Equipes de reportagem da Agência Pública estão na Amazônia, no Vale do Javari, para se unir ao esforço de jornalistas de todo o mundo na tentativa de elucidar as circunstâncias do assassinato de Dom Phillips e Bruno Pereira e informar o público sobre as ações das autoridades e instituições no caso. Leia aqui as primeiras reportagens de Rubens Valente, Ciro Barros, Avener Prado, José Medeiros, editadas por Marina Amaral e Thiago Domenici para a Agência Pública.
Protesto indígena nos tempos de cólera Bolsonaro presidente
Se, diante de tudo isso, não conseguirmos conduzir um processo severo na justiça contra Bolsonaro, teremos fracassado como sociedade
por Clarissa de Franco
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Nesta semana vieram ao grande público imagens que nos remeteram a países como Etiópia, Sudão, Zambia, Congo, países que carregam a marca de constarem no mapa da fome mundial. Tomar consciência da realidade dos yanomamis em Roraima. 11 mil casos de malária, desnutrição, síndrome respiratória aguda, verminoses, grave insegurança alimentar, contaminação por mercúrio, falta de medicamento e de assistência de saúde... a lista das mazelas é enorme e assusta.
Assusta ainda mais é saber que 21 ofícios foram enviados ao governo Bolsonaro e o que foi feito foi justamente liberar ainda mais as terras indígenas para o garimpo ilegal. Em julho de 2020, o então presidente Jair Bolsonaro promoveu vários vetos ao Plano Emergencial para Enfrentamento à Covid-19 nos territórios indígenas, tendo vetado, inclusive pontos que previam o acesso das aldeias a leitos hospitalares, à água potável, a materiais de higiene, entre outros.
Não se pode dizer que Bolsonaro nos apresentou uma farsa quanto a este tema. Foi tudo bem explícito, na verdade. Em 2017, anunciou que, se dependesse dele não seria demarcado “nenhum centímetro” de terra indígena. Durante a campanha presidencial em 2018, ele foi bem claro, afirmando: “Não podemos ter ambientalismo xiita no Brasil. Vamos acabar com a indústria da demarcação de terras indígenas”. Chamando, portanto, a demarcação de território indígena de indústria e o ambientalismo que protege os povos originários de xiita, Bolsonaro nos forneceu ao longo de anos, aulas de como o Estado pode se tornar uma ferramenta de genocídio histórico, cultural, político, patrimonial, ambiental, e em última instância, humano. Tudo na nossa frente. Queimadas, garimpos, desmatamentos, assistimos à legalização da morte, enquanto o mundo retirava apoio financeiro para proteger a Amazônia e fazia do Brasil um alvo de chacota pública por termos eleito um representante do nível Bolsonaro.
Rita Segato, uma grande pesquisadora decolonial argentina que atuou durante anos no Brasil, na UNB, apontou que o contato de garimpeiros, madeireiros e empreiteiros com os povos indígenas produz uma série de adoecimentos e violências no ecossistema indígena. O olhar colonizador do homem branco que depreda a terra vê a mulher indígena e seu corpo também como um território a ser dominado, invadido, violado, violentado. Além da violência explícita, a sexualização da nudez, torna-se um legado simbólico difícil de ser apagado.
Para os indígenas, os mal tratos e as violências ao território representam violar uma parte fundamental e vital de seu povo, já que a terra é uma extensão de sua existência. Não há vida indígena sem terra. E não há Brasil sem indígenas. O que temos assistido como efeitos catastróficos do governo da necropolítica é o desprezo pela nossa história e pelas nossas vidas. Se, diante de tudo isso, não conseguirmos conduzir um processo severo na justiça contra Bolsonaro, teremos fracassado como sociedade.
Passando a boiada
Jornalistas Livres
@J_LIVRES
Polícia Federal revela o mandante dos assassinatos de Bruno Pereira e Dom Phillips. Segundo a PF, Rubens Villar Coelho, conhecido como "Colômbia", mandou matar o indigenista brasileiro e o jornalista britânico em junho do ano passado no Vale do Javari, no Amazonas
MPF afirma que decreto das armas de Bolsonaro facilita desvio para crime organizado e milícias (O Globo, outubro de 2019)
Governo Bolsonaro revoga portaria que prevê rastreamento e identificação de armas. Medida visava dificultar acesso do crime organizado a armas. (Estadão, abril de 2020)
Pesquisadores apontam que revogação feita por Bolsonaro ajuda facções e milícias (UOL, abril de 2020)
Decreto de Bolsonaro pode beneficiar Ronnie Lessa, acusado de matar Marielle, em processo por tráfico internacional de armas (O Globo, agosto de 2021)
Dono de arsenal registrado como CAC desviava munições compradas legalmente para traficantes do Rio (Fantástico, janeiro de 2022)
Armados pelo governo Bolsonaro, CACs usam acesso a material bélico para fortalecer milícia e tráfico (O Globo, fevereiro de 2022)
Decretos assinados por Bolsonaro beneficiam traficantes internacionais de armas. Condenados conseguiram redução de pena ou foram até inocentados (O Globo, maio de 2022)
Polícia afirma que integrantes da facção criminosa PCC usavam fuzil, metralhadora e pistolas legalizadas (Band, junho de 2022)
Exército admite que liberou compra de fuzil para integrante do PCC. Integrante do PCC usou autodeclaração de idoneidade, que foi aceita pelo Exército (Folha, julho de 2022)
Investigações mostram como política de Bolsonaro arma o PCC. 'Cesta básica' do crime formada por fuzis, carabinas e pistolas ficou até 65% mais barata com liberação de armas (Estadão, julho de 2022)
