção. Como de hábito, Bolsonaro usou o velho truque: criou um novo fato ao atacar a jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de S. Paulo. A repórter, uma das mais competentes da sua geração, estava entre os jornalistas que denunciaram o uso fraudulento de nomes e CPFs para disparos de mensagens no WhatsApp em benefício de Bolsonaro. Uma de suas fontes, Hans River, ao depor na CPMI das Fake News do Congresso, disse que Patrícia teria tentado obter informações “a troco de sexo”, embora as trocas de mensagens entre os dois provem exatamente o contrário. Em sua coletiva informal diante do Alvorada, a mesma em que costuma mostrar bananas para os jornalistas, Bolsonaro atacou: “Ela [Patrícia] queria um furo. Ela queria dar o furo [pausa para risos] a qualquer preço contra mim”.

Este episódio, amplamente divulgado, revela mais do que o truque do manual dos novos fascistas para desviar a atenção do público. Bolsonaro tem problemas com furos. Em vários sentidos. Sua obsessão com o que cada um faz com seu ânus é notória. Está sempre tentando regular onde cada um coloca o próprio pênis. Volta e meia dá um jeito de falar de cocô, como fazem as crianças pequenas. Para ele, a vagina é um furo, visão bastante surpreendente para um homem com mais de 60 anos que já deveria, para o próprio bem, ter conhecido um pouco mais sobre o órgão sexual das mulheres. Chegou a dizer que a Amazônia “era uma virgem que todo tarado de fora quer”. Só um/a psicanalista que um dia recebesse Bolsonaro no seu divã poderia encontrar pistas para o que essa redução da sexualidade a uma coleção de furos – uns feitos para o estupro, outros proibidos para o sexo – significa. Nós, os governados por tal homem, só conseguimos entender que ele tem obsessão por furos, por cocô e por pênis. E que isso determina seu Governo.

No "Ensaio sobre fertilidade e esterilidade na Bíblia hebraica", Suzana Chwarts começa historiando:

"No que diz respeito à fertilidade, Israel é como todas as outras culturas do mundo. O ideal bíblico é o de fecundidade, abundância e multiplicidade – impulsos naturais de todas as civilizações. Este ideal está expresso no Si 128 :3-4 “Sua esposa será como vinha fecunda, na intimidade do seu lar. Seus filhos, rebentos de oliveira, ao redor de sua mesa. Essa é a bênção para o homem que teme o Eterno”. 

Todas as bênçãos de Israel focalizam a abundância e a fecundidade. Em Lv 26 Deus promete que trará

(...) chuvas no seu devido tempo, a terra dará os seus produtos, e a árvore do campo seus frutos (...) comereis vosso pão até vos fartardes, voltar-me-ei para vós e vos farei crescer e multiplicar; depois de vos terdes alimentado da colheita anterior, tereis ainda de jogar fora a antiga, para dar lugar à nova. 

Em Dt 28:4,

bendito será o fruto do teu ventre, o fruto do teu solo, o fruto dos teus animais, a cria das tuas vacas e a prole das tuas ovelhas. Bendito será o teu cesto e a tua amassadeira (...) Deus te concederá abundância de bens no fruto do teu ventre, no fruto dos teus animais, e no fruto do teu solo, este solo que Deus jurou a teus pais que te daria.

Aqui a "Fertilidade" tem a mesma importância que a "Abundância" que os cristãos nos Estados Unidos, na década de 1940, vão propagar como Teologia da Prosperidade, e importada para o Brasil somente na década de 1970.

Em 2015, tendo como fonte o Infomoneya revista Piauí destacava a impressionante riqueza dos pastores brasileiros:

1. Edir Macedo – fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, que também tem templos nos Estados Unidos, é de longe o pastor mais rico no Brasil, com um patrimônio líquido estimado pela Forbes de US$ 950 milhões, ou cerca de R$ 1,9 bilhão.

2. Valdemiro Santiago – fundou sua própria igreja, chamada Igreja Mundial do Poder de Deus, que tem mais de 900 mil seguidores e 4 mil templos. Segundo estimativa da Forbes, seu patrimônio líquido é de US$ 220 milhões, ou aproximadamente R$ 440 milhões.

