Invadida por garimpeiros e madereiros e abandonada pelo governo Bolsonaro, Terra Indígena Yanomami sofre com malária, contaminação por mercúrio e desnutrição severa
Estudo confirma que pelo menos 692 crianças de até 9 anos morreram no período
por Rubens Valente
Agência Pública
Um relatório produzido pelo projeto “Achados e Pedidos” revelou “o estrangulamento” da aplicação de recursos do órgão do governo federal responsável por cuidar da saúde de 28 mil indígenas Yanomami e Ye’kwana, em Roraima e Amazonas, durante os quatro anos do governo de Jair Bolsonaro (2019-2022). Em janeiro de 2023, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva declarou emergência sanitária e deflagrou uma operação para retirada dos invasores da terra indígena, ao denunciar uma grave crise de fome, malária e altos índices de mortalidade no território.
“A redução orçamentária da saúde indígena Yanomami desembocou na tragédia humanitária. […] Os dados oficiais são precários, incongruentes, subnotificados e parciais, mas ao menos 692 crianças Yanomami com até 9 anos morreram de 2019 a 2022”, apontou o relatório.
O “Achados e Pedidos”, projeto realizado pela Transparência Brasil e pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), examinou o orçamento executado de 2019 a 2022 pelo Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (Dsei-Y), sediado em Boa Vista (RR), vinculado ao Ministério da Saúde. Foram ministros da Saúde no período Luiz Mandetta (2019-abril de 2020), Nelson Teich (abril e maio de 2020), Eduardo Pazuello (2020-2021) e Marcelo Queiroga (2021-2022).
O relatório lembra que em janeiro de 2018, quando Bolsonaro assumiu a Presidência, “o sinal de alerta já estava aceso no DSEI-Y”. Em 2018, segundo o estudo, “ao menos 119 bebês haviam morrido antes de completar um ano”, “cerca de 2,5 mil crianças com menos de cinco anos apresentavam peso baixo ou muito baixo e outras mil sequer eram monitoradas” e havia pelo menos 10 mil casos de malária, “uma alta de 26% em relação ao ano anterior [2017]”.
Um estudo conduzido pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), segundo o relatório, constatou que “a situação nutricional das crianças Yanomami é a mais delicada já reportada em toda a literatura científica nacional e uma das maiores em escala mundial”.
“Fica evidente que o governo Bolsonaro sucateou o distrito sanitário”
Apesar de todos esses alertas, “o volume de recursos federais aportados no DSEI-Y em 2019 foi o menor desde 2013”. Aplicando a correção inflacionária, “houve um corte de 26% nas liquidações em relação ao ano anterior e de 48% se comparado a 2016”.
A política adotada nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro teve impacto profundo na saúde Yanomami. “Em 2019, os casos de malária dobraram. Os dados oficiais apontam, incluindo todas as causas, a morte de 190 crianças e jovens com menos de 20 anos – 14% superior a 2018.”
No mesmo ano, a taxa de liquidação dos empenhos para a saúde Yanomami “foi de apenas 79%, a mais baixa desde 2013”. Em 2019, cerca de R$ 10,8 milhões, em valores corrigidos pela inflação, “tiveram o empenho emitido, mas não foram liquidados”, ou seja, “houve reserva de recursos, mas não ocorreram contratações ou entrega dos produtos e serviços correspondentes eventualmente contratados”.
“No comparativo com anos anteriores, fica evidente que o governo Bolsonaro sucateou o DSEI-Y. Em 2018, foram empenhados R$ 7,1 milhões na categoria investimento em valores correntes. Em 2019, apenas R$ 96,3 mil. No ano seguinte, nada foi lançado nessa classificação. Os investimentos, em geral, significam aquisições de equipamentos de longa duração e obras, ou seja, melhorias estruturais.”
O relatório cita algumas despesas realizadas pelo Dsei-Y antes de Bolsonaro chegar à Presidência. No final de 2018, durante o governo de Michel Temer (2016-2018), por exemplo, o distrito sanitário comprou 50 refrigeradores para armazenamento de vacinas e medicamentos, ao custo de R$ 5,8 milhões. Em 2016, os investimentos somaram R$ 2,96 milhões. Durante os quatro anos do governo Bolsonaro, contudo, foi empenhado apenas R$ 1,3 milhão em investimentos no Dsei-Y.
O maior empenho individual, diz o relatório, foi para a compra de 30 botes de alumínio no padrão “‘embarcação patrulha’, com capacidade para transportar de 8 a 12 homens armados, e com ‘padronização de pintura do Exército brasileiro’, ao custo de R$ 367 mil”. (continua)
Durante a pandemia da Covid-19, as projeções de mortes e os casos foram escondidos pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), mesmo com a inteligência do governo tendo elaborado mais de mil relatórios sobre a situação. As informações são da Folha de S.Paulo.
Postos sob sigilo, os relatórios em questão foram produzidos por pelo menos um ano, de março de 2020 a julho de 2021.
O material, ao qual a Folha teve acesso, tem carimbo oficial da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e reforça que Bolsonaro ignorou as informações levantadas pelos próprios agentes do governo, além das recomendações do Ministério da Saúde (MS).
“Estudos recentes realizados em pacientes com Covid-19 que usaram esses medicamentos identificaram graves distúrbios do ritmo cardíaco, em alguns casos fatais, particularmente se utilizados em dosagens altas ou em associação com o antibiótico azitromicina”, afirma relatório de 23 de abril de 2020, acessado pela Folha de S.Paulo.
Os documentos recomendam o distanciamento social e a vacinação como formas efetivas de controlar a doença, trazem estudos que desaconselham o uso da cloroquina, alertam sobre possibilidade de colapso da rede de saúde e funerária no Brasil e reconhecem a falta de transparência do governo Bolsonaro na divulgação dos dados da pandemia da Covid-19.
Veja os superiores da Abin e GSI à época:
à frente da GSI, o general Augusto Heleno;
à frente da Abin, o atual deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ);
à frente do MS, foram quatro: Luiz Henrique Mandetta, Nelson Teich, Eduardo Pazuello e Marcelo Queiroga.
As estimativas feitas pela Abin nos documentos se aproximaram dos dados registrados no país nos períodos em questão, mas houve casos em que a pandemia superou a expectativa dos estudos: em abril de 2021, o pior cenário analisado esperava mais de 338 mil mortos, mas o número foi superior a 341 mil.
São mais de mil arquivos à disposição da Folha, após solicitações via Lei de Acesso à Informação (LAI). Desses, pelo menos 18 relatórios citam o risco de colapso regional, e outros 12 relatam que o país ainda não havia atingido o pico da doença.
No dia 8 de janeiro, data em que manifestantes golpistas invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes em Brasília, o general da reserva Ridauto Lúcio Fernandes, um kid preto que dirigiu o setor de Logística do Ministério da Saúde no governo de Jair Bolsonaro, gravou um vídeo em que aparece festejando enrolado em uma bandeira do Brasil. “Quero dizer que eu tô arrepiado aqui”, disse, em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF).
“Kids Pretos” é o apelido dado a especialistas em operações especiais do Exército, que são altamente treinados em, por exemplo, ações de sabotagem e incentivo à insurgência popular, as chamadas “operações de guerra irregular. Também intitulados “forças especiais”, eles compõe a elite de combate do Exército.