Atirador desportivo é preso sob suspeita de vender armas e munição ao PCC (Folha, agosto de 2022)
2. GARIMPO ILEGAL
Após desmontar esquema de garimpo ilegal em Terras Indígenas, Bruno Pereira é demitido do cargo de coordenador da Funai (Brasil de Fato, outubro de 2019)
Bolsonaro promete rever norma de queima de maquinário ilegal de garimpeiros (Valor, novembro de 2019)
Bolsonaro assina projeto que autoriza garimpo em terras indígenas. Presidente afirmou que confinaria ambientalistas na região amazônica para que eles 'parem de atrapalhar' (Folha, fevereiro de 2020)
Avião da FAB é usado para transportar garimpeiros ilegais para reunião com Salles (Diário de PE, agosto de 2020)
Garimpo ilegal explode em território yanomami e ameaça indígenas (DW, março de 2021)
Bolsonaro visita garimpo ilegal em terra indígena de Roraima (Poder 360, outubro de 2021)
Bolsonaro cria programa que estimula garimpo na Amazônia legal (Congresso em Foco, fevereiro de 2022)
Decreto de Bolsonaro sobre 'mineração artesanal' é incentivo ao garimpo ilegal na Amazônia, apontam ambientalistas (G1, fevereiro de 2022)
Governo Bolsonaro utiliza AGU para defender mineração em terras indígenas mesmo sem lei (Folha, abril de 2022)
Com avanço do garimpo, terror se espalha nas terras indígenas. Avanço do garimpo em reservas, sem fiscalização dos órgãos competentes, tem deixado rastro de violência e destruição (Correio Braziliense, maio de 2022)
Bolsonaro demite responsável no INPE pelo monitoramento do desmatamento. A demissão ocorreu após a divulgação pelo órgão de dados sobre o aumento do desmatamento da Amazônia. (Correio Braziliense, agosto de 2019)
Desmatamento na Amazônia bate recorde e cresce 29,5% em 2019 (Folha, novembro de 2019)
Salles demite analista que se opôs a exportação ilegal de madeira (Congresso em Foco, abril de 2020)
Em reunião ministerial, Ricardo Salles, Ministro do Meio Ambiente defende "passar a boiada" e mudar regras ambientais enquanto atenção da mídia estava voltada para a Covid-19 (G1, maio de 2020)
ONGs, índios, Inpe, governadores e DiCaprio: veja quem já foi acusado por Bolsonaro pelas queimadas e desmatamento na Amazônia (G1, setembro de 2020)
Desmatamento na Amazônia cresce 9,5% em 2020 e bate novo recorde (DW, novembro de 2020)
Governo Bolsonaro ignora 97% dos alertas de desmatamento no Brasil emitidos desde 2019 (G1, maio de 2021)
PF aponta envolvimento de Ricardo Salles em contrabando de madeira ilegal. EUA entregaram ao Brasil detalhes sobre o envolvimento de Salles no esquema (Reuters e El País, maio de 2021)
Ricardo Salles pediu demissão após saber que seria preso (Estadão, junho de 2021)
Desmatamento na Amazônia cresce 21,97% em 2021; maior índice desde 2006 (Gazeta do Povo, novembro de 2021)
Maior taxa de desmatamento na Amazônia em 15 anos coincide com menor número de autuações do Ibama (G1, novembro de 2021)
No governo Bolsonaro, 98% das multas ambientais ficam travadas (Estadão, dezembro de 2021)
Advogado de Bolsonaro atuou para liberar madeira ilegal apreendida pela PF (Rede Brasil Atual, janeiro de 2022)
Relatório da CGU aponta que Ministério do Meio Ambiente colocou em risco continuidade do Fundo Amazônia, que tem R$ 3,2 bilhões paralisados (G1, junho de 2022)
Após prometer exoneração, Bolsonaro troca superintendente da PF no Rio (Exame, agosto de 2019)
Bolsonaro aciona AGU para defender redes sociais de apoiadores investigados em inquérito do STF (UOL, julho de 2020)
Roberto Jefferson defende criação de milícia para dar um pau na guarda municipal de Juiz de Fora. Segundo ele, os milicianos deveriam 'atear fogo nas viaturas' e 'dar pauladas nos joelhos e cotovelos, para quebrar' os agentes municipais (Estado de Minas, março de 2021)
Bolsonaro ameaça ministros do STF após prisão de Roberto Jefferson (Correio Braziliense, agosto de 2021)
Diretor-geral da PF troca delegado que investiga Jair Renan e fake news (Correio Braziliense, outubro de 2021)
Secretário de Justiça tentou retardar extradição de Allan dos Santos (O Globo, novembro de 2021)
PF exonera delegada que determinou ordem de prisão de Allan dos Santos (Congresso em Foco, dezembro de 2021)
Assessora envolvida na extradição de Allan dos Santos é exonerada (Metrópoles, dezembro de 2021)
Secretário de Justiça que tentou retardar extradição de Allan dos Santos ganha medalha (O Antagonista, dezembro de 2021)
Novo diretor-geral da PF troca o delegado responsável pelo setor de investigação de corrupção. Delegacia era responsável por investigações de aliados e filhos de Bolsonaro (G1, março de 2022)
Bolsonaro concede indulto a Daniel Silveira. O deputado federal havia sido condenado pelo STF a 8 anos e 9 meses de prisão por estimular atos antidemocráticos e incitar ataques a integrantes do Supremo (Correio Braziliense, abril de 2022)
Bolsonaristas vão defender projeto na Câmara para perdoar mais aliados do presidente (Congresso em Foco, abril de 2022)
AGU assume a defesa de Wal do Açaí em processo de improbidade administrativa (Conjur, maio de 2022)
MPF diz que é ilegal AGU defender Bolsonaro e Wal do Açaí em ação de improbidade (G1, junho de 2022)
MP pede para investigar Bolsonaro por interferência em apuração sobre corrupção no MEC (Metrópoles, junho de 2022)
Pense bem nisso. Mais de 2 bilhões de árvores foram mortas na floresta amazônica desde que Jair Bolsonaro se tornou presidente do Brasil.