3. Silas Malafaia – líder da maior igreja pentecostal do Brasil. O pastor está constantemente envolvido em escândalos relacionados à comunidade gay. “Ele é defensor de uma lei que poderia classificar o homossexualismo como uma doença e é uma figura proeminente no Twitter, onde tem mais de 440 mil seguidores”, disse a publicação.

4. RR Soares – é o mais ativo em multimídia entre os pregadores evangélicos. O religioso é compositor, cantor e televangelista. Como fundador da Igreja Internacional da Graça de Deus, Soares é um dos rostos mais conhecidos na televisão brasileira. Com isso, sua fortuna estimada pela Forbes, é de US$ 125 milhões, ou R$ 250 milhões.

5. Estevam Hernandes Filho e sua esposa Sonia – fundadores da Igreja Apostólica Renascer em Cristo, Apóstolo Estevam Hernandes Filho e sua esposa, Bispa Sonia, supervisionam mais de mil igrejas no Brasil e no exterior, incluindo a Flórida. Juntos, o casal tem um patrimônio líquido estimado pelo site em US$ 65 milhões dólares, ou R$ 130 milhões.O objeto inflado durante as manifestações do 7 de Setembro.

O deus da Prosperidade esteve bem representado no grande comício golpista de Jair Bolsonaro no dia 7 de Setembro último. Comentou Juan Arias:

"Um dos muitos detalhes simbólicos foi o surgimento na cena de um pênis gigante com as cores verde e amarelo da bandeira do Brasil, que foi apropriada pelas forças mais golpistas do país. O pênis inflado estava colocado sobre um carrinho vazio de supermercado. Estava rodeado por homens de idade.

Dizem que o presidente não sabe chorar, e muito menos pela dor alheia. Sua melhor identidade é a raiva; seu lema, a destruição; sua vocação, a terrorista; sua sexualidade, misteriosa; seu sonho de poder absoluto depois de ter ameaçado todas as instituições, com o agravante de que essas instituições parecem amedrontadas e acovardadas pelas ameaças fanfarronas do aprendiz de ditador e terrorista.

Melhor, mais simbólico e mais real do que o pênis gigante e grotesco verde e amarelo da avenida Paulista teria sido uma fila de carrinhos vazios de supermercado para simbolizar o drama que aflige e faz chorar em silêncio tantas famílias vítimas da incapacidade de governar de quem há muito deveria estar fora do poder para permitir que o país recupere a esperança que lhe foi tragicamente roubada. E como ensina a psicologia, nada é mais difícil para uma pessoa e para uma nação do que a desesperança que seca a alma e arrasta para a depressão". 

Bolsonaro perder a eleição porque fez um péssimo governo é um julgamento do eleitor. Voto contra Bolsonaro cidadão.

Para que não voltem a ser usados pela misteriosa Terceira Via, a campanha de Lula, para exemplificar, deve ser contra os slogans e símbolos que elegeram Bolsonaro. O ideário. As ideologias da direita, da extrema direita, do nazismo, do fascismo, do integralismo. Para que jamais sejam utilizadas novas cores para propagar antigas mensagens de um Brasil escravocrata, racista, preconceituoso, colorista, fundamentalista, com um militarismo golpista e cruel e um judiciário elitista e parasita. 

 

24
Ago21

A herança dos golpes militares

Talis Andrade

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por Roberto Bueno

A herança dos golpes militares é o sangue que jorra de corpos abertos e segue escorrendo pela memória histórica até que difíceis processos de acordo político e social sejam concretizados, mas não sem que os devidos julgamentos nas barras dos tribunais reconheçam os crimes dos agentes públicos e, finalmente, prestando homenagem às vítimas, a sociedade possa redirecionar energias para o futuro, e não mais manter-se absorta no passado, senão através da viva memória dos que foram excluídos violentamente do convívio. Ao transgredir o pacto civilizacional alavancado pelo peso da insanidade do uso da violência como instrumento político resta interditada qualquer expectativa de futuro.