Além de Fernandes, que mesmo com os olhos irritados pelo efeito do gás lacrimogêneo da Polícia Militar elogiou a corporação, outros dois kids pretos da reserva comentaram o que acontecia na capital do Brasil. “O Brasil e o Exército esperam que o senhor cumpra o seu dever de não se submeter às ordens do maior ladrão da história da humanidade. O senhor sempre teve e tem o meu respeito. Força”, disse o coronel José Placídio Matias dos Santos, se dirigindo ao então general Operação Lava Jato está morta e enterrada? Quem responde a pergunta é o advogado Marco Aurélio de Carvalho em entrevista a Breno Altman no programa 20 MINUTOS desta segunda-feira (26/06). A cassação de Deltan Dallagnol e a escalada de denúncias contra Sérgio Moro parecem dinamitar o que resta da Operação Lava Jato, que também vai perdendo terreno nas decisões das cortes superiores, paulatinamente revisando todas as sentenças que foram proferidas na 13ª Vara da Justiça Federal, sediada em Curitiba. As forças de esquerda, que antes criticavam a cúpula do Poder Judiciário por proteger a República de Curitiba e ser cúmplice do golpe de 2016, agora vibram com as seguidas ações contra o lava-jatismo e a turma de Bolsonaro. A extrema-direita, por sua vez, agora arremete contra o sistema de justiça, acusando-se de perseguição ao ex-presidente e seus aliados. Para debater os novos ares nos tribunais brasileiros, vou entrevistar o advogado Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do Grupo Prerrogativas, organização que esteve na vanguarda da crítica à Operação Lava Jato. Formado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, também é um dos fundadores da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD). Cesar de Arruda, no Twitter.
“Patriotas brasileiros, ignorem a grande imprensa nacional e internacional. Qualquer manifestação contra o establishment será sempre apresentada como atos antidemocráticos. Façam o que deve ser feito”, incentivou o coronel Fernando de Galvão e Albuquerque Montenegro, outro kid preto, de Portugal, onde vive.
Procurados pela revista Piauí, que fez uma reportagem sobre os indícios da participação dos kids pretos nos ataques de 8 de janeiro, os três apresentaram posturas diferentes. O general Ridauto Fernandes não quis comentar sua presença no meio dos bolsonaristas e limitou-se a dizer que sempre pautou sua conduta “pela legalidade, que está embutida no conceito da disciplina”.
O coronel Placídio negou que tenha publicado as postagens golpistas no Twitter: “Eu não incentivei [o golpe]. Ao contrário, repudio veementemente as depredações que ocorreram naquele dia. Eu não estava em Brasília e soube do ocorrido pelas notícias. Além disso, havia várias postagens na minha conta [do Twitter] que definitivamente não foram de minha autoria”. Já o coronel Montenegro não retornou o contato da reportagem.
Os vídeos da tentativa de golpe mostram ações de quem teve treinamento militar. Os bolsonaristas, que ao chegar na Praça dos Três Poderes se depararam com grades que os impediam de avançar, se coordenaram e se organizaram para empurrar a barriera ao mesmo tempo. “É pura tática militar”, disse um oficial do Exército ligado aos FE que preferiu não ser identificado.
Os baderneiros também se dividiram entre quem cuidava do enfrentamento direto com a polícia e quem distribuía água mineral para ajudar na diminuição dos efeitos do gás lacrimogêneo e do gás de pimenta no rosto. “Assim que invadiram o Senado, percebemos que eles logo procuravam as mangueiras anti-incêndio para espalhar pelo ambiente e minimizar os efeitos do gás”, contou um policial do Senado.
“Enquanto expele o gás, esse dispositivo fica muito aquecido e só pode ser recolhido com luvas. Um civil sem treinamento dificilmente se prepararia para isso”, completou, sobre o fato de que alguns dos vândalos utilizaram luvas de couro para atirar as bombas de volta. A dica do uso do acessório não constava nas postagens golpistas que faziam convocação para a manifestação.
No Senado, aconteceu o caso mais grave. Golpistas atiraram uma granada do tipo GL-310, apelidada de “bailarina” por saltitar no chão enquanto dispara o gás lacrimogêneo, o que evita que o alvo a capture e lance de volta: “O estranho é que as polícias do Senado e da Câmara não têm esse tipo de granada. Então isso veio de fora”.
Saúde nomeia general Ridauto Fernandes como diretor de logística no lugar de um comedor de bola
Roberto Dias, agora ex-diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde — Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil
Pediu US$ 1 de propina por dose de vacina para fechar contrato
Por Filipe Matoso, G1
No final de junho de 2022, o governo exonerou o diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias. A decisão, anunciada na noite de noite de terça-feira (29), foi publicada no "Diário Oficial da União" desta quarta (30) e é assinada pelo ministro-chefe da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos.
Ao repórter Nilson Klava, da GloboNews, Roberto Dias se disse alvo de retaliação por ter cobrado de Dominguetti que comprovasse representar a AstraZeneca, o que, segundo o diretor, nunca aconteceu. Dias afirmou também que divulgará uma nota sobre o assunto.
Trecho do 'Diário Oficial da União' em que foi publicada a exoneração de Roberto Dias — Foto: Reprodução/Diário Oficial da União
Na nota divulgada na noite desta terça, o ministério não explicou o motivo da exoneração de Roberto Dias. Disse somente que a decisão foi tomada no período da manhã.
"O Ministério da Saúde informa que a exoneração de Roberto Dias do cargo de Diretor de Logística da pasta sairá na edição do Diário Oficial da União desta quarta-feira (30). A decisão foi tomada na manhã desta terça-feira (29)", informou o ministério.
O general Ridauto foi nomeado para apagar o fogo (transcrevi trecho. Leia mais aqui). Não puniu nenhum ladrão. Convocou coroneis para a militarizaçao do Ministerio da Saude.
Uma das muitas lendas espalhadas antes e depois das eleições de 2018 dizia que Jair Bolsonaro, ex-capitão expulso do Exército após se insurgir contra superiores e planejar explodir bombas em unidades militares, é que seus antigos colegas de farda funcionariam, durante seu governo, como garantia de contenção a suas eventuais recaídas incendiárias.
Eleito, Bolsonaro se cercou de militares e espalhou minas terrestres por onde passou.
As constantes ameaças de intervenção, como as proferidas em 7 de Setembro de 2021, eram chamadas de "atos impensados", tomados por um "desequilibrado", no calor da hora, nos momentos do recuo. E, ao menos para o grosso da opinião pública, nunca ficou muito clara a paternidade de atos cometidos por seus seguidores, sobretudo no período entre a eleição de Lula (PT) e as invasões de 8 de janeiro, classificadas por apoiadores como obra de tresloucados ou inimigos infiltrados.
Nessa conta entrava uma tentativa de atentado a bomba em um caminhão de combustível à entrada do Aeroporto de Brasília, em dezembro de 2022. E também a quebradeira promovida por bolsonaristas no dia da diplomação do petista, no mesmo mês, quando cinco ônibus, três automóveis e uma viatura do Corpo de Bombeiros foram incendiados na capital do país.
Observados assim, os atos golpistas pareciam expor o fracasso de militares em trancar um touro, preso junto a seus seguidores mais radicais em uma loja de cristais protegida por defensores da lei e da ordem.