Um massacre dessa dimensão é quase impossível de conceber. Então, vamos percorrer juntos essa escalada. Pense nas duas árvores favoritas de sua vida: talvez aquelas com as quais você cresceu e que lembra sua família, ou as belezas outonais de um jardim ou parque favoritos, ou aquelas que na sua rua dão um sopro de cor e de vida quando você passa por elas no seu caminho para fazer compras, ou as árvores enormes que lhe deram sombra no sol ou abrigo na chuva.
Multiplique essas duas árvores primeiro por dez, depois por cem, em seguida por mil. Por um instante vista a pele dessa árvore, enfie-se dentro de seu tronco e imagine a vitalidade ali contida. Pássaros, insetos, musgos, liquens, pequenos animais, riachos gotejantes. Pegue então essas duas mil árvores e multiplique-as por mil e pense quantas horas levaria para você caminhar por essa floresta de dois milhões de árvores que você criou. Ainda não é tudo. Finalmente pegue essa floresta inteira e mais uma vez multiplique-a por mil. Aí, sim, pare e espante-se diante da imensidão da existência de 2 bilhões de árvores.
Dois bilhões de árvores em menos de quatro anos. Em geral, quando a gente fala de desmatamento, ignoramos números como esse, número de vidas. Em vez disso, falamos de hectares, ou quilômetros quadrados, ou campos de futebol, ou comparamos com o tamanho de Manhattan ou o País de Gales. Também é assim que eu tenho escrito por mais de dez anos. Mas a derrubada da Amazônia não deve ser medida somente em termos imobiliários. Essa terra é viva. Mais viva do que qualquer outra no planeta. É densa de plantas, repleta de insetos, preenchida por cantos de pássaros, sapos e macacos. Quando nós falamos tranquilamente sobre a abertura de clareiras devemos ter consciência de que isso significa o assassinato da vida, o massacre da natureza.
Dois bilhões de árvores em menos de quatro anos. Em média, isso é mais de um milhão por dia, 57 mil por hora, 950 por minuto ou 15 por segundo. Não tem como isso ser feito com machados ou motosserras ou mesmo tratores. Não é por acaso que grileiros e fazendeiros usam o fogo. Sua ação produz uma névoa no céu durante a época de queimadas mesmo quando não dá para ver as chamas. Pilotos de avião sofrem para sobrevoar a fumaça. Às vezes, jogos de futebol precisam ser cancelados por causa da pouca visibilidade. Quando me preparava para escrever este artigo, nós tivemos uma névoa dessas aqui em Altamira. No mês passado, vimos um incêndio no horizonte tão intenso que gerou seus próprios relâmpagos.
Dois bilhões de árvores em menos de quatro anos significa que as queimadas se tornaram comuns. Há muito menos risco de punição agora que o presidente eviscerou os órgãos de proteção ambiental e deu sinal verde para madeireiros, garimpeiros e grileiros. Sob Bolsonaro, o desmatamento é agora 86% maior do que nos oito anos anteriores. Para aqueles que prosperam pelas chamas e fumaça, esta tem sido uma era dourada, mas eles explicitamente temem que ela esteja chegando ao fim. Com Bolsonaro em segundo lugar nas pesquisas e o risco de a maioria dos eleitores escolherem um presidente com menos gosto para incêndios criminosos, há uma corrida para queimar a floresta enquanto é tempo. Como SUMAÚMA documentou em sua primeira edição, o último mês viu 33.116 incêndios na Amazônia – pior número desde que Bolsonaro assumiu. O mês de setembro pode ser ainda mais devastador, com 22.487 queimadas apenas nos primeiros dez dias.
Dois bilhões de árvores em menos de quatro anos. Conforme o fogo avança, o quanto de vida não expira? SUMAÚMA pediu para o renomado instituto de pesquisa Imazon uma estimativa do impacto na floresta amazônica. Segundo Paulo Barreto, pesquisador sênior do Imazon, o número de árvores com pelo menos dez centímetros de diâmetro que provavelmente foram destruídas ou afetadas pelo fogo e derrubadas desde agosto de 2018 está entre 2,2 e 2,6 bilhões. O número de macacos mortos, machucados ou impactados está entre 1,6 milhão e 3,8 milhões, enquanto que o número de pássaros que perderam seus ninhos, habitats ou vidas está entre 78,1 e 89,1 milhões.
Dois bilhões de árvores em menos de quatro anos. Essas estimativas são calculadas usando uma avaliação do número médio desses grupos em um único hectare da Amazônia, e então esse valor é multiplicado por 4.709.511, que é o número de hectares que queimaram ou foram derrubados nos últimos quatro anos. Para fazer uma dupla verificação, perguntei a outro pesquisador de renome internacional, Tasso Azevedo, do Map Biomas, qual era sua própria avaliação de danos. A resposta é bastante semelhante: 2,3 bilhões de árvores destruídas de 2019 até hoje.
Dois bilhões de árvores em menos de quatro anos. O número de mortos de outras espécies é quase impossível de avaliar. Cientistas acreditam que identificaram menos da metade das espécies na floresta. Noemia Ishikawa, a principal micologista da Amazônia, me contou que há tantos tipos novos de fungos sendo descobertos que é difícil saber quantos mais existem por aí, o que faz com que a perda deles seja impossível de calcular. A situação para insetos, orquídeas, liquens, minhocas e bactérias é ainda mais obscura.