Sofrer, testemunhar ou resistir aos miseráveis poderosos e sua prática trituradora de corpos e esperanças humanas não é tarefa simples nem destituída de riscos. Nunca foi, nem poderá ser. Rodolfo Walsh (1927-1977) foi admirável intelectual e jornalista argentino, capaz de articular brilhantes textos e arregimentar sua inteligência para resistir ao regime ditatorial militar argentino imposto em 24 de março de 1976, e que se apresentou em sua quadra histórica como grande desafio e que deixou profundas marcas para toda uma geração. Em Walsh sua agudeza recheada de compaixão e solidariedade vieram temperadas pela ousadia para a ação, alguém que exerceu o seu ofício em tempos perigosos, nos quais a imprensa deveria alinhar-se no mesmo sentido que os fuzis apontassem, pois colocar-se contra eles equivalia a assumir a proximidade do fim.

A trajetória intelectual de Walsh entrou com destaque para as mais luminosas páginas da história do jornalismo investigativo argentino – é notável que seu livro “Operação Massacre” (1957) antecipa “A sangue frio” (1966) de Truman Capote – enquanto a de seus carrascos militares para a lista de longos processos criminais, e posterior condenação por crimes de todo o gênero, incluindo sequestro de bebês, tortura, violações, roubo de bens, sequestros e assassinatos em série, algo que, dada a amplitude dos fatos, veio a ser qualificado como crimes de lesa-humanidade, que renderia prisão perpétua a Jorge Rafael Videla. O jornalismo investigativo de Walsh encontraria decisivo momento ao dedicar-se a redigir e publicar notícias que a imprensa sob censura não podia veicular e, assim, informar a população sobre os primeiros desaparecimentos, sequestros e o surgimento de corpos estraçalhados lançados ao mar pelos militares e posteriormente encontrados na costa da Argentina e do Uruguai.

Walsh escreveu último e importante texto publicado no dia 24 de março de 1977. Intitulado “Carta aberta de um escritor à Junta Militar”, um balanço crítico por ocasião do transcurso do primeiro ano da ditadura militar argentina encabeçada por Videla, secundada por Massera e Agosti. Regime classificado pelo distinto General Balza como violento e criminoso,as altas patentes como Videla traíram o instável regime de “Isabelita” Perón, sem embargo, legitimado constitucionalmente. Assestado o golpe que alguns setores de esquerda não acreditavam que poderia ocorrer, Videla e os seus logo dedicaram-se a organizar e implementar terrorismo de Estado para varrer o país do risco comunista, seguindo orientação similar a processo que iniciara no Brasil em 1964, assim como nos vizinhos Uruguai e o Chile– sob o sanguinário regime de Pinochet desde setembro de 1973 enquanto Perón era eleito em outubro do mesmo ano –, mas também no Paraguai e na Bolívia em suas diversas fases. No dia posterior ao da publicação de sua célebre “Carta aberta”, na esquina de ruas de Buenos Aires – San Juan e Entre Ríos –Walsh foi metralhado à luz do dia pelos sicários do regime militar cujo caráter homicida havia denunciado com todas as letras em sua “Carta aberta” no dia anterior. Walsh declarou fidelidade aos seus princípios mas também certeza e segurança das perseguições que sofreria por parte daqueles que, muitos anos depois, foram julgados e condenados por seus crimes contra a humanidade, dentre os quais Videla e Massera.

No dia em que sua filha María Victoria (Vicki), resistente Montonera, foi cercada juntamente com seus outros quatro companheiros por 150 militares, a opção de todos foi o suicídio antes do que deixar-se apanhar. A resistência lutou com as armas de que dispunha, poucas ante Forças Armadas treinadas, bem armadas e sem limites legais para o enfrentamento. Lutaram com os meios e possibilidades contra o regime político que se orientava e aplicava política econômica que ampliava a escala de suas atrocidades, realidade para a qual o texto de Walsh apontava ao dizer que “debe buscar se no solo la explicación de sus crímenes sino una atrocidade mayor que castiga a millones de seres humanos com la miseria planificada”. A miséria não era, como não continua sendo, uma variável casual em países ricos como a Argentina e o Brasil, mas sim fruto de planejamento para potencializar a concentração de riquezas.