Mas, conforme avançam as investigações sobre os dias que antecederam o 8 de janeiro, cai um pouco a cada dia a lenda do cavalo eleito presidente que precisava ser moderado para não botar fogo no parquinho.
Em uma reportagem publicada na quarta-feira (6) no site da revista piauí, o repórter Allan de Abreu apontou as digitais de forças militares especiais antes, durante e depois da depredação dos prédios dos Três Poderes. Conhecidos como "kids pretos", esses militares compõem a elite do Exército brasileiro e, segundo a reportagem, são treinados para ações de sabotagem e insurgência popular, conhecidas como "operações de guerra irregular". Alguns deles ocuparam posição de destaque na gestão Bolsonaro, que em seus tempos de Exército alimentou o sonho de se tornar também um membro da força especial.
Não conseguiu, mas se tornou o chefe de ao menos 26 "kids pretos" — entre eles os ex-ministros Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil) e Eduardo Pazuello (Saúde), e o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, hoje preso.
Mensagens interceptadas no celular de Mauro Cid expuseram as pressões de amigos e auxiliares diretos de Bolsonaro para que o Exército tomasse a dianteira numa tentativa de golpe de Estado, gestado em minutas golpistas e insurreições que poderiam levar a um sonhado decreto de Lei de Garantia e Ordem e deixassem como os militares a missão de administrar a bagunça. Um desses subordinados era o coronel Elcio Franco Filho, um "kid preto" que atuou como número 2 da Saúde e da Casa Civil.
A apuração se debruçou sobre detalhes do 8 de janeiro que exigiam treinamento em ações de sabotagem e insurgência, como uso de granadas, luvas especiais, táticas para derrubada de portões e resistência contra bombas de gás lacrimogêneo, o que demonstra um método nas invasões que não poderia ser assimilado por uma multidão em fúria e desorganizada, como era de se esperar em situações do tipo.
Um dos muitos "kids pretos" presentes na ação era o próprio chefe do Gabinete de Segurança Institucional de Lula, que mal havia assumido e caiu após aparecer em vídeos internos distribuindo água e orientando os golpistas.
Ainda a ser esclarecido, o interesse do grupo em empurrar o país à beira de uma guerra civil parece, a cada dia, mais evidente: inviabilizar o governo que poderia frear o processo de militarização e tutela das estruturas civis (o que se traduziu, sob Bolsonaro, em expansão de privilégios, cargos, recursos e picanha).
Era isso o que parte das tropas queria quando, lá em 2018, dizia-se que eles apenas toleravam a ideia de ver um insubordinado passar a dar ordens para generais de quatro estrelas.
"Esse cara está nas nossas mãos", disse aos amigos, segundo a piauí, o general Luiz Eduardo Ramos, após telefonar para um então obscuro deputado do baixo clero em março de 2018. Era Jair Bolsonaro.
O cavalão, como era conhecido em seus tempos de militar, era na verdade o Cavalo de Troia de um grupo de elite que, tudo leva a crer, orientou e seguiu orientando planos de sabotagem até mesmo quando o agora ex-presidente saiu de cena e já não tinha utilidade.
Que Bolsonaro tem na sua manga uma parcela dos militares, isso todo mundo sabe. O que ninguém entendia era como um militar rebelde como Bolsonaro poderia fazer isso. A chave pra responder a essa dúvida pode estar nos Kids Pretos, uma força militar especializada em criar confusão.
O jornal O Globo publicou nesta terça-feira (16) uma longa reportagem que confirma a conspiração de militares ligados ao ex-presidente. Com o título “PF diz que mensagens em celulares de aliados de Bolsonaro evidenciam plano de golpe e prisão de Moraes”, a matéria pode até acelerar a prisão do “capetão” e dos seus milicianos fardados.
A reportagem mostra que a trama golpista, segundo as investigações da Polícia Federal, “consistia em incitar ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF), hostilizar as urnas eletrônicas, convencer a cúpula do Exército a rejeitar o resultado das eleições em 2022 e prender o ministro Alexandre de Moraes”.
Em mensagens e áudios, o plano foi discutido pelo major reformado Ailton Barros, pelo coronel Elcio Franco e “por um militar ainda não identificado”. De acordo com a PF, os diálogos “deixam evidente a articulação conduzida por Ailton Barros e outros militares para materializar a tentativa de golpe de Estado no Brasil”.
Os militares Ailton Barros, Elcio Franco e Mauro Cid
A polícia chegou a esta conclusão “após analisar áudios e prints encontrados nos arquivos de um celular de Barros durante investigação envolvendo Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro”. Entre as mensagens que despertaram a atenção da PF, estão dois prints (capturas de tela) de uma conversa entre Ailton Barros e um contato denominado PR-01, “possivelmente relacionado ao ex-presidente Jair Bolsonaro”.
A primeira tratava da intenção de grupos organizadores dos atos de 7 de setembro de 2021 de acamparem em Brasília para pressionar os onze ministros do STF a “saírem de suas cadeiras”. A segunda sugeria inserir nesses movimentos golpistas temas de interesse de Jair Bolsonaro, como a defesa do impeachment de Alexandre de Moraes e o ataque às urnas eletrônicas.
“Para a PF, há fortes indícios de que Barros não só tinha proximidade com Cid, mas também mantinha contato direto com Bolsonaro e se ‘dispôs a incitar grupos de manifestantes para aderirem a pautas antidemocráticas do interesse do ex-presidente’. Na eleição passada, Barros divulgou em sua campanha a deputado estadual um áudio em que Bolsonaro o chamava de ‘segundo irmão’. O militar da reserva ainda acompanhou o então presidente durante a votação no segundo turno na Vila Militar, no Rio de Janeiro”, descreve o jornal O Globo.
General Braga Netto também aparece
Ainda de acordo com o relatório de análise das mensagens, a PF destacou outros dois áudios encontrados no celular de Ailton Barros e registrados em 15 de dezembro de 2022. Os arquivos são atribuídos a um militar da reserva não identificado que tenta acelerar a realização do plano golpista. “Combatente, nós estamos no limite da ZL (zona limite). Daqui a pouco não tem mais como lançar. Vamos dar passagem perdida, e aí é perdida para sempre. Você entende que eu tô falando (...) Tão há 40 e poucos dias, entendeu, até o Braga Netto veio aqui conversar com eles, que nem eu falei, tirou foto”, diz o interlocutor na gravação analisada pela Polícia Federal.
Em outro áudio, também registrado em 15 de dezembro, um interlocutor não identificado diz: “Então, esse próximo áudio, também, além do ZERO UNO, aí tem que ser passado para todo aquele pessoal que você passa sempre, entendeu? Então agora, negão, é... assim. Já estamos em guerra, né? Só que agora é ... assim. Temos que executar essas ações. Vou dar o conceito da operação”.
Para a PF, a “operação” seria um codinome para a execução do golpe de Estado, “que culminaria na tomada de poder pelas Forças Armadas, lideradas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. Os investigadores ainda destacam que ‘o plano descrito pelo interlocutor também incluía a prática de Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito, restringindo o exercício de um dos poderes da República, no caso, o STF, que seria implementado com a prisão do ministro Alexandre de Moraes pela Brigada de Operações Especiais de Goiânia/GO”.