Dois bilhões de árvores em menos de quatro anos e esta é uma estimativa conservadora baseada unicamente em terras totalmente devastadas na Amazônia. Ela não leva em conta a parte da floresta parcialmente degradada, que é enorme. Nem inclui outros vastos biomas do Brasil, como a Mata Atlântica, o Pantanal e o Cerrado. Como podemos avaliar a perda dessa complexa rede de interações? Certamente não em termos de mercado, que tendem a valorizar mais as árvores mortas do que vivas. Economistas tentaram repetidamente medir os “serviços ambientais” fornecidos por uma floresta viva em termos de sequestro de carbono, purificação da água, produção de comida, benefícios de saúde, fornecimento de habitats e regeneração de solo. Suas contagens em dólar possuem uma impressionante quantidade de zeros, mas não chega nem perto do que está sendo realmente perdido. Como é que se pode precificar um clima estável, ciclos globais de água, bem-estar espiritual, interdependência? Ou como precificar o impacto de saber que suas crianças vão herdar um mundo degradado no qual a maior floresta tropical está sendo incinerada até o ponto de não retorno?
Dois bilhões de árvores em menos de quatro anos. Meu amigo e colega Dom Phillips descreveu Bolsonaro como “o presidente da morte” em uma mensagem de WhatsApp que me mandou em 2021. Ele estava falando principalmente da resposta assassina e desdenhosa que o líder do Brasil deu à pandemia de covid-19, que até agora resultou na morte de mais de 685 mil brasileiros, uma das piores contagens nacionais do mundo. Mas Dom também reportou e temeu a piora da destruição da Amazônia, o relaxamento das leis de armas, os níveis crescentes de fome, o aumento da confortável impunidade de criminosos, além de casos de violência contra os defensores da floresta e os ambientalistas. Essas são todas manifestações de uma cultura da morte. Dom também foi vítima de uma cultura do assassinato, quando, em junho deste ano, ele e o indigenista Bruno Pereira foram executados e enterrados no Vale do Javari. Dom foi morto quando fazia suas pesquisas para um livro chamado “Como Salvar a Amazônia”.
Dois bilhões em menos de quatros anos. O ex-capitão que se tornou presidente se gaba de sua disposição para tirar vidas. “Eu sou um capitão do Exército”, disse ele antes de assumir o poder. “Minha especialidade é matar.” Junto com pessoas e a natureza, essa bandidagem crua provocou outra baixa: a reputação global do Brasil. Dez anos atrás, o Brasil era admirado mundo afora como uma democracia multiétnica que crescia saudavelmente e que estava enfrentando a desigualdade e a destruição ambiental. Hoje, o país tornou-se um pária internacional graças às grosserias de seu líder. Apenas uma rápida olhada na onda de manchetes negativas desde que ele assumiu o poder e torna-se explícito que o presidente da morte está matando também a reputação do Brasil. É mais um legado que se soma a um número de vítimas fatais de covid equivalente à população de algumas capitais e a um holocausto florestal de 2 bilhões de árvores.
O presidente Jair Bolsonaro (PL), a primeira-dama Michelle e a comitiva brasileira chegaram a Londres no início da manhã deste domingo (18/9). O governo brasileiro participa do funeral da rainha Elizabeth II, em eventos hoje e nesta segunda-feira (19/9).
Depois de desembarcar em território britânico, o mandatário seguiu até a embaixada brasileira, onde foi recebido por dezenas de apoiadores. Aproveitando o momento, que teve até distribuição de pão de queijo por parte dos brasileiros residentes na capital, Bolsonaro fez discurso de improviso.
Acompanham o presidente, entre outros, os filhos Flávio e Eduardo e o pastor Silas Caifás Malafaia.
O vexame de Jair Bolsonaro ao usar a viagem para o funeral da rainha da Inglaterra para fazer propaganda eleitoral repercutiu nos tabloides londrinos e foi alvo de críticas por parte da mídia liberal.
O tabloide Mail afirma que o discurso de Bolsonaro visou "ganhar pontos antes das eleições".O colunista da Folha de S.PauloNelson de Sácita a chamada do liberal The Guardian: "Bolsonaro usa visita para funeral da rainha como ‘palanque eleitoral’".
O jornal chama Bolsonaro de "presidente de extrema-direita" e informa que "amigos e parentes do jornalista britânico Dom Phillips, assassinado na Amazônia, também se reuniram [diante da embaixada] para expressar sua indignação com a presença de Bolsonaro. O pequeno grupo teve que ser protegido pela polícia".
O Guardian anota que Lula criticou a ação de Bolsonaro, dizendo que ele estaria atrás de "boa imagem" no exterior.
Para a agência Reuters, "Bolsonaro atrai atenção por discurso de campanha agressivo antes do funeral da rainha". Por sua vez, a agência Associated Press escreve que "Bolsonaro busca votos antes do funeral da rainha".
Gritos da Amazônia. Juca Kfouri entrevista Eliane Brum. O presidente do Indigenistas Associados (INA), Fernando Vianna, disse que o brasileiro e o inglês foram mortos numa região onde, em 2019, um colaborador da Funai também foi assassinado por conta de seu trabalho de fiscalização no combate a atividades ilícitas
Fonte Agência Senado
Representantes de entidades indigenistas insistem na tese de que o assassinato do ativista Bruno Araújo e do jornalista britânico Dom Phillips não foram fatos isolados e estão num contexto de criminalidade crescente na região Amazônica, em especial no Vale do Javari. A violência na Amazônia foi debatida, nesta terça-feira (22), em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH) e da Comissão Temporária sobre a Criminalidade na Região Norte.
A iniciativa partiu do presidente da CDH, senador Humberto Costa (PT-PE), que alegou que o desmatamento tem aumentado de forma acelerada no país. Ele também acusou o governo federal de se omitir no combate a atividades criminosas no setor e de desmontar instituições responsáveis pelo combate a crimes ambientais e pela proteção dos povos indígenas.
— É interesse do Senado e do Congresso Nacional e tenho convicção que tudo será feito pelo Poder Legislativo para evitar a repetição de fatos como esse — afirmou, referindo-se às mortes que tiveram repercussão internacional.