A produção da miséria em países ricos como o Brasil requer efetivo planejamento, e no caso argentino Walsh também identificava uma variável para além da política econômica, a saber, a política sanitária, pois então, como hoje, são reduzidos os orçamentos sob a completa ciência de que são potencializadas as estatísticas de produção da morte, e assim concluía Walsh acusando a Junta Militar argentina: “Como si essas fueran metas deseadas y buscadas, han reducido ustedes el presupuesto de la salud pública a menos de un tercio de los gastos militares, suprimiendo hasta los hospitales gratuitos mientras centenares de médicos, profesionales y técnicos se suman al éxodo provocado por el terror, los bajos sueldos o la «racionalización»”. O propósito de matar era patente, e foi sempre evidente entre militares latino-americanos e os grupos de poder de ultradireita e sua indisfarçável aproximação neonazista.

Era contra este quadro de infâmia e opressão que grupos de resistência se insurgiram, mas em frente à selvageria do sistema era corriqueiro na época que os membros dos grupos resistentes ao regime tivessem em seu poder cápsula de cianeto para dispor da opção de não ter as suas vidas expostas a sofrimentos indescritíveis e escolher, assim, se, quando e como morrer. O grupo montonero com o qual se encontrava Vicki quando deparado com o massivo cerco dos chacais fardados após inexitosa resistência armada optou por colocar fim às suas vidas valendo-se de pistolas antes do que deixar que seus corpos fossem tomados pelos criminosos fardados cuja barbárie praticada nos seus aproximados 500 campos de concentração (“Centros Clandestinos de Detención” [CCD]) logo se tornaram amplamente conhecidos. Eram espaços onde a única regra era a exceção à ordem jurídica nacional. Ali tudo era possível, não havia lei nem sequer Deus, e talvez seja dubitável que o próprio Diabo ousasse adentrar naquele espaço gerido por militares treinados para a tortura e assassinato pelos EUA, “habilidades” também ensinadas aos seus colegas brasileiros, uruguaios, bolivianos, chilenos, paraguaios etc.

Impossibilitado de despedir-se fisicamente, Walsh escreveu emotiva carta a sua filha, ciente de que a sua opção pelo suicídio juntamente aos demais companheiros se devia ao pleno conhecimento do tratamento que era reservado aos aprisionados pelo regime dos criminosos fardados, posto que já corriam múltiplos testemunhos a respeito do que sucedia aos milhares que haviam caído, tratamento que não seria admitido aos prisioneiros de verdadeira guerra como aquela em que intervieram os militares no enfrentamento com a Inglaterra pelas ilhas Malvinas, na qual não se contou sequer um caso próximo de tratamento de militares ingleses como as Forças Armadas argentinas reservaram aos seus próprios cidadãos.

Aos assassinos fardados decorados com altas patentes e baixo caráter que ocupavam posições de mando nas Forças Armadas argentinas durante o regime instaurado em 24 de março de 1976, assim como aos seus “colegas” latino-americanos, não lhes interessava submeter-se a quaisquer convenções internacionais, códigos de honra ou a celebração prática das virtudes militares, e nem sequer a preceitos cristãos. O seu exclusivo dínamo era o sangue vertido de corpos dilacerados, que lhes servia como trágico líquido cujo poder embriagante ocorre tão somente em mentes bárbaras. São estas que decidiram pela aplicação da violência militar sobre objetivos não militares, algo injustificável, criminoso e punível como o mais grave dos delitos, em não menor escala quando perpetrados contra populações civis, e através da aplicação do direito interno quando as vítimas são a sua própria gente.

 

11
Mai21

Chacina em Jacarezinho: um rio de sangue corta o Rio de Janeiro

Talis Andrade

jacarezinho por thiago.jpgA chacina de Jacarezinho aconteceu no dia seguinte à agenda que reuniu o governador, o comandante do Gabinete de Segurança InstitucionalMarcelo Bertolucci e o presidente Jair Bolsonaro.