Numa das mensagens, o interlocutor afirma que durante a “operação” seria dada “a missão ao comandante da Brigada de Operações Especiais de Goiânia de prender o Alexandre de Moraes no domingo, na casa dele, como ele faz com todo mundo. E aí, na segunda-feira, ser lida a portaria, o decreto de Garantia da Lei e da Ordem, e botar as Forças Armadas, cujo Comandante Supremo é o presidente da República, para agir, senão nunca mais nós vamos limpar o nome do glorioso Exército de Caxias”. A PF também analisou áudios atribuídos ao coronel Elcio Franco, ex-número 2 do ministro Eduardo Pazuello na Saúde e ex-assessor do general Braga Netto na Casa Civil.
O corpo indígena chama mais atenção segurando um celular do que sequestrado, estuprado e morto – Woia Xokleng
Eu li essa frase há algum tempo noTwitter, no contexto dodesaparecimentodos Yanomami, e nunca mais a esqueci. Ela é a definição exemplar de uma sociedade que continua a cobrar comunidades como as indígenas e quilombolas a manter suas tradições quando vivem o mesmo desemprego, acesso precário ao sistema de saúde, violência, insegurança alimentar, uso necessário de tecnologias, etc. que o resto de nós. Isso é racista e se refere especialmente a indígenas e comunidades tradicionais de todo o país, como as quilombolas. Para muita gente, elas só são “autênticas” se aparecem com arco e flecha ou vivendo em palhoças, comendo farinha para sobreviver.
Essa percepção discriminatória atravessa todo o pedido de reintegração de posse número 1003280-80.2022.4.01.3700, no qual a Força Aérea Brasileira, a FAB, via Advocacia-Geral da União, a AGU, solicita que uma área de aproximadamente 12,5 mil metros quadrados em Alcântara, no Maranhão, seja “devolvida” aos militares. A cidade é um dos maiores territórios quilombolas do Brasil, com cerca de 200 comunidades.
As aspas acima têm uma razão: a área em questão já foi reconhecida como território quilombola. Falta apenas a titulação. Voltarei ao assunto.
O pedido feito pelos militares do Centro de Lançamento de Alcântara, a CLA, foi motivado pela presença deum restauranteconstruído na casa de Moisés Costa Santos, de 36 anos, morador da área quilombola de Vista Alegre, onde vivem cinquenta famílias, em uma terra em disputa judicial. Ele começou a organizar o negócio no começo de 2020, prevendo o período difícil da pandemia, e passou a expandi-lo conforme as medidas de distanciamento foram diminuindo. Deu certo: Vista Alegre está localizada em uma das praias mais bonitas de Alcântara, e o fluxo de visitantes ajudou Moisés e outros moradores que trabalhavam no restaurante Vista del Mar a sobreviver.
Moisés levantou um galpão e alguns quiosques e passou a divulgar o negócio nas redes sociais. Hoje, suas postagens no Instagram e no Facebook são usadas contra ele e constam no pedido de despejo feito pelos militares. Eles já foram devidamente atendidos: em 29 de março, as Forças Armadas e o Batalhão de Choque da Polícia Militar chegaram ao local combombas de efeito moral e balas de borracha, concentrando um helicóptero e cerca de 50 viaturas, segundo moradores. Uma das balas atingiu o rosto de uma criança, sobrinha de Moisés. De acordo com os quilombolas, duas casas, o restaurante e dois quiosques foram derrubados.
“Era um um pequeno restaurante de um morador, nascido e criado aqui. Sua utilização e gestão eram feitas por toda a comunidade. Não tem nada que nos impeça de ser empresários.Achar que quilombola não pode ser empreendedor é tão racista quanto nos negar a terra“, afirmou o cientista políticoDanilo Serejo, também de Alcântara. Serejo chama atenção para o que chama de aparato de guerra movimentado para o despejo. “A comunidade fica em área estratégica, em uma das melhores praias. Aí, o estado mobiliza toda essa força, a Polícia Federal, a Polícia Militar e até a polícia da Aeronáutica. Foi um poder de ação que extrapolou os limites do restaurante. A reação se deu não só em proteção ao dono do empreendimento, mas de um negócio que beneficiava toda a comunidade”.
Desde que começou a expandir o restaurante, Moisés conta que passou a sofrer pressão do CLA, que primeiro pediu um alvará de funcionamento da empresa, e, posteriormente, a desocupação do imóvel. “Achamos que a gente deveria expandir e vender comida para ganhar um dinheiro, porque a vida aqui não é fácil só com a pesca e a lavoura”, disse ele a Fernanda Rosário, doAlma Preta. Com a pressão dos militares, que fotografaram constantemente o Vista del Mar, ele decidiu fechar o empreendimento ano passado. Ou seja, o próprio objeto da ação judicial já não existia e, mesmo assim, o pedido dos militares foi atendido pela AGU e executado pela força repressiva.
“O atual conceito de comunidade quilombola não pode se referir a um passado colonial, quando nosso povo esteve à margem da sociedade, de direitos e de políticas públicas.O que nos caracteriza como quilombo é nossa relação ancestral com a terra e território, nosso modo de fazer, de criar e nossa cultura, que também muda. Além disso, temos direito a conforto e a bens de consumo. Pobreza e miséria não fazem parte da nossa vida, nem trajetória”, defendeu Serejo.
Braço inimigo
A ação espetaculosa é o caso mais recente de uma disputa que se prolonga há décadas. A Fundação Palmares reconheceu a área em 2004, e um relatório técnico de identificação e delimitação, nunca contestado pelo governo, foi publicado no Diário Oficial da União em 4 de novembro de 2008. No entanto, a titulação, processo último desse reconhecimento, nunca chegou.É um dos muitos fatos que comprovam atensa relaçãoentre os governos petistas e as Forças Armadas.
A última tem especial interesse na expansão da base implantada em 1980 e que, com perdão pelo trocadilho, nunca decolou: uma das saídas para tornar a própria base viável economicamente é realizar acordos bilaterais com outros países, como já aconteceu com os EUA, país que pode “alugar” a estrutura para realizar o lançamento de satélites. Oprojeto do uso bipartido, que não foi discutido com a população local, foi aprovadono primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro, em 2019.
Pois é: as Forças Armadas podem “diversificar o negócio” e procurar mais dinheiro para manter o funcionamento do seu projeto em Alcântara. Mas quem sempre viveu lá e também deseja outros meios de sobrevivência, não.
A obtenção de lucro por parte da comunidade quilombola, em especial por Moisés, é criticada no documento enviado pelos militares para a AGU,no qual pedem ressarcimento referente ao período em que o restaurante funcionou e falam em “enriquecimento sem causa às custas da União“. [Com o dinheiro faturado pelo restaurante vão lançar o primeiro foguete brasileiro...]
“A reparação integral do dano na presente situação ainda deve incluir o pagamento de contraprestação pelo uso do bem público, pois acaso o imóvel houvesse sido disponibilizado regularmente à exploração por particulares, necessariamente teria que estar sujeito a uma contraprestação, em especial porque se trataria da concessão para fins de exploração comercial por agente privado”, afirmou um trecho do documento.
Para isso, pedem na justiça que a Receita Federal do Brasil informe o lucro declarado pela empresa desde maio de 2020 e o pagamento de uma multa de R$ 20 mil. Sim, a mesma entidade que gastou verba federal destinada ao combate da covid-19 compicanha e salgadinho, segundo auditoria do Tribunal de Contas da União, quer ser ressarcida pelo uso de uma área sob judice. Também expressa que a tentativa de Moisés de melhorar as condições de sua vida e a da sua família são “sem causa”.