Críticas à Funai
O presidente do Indigenistas Associados (INA), Fernando Vianna, disse que desde o início, quando soube do desaparecimento das duas vítimas, ficou muito preocupado, pois sabia que se tratava de um fato inserido num contexto mais amplo.
Segundo ele, o brasileiro e o inglês foram mortos numa região onde, em 2019, um colaborador da Funai também foi assassinado por conta de seu trabalho de fiscalização no combate a atividades ilícitas.
— Há todo um quadro de invasão de pessoas que ingressam nas terras para atividades ilegais. Junto com os crimes ambientais mais costumeiros, como pesca e caça ilícitas, há articulações com forças do crime muito mais complexas, com conexões com o narcotráfico internacional e o comércio de armas — afirmou.
Fernando Vianna ainda fez críticas ao trabalho atual da Funai, que, segundo ele, tem uma diretoria comprometida não com direitos indígenas, mas com interesses econômicos e de setores que disputam a posse de terras e querem se apoderar de recursos naturais.
Ele ainda fez um pedido aos senadores que ajudem na articulação com o Ministério da Justiça, já que os servidores da Funai estão em estado de greve.
Diretoria marcada
Além de pedir à Polícia Federal uma investigação mais ampla sobre os assassinatos de Dom e Bruno, o representante da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), Eliesio Marubo, afirmou que a diretoria toda da Univaja está marcada e ameaçada de morte, que se intensificaram a partir de 2019, assim como a violência na região.
Ainda segundo ele, a atuação da instituição é toda pautada no interesse das comunidades, uma vez que o Estado é omisso na região.
— Gostaria muito de ouvir o que a Funai tem a dizer. O que o MP fez com tantas denúncias que temos feito? É importante esse acompanhamento da comissão, para darmos respostas às famílias e à sociedade. Certamente teremos mais casos na região. Vários integrantes da diretoria da Univaja estão ameaçados. Continuaremos de cara limpa brigando pelos nossos parentes e exigindo que o Estado cumpra sua obrigação — lamentou.
A pedido do presidente da Comissão Temporária sobre a Criminalidade na Região Norte, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Eliesio Marubo também explicou aos parlamentares a situação de Bruno Araújo, que havia pedido licença da Funai, depois de alegar estar sendo perseguido pela cúpula da instituição.
— Ele nos relatava muito a perseguição sofrida pela atuação dele contra principalmente a caça e pesca ilegais. São atividades com reflexo no mundo político. Quem realiza essas condutas aparentemente simples, porém ilegais, são famílias grandes, que têm títulos de eleitor. E os políticos locais, que tem seus padrinhos, precisam demonstrar apoio — acusou.
Irritação
O coordenador-geral substituto de Índios Isolados e Recém-Contatados da Fundação Nacional do Índio, Geovanio Oitaia Pantoja, informou que a Funai soube do desaparecimento de Bruno e Dom na segunda-feira de manhã e, no mesmo dia, entrou nas buscas, que já estavam sendo feitas desde domingo pela Univaja.
— Em todo o momento a ideia era encontrá-los vivos. A Funai esteve presente em todo o processo de busca e acompanhamento juntamente com outras instituições — explicou.
Ainda segundo ele, a Funai tem feito ações de repressão e fiscalização dentro de territórios indígenas com apoio da Força Nacional de Segurança Pública e Polícia Militar.
Depois de ter pressionado o representante da Funai para esclarecer mais detalhes sobre a atuação da entidade na região e para saber de quantas operações de fiscalização ele havia participado, Randolfe reagiu ao constatar que Geovanio estava em Brasília, mas participando da audiência pública por meio virtual.
— Ele está aqui em Brasilia falando conosco por via remota! O senhor estar falando daqui é um desrespeito a essa comissão! — afirmou.
O servidor da Funai ainda respondeu algumas perguntas do senador Nelsinho Trad (PSD-MS), relator da comissão temporária. Mas, insatisfeito, Randolfe sugeriu que Geovanio seja convocado ou convidado futuramente para prestar mais esclarecimentos.
O comparecimento presencial de Geovanio foi requisitado também pelo vice-presidente da comissão temporária, senador Fabiano Contarato (PT-ES), para quem a situação da Funai é muito grave.
— Esse governo está armando grileiros e enfraquecendo órgãos de fiscalização em todos os cantos do país. O mesmo governo que enfraquece os órgãos fiscalizadores estimula crimes ambientais, por isso essas duas comissões precisam jogar luz nesta situação — avaliou.
Prevaricação
No fim da reunião, o senador Humberto Costa deu a palavra a lideranças indígenas que participaram da audiência. Em comum, prestaram solidariedade às vítimas; cobraram demarcações de terra; criticaram a atuação da direção da Funai; denunciaram crimes; e pediram providências e respeito aos direitos consagrados pela Constituição.
As comissões também receberam dos ativistas um documento da Univaja contendo as denúncias feitas pela instituição a diferentes órgãos e entidades locais e federais. Os senadores informaram que vão enviar comunicado a cada uma das autoridades que em algum momento recebeu denúncias e cobrar providências sobre o que foi feito desde então.
Randolfe lembrou que entre as denuncias feitas pela Univaja está um ofício de abril, já dando noticias sobre pesca ilegal na região com a participação de um homem conhecido como Pelado, apontado como um dos assassinos de Bruno e Dom.
— Esse ofício é quase uma premonição. Dá informações sobre quem faz a atividade ilegal, onde mora, como atua e que está armado. Não demorou 60 dias, mataram Bruno e Dom [...] Deixaram ocorrer esses homicídio, no mínimo, com a prevaricação criminosa do Estado brasileiro — disse Randolfe.
As eleições brasileiras tornaram-se um assunto mundial após a derrota de Donald Trump em 2021 nos Estados Unidos. O que está em jogo não é pouco. O Brasil é o maior país da América Latina, tem uma fonte de riquezas ainda inexplorada, abriga a Amazônia e possui um mercado interno potencial de fazer inveja ao resto do planeta.