"O Rio de Janeiro vive uma crise civilizatória que, há muito, decretou o fracasso do nosso modelo de sociedade", escrevem Bernardo Cotrim, jornalista, e Noemi Andrade, diretora do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da UFRJ e da CUT-RJ, em artigo publicado por Rede Brasil Atual:

A favela do Jacarezinho, na zona norte do Rio de Janeiro, amanheceu ao som de helicópteros e tiros. A restrição explícita que vigora desde junho de 2020, quando o STF suspendeu operações policiais em favelas (salvo hipóteses absolutamente excepcionais, e com obrigação de comunicar o Ministério Público), foi aparentemente driblada pela Polícia Civil, já que a comunicação ao Ministério Público do Rio de Janeiro aconteceu horas depois do início da ação. A Operação Exceptis, que investiga o aliciamento de crianças e adolescentes para ações criminosas, mobilizou enorme contingente policial para a favela. O saldo da barbárie é, até agora, de 25 mortes na chacina do Jacarezinho, configurando a mais sangrenta operação policial já realizada no estado. Entre as vítimas fatais, um policial e “vinte e quatro suspeitos”. A polícia, no entanto, não informou as identidades nem as circunstâncias em que foram mortos.

Os relatos dos moradores e as cenas que circulam pela rede falam por si: dois passageiros foram atingidos no metrô, na altura da estação de Triagem; uma gestante, com parto marcado, foi impedida de sair de casa; uma noiva perdeu o próprio casamento. Em frente a unidade básica de saúde de Manguinhos, uma fila de pessoas que aguardava a vacinação contra covid-19 correu a procura de abrigo depois que a unidade de saúde teve a abertura inviabilizada pela operação.

Famílias inteiras trancadas em casa, intoxicadas pelo gás das bombas atiradas pela polícia, enquanto um rio de sangue corria pela favela. Mortos com marcas de tiros nas costas, um salão de beleza destruído pela polícia na perseguição e execução de um suspeito. Uma pessoa já baleada deitada no chão, sem oferecer risco, foi assassinada com mais quatro tiros. No registro mais impactante, o corpo de uma vítima foi colocado sentado em uma cadeira com o dedo na boca. Barbárie.

Na entrevista coletiva, realizada ao final da operação, faltou explicação nas declarações do delegado Oliveira, que é subsecretário operacional da Polícia Civil, mas sobraram autoelogios e verborragia ideológica reacionária, com a complacência grotesca dos presentes. “Não estamos comemorando, mas tiramos vários criminosos de circulação”; “a polícia sempre se fará presente para defender a sociedade de bem”; “o ativismo judicial prejudica a ação policial e fortalece o tráfico”; “a Polícia Civil não irá se furtar a garantir o direito de ir e vir da sociedade de bem” foram algumas das pérolas proferidas pelo comandante da Polícia Civil, entremeadas com críticas aos “pseudoespecialistas em segurança pública” e bravatas diversas contra “ativistas e ONGs”, chegando ao cúmulo de responsabilizar estes setores pela morte do policial civil na operação.

A entrevista foi encerrada abruptamente com um seco “o combinado não sai caro” proferido pelo delegado no momento em que acabaram as perguntas dos repórteres de programas sensacionalistas e jornalistas de outros veículos se preparavam para apresentar suas questões.

A falência da política de guerra às drogas não é novidade. Em vigor no estado há décadas, sem interrupção, não há sinal de enfraquecimento do poder do tráfico. Assusta, no entanto, a banalidade da violência: uma operação contra a cooptação de crianças e adolescentes pelo tráfico, organizada para cumprir 21 mandados de prisão, invadiu a favela com blindados e helicópteros e deixou um rastro de 25 mortos. Mandados cumpridos? Apenas seis. Mas, na opinião da Polícia Civil, a operação foi “um sucesso”, e lamenta-se apenas a morte do policial. O restante, “24 vagabundos”, são vidas descartáveis, em um conceito elástico que incorpora cada vez parcelas maiores da juventude negra e favelada nos seus limites.

