MPPR denuncia Ricardo Barros por esquema milionário de propina na companhia de energia do Paraná
Denúncia afirma que o deputado, líder do governo Bolsonaro, recebeu mais de R$ 5 milhões da Galvão Engenharia por agilizar compra de eólicas da companhia pela Copel
O deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo Bolsonaro na Câmara, foi denunciado pelo Ministério Público do Paraná (MPPR) por cobrança de propina, lavagem de dinheiro e tráfico de influência em transações realizadas pela Copel – companhia estatal de energia do Paraná. A denúncia envolve a aquisição de duas empresas do setor eólico, ambas da Galvão Engenharia, a um custo de R$ 196,9 milhões. A investigação aponta que o parlamentar teria recebido da empreiteira cerca de R$ 5,1 milhões por facilitar junto à direção e a funcionários da estatal o fechamento dos negócios. Movimentações de lavagem do dinheiro podem ter rendido ainda mais ao político.
Outras quatro pessoas foram denunciadas por envolvimento nos episódios, que também teriam chegado a envolver, em determinado momento, membros da cúpula do governo do Paraná, à época sob a gestão do governador Beto Richa (PSDB). Entre os que vão responder pelos crimes estão ainda os executivos da Galvão Eduardo Queiroz Galvão e Jean Alberto Luscher de Castro, delatores do esquema, e dois empresários próximos ao político.
A investigação relata episódios ocorridos quando Barros comandava a extinta Secretaria da Indústria, Comércio e Assuntos do Mercosul do Paraná. O deputado chefiou a pasta entre janeiro de 2011 e março de 2014 e deixou o cargo para concorrer às eleições gerais de outubro daquele ano, em data limite para cumprimento da legislação eleitoral.
Nas eleições de 2014, o maringaense voltou a ser eleito deputado federal. Segundo o MP, há indícios de que a maior parte da propina recebida pelo parlamentar por ter articulado a venda dos empreendimentos eólicos à Copel tenha sido repassada ilegalmente por executivos da Galvão Engenharia como doação eleitoral, motivo pelo qual as investigações foram conduzidas pela Promotoria de Justiça Eleitoral.
Apesar de o processo correr sob sigilo, o Plural teve acesso à denúncia, em trâmite na 3ª Zona Eleitoral de Curitiba. O deputado repudiou os fatos encaminhados pelo Ministério Público.
Transações suspeitas
A compra das eólicas que teriam rendido a Barros cifras milionárias ilegais foi efetuada pela companhia de energia paranaense em dois momentos distintos: o primeiro em novembro de 2011; e o segundo, em dezembro de 2013, como parte de um projeto da estatal de expandir a marca no mercado de fontes alternativas.
Os parques, no Rio Grande do Norte, pertenciam à São Bento Energia e Dreen Brasil, operadas pela subsidiária de energia do Grupo Galvão. Na primeira negociação, as empresas tiveram 49,9% dos ativos alienados à Copel.
O documento elaborado pela promotora Michelle Ribeiro Morrone Fontana afirma que, “em razão de uma pretensa influência que teria sobre integrantes do corpo diretivo e técnico da Copel”, Barros “solicitou e recebeu, de executivos do grupo Galvão que o haviam procurado, valores ilícitos, parte em espécie e parte mediante doações eleitorais ideologicamente falsas”.
Nesse período, a esposa de Barros, Cida Borghetti (PP), ainda não era vice-governadora do estado. Mesmo assim, a denúncia indica que o deputado gozava de trânsito privilegiado no governo.
Em demonstração de influência, o então secretário teria participado presencialmente das tratativas da compra das eólicas, mesmo sem qualquer ligação oficial com os trâmites. Ele também tinha, segundo a promotoria, acesso à agenda de reuniões relativas ao projeto e conseguia, com isso, manter informados os executivos Galvão envolvidos diretamente nos acordos.