A direita mundial está em pânico. A mensagem de Trump rasgando elogios aBolsonarodepois do 7 de setembro diz tudo. Apesar de derrotado em casa, Trump, magnata americano, ainda reúne milhões de seguidores e almeja voltar ao poder.
Depois dos resultados eleitorais que deram vitória a Joe Biden, Trump ainda tentou um golpe inédito em 6 de janeiro ao comandar a invasão do Capitólio. Fracassou num primeiro momento. Não se deu por rogado. Expulso da Casa Branca pelo voto, Trump surrupiou documentos secretos para uso particular e agora tenta escapar de uma penca de processos. A democracia americana fraqueja diante de tanta desfaçatez.
Agora, é Bolsonaro, seu aliado preferencial de outrora na América Latina, que carrega a tarefa de manter vivo o domínio de supremacistas brancos, do grande capital e da exploração desenfreada do povo pobre mundo afora. Engana-se quem pensa que os cartuchos já foram esgotados no Brasil. Pesquisas são pesquisas. Não são elas que decidem o jogo.
Bolsonaro e sua horda de alucinados partiram para o tudo ou nada. Além do combate às urnas eletrônicas, as mortes começam a se acumular. Nesta quinta-feira (08/09), um bolsonarista matou um petista a facadas em Mato Grosso do Sul. Tinha um machado para completar o “serviço”.
Lembrem-se da morte do dirigente do PT fuzilado no Paraná quando comemorava seu aniversário, para não falar de Marielle Franco, de Bruno Pereira e Dom Philips e de muitos outros vitimados com a conivência do Planalto e também, cada uma a sua maneira, de instituições que deveriam defender a democracia.
O 7 de setembro reforçou o recado. “Temos que extirpar essa gente”, bradou o capitão expulso do Exército ao lado de um empresário investigado por articulações golpistas, o “Louro José” Luciano Hang, das lojas Havan. O “salve geral” foi enviado aos bolsonaristas como licença para cometer atrocidades contra quem se opuser à direita e à extrema direita. Não por acaso,o deputado estadual cearense Francisco de Assis Cavalcante Nogueira, mais conhecido como Delegado Cavalcante (PL-CE),bolsonarista-raiz, achou-se à vontade para, em seu discurso no mesmo 7 de setembro, ameaçar: “Se a gente não ganhar nas urnas, nós vamos ganhar na bala”
Bolsonaro usou o 7 de setembro como um comício televisionado ao vivo a favor de suas barbaridades, temperado com o machismo de sempre e custeado pelo dinheiro do povo. Usa as canetadas para distribuir dinheiro a rodo (só até dezembro), financiar um orçamento clandestino e obstruir investigações sobre o crescimento astronômico do seu patrimônio e da família em dinheiro vivo! Nada acontece: Supremo, Tribunal Eleitoral, grande mídia & cia escondem-se atrás de prazos processuais e minudências judiciais para deixar o fogo se alastrar.
É preciso ampliar os horizontes sobre o que está acontecendo. A grande imprensa internacional, controlada por uma “direita civilizada”—vigiada por sociedades com tradição mais ou menos democráticas–, alerta insistentemente para os riscos da jornada bolsonarista. A publicação mais enfática a respeito foi a revista britânica “The Economist”, que pode ser acusada de muita coisa, menos de ser porta-voz da esquerda. Nesta semana, dedicou reportagem de capa às eleições brasileiras.
O texto termina assim: “O melhor resultado seria o sr. Bolsonaro perder por uma margem tão ampla que ele não possa plausivelmente alegar ter vencido, seja no primeiro turno em 2 de outubro, ou (mais provável) em um segundo turno em 30 de outubro. Serão semanas tensas e perigosas. Outros países devem apoiar publicamente a democracia brasileira e deixar claro aos militares brasileiros que qualquer coisa que se assemelhe a um golpe faria do Brasil um pária. Os eleitores brasileiros devem resistir à atração de um populista desavergonhado. Eles, e o país, merecem coisa melhor.”
A “Economist” não virou a casaca. Apenas enxerga o que boa parte da imprensa brasileira trata cheia de dedos. Bolsonaro é um risco não apenas para o país, mas para os grandes negócios das multinacionais e do dinheiro gordo.
O capitalismo está às voltas com uma crise que não para de crescer, feita de descontrole financeiro, desastre ambiental, insurreições, inflação descontrolada e piora generalizada das condições de vida do povo pobre e mesmo da classe média –ambos a maioria.
O mundo ainda vive as ondas de choque do crash de 2008, que assinou novo atestado de óbito do neoliberalismo. Naquela crise, os mandatários supostamente “anti-estatizantes” despejaram montanhas de dinheiro público para salvar bancos e capitalistas à beira do naufrágio. O governo americano e seus congêneres chegaram a comprar grandes empresas prestes a falir para depois devolvê-las a responsáveis pela catástrofe.
Agora, temos outro momento bastante grave. O capitalismo precisa da rapina desenfreada e selvagem para sobreviver, mas precisa também de “certo consenso” para que a exploração seja suavizada e pareça aos explorados o curso natural das coisas. Só que é possível enganar poucos durante algum tempo, muitos durante pouco tempo, mas não todos durante todo o tempo.
As grandes potências internacionais hoje lutam em torno de uma saída palatável para manter seus privilégios e suas fontes de recursos. A guerra da Ucrânia continua, sabiam? Disputa por combustíveis, gás e cerco à Rússia e à Ucrânia. Milhares de mortos, milhões de refugiados em plena Europa. Alguém ainda fala disso? A mídia se encarregou de abafar o caso.