O relatório final da CPI realizada no Senado, em 2016, atesta o massacre de jovens negros em curso no Brasil. Segundo o texto, “a quantidade de jovens mortos no Brasil é um problema social que demanda a adoção de providências urgentes, profundas e multidimensionais. Além disso, também se concluiu que o Estado brasileiro precisa se debruçar mais atentamente sobre o racismo existente de maneira estrutural nas políticas públicas de modo geral. Se nada for feito, nossos jovens, sobretudo a nossa juventude negra, continuarão sendo mortos precocemente, deixando famílias desprovidas de seus filhos e o Brasil privado de toda uma geração de crianças e adolescentes”.

De lá pra cá, o problema se agravou. A ascensão da extrema direita, com a vitória de Bolsonaro para a presidência, e de Wilson Witzel para governador do Rio de Janeiro, endossou a barbárie e promoveu, na prática, uma licença para matar: Em 2019, foram 1.814 mortos pela polícia fluminense; destes, 86% são negros.

alta de mortes continuou durante a pandemia, motivando a proibição de operações policiais pelo STF. Mesmo assim, em outubro de 2020, houve um aumento de 415% de mortes, obrigando o Supremo a cobrar explicações do governador em exercício (com o afastamento de Witzel), Claudio Castro.

Agora governador em definitivo, com a conclusão do impeachment de WitzelClaudio Castro mostra seu cartão de visitas. A operação no Jacarezinho aconteceu no dia seguinte à agenda que reuniu o governador, o comandante do Gabinete de Segurança InstitucionalMarcelo Bertolucci e o presidente Jair Bolsonaro. O alinhamento absoluto entre governador e presidente promete novos atos de delinquência. E a ação de hoje, que registra o maior número de mortos em uma única operação no RJ, poderá durar pouco tempo no topo do ranking da morte.

Rio de Janeiro vive uma crise civilizatória que, há muito, decretou o fracasso do nosso modelo de sociedade. Escolher entre a vida e a morte tornou-se um imperativo, ou o ciclo de violência continuará alimentando o tráfico, as milícias e aqueles que lucram com os corpos empilhados, ao passo em que uma parcela expressiva da população, não obstante a convivência forçada com a negação de direitos, engrossa a macabra estatística da negação da vida.

 

10
Mai21

Fachin envia a Aras vídeo com indícios de "execução arbitrária" no RJ

Talis Andrade

Colégio Marista de Natal provoca polêmica com charge mostrando racismo e  violência da PM

 

por Sérgio Rodas /ConJur

 

O ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin pediu, nesta sexta-feira (7/5), que o procurador-geral da República, Augusto Aras, investigue se houve abusos policiais, inclusive execuções, na operação desta quinta (6/5) que deixou 29 mortos na favela do Jacarezinho, zona norte do Rio de Janeiro.

Ao encaminhar a Aras ofício e vídeos enviados a seu gabinete pelo Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular, ligado à Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Fachin apontou que "os fatos relatados parecem graves e, em um dos vídeos, há indícios de atos que, em tese, poderiam configurar execução arbitrária".

"Certo de que vossa excelência, como representante máximo de uma das mais prestigiadas instituições de nossa Constituição cidadã, adotará as providências devidas, solicito que mantenha este relator informado das medidas tomadas e, eventualmente, da responsabilização dos envolvidos nos fatos constantes do vídeo", disse o ministro.

Em 5 de junho de 2020, Fachin concedeu liminar para limitar, enquanto durar a epidemia de Covid-19, as operações policiais em favelas do Rio a casos excepcionais, devendo ser informadas e acompanhadas pelo Ministério Público. A decisão foi confirmada pelo Plenário do STF em agosto.

Decisão descumprida
Na petição, o Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular afirmou que a decisão do STF vem sendo descumprida pelas Polícias Civil e Militar do Rio. E destacou que o Ministério Público não está fiscalizando as operações.

A entidade citou estudo do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni-UFF). De acordo com a pesquisa, a liminar do Supremo que restringiu as operações policiais no Rio reduziu as mortes causadas por agentes de segurança em 34%, salvando pelo menos 288 vidas em 2020.