No documento enviado para a AGU, consta que o imóvel pertence à Aeronáutica, tendo sido desapropriado para a base de lançamentos. De fato, como vemos abaixo, uma decisão judicial desapropriou em 2005 uma área que pertencia ao espólio dos antigos moradores Raimundo Neto, Francisco da Silva e Raimundo Teixeira, passando-a para a União. O dia não poderia ser mais simbólico: 20 de novembro, que marca a memória de Zumbi dos Palmares.
Essa desapropriação, no entanto, é anterior à divulgação do relatório técnico publicado no Diário Oficial e aconteceu um ano após o reconhecimento da terra quilombola pela Fundação Palmares. “O CLA, por meio da AGU, aproveitou essa brecha de haver um empreendimento privado para entrar com a ação e agredir a comunidade”, criticou Danilo Serejo, que representa na justiça o Movimento dos Atingidos pela Base Espacial de Alcântara. Foi o juiz federal Clodomir Sebastião Reis, da Terceira Vara de Justiça de São Luiz, quem autorizou a reintegração de posse.
Casos na Corte Internacional
Nos dias 26 e 27 de abril, uma audiência na Corte Interamericana de Direitos Humanos vai se debruçar sobre a falta de emissão de títulos de propriedades de terras pelo estado brasileiro. O julgamento doCaso Comunidades Quilombolas de Alcântara vs. Brasilreúne questões sobre violações em 152 propriedades desde a instalação da base aeroespacial: a expropriação de terras e territórios e a falta de recursos judiciais para remediar os conflitos integram a pauta.
A falta de titulação, por exemplo, expõe continuamente comunidades há muito retiradas de seus territórios à insegurança: para a construção da base, 52 mil hectares do território habitado por 32 comunidades quilombolas foram declarados de “utilidade pública”. As famílias foram reassentadas nas chamadas agrovilas. Sete delas foram criadas longe do mar, dificultando uma das atividades básicas de sustento e da economia local: a pesca.
“A Força Aérea Brasileira, especialmente o CLA, nunca respeitou nossa posse ancestral e atuam o tempo todo para aviltar nossos direitos territoriais. Tentam a todo custo, com a anuência dolosa de diversos órgãos do estado e do sistema de justiça, roubar nossas terras” argumentou um trecho de umanotaassinada por diversas instituições representativas das comunidades quilombolas de Alcântara.
Os militares continuam acampados na região. Apesar do forte bolsonarismo que demarca a CLA (é impossível esquecer que o ex-presidentese referia a quilombolas como animais), as entidades miram o fim das disputas judiciais no contexto do governo Lula. Mas a coisa não é simples.
“Nosso processo de regularização e titulação está pronto desde 2008. Não houve contestações, nem da União. Na época, Lula não titulou, porque se acovardou diante dos militares da Aeronáutica. O que explica isso também é o racismo, já que não titular nos deixa em permanente estado de insegurança jurídica. Espero que agora Lula não se acovarde novamente e titule nossas terras.”
Há outros casos de quilombolas, inclusive evangélicos,denunciandoos assédios sofridos.
Procurados, os ministérios dos Direitos Humanos e da Igualdade Racial afirmaram que “repudiam o uso excessivo da força e as violações de direitos ocorridas em Alcântara” e que determinaram que se tomem “as medidas necessárias para acolhimento, identificação do número de pessoas afetadas e futuras reparações”, além de estarem em contato com órgãos como o Ministério da Justiça e Segurança Pública, a Defensoria Pública do Maranhão e o Ministério Público Federal.
Já a O CLA afirmou que a reintegração de posse foi feita “pelo oficial de justiça acompanhado de força policial, tendo em vista a resistência de cumprimento da decisão por parte do proprietário” e que não houve nessa ocasião, nem em seus 40 anos de existência qualquer confronto com a comunidade. “O relacionamento do CLA com as comunidades ao entorno é pacífico, sendo este o maior gerador de renda do município”, completou.
Atualização: 11 de abril, 10h24 Este texto foi atualizado com as respostas do CLA e dos ministérios dos Direitos Humanos e da Igualdade Racial.
Transcrevo a reportagem de Fabiana Moraes para denunciar que a CPI do MST na Câmara dos Deputados não vai investigar as invasões nas terras dos quilombolas, povos indígenas, populações ribeirinhas, camponeses e trabalhadores rurais. É uma CPI para proteger a grilagem de terras promovida por empresas nacionais e estrangeiras, e bilionários e milionários brasileiros e dos cinco continentes do agronegócio, dos pecuaristas, das mineradoras, das madereiras, do contrabando internacional de produtos florestais, da riqueza das reservas indígenas, do ouro, das pedras preciosas, dos minérios estratégicos, e da grilagem de terras na Amazônia, grilagem que promove fogo nas florestas e envenena os rios com mercúrio. É a CPI dos ricos - das Bancadas do Boi, da Bala - contra os pobres. No mais, "enriquecimento às custas da União" aconteceu com a militarização do Ministério da Saúde, general Eduardo Pazuello ministro, com os "coronéis da saúde", com os "coronéis da vacina", com o general Braga Neto coordenador do combate à covid.
Mourão atropela princípios legais, em nome de banalizar o que tem toda a aparência de “crimes”, cometidos por Bolsonaro
por Denise Assis
O terno bem cortado não disfarça a postura empertigada do corpo habituado à farda. O corte de cabelo à moda reco já vem com o talhe para acomodar o cape militar. O linguajar foi moldado na caserna e, a despeito do curso de mídia training feito pelo general Hamilton Mourão, logo que assumiu o cargo de vice-presidente, estão lá todos os cacoetes militares. Inclusive a defesa cega das fileiras – o que serve para o bem e para o mal – e a obediência canina, ao “chefe”, o que o leva a um discurso que beira o infantil. Atropela princípios legais, em nome de banalizar o que tem toda a aparência de “crimes”, cometidos por Bolsonaro.
Ao negá-los, Mourão pode estar também querendo tirar de seus ombros alguma sobra que porventura possa recair sobre ele. Agora, na pele de senador (Republicanos – RS), tenta vender-se como o civil que nunca foi. E mente, ao dizer em entrevista à Folha, que jamais usou o título de general politicamente. Não só usou, como o fez para pregar o golpe, para aplaudir - por Twitter ou nota - o 31 de março nos anos em que passou no governo e para louvar torturadores, classificando um deles, em entrevista para a TV, de um dos seus heróis.
Foi assim, ainda fardado, (exibindo medalhas, que a gente fica se perguntando onde foram obtidas, posto que não tivemos guerra nem escaramuças nos últimos anos), que chegou à cena política. No dia 15 de fevereiro de 2017, em palestra na Maçonaria em Brasília, o general - sim, o general -, defendeu uma intervenção militar para “salvar o país”. Empregou o termo militar: “aproximações sucessivas”, para reivindicar a derrubada do governo de então (Dilma Rousseff), ou “teremos que impor isso”. Não precisou. O desfecho, todos nós sabemos, coube a Michel Temer, um aliado que transitou entre o Planalto e a caserna até conseguir fazer triunfar o golpe e tirar a presidente eleita, do poder.