Hoje o Brasil não está apenas na mira dos EUA; o destino do país interessa à União Europeia, China, Rússia e sobretudo a gente oprimida por anos de submissão aberta ou disfarçada. É a velha luta de classes que está em curso. O Brasil neste momento está no centro do tabuleiro. A derrota de Bolsonaro será um respiro para quem ainda almeja um presente melhor e um futuro promissor.
Será só um primeiro passo, porém sem ele não se darão o segundo nem os posteriores. Os petistas ou não petistas devem ter isso em mente nesta reta final de campanha. Todo esforço é pouco para deter um retrocesso que só significará mais fome, miséria, obscurantismo, discriminação e desencanto. Aqui e alhures.
A intolerância religiosa é considerada uma forma de violência de caráter físico ou simbólico, é um ato de discriminação, ofensa e agressão às pessoas por causa de sua crença e prática religiosa
APalavra da Semana, um dos termos que são mais pesquisados e compartilhados na web, é Intolerância Religiosa, que está em evidência por conta da postagem de Michelle Bolsonaro no Twitter relacionada à religião africana. No Brasil, intolerância religiosa é crime previsto em lei, de acordo com o Código Penal brasileiro, Decreto-Lei número 2.848, dos crimes contra o sentimento religioso. É crime escarnecer publicamente por motivo de crença ou função religiosa, impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso, vilipendiar publicamente ato objeto de culto religioso. Quem comete esse crime pode pegar pena de detenção de um mês a um ano ou pagar multa. A intolerância religiosa é considerada uma forma de violência de caráter físico ou simbólico, é um ato de discriminação, ofensa e agressão às pessoas por causa de sua crença e prática religiosa. Especificamente no Brasil essa intolerância está diretamente relacionada com o racismo religioso, sendo uma violência praticada em maior grau contra os praticantes das religiões de matrizes africanas.
Palavra da Semana Produção e apresentação: Professora Deise Maria Antonio Sabbag - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) Coprodução e Edição: Rádio USP Ribeirão Coordenação: Rosemeire Talamone Estagiária: Brenda Marchiori Baixar arquivo
Grande parte dos conflitos religiosos que acontecem no mundo envolve crenças religiosas, misturado a fatores políticos, econômicos, raciais e étnicos. Muito do preconceito contra algumas religiões é por desconhecimento, intolerância e falta de diálogo com o outro. Então, religiões que deveriam viver em paz, acabam por se odiar e se enfrentar em conflitos e desgastes inúteis. A charge acima indica(A) religiões diferentes em diálogo inter-religioso. (B) um compartilhamento harmonioso entre pessoas de religiões diferentes. (C) um falso religioso contrariando os principios de uma verdadeira religião. (D) pessoas de religiões iguais em uma celebração religiosa.
Fracassamos a tal ponto, mas a tal ponto,que temos de provar p/Bolsonaro e Jovem Pan que 64 foi um golpe! No Brasil nem a história existe. Próximo passo: negar a escravidão e descendentes de escravocratas pedirem indenização. Foram expropriados. Bingo.
Eliane Cantanhede em forte recaída lavajatista defendendo quem? Quem? Dallagnol. O cara apronta todas, gasta 4 milhões para diárias inclusive a quem mora na própria cidade e ela diz que os fins justificam os meios. Não tem cura isso. Só banho de descarrego! “Viva Moro”!
Bolsonaro falseia feio a história sobre 1964: foi feito de “acordo com a Constituição de 1946”. Não basta negar COVID. Tem de negar o golpe. Negar a ditadura. E pensar que o STF julgou constitucional a lei da anistia. Que baita erro. E os militares criticam o STF…Deviam vibrar.
Resposta a Sardenberg que criticou a Carta aos Brasileiros! No O GLOBO:
Não tem um cristão ou uma alma bondosa que informe a essa malta de repórteres que se diz “dolo” com “o” aberto e não “dôlo”? Bando de infelizes. Que irritante.
Caminhão circula em Los Angeles, durante a Cúpula das Américas, com telão que traz a imagem de Dom Phillips e Bruno Araújo. Repercussão no mundo é a pior possível. E com razãoI
por Reinaldo Azevedo
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Pronto!
Já se sabe o que se temia saber: Dom Philipps e Bruno Araújo Pereira estão mortos. O governo Bolsonaro é culpado? "Culpa" é vocábulo oriundo ou da religião ou do direito penal. O governo Bolsonaro é responsável. E a "responsabilidade" integra o vocabulário da política e da moral.
Bolsonaro, como ficou evidente em mais de uma manifestação, preferiu culpar as vítimas. É o que também fazem os seus bate-paus nas redes sociais. A síntese é esta: "Conheciam os perigos; quem mandou?". Os facinorosos digitais, na verdade, já estão dedicados a uma campanha para demonizar o jornalista e o indigenista, a exemplo do que fizeram com Marielle Franco, assassinada no dia 14 de março de 2018.
No extremo da abjeção, chegaram a associá-la ao tráfico de drogas. Na sanha para atrair o eleitorado de extrema-direita, o então candidato ao governo do Rio Wilson Witzel, que disputava o segundo turno com Eduardo Paes em 2018, levou Daniel Silveira e Rodrigo Amorim a um ato para quebrar uma placa de rua em homenagem à vereadora. Silveira e Amorim já tinham sido eleitos, respectivamente, deputado federal e deputado estadual. Era a brutalidade em estado puro. Na foto, os três riem à larga.
Em 1976, Milton Nascimento e Ronaldo Bastos compuseram a música "Menino", em homenagem a Edson Luís, assassinado pela Polícia no dia 28 de março de 1968 no Calabouço, restaurante estudantil que ficava no Aterro do Flamengo. Diz a letra:
"Quem cala sobre teu corpo/ Consente na tua morte (...) Quem cala morre contigo/ Mais morto do que estás agora".
O bolsonarismo não cala sobre os corpos. Essa gente os proclama e os transforma em estandarte às avessas, como se fossem despojos que tomaram do inimigo. Assim, não basta que morram: também é preciso destruir a sua reputação, tentando impor-lhes uma segunda morte, como tentaram fazer com Marielle.
