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O CORRESPONDENTE

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O CORRESPONDENTE

04
Set23

Como super-ricos podem continuar driblando impostos

Talis Andrade
 
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Pressionado a elevar a arrecadação para tirar as contas públicas do vermelho, o presidente de Luiz Inácio Lula da Silva quer aumentar impostos sobre os mais ricos, medidas que dependem de aprovação no Congresso Nacional.

A proposta casa bem com o discurso histórico do PT de combater as desigualdades, mas é novidade nas gestões petistas, já que os primeiros governos de Lula e Dilma Rousseff evitaram mexer nos bolsos dos mais endinheirados e optaram por distribuir renda por meio de programas sociais como o Bolsa Família.

Aumentar tributos é uma agenda impopular e, quando atinge os mais ricos, enfrenta o obstáculo adicional do forte poder de influência política desse grupo.

"Não são medidas fáceis para o Congresso deliberar", reconheceu o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na quinta-feira (31/8), quando o governo anunciou necessidade de elevar a arrecadação em R$ 164 bilhões no próximo ano para zerar o rombo nas contas da União.

Especialistas ouvidos pela BBC News Brasil se dividem sobre o apoio às propostas do governo, mas concordam num ponto: se os novos tributos não forem bem desenhados, há o risco de os contribuintes de maior renda continuarem driblando o Fisco — por exemplo, modificando seus investimentos ou o funcionamento de suas empresas.

É o que se chama de elisão fiscal — quando o contribuinte lança mão de brechas legais para fugir dos impostos.

Estão na mira do Fisco medidas como taxar fundos exclusivos para milionários e investimentos no exterior, voltar a tributar lucros e dividendos distribuídos por empresas, e novas regras no imposto sobre herança para impedir que famílias mais ricas evitem essa cobrança.

“Aqui no Brasil, o mais pobre paga mais imposto de renda do que o dono do banco, porque só desconta mesmo de quem vive de salário. As pessoas que vivem de rendimento, as pessoas que recebem lucro no final do ano, terminam não pagando imposto de renda”, disse Lula no programa semanal do governo Conversa com o Presidente, transmitido pelo Canal Gov, logo após o Executivo enviar ao Congresso propostas para taxar fundos de super ricos.

A fala de Lula tem base em números. Um novo levantamento do Sindifisco (sindicato que representa os auditores-fiscais da Receita Federal) mostrou que contribuintes milionários pagam no Brasil alíquotas menores de imposto de renda do que profissionais de renda média e alta, justamente porque uma parcela relevante de seus ganhos está isenta de tributos.

Segundo esses dados, contribuintes que declararam em 2021 ganhos totais acima de 160 salários mínimos (R$ 2,1 milhões no ano, ou R$ 176 mil por mês) pagaram, em média, uma alíquota efetiva de Imposto de Renda (IR) de menos de 5,5%.

A alíquota efetiva é o percentual da renda total que de fato foi consumida pelo IR. É uma taxa menor do que a parcela paga por aqueles com renda mensal na faixa de R$ 7 mil (alíquota efetiva média de 6%). Ou menos da metade da cobrada sobre contribuintes com ganho mensal na casa de R$ 21 mil (alíquota efetiva média de 11,25%).

Alguns economistas, como Sergio Gobetti (Ipea) e Samuel Pessôa (FGV), dizem que para mudar essa realidade também é preciso rever regimes especiais de tributação, como o Simples Nacional, que acaba beneficiando contribuintes de renda elevada, como profissionais liberais e donos de pequenas empresas.

Para eles, alcançar esse público é importante, já que também se trata do topo da pirâmide brasileira. Segundo dados do IBGE, a renda média mensal per capita entre o 1% mais rico da população foi de R$ 17.447 em 2022.

Mexer no Simples Nacional, porém, enfrenta resistência ainda maior no Congresso e não tem sido citada pelo governo.

Entenda melhor a seguir algumas das propostas em discussão, os argumentos a favor e contra, e os desafios para evitar que os mais ricos continuem pagando menos impostos mesmo que essas medidas sejam aprovadas.

 

Primeiro alvo: fundos de milionários

Está nos planos do governo uma ampla reforma do Imposto de Renda que mexeria na tributação de empresas e voltaria a taxar lucros e dividendos distribuídos a seus acionistas — importante fonte de renda dos brasileiros mais ricos e que hoje não sofre qualquer tributação (entenda melhor ao longo da reportagem).

O Brasil é um dos poucos países que não taxa esse tipo de renda. Só em 2021 (dado mais recente disponível), foram pagos R$ 555,68 bilhões em lucros e dividendos pelas empresas, dinheiro que entrou no bolso dos acionistas limpo de taxas.

Mas o próprio ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já disse que a questão será tratada de “forma cautelosa”, por duas razões: demandaria uma revisão também de tributação direta das empresas e afetaria não só milionários, mas brasileiros de renda média alta, como profissionais liberais e donos de empresas menores — o que aumenta a dificuldade de aprovação.