Para a primeira tratativa com a Copel, fechada em dezembro de 2011, Barros teria recebido R$ 1,55 milhão – resultado do pedido de R$ 1 milhão fixo e mais 1,5% sobre o preço pago pela estatal pelos 49,9% dos ativos iniciais. O valor final do negócio oficial foi de R$ 49,4 milhões. O total solicitado pelo trabalho de influência, mostra o MP, foi pago em cinco a parcelas e, estrategicamente, bem depois do fim das negociações. O primeiro embolso foi em 3 de outubro de 2013, e o último, no dia 27 de março de 2014 – às vésperas de deixar o governo Richa.
O Ministério Público encontrou registros dos repasses em uma planilha elaborada por Eduardo Galvão. Apenas a primeira parcela da propina, de R$ 150 mil, teria sido paga na sede da companhia beneficiada. Já os demais montantes foram diluídos e entregues em encontro do parlamentar com José Ubiratan Queiroz, em um flat na Vila Olímpia, em São Paulo. Ubiratan Queiroz foi ex-diretor corporativo da Galvão Investimentos, outro nome sob a holding Grupo Galvão.
Lavagem de dinheiro
A origem dos valores, aponta o retrato feito pelo MP, foi dissimulada por esquemas de lavagem de dinheiro. Há indícios de que Barros usou empresas em seu nome e firmou contratos de gaveta para aplicar o dinheiro em empreendimentos imobiliários, os quais teriam rendido a ele, com as vendas, uma quantia ainda mais farta.
Para um dos negócios, no Jardim Azaleia, em Maringá, foi direcionados R$ 1,2 milhão do dinheiro pago pela Galvão Engenharia. Em modo oficial, o empreendimento foi encabeçado pela imobiliária maringaense New Center Construções, de Elio Alvos Pereira, empresário próximo à família do parlamentar. Mas documentos colhidos durante mandado de busca e apreensão cumprido em setembro do ano passado pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), braço do MPPR, revelaram a existência de “acordo de gaveta” que garantiria a Barros cerca de 18,57% dos lucros do negócio.
Para evitar ter o nome associado às transações, o deputado usou documentos e contas bancárias das empresas MRC Incorporadora e Empreendimentos e International Bilingual Schools, em Maringá, das quais era sócio. Parte dos pagamentos relacionados foram feitos por Delmo Sérgio Vilhena, que aparece como uma espécie de operador de Barros no esquema. A operação do Gaeco em setembro passado também chegou a um endereço de Vilhena, em São Paulo.
Com a última parcela da suposta propina, de R$ 200 mil, Barros investiu em outro loteamento de sua cidade natal, no distrito de Gleba Caxias. Outro contrato frio firmado com a New Center – negociante oficial – acabou garantindo ao líder de Bolsonaro na Câmara 50% dos lotes do empreendimento. O valor da parte final foi depositado na conta dos antigos proprietários do imóvel por Vilhena, segundo revelaram as delações e os documentos usados pelo MPPR.
Doações eleitorais
A denúncia formalizada à Justiça acusa ainda o deputado paranaense de ter lavado dinheiro por meio de mecanismos de doação eleitoral.
Prometendo agilizar o trâmite da compra do restante dos ativos da São Bento Energia e Dreen Brasil pela Copel, o parlamentar solicitou aos delatores vantagem indevida de R$ 1,2 milhão e mais 2,5% sobre o valor final da negociação – parte esta que, conforme o documento, seria destinada “a outras pessoas, não identificadas, que também integrariam a cúpula do Governo do Estado do Paraná.
O pedido teria sido feito em março de 2013, na sede do Partido Progressista (PP) em Curitiba, no bairro Centro Cívico.
Mas no acordo final, em meados de 2014, ficou estabelecido o pagamento de propina por meio de doações eleitorais. A constatação da promotoria de Justiça é de que os repasses realmente ocorreram, em um total de R$ 3,5 milhões. O valor também foi fracionado e endereçado à direção nacional do PP – apesar de Barros ter sido o beneficiário direito das cifras.