AS RESPONSABILIDADES
O governo Bolsonaro é culpado? É responsável pelo desmonte das políticas ambientais; pela incitação quase cotidiana, ainda que indireta, à invasão de terras indígenas; pela demonização das reservas; pela desqualificação permanente de lideranças e entidades que atuam em favor da preservação da Amazônia; pela incentivo à resolução de conflitos na base da bala; pela desqualificação dos críticos, mesmo os mais técnicos, que são tratados como inimigos.
A rede bolsonarista antecipou um argumento que o próprio presidente vocalizou em solenidade no Palácio do Planalto:
"Quando mataram a Dorothy Stang, ninguém culpou o governo. Era de esquerda".
No dia 12 de fevereiro de 2005, a freira norte-americana Dorothy Stang, naturalizada brasileira, foi assassinada com seis tiros na área rural do município de Anapu, no Pará. A morte da missionária foi encomendada pelos fazendeiros Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, e Regivaldo Galvão, o Taradão. Amair Feijoli da Cunha, o Tato, foi intermediário do crime. Rayfran das Neves Sales e o comparsa, Clodoaldo Carlos Batista, foram os executores.
Numa entrevista, Rayfran diz que não esperava que a morte da freira tivesse tamanha repercussão porque, vejam vocês, "quase todo dia morria gente lá". E depois emendou: "A mídia fez isso. Colocaram o que eles quiseram colocar. Eu não sou um monstro". E dá um sorriso.
Matadores não gostam da mídia.
O presidente era Lula. A ministra do Meio Ambiente era Marina Silva. É fácil enfrentar a questão proposta por Bolsonaro — até porque ninguém está "culpando" o seu governo. De fato, a gestão Lula não podia ser considerada responsável porque buscava combater a grilagem de terra e dava suporte à reforma agrária. O assassinato de Dorothy estava contra a metafísica influente do Palácio do Planalto então; já as mortes de Dom e Bruno estão a favor do Palácio de agora.
É claro que o presidente da República sabe a diferença. Assim como diferentes foram as reações.
Lula se pronunciou deste modo sobre Dorothy:
"É abominável que as pessoas ainda achem que um revólver 38 seja a solução para um conflito, por mais grave que ele seja. Nós não descansaremos enquanto não prendermos os assassinos e os mandantes do crime para que a gente mostre, claramente, que no nosso governo não tem impunidade".
Em seguida, referiu-se à preservação ambiental, à criação de reservas e a assentamentos:
"Essas coisas têm incomodado alguns reacionários, alguns conservadores da área madeireira. Porque os bons madeireiros estão trabalhando de acordo com o governo; estão fazendo parcerias com a ministra Marina [Silva, do Meio Ambiente]"
Bolsonaro preferiu atribuir a responsabilidade às vítimas:
"Esse inglês era malvisto na região porque ele fazia muita matéria contra garimpeiro, questão ambiental. Aquela região lá, região bastante isolada, muita gente não gostava dele. Tinha que ter mais do que redobrado a atenção para consigo próprio. E resolveu fazer uma excursão. (...) A gente não sabe se quando, saiu do porto, só dois, alguém viu e foi atrás dele. Lá tem pirata no rio, tem tudo o que se possa imaginar lá. É muito temerário você andar naquela região sem estar devidamente preparado fisicamente e também com armamento, devidamente autorizado pela Funai. Pelo que parece, não estavam".
Não havia, efetivamente, como responsabilizar — culpados são os assassinos — o governo Lula porque este buscava coibir, em vez de incentivar, atividades ilegais em reservas indígenas.
PARALELISMOS CANALHAS
Em conversa com uma militante bolsonarista, o presidente reclamou de uma decisão do ministro Roberto Barroso, que cobrou providências do governo. E citou os 60 mil desaparecidos por ano no país:
"Barroso podia dar cinco dias também para achar os 60 mil. Vem sentar na cadeira para dar dica de como achar os 60 mil desaparecidos e não só dois que estão lá porque todos merecem dedicação".
É outro argumento vomitado por seus apoiadores nas redes. O número, com efeito, é brutal, mesmo para um país com 215 milhões de habitantes. É evidente que são múltiplas as causas que o explicam — e não se descarte que parcela se deva à violência. Mas só os estúpidos, ou contaminados por incurável má-fé, ignoravam que o desaparecimento (e, agora se sabe, morte) de Bruno e Dom estava ligado a uma questão que diz respeito a políticas públicas e a escolhas feitas pelo Estado e pelo governo brasileiros.
A canalha igualmente grita: "Quase 60 mil pessoas são assinadas por ano. Por que duas fazem tanto barulho?" Noto que a política armamentista de Bolsonaro concorre para a carnificina. Mas isso fica para outra hora. Mesmo diante da tragédia civilizatória que representam essas milhares de mortes, o "barulho" por Bruno e Dom é justificável e tem de ser amplificado. Ainda que seus assassinos possam não ter a consciência de todas as implicações de seu crime, este tem uma óbvia dimensão política. Dada a orientação que hoje emana do Palácio do Planalto, pode-se falar que essas mortes são conexas à política oficial.
PARA ENCERRAR
E, se ainda faltassem evidências da responsabilidade do governo federal pela tragédia, convém lembrar que, enquanto Bruno e Dom estavam desaparecidos, Bolsonaro fez dois discursos furibundos contra reservas indígenas, ameaçando descumprir decisão judicial caso o Supremo não reconheça o tal marco temporal -- que é inconstitucional.
Vale dizer: havia dois defensores de reservas indígenas, provavelmente mortos, como o próprio Bolsonaro especulou, e ele fez proselitismo fascistoide contra terras indígenas. O bolsonarismo não consente nas mortes porque cala.