Hamilton Mourão voltou ao centro das atenções, na figura do vice de última hora, depois da negativa pública da advogada paga pelo PSDB, para redigir a proposta do impeachment de Dilma Rousseff, conforme noticiado na época. Sua ascensão ao cargo de vice foi providencial. Bolsonaro eleito, Mourão foi o espantalho que afugentou a ideia de um impeachment contra ele. Ninguém quis arriscar trazer para a cadeira da presidência, novamente, um general, ainda que reformado. Um país traumatizado por 21 anos de uma ditadura sanguinária e corrupta, não arriscaria... E, assim, arrastamos quatro anos de correntes, vergonhas internacionais, sofrimento, mortes desnecessárias e a banalização do mal. E, o que é pior, a desorganização do poder Judiciário, que errou inúmeras vezes, até que, por ironia, nos salvou no final, nos garantindo eleições limpas.
Em redes sociais, o general continua se apresentando como sempre o fez: general Hamilton Mourão. No governo, reproduziu a lei da caserna: um manda, o outro obedece, tal como o colega Eduardo Pazuello.
Foi assim, que no apagar das luzes do governo a que servia, enquanto Bolsonaro se preparava para a fuga, lhe pediu para assinar a promoção do ex-secretário da Receita Federal, Julio Cesar Vieira Gomes (envolvido no caso do “presente” das joias das arábias). O funcionário é também investigado por suposta pressão para amenizar punição a responsável por devassa em dados sigilosos de desafetos do ex-presidente) e de José de Assis Ferraz Neto, ex-subsecretário-geral. (Descrição da Folha).
Perguntado se considera que Bolsonaro consegue se explicar, (ou escapar dessa, para ficar claro) respondeu “candidamente”, à moda dos tempos bolsonaristas/caserna: “Eu acho que tranquilamente, pô. Eu acho que é uma coisa simples. O TCU já deu cinco dias de prazo. Parte delas [das joias] estão lá na Receita Federal, no aeroporto de Guarulhos. É só recolher e mandar para o acervo da Presidência. Aquele outro pacote que teria ficado com o presidente, ele entrega e acabou. Morre o assunto”.
Mourão descreve assim, a saída para o escândalo, como a mãe de um aluno faltoso manda que o filho devolva a borracha que surrupiou” do coleguinha, para dar-lhe uma lição. Não morre não, general. Aqui não se trata de disputa de “coleguinhas” de colégio. Estamos falando de um ex-presidente da república que - tudo aponta para esses indícios –, cometeu crime de peculato, corrupção, apropriação indébita de bem público e, se comprovado que o “presente” foi propina, aí chega-se a um outro patamar.
No Senado ou na pele do general que está grudado para sempre em sua história, o senhor deveria ter melhor dimensão do que dizem as leis desse país. Deveria entender o quanto de falta de ética está contida em sua fala. E, a propósito, general, foi o governo a que o senhor serviu, - e não o atual - quem transformou os militares em cidadãos “de segunda categoria”, quando os perfilou para servir a um “chefe” e não à nação e à Constituição.
Quando se pensa que estamos perto do fim do precipício em que os militares jogaram o país, descobre-se um degrau ainda mais baixo. O fundamental é não se surpreender, porque sempre pode ser pior do que se imagina.
É o que comprova a nova descoberta sobre o orçamento secreto e particular, livre do controle republicano, mantido pelos comandos das Forças Armadas no exterior. Uma espécie de offshore fardada.
O orçamento secreto foi inventado pelo governo fascista-militar para comprar apoio ao plano brutal de pilhagem do Brasil e para assegurar a blindagem do Congresso em relação aos mais de 100 pedidos de impeachment do Bolsonaro.
Deu certo. Ao custo, porém, de uma corrupção bilionária, de malversação em escala industrial e do desvio sistemático de verbas públicas. Com efeitos devastadores para o país.
Coube a um general – sempre eles, os militares, metidos em todo tipo de trampa de/no governo – a condução do assunto em linha com o colaboracionista Arthur Lira, presidente da Câmara.
Um detalhe importante: Ramos ainda estava no serviço da ativa e era o comandante militar do Sudeste. Apesar disso, contudo, do mesmo modo que com o general e ex-ministro da Morte Eduardo Pazuello, nada aconteceu com o delinquente fardado.
Monica Bergamo relata na Folha de São Paulo[18/3] que o Tribunal de Contas da União [TCU] enviará uma equipe de auditores aos EUA “para fazer uma devassa em compras feitas pelos comandos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica naquele país entre 2018 e 2022”.
A cifra envolvida está dentro do “padrão orçamento secreto”: foram cerca de R$ 20 bilhões pagos pelos militares no período através das três comissões das Forças Armadas brasileiras instaladas nos EUA, e das outras duas na Europa.
O envio de auditores do TCU para apurarem in loco os gastos deriva “da quantidade de transações detectadas e da recusa dos fardados em conceder acesso integral ao sistema de compras”, informa a jornalista.
Este é mais um caso indecente da coleção interminável de ilícitos e crimes envolvendo militares e que, no entanto, são enfrentados de maneira equivocada pelas instituições civis: ou com leniência, ou com temor, ou com jeitinhos e acomodações.
É absolutamente descabido, porque é inconstitucional e ilegal, o TCU aceitar a recusa das Forças Armadas em conceder o acesso pleno ao controle das despesas públicas. Assim como os servidores civis, os militares também estão sujeitos às normas da Administração Pública; e, quando cometem ilícitos, devem ser demitidos, a bem do serviço público.
Este escândalo evidencia, também, que é equivocado o governo brasileiro manter missões das Forças Armadas no exterior, onde oficiais passam temporadas se locupletando e amealhando fortunas pessoais sem nenhum benefício aos interesses nacionais e à defesa do país.
Em Washington, por exemplo, quase duas centenas de militares se aboletam de tempos em tempos em revezamento num trenzinho da prosperidade; uma estrutura mais inchada que as principais e maiores representações diplomáticas do Brasil no estrangeiro.
Os militares se envolveram de maneira sistêmica e profunda com ilícitos, desvios, corrupção e ilegalidades. Delinquentes fardados são o pior exemplo de servidor público; desonram as Forças Armadas de qualquer Nação.
A sociedade brasileira tem diante de si a melhor oportunidade dos últimos 50 anos para encerrar em definitivo o delírio das cúpulas partidarizadas das Forças Armadas, que reivindicam a fantasia alucinógena de atuar como Poder Moderador.
Desaproveitar esta oportunidade e deixá-los outra vez impunes poderá ter como preço o surgimento futuro de uma nova intentona fascista-militar contra a democracia.
Enquanto tentava se explicar sobre sua atuação diante dos atos terroristas de 8 de janeiro, um coronel da PM do Distrito Federal disse que os bolsonaristas estavam em um “mundo paralelo” e que tinha até gente que dizia ser extraterrestre
Alienígenas ajudariam exército a dar um golpe
Em depoimento à CPI dos Atos Antidemocráticos, promovida pela Assembleia Legislativa do Distrito Federal, o coronel Jorge Eduardo Naime, da PM-DF, afirmou que os bolsonaristas acampados em frente ao quartel-general do Exército em Brasília “viviam em um mundo paralelo”. “Teve um que me abordou e falou para mim que era um extraterrestre, que ele estava ali infiltrado e que assim que o Exército tomasse, os extraterrestres iriam ajudar o Exército a tomar o poder”, relatou o coronel nesta quinta-feira 16. “Eles consumiam só informações deles, era só o que era falado no carro, estavam em uma bolha.”