O Geni-UFF informou que houve dois momentos desde a liminar proferida por Edson Fachin em 5 de junho de 2020. Nos quatro primeiros meses (junho a setembro), a decisão parece ter sido razoavelmente cumprida. No entanto, no segundo momento, que se inicia em outubro, a liminar passou a ser "sistematicamente violada", com o aumento de operações e mortes.

Além disso, o Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular apresentou ao ministro imagens que apontam abusos de policiais na operação no Jacarezinho.

Dessa maneiro, a entidade pede o cumprimento da decisão na ADPF 635. Também requer que o governador do Rio, Cláudio Castro (PSC), esclareça os procedimentos adotados para evitar abusos de policiais e indique os motivos e resultados da operação no Jacarezinho.

O grupo ainda quer que o Ministério Público do Rio informe como vem fiscalizando as ações policiais.

Clique aqui para ler o ofício
ADPF 635

Necropolítica

"Nunca existiu presunção de inocência nas favelas do Rio de Janeiro", dizem advogados, leia reportagem de Sérgio Rodas 

 

07
Mai21

“Banho de sangue”, diz representante da OAB sobre ação no Jacarezinho

Talis Andrade

Operação policial no Jacarezinho, Rio de JaneiroImagens mostram banho de sangue em operação policial no Jacarezinho

Ruas ficaram marcadas com o sangue dos 25 mortos

 

Ordem vai cobrar perícia independente para apurar as mortes de 24 pessoas durante a operação da Polícia Civil

por Adriana Cruz /Metrópoles
 
Patrícia Félix, uma das representantes da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), disse nesta sexta-feira (7/5) que a entidade vai cobrar perícia independente em relação às mortes de 24 pessoas durante a operação da Polícia Civil na comunidade do Jacarezinho, no Rio de Janeiro.
 

“O que conseguimos ver foram relatos de moradores que estão abalados pela polícia ter entrado e matado as pessoas dentro das casas. Foi um banho de sangue”, afirmou.

Sobre elementos de execução, a comissão está recebendo vários materiais, como o relato de parentes e vídeos. Dos 24 suspeitos mortos durante a operação, apenas três tinham mandados de prisão.

“A pobreza não pode ser criminalizada. Na zona sul isso não acontece. A família tem reclamado do tratamento pós-morte. Independentemente de ser bandido, não tem que ter pena de morte. As famílias falam que muitos deles se entregaram e foram assassinados. Uma operação com 25 mortos não é de sucesso”, disse Patrícia Félix.
 

A Polícia Civil informou que essas pessoas perderam a vida porque reagiram e tentaram matar integrantes das forças de segurança. Além dos suspeitos, o policial civil André Frias, de 48 anos, foi morto no Jacarezinho, totalizando 25 óbitos. Outras seis pessoas foram presas.

Também nesta sexta, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu ao procurador-geral da República, Augusto Aras, investigação sobre a operação policialPara o magistrado, há indícios de “execução arbitrária”.Imagens mostram banho de sangue em operação policial no Jacarezinho

Menina de 8 anos ficou traumatizada após ter dois homens mortos em seu quarto

 

Em nota, a OAB destacou que “operações de enfrentamento ao crime organizado são necessárias, mas devem ser feitas com inteligência e planejamento. Salientamos que o norte permanente da atuação das forças de segurança deve ser a preservação de vidas, inclusive dos próprios policiais”.

A entidade continua: “Independentemente das circunstâncias, as forças de segurança devem cumprir suas funções respeitando o universo de direitos e garantias fundamentais previsto na Constituição Federal. Nunca será aceitável que um braço do Estado opere acima das leis”.

A direção do Hospital Municipal Souza Aguiar informou que, dos 20 corpos que chegaram à unidade, 13 ainda estão aguardando remoção para o IML, que vai avaliar os tipos de lesão e confirmar a identificação de cada um. O pedido de remoção é emitido pela Polícia Civil e a retirada do corpo é feita pela Defesa Civil.

 

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