“Não dá para fazer de forma atabalhoada. Primeiro porque pode não sair. E segundo porque pode não produzir os resultados que nós desejamos”, reconheceu em julho, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo.

Haddad escolheu como medida inicial ampliar a taxação sobre investimentos que atendem brasileiros milionários — são os chamados fundos exclusivos (fechados para apenas um investidor) e os fundos offshore e trusts (investimentos no exterior).

Uma medida provisória e um projeto de lei foram encaminhados ao governo em agosto, e, após negociações, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), se comprometeu a pautar as propostas nas próximas semanas.

O governo conta com dois fatores para conseguir a aprovação: são aplicações que atendem uma parcela muito pequena de brasileiros e que hoje são menos taxadas que outros tipos de investimento.

Esses dois tipos de fundos são tributados, atualmente, apenas no saque das aplicações. A proposta do governo é que os investidores passem a pagar uma taxa sobre seus rendimentos anuais, como já ocorre com outras aplicações.

"É uma legislação anacrônica, que não faz sentido nenhum. Não é tomar nada de ninguém, é cobrar rendimento deste fundo, como qualquer trabalhador paga imposto de renda", já disse o ministro, em uma entrevista sobre a taxação dos fundos exclusivos.

A previsão do governo é de arrecadar R$ 24 bilhões entre 2023 e 2026 com as duas medidas.

No caso dos fundos exclusivos, a Medida Provisória enviada ao Congresso prevê que essas aplicações passarão a ter a cobrança periódica do come-cotas, de 15% a 22,5% sobre os rendimentos, como ocorre com outros fundos no país.

Segundo estimativas do Executivo, hoje 2,5 mil brasileiros (cerca de 0,001% da população) contam com recursos aplicados em fundos exclusivos, que acumulam R$ 756,8 bilhões e respondem por 12,3% dos fundos no país.

Já o projeto de lei que trata das offshores e trusts prevê tributação anual de rendimentos de capital aplicado no exterior com alíquotas progressivas de 0% a 22,5%.

Para viabilizar a aprovação da proposta, a Fazenda acolheu sugestão do presidente da Câmara, Arthur Lira, para retirar a incidência do imposto sobre a variação cambial — ou seja, uma valorização da aplicação no exterior devido à valorização do dólar, por exemplo, não entraria no rendimento a ser tributado.

Esses investimentos fora do país são muito usados por famílias ricas para evitar o imposto sobre herança (ITCMD). Isso porque a Constituição de 1988 exige uma lei complementar para regulamentar a taxação de herança no exterior, mas passaram-se décadas sem que o Parlamento fizesse isso.

Enquanto essa lei complementar não for aprovada, o valor investido nesses fundos continuará isento do ITCMD, mesmo com a eventual aprovação da nova tributação anual proposta pelo governo.

Para o consultor tributário Everardo Maciel, secretário da Receita Federal durante o governo Fernando Henrique Cardoso, a gestão Lula está certa em tentar igualar o tratamento de diferentes tipos de fundos. Ele avalia, porém, que os mais ricos continuarão buscando outras opções de investimento isentas, como Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) e Letra de Crédito Imobiliário (LCI).

“O contribuinte não é um cordeirinho que fica aguardando você fazer as coisas (novos tributos) e dá o pescoço, não. Ele vai dar saída (dos investimentos). Ele pode ter dois caminhos: aplicar no exterior ou pagar em outros papéis que não têm imposto”, ressalta.

 

Taxar ou não taxar dividendos?

Por outro lado, Maciel é contra a volta da tributação de lucros e dividendos. Foi durante sua gestão na Receita Federal que o Congresso aprovou o fim dessa taxação.

O Brasil é um dos poucos países do mundo que não taxa esse tipo de renda. Isso não quer dizer, no entanto, que o dinheiro que entra no bolso do acionista nunca foi tributado.

Sobre o lucro das empresas incide, via de regra, dois tributos: o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), cujas alíquotas somam 34%. É uma tributação alta na comparação internacional, mas estudos indicam que, na prática, empresas brasileiras pagam alíquotas menores, devido a incentivos fiscais e regimes especiais para companhias menores.

Maciel argumenta que isentar dividendos e taxar diretamente o lucro das empresas é uma maneira mais eficaz de arrecadação. Segundo ele, a mudança foi implementada em 1996 porque os empresários adotavam medidas para driblar a cobrança sobre dividendos, fazendo uma distribuição disfarçada de lucros, ao pagar contas pessoais com recursos das empresas, por exemplo.

“O fato é que a força de trabalho da receita era concentrada estritamente para ver distribuição disfarçada de lucro”, afirma.

Depois da mudança, ele ressalta, houve um forte aumento de arrecadação sobre o lucro das empresas.