Bolsonaristas "pediram ajuda extraterrestre"
com luzes de celulares no RS
O fotógrafo Marcelo Nunes compartilhou um vídeo de manifestantes reunidos na frente do Comando Militar do Sul, no Centro Histórico de Porto Alegre, no domingo (20). Eles estão segurando os celulares sobre a cabeça e pedindo socorro a um "general". Mas, não se sabe se de fato a quem eles estariam pedindo ajuda: aos ETs ou ao general do Exército.
É hora de injetar energia democrática na veia dos ativistas da saúde pública. A 17ª Conferência Nacional de Saúde será realizada em julho de 2023
por Gustavo de Mello
“Amanhã vai ser outro dia” é o tema aprovado pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) para a 17ª Conferência Nacional de Saúde que será realizada de 2 a 5 de julho de 2023, com o Ministério da Saúde. Na Presidência da República estará o recentemente eleito Luís Inácio Lula da Silva, um governante a quem caberá produzir símbolos políticos de repactuação democrática da sociedade brasileira. O ambiente de retomada da rotina de reuniões dos conselhos, será fundamental para os próximos anos; empoderar este eficiente mecanismo de controle social das estruturas estatais, será um ganho de cidadania.
A tarefa governamental de recomposição será retificar, com atos administrativos, uma herança autoritária de extinções e esvaziamentos. Instituir mecanismos de apuração, inclusive com reparação aos membros da sociedade civil que foram alvos de ataques, como parte de uma estratégia empenhada em impedir o esquecimento. Os assassinos da memória, foram falsificadores de informações que contribuíram para um ambiente de devastadora escalada de violações ao Estado Democrático de Direito, portanto, homenageando os que mais resistiram aos inúmeros episódios de desconstrução do sistema público nacional de saúde, desde que a União sofreu uma traição política (2016 – 2022) e a democracia brasileira foi usurpada com acusações de crimes de improbidade. Agora é a hora de injetar energia democrática na veia dos ativistas da saúde pública.
As etapas municipais das conferências de saúde já começaram e, por exemplo, na cidade de onde escrevo há uma guerra com os terceirizados que a todo custo querem proteger suas margens de lucro, usando os números da tabela SUS como desculpa para abocanhar mais recursos públicos. Santana do Livramento, terá o lançamento da etapa municipal com sua 6° Conferência, dia 07 de dezembro, na Sala Cultural.
Os encontros com a população no território das cidades, sem esquecer das áreas rurais, devem se realizar até março e as estaduais e do Distrito Federal de abril a maio de 2023. O evento é legalmente organizado pelos Conselhos de Saúde e acontece a cada quatro anos, um dos mais importantes espaços de diálogo entre governo e sociedade para a construção das políticas públicas do Sistema Único de Saúde (SUS).
No centro dos debates preparatórios, usuários, sindicalistas e demais representantes que possuem assento no Conselho de Saúde, deverão questionar as diversas facetas do (des) financiamento (União, Estado e Município) das ações e serviços ofertados, nas diversas regiões geográficas.
O recurso público acabou sendo sequestrado pelas variadíssimas formas de terceirizações; desde pessoas jurídicas, empresas de pequeno porte que repartem, mês a mês, os escassos recursos públicos que passaram a ser descentralizados para os Fundos Municipais na forma em que se aprovou a emenda constitucional 95, de 2016, conhecida como a “emenda da Morte” (PEC 241/2016), um fruto que ganhou outro número de tramitação no Senado, mas foi amadurecido em tempos neoliberais, contribuindo para o desmonte que se evidenciou na gestão temerária da pandemia de covid 19.
Para não ampliar o leque de análise de impasses que devem ser enfrentados, apenas pontuamos que não devemos deixar de lado outros mecanismos que jogam milhões de recursos públicos no ralo, a fraude na jornada de trabalho nos postos de saúde da família. Prossigamos, mas esse assunto não é irrelevante.
A indignação dos congressistas se expressa como prenúncio de tempestades e turbulências quando chegar a hora de ir muito além da avaliação das políticas da União, consideradas um laboratório de iniquidades, com resultados mortais. Um genocídio, na acepção típica da palavra. Segundo estes setores, que mantiveram suas vozes firmes em milhares de reuniões, os mais críticos e mobilizados, não consideram pacífico deixar de lado os desmandos, fruto do negacionismo. A desprezível militância contra protocolos que em outras endemias foram construídos e salvaguardados no Ministério da Saúde que nunca afrontaram tão acintosamente o método científico, as diretrizes sanitárias, consenso em âmbito internacional.
Entraram em campo nos últimos quatro anos, ganhando notável impulso, teses tresloucadas de imunidade de rebanho, sem nenhuma, única, segura comprovação científica. Desprezados os únicos meios acadêmicos habilitados, inclusive para um simples trabalho de graduação, os falastrões eram discípulos de Steve Banon e Olavo de Carvalho, agindo com a autoridade de profissionais médicos, superiores. Eram os que tinham mais espaço com a disseminação de informações falsas, usada por agentes econômicos, do que aqueles que buscavam se contrapor, disputando espaços nas redes sociais e nos vídeos de WhatsApp, para argumentar que a vacina era um caminho seguro para salvar vidas, além das medidas não farmacológicas que impediam a disseminação do vírus em parte. Que os testes que vinham sendo feitos em laboratórios, desde muito antes que a China se tornasse uma potência econômica mundial, eram mais eficientes para demonstrar que vacina de covid 19 com vírus inativado era o meio de enfrentar as mortes em profusão ocorridas durante a pandemia, pois os testes científicos indicavam que o meio vacina era seguro para salvar vidas. Os senões da vacina em nada tinham a ver com os protocolos de saúde pública.
MADRUGADA DE SEGUNDA-FEIRA,28 de novembro:quatro tirosde calibre 38 são disparados contra as portas de um bar – àquela altura fechado – na Asa Norte, Plano Piloto de Brasília. Alguns dias antes, o nome da Casa MimoBar figurou em uma lista de estabelecimentos a serem boicotados por “patriotas” na capital.
Outro estabelecimento brasiliense, um café chamado Objeto Encontrado, vem sofrendo ataques de vandalismo sistemáticos após o segundo turno das eleições. Suas portas passaram a amanhecer cobertas de fezes humanas – o carro de uma funcionária também foi emporcalhado. Na madrugada de domingo, dia 27, câmeras instaladas após a onda de ataques flagraram um homem urinando na porta do café, fechado naquele momento. Uma escolha não usual, uma vez que a área que circunda o local é toda gramada e arborizada – e menos iluminada.
Em comum, os dois bares têm, além da presença na lista dos patriotas, um público majoritariamente progressista e LGBTQIA+ – e a vizinhança de blocos residenciais habitados por oficiais da ativa e da reserva do Exército.
Em 1º de novembro, véspera dos primeiros protestos golpistas de inconformados com a vitória eleitoral de Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin,tiros atingiram um escritório do Partido dos Trabalhadores em Pontal do Paraná, litoral do estado. Como nos casos em Brasília, escolheu-se um horário em que não havia ninguém no local: a ideia era – ao menos por ora – assustar. Meter medo. Intimidar.
São três entretantos casosregistrados nos últimos dias que trazem à lembrança um modus operandi que o Brasil não via desde a virada de 1979 para 1980. Naquela época,os alvos eram bancas que vendiam jornais alternativosque denunciavam a já então moribunda ditadura militar. Os ataques ocorriam quase sempre de madrugada: usando bombas ou simplesmente ateando fogo, os terroristas passavam o recado de que os jornaleiros não deveriam “colaborar com o comunismo” (soa familiar?). Só em São Paulo,a ditadura atacou 30 bancasnaquele período. E houve ataques por todo o país e também a locais como escolas de samba, sindicatos, teatros, livrarias.
Naquele início dos anos 1980, os atentados eram obra de militares da linha dura inconformados com a abertura “lenta, gradual e segura” admitida por Ernesto Geisel e Golbery do Couto e Silva. Ocorriam sob o olhar complacente das polícias estaduais – que, o mundo descobriria anos depois, eram cúmplices de torturas e assassinatos nos porões da ditadura. E culminaram, em 30 de abril 1981, noatentado no Riocentro. O Exército (com auxílio da polícia fluminense) criou uma farsa para causar terror entre os quase 10 mil presentes em um show que comemorava o dia do trabalhador: buscava-se colocar a culpa em movimentos de esquerda e justificar uma nova guinada autoritária.
Mas a bomba explodiu antes da hora no colo de um sargento, estripou o capitão sentado ao lado dele no carro estacionado no Riocentro e expôs também a canalhice que se armara. Após o episódio, o governo do último ditador militar, João Baptista Figueiredo (avô de um patético comentarista da rádio Jovem Pan), tombou para nunca mais se levantar. Os terroristas de extrema direita, por prudência, acharam melhor se retirar para a sarjeta mais próxima.
Em 1980, os terroristas de extrema direita queimavam bancas de jornal, como esta em São Paulo. Agora, chutam repórteres. Foto: Folhapress
Ao menos desde 2018 (quandouma caravana liderada por Lula foi alvejada a tirosem Laranjeiras do Sul, no Paraná, num caso que a polícia e o Ministério Público locaisjamais se deram ao trabalho de esclarecer), a tigrada tem se sentido à vontade para voltar a dar as caras. Novamente, trata-se de inconformados com a derrota – desta vez, nas urnas – de um governo militar, truculento e obcecado por pintar seus adversários como “comunistas”, como se isso legitimasse qualquer que seja a estratégia usada para derrotá-los.
Não há, até o momento, indícios, informações ou testemunhas que liguem o aparato estatal – ou militares da reserva – a ataques como os relatados na abertura deste texto. Por outro lado, estamos, em 2022, mergulhados num caldeirão muito mais complexo que o de 1980. Basta pensar no papel das redes sociais e dos fóruns hospedados na deep web – os chans – em umoutro ato de terrorismo de extrema direita, que matou quatro pessoas e feriu 12, cometido por um jovem nazista na semana passada em Aracruz, Espírito Santo.
Isso não significa, entretanto, que se deva eximir de culpa autoridades que até agora foram – no mínimo – lenientes com os atos golpistas. Nem é o caso de falarmos de Jair Bolsonaro: como dizia o Barão de Itararé, de onde menos se espera é que não vem nada mesmo. Mas olhemos para quem tem a si mesmo na conta de gente séria: o caricatural ministro da Defesa e general do Exército Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira e os comandantes das Forças Armadas – Marco Antônio Freire Gomes, do Exército; Almir Garnier Santos, da Marinha; e Carlos de Almeida Baptista Junior, da Aeronáutica.
Paulo Sérgio, o ministro, topou ser oSargento Pincelde Bolsonaro na esquete de humor chinfrim montada pelos fardados para dar ao presidente e “mau militar” – palavras de Ernesto Geisel – a chance de não reconhecer uma derrota eleitoral legítima. Freire Gomes, Garnier e Baptista Junior não se saíram melhor: publicaram umacartaem que arvoram para as forças que comandam o papel de “moderadoras nos mais importantes momentos de nossa história”. É até possível ser mais golpista que isso. Mas não é fácil.
Ao mesmo tempo que requerem para si um papel que a Constituição que juram defender não prevê, os três chefes militares – notadamente Freire Gomes – assistem bovinamente ao desfile de golpismo diante de seus gabinetes. Em Brasília, o comandante do Exército beberica cafezinhos tendo entre si e o pôr do sol faixas que pedem a dissolução do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral e desafiam a posse de Lula (“não sobe a rampa”). Na lorota contada pelos militares, é apenas uma “manifestação pacífica e crítica aos poderes constitucionais e à atividade jornalística”. Falando em jornalistas, houvemais de 60 ataques contra profissionais da imprensanos atos golpistas. Em 1980, queimavam bancas. Agora, chutam repórteres.
Estamos num caldeirão muito mais complexo que o de 1980 – basta pensar no papel das redes e dos chans
Fico curioso ao imaginar qual seria a reação de Freire Gomes e seus pares caso algum gaiato resolvesse montar acampamento naPraça dos Cristais, em frente ao Quartel General, com faixas berrando pedidos pela dissolução imediata do Alto Comando do Exército. Ou, mais modestamente, pela prisão do general da reserva Eduardo Pazuello pelo trágico comando do Ministério da Saúde durante o auge da pandemia de covid-19. Não creio que haveria tempo para estrear a barraca.
Por que, então, a complacência com gente que transformou o Setor Militar Urbano de Brasília num imenso lamaçal coalhado de barracas e centenas de carros, camionetes e caminhões semi-atolados, como num delírio febril de um festival de Woodstock em que a Banda dos Corações Golpistas do Clube Militar é headliner e as drogas bateram muito, mas muito mal? Não consigo pensar num único motivo que tenha a boa fé e o cumprimento estrito dos deveres militares como ingredientes.
Vem mais por aí: falta pouco mais de um mês para a posse de Lula e Alckmin. É razoável supor que a militância petista, habitualmente numerosa e organizada, irá se deslocar maciçamente a Brasília – fala-se em150 mil pessoas, multidão semelhante à presente no ato golpista de 7 de setembro de 2021. Muitos virão de ônibus, em caravanas que partirão de quase todos os cantos do país. E precisarão atravessar estradas que, até há pouco, estavam bloqueadas pormanifestantes golpistas acobertados pela Polícia Rodoviária Federal.
Pelo que se viu até agora, é razoável imaginar que o Exército seguirá a não fazer nada para retirar da porta de suas instalações a turba sequiosa por um golpe de estado e uma ditadura. É provável que vários entre eles estejam armados. Ainda que venham a ser impedidos, como prometem as autoridades, de chegar à Esplanada dos Ministérios em 1o de janeiro, nada garante que não estarão no caminho dos lulistas que rumam a Brasília – seja já na capital ou em estradas pelo país. E aí, quem irá intervir? A PRF, de Silvinei Vasques? Ou as polícias militares, boa parte delas comandadas por gente como o infameHudson Leôncio Teixeira, que admitiu no Paraná que prevaricou em favor dos golpistas?
O último legado do governo de Jair Bolsonaro e seus cafajestes é a volta ao Brasil de um terrorismo da extrema direita de intricadas e insondáveis conexões com o aparato estatal de segurança pública.
Que estejamos atentos para prevenir o novo Riocentro.