“Temos três maneiras de tributar (o lucro): uma só na empresa, outra só na distribuição de dividendos, e a terceira nos dois. A escolha deve ser feita pela forma que for mais eficiente. Do ponto de vista da sonegação, é muito mais fácil fazer planejamento tributário fazendo a tributação nessas duas formas (nas empresas e na distribuição de dividendos), do que fazer só na empresa”, reforça. (continua)

09
Ago20

Bolsonaro sabe o que esconde e se preparou para montar sistema protetor

Talis Andrade

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por Janio de Freitas

- - -

O lento caminhar dos inquéritos sobre as relações sigilosas dos Bolsonaro e Fabrício Queiroz tem um mérito preliminar: baseia-se em investigações, trabalho de promotores e polícia do Rio, e não em chantagistas delações bem premiadas, tipo Lava Jato curitibana.

Outro mérito do gênero, não assola o sensacionalismo que tira imprensa e TV do jornalismo para os interesses políticos e econômicos. Mas estende com perigo, sob o cerco de atingidos descontrolados, uma situação com implicações importantes na ordem institucional. Por mais grave que seja, o já revelado está longe do que pode alcançar.

Bolsonaro sabe o que esconde e se preparou desde a campanha para montar um sistema protetor. O caso ainda em curso do dossiê sobre antifascistas, montado no Ministério da Justiça, é um exemplo que independe do documento, aliás, existente mesmo. Foi feito na Seopi, Secretaria de Operações Integradas, como revelado no UOL pelo repórter Rubens Valente.

Um serviço criado no ministério para intermediar ações conjuntas de polícias federal e estaduais. Nada a ver com espionagem política, judicial ou qualquer outra.

Até 1º de janeiro de 2019. No dia mesmo da posse, Bolsonaro decreta, encoberta pelos acontecimentos públicos, a transformação da Seopi em serviço de informação interna. Medida, claro, articulada com Sérgio Moro, que assumia o ministério e viria a conduzir a alteração. Dela foi incumbido o coronel Gilson Mendes Libório, demitido pelo atual ministro André Mendonça quando revelado o dossiê.

A Seopi de espionagem teve uma citação pública, pelo próprio Bolsonaro, embora continuasse desconhecida. Durante a reunião de botequineiros no Planalto em 22 de abril, e antes que Abraham Weintraub satisfizesse Bolsonaro com o ataque aos ministros do Supremo, o assunto relevante foram os serviços de informação.

Bolsonaro atacou todos, por omissão das informações que lhe interessavam, até berrar uma ressalva: “Menos o meu, particular”. Seguiu-se orgulhoso elogio.

Desde então, muitos se perguntaram que serviço particular seria aquele. A Seopi. Recriada para as necessidades de Bolsonaro & família. Com serviços como o dossiê sobre 579 policiais e três professores antifascistas, quer dizer, democratas perigosos. Datado de junho, pode ser o mais recente, mas não é imaginável que seja o único em 18 meses de “serviço particular” de informação espiã para Bolsonaro.

Com a revelação que prejudica a continuidade da espionagem bolsanara pela Seopi, reaparece, às pressas, a criação de um Ministério da Segurança Pública. Um ministério para a segurança dos Bolsonaro. O nome, com máscara de público, é irrelevante, seu cinismo não precisa de exame.

Por ora, mais interessante será verificar, por exemplo, se os 27 depósitos com R$ 87 mil, feitos por Fabrício Queiroz e Márcia Aguiar em conta de Michelle Bolsonaro, foram para a destinatária ou não.

O primeiro depósito descoberto, de R$ 24 mil, nunca motivou nela uma só palavra que fugisse ao seu modo discreto e elegante. Nem mesmo por uma notinha, salvo seja. E nisso há algum significado, até por ser ela muito mais habilitada a pensar e falar do que Bolsonaro, inventor da patetice de empréstimo de R$ 40 mil a Queiroz.

Aprofundado, o comprometimento do nome de Michelle sujeita-a a efeitos judiciais comuns. O que seria uma vergonha a mais, mas não um sismo institucional.

Este é previsível com o avanço, se houver, dos inquéritos no Rio sobre os Bolsonaro. Os inquéritos atuais, que dos possíveis e justific —cala-te boca.

No coração

Ex-secretário da Receita Federal, de comprovada competência, Everardo Maciel diz, a um só tempo, o mínimo e tudo sobre a “reforma” tributária projetada por Paulo Guedes: “Aumentam a carga tributária da escola e diminuem a do carro de luxo”.

Imitando-o: criam imposto sobre o livro e conservam a dispensa de R$ 300 bilhões de impostos, quase todos de graúdos.

Leia livros

A paciência com o confinamento se esvai. Ocasião propícia para a leitura de “O Retalho” (Ed. Todavia).

O relato de um sobrevivente do ataque de terroristas islâmicos ao sério-humorístico “Charlie Hebdo”, que comoveu o mundo, é uma segunda comoção causada pelo crime. Philippe Lançon , atingido por uma bala no rosto, volta ao mundo pela comunhão indissolúvel que cria entre sabedoria e paciência.

Duas carências nossas.

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