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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

17
Mar24

A TORTURA NUNCA TERMINA

Talis Andrade

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                      1

                       Na escuridão do cárcere

                       não persiste a mínima

                       noção de tempo

                       A escuridão prolonga

                       um suplício

                       que nunca termina

 

                       Na escuridão do cárcere

                       o prisioneiro desconhece

                       quando os encapuzados

                       vão recomeçar o ritual

                       das místicas

                       sessões cívicas

 

                       Desconhece de onde vêm

                       os cruciantes gritos

                       se da cela vizinha

                       ou dos porões da mente

                       Gritos que não lhe deixam em paz

                       estouram os tímpanos

                       Pregos penetram o corpo

                       revificando os estigmas da crucificação                       

                       o sangue a coroa de espinhos os escarros

 

                       Os pungentes gritos

                       recordam os sermões

                       dos tempos de menino

                       O padre Nicolau

                       descrevia as estações

                                               da via-crúcis

                       ameaçando com os tormentos

                                               do inferno

 

                         O corpo aferroado

                         por tridentes em brasa

                         a carne torrificada

                         no castigo do fogo eterno

                         A capela exalava

                         malsinado cheiro

                         de carne queimada

                                               e enxofre

                        Por toda capela

                        o beatífico aroma

                       de incenso e cera

                       de círios acesos

 

                      2

                       O prisioneiro desconhece de onde vêm

                       os cruciantes gritos

                       se da cela vizinha

                       ou dos porões da mente

 

                       No terror implantado o preso não percebia

                       quando tudo era um macabro divertimento

                       o cruel vexatório brinquedo do gato com o rato

                       ou triste cenário de um banho de sangue

                       O real o imaginário se (con)fundiam

                       no surrealismo de uma guerra suja

                       Nos aviões os prisioneiros avisados

                       de que seriam atirados ao mar

                       aterrizavam humilhados por continuarem vivos

                       Carros os freios sabotados desabavam no abismo

                       Corpos caiam no poço dos elevadores           

                       Carros invisíveis atropelavam nas esquinas

                       Prisioneiros alinhados ao pé do muro viam a morte fugir

                       nos fuzilamentos com balas de festim

                       Prisioneiros eram trucidados

                       em uma simulação de fuga

                       ou simplesmente sumiam

                       Outros anunciados como mortos                      

                       retornavam lampeiros perambulando pelas ruas

 

                      3

                      A imprevisibilidade uma tortura

                      Os segundos sobressalente eternidade

                      Os inquisidores não têm hora precisa           

                      Os inquisidores podem chegar

                      a qualquer instante

 

                      Os segundos se arrastam

                      Perde-se a noção

                      de quando dia

                      de quando noite

                      Não existe mês

                      no calendário da escuridão

 

                       Na angustiante espera

                       o prisioneiro sofre a tortura

                       de desconhecer

                       quando chegará a vez

                       de ser empurrado

                       pelos campos de sangue

                       para os subterrâneos da morte

                       os olhos vendados

                       para uma viagem sem volta

31
Jan24

Tradução de "Lula" de Fernando Morais revela biografia do presidente do Brasil na França

Talis Andrade

O primeiro volume da biografia “Lula” (Companhia das Letras, 2021), de Fernando Morais, está sendo lançado na França neste início de 2024, pouco mais de dois anos depois de sua publicação no Brasil. Ao contrário da versão em português, a tradução francesa, traz um subtítulo: “da luta sindical ao combate político”, e um prefácio assinado pelo ex-diretor do jornal “Le Monde Diplomatique”, Ignacio Ramonet

Fotomontagem com o escritor Fernando Morais e as capas dos seus livros em francês e português.Fotomontagem com o escritor Fernando Morais e as capas dos seus livros em francês e português. © Divulgação companhia das letras e ithaque
 

A biografia ”Lula”, traduzida por Ana de Staal e Gilles de Staal, chega às livrarias francesas pela editora “Ithaque”. O livro foi lançado na última sexta-feira (26) em Paris, na presença de Ignacio Ramonet, que assina o prefácio, e do sociólogo Michael Löwy, de origem brasileira. “Fernando Morais é um mestre da não-ficção. (...) E prova isso, mais uma vez, com essa magistral biografia de um dos maiores líderes progressistas da América Latina e do mundo”, escreve o ex-diretor do “Le Monde Diplomatique” na introdução da versão francesa.

Fernando Morais, que termina a redação do segundo volume da biografia “Lula”, não pôde vir à França para participar do lançamento, mas concedeu uma entrevista à RFI à distância sobre a publicação do livro em francês. Ele lembrou que vários de seus livros já foram publicados na França, onde tem “a sorte de ser bem tratado pela crítica”, mas acredita que o interesse por “Lula” no país será ainda maior.

“O livro está saindo no momento em que o presidente Lula readquire, sobretudo no panorama Internacional, um papel que o Brasil tinha perdido nos últimos 6 anos. Felizmente, volta agora com muita força e com uma coisa boa, sobretudo para nós, jornalistas, com posições polêmicas” do Lula em relação à Ucrânia ou ao conflito entre Israel e o Hamas, por exemplo, afirma. Fernando Morais completa dizendo que “muita gente quer saber que Lula é esse”.

Duas prisões

“Lula” é uma biografia, mas a narrativa não é linear. O autor escolheu começar pelo episódio da prisão de Lula, em 2018. Fernando Morais conhece o atual presidente da República há mais de 50 anos, desde o período de liderança sindical e das greves no ABC no final dos anos 1970 e final da Ditadura Militar no Brasil. Na época em que o livro foi lançado, em 2021, teve gente no Brasil que o acusou de querer influenciar a campanha eleitoral que começava.

O autor de “Chatô” e “Olga” reivindica a sua independência jornalística e autoral. Garante que Luiz Inácio Lula da Silva nunca tentou “nenhum tipo de censura”, e que “Lula” “é um livro tão honesto quanto os nove livros anteriores” dele.

“Eu cheguei à conclusão de que o melhor para traduzir para o leitor, não só o personagem, mas o Brasil, (era) pegar dois momentos fundamentais da vida do Lula, que são as duas prisões que ele sofreu, em dois momentos diferentes da vida política brasileira, por duas razões diferentes”, esclarece. A primeira prisão, em 1980, no final da Ditadura Militar, e a segunda agora, em um período democrático. “Isso é muito mais revelador e muito mais tentador. Começar com o juiz assinando a prisão dele e ele decidindo: ‘me entrego ou resisto?’”. 

Fernando Morais demorou cerca de 10 anos para acabar o primeiro volume e dá os últimos retoques no segundo volume, que deve chegar às livrarias brasileiras ainda em 2024. “O segundo, talvez, até desperte mais polêmica porque eu vou acompanhar toda a crise do golpe contra a Dilma do ponto de vista do Lula”, antecipa.

Luiz Inácio Lula da Silva recebeu o título de Cidadão Honorário de Paris das mãos da prefeita Anne Hidalgo, na prefeitura da capital francesa. Acompanhado da ex-presidente Dilma Rousseff e do ex-ministro da Educação e candidato derrotado na eleição presidencial de 2018, Fernando Haddad, Lula defendeu as conquistas obtidas durante os anos do Partido dos Trabalhadores (PT) no poder, “apesar de quaisquer erros”. O líder petista lembrou dos brasileiros mais “desfavorecidos” ao receber a honraria e não perdeu a oportunidade de atacar o juiz Sérgio Moro.

Luiz Inácio Lula da Silva, metalúrgico e filho de analfabetos que entrou na política pelo sindicalismo e ganhou fama mundial, que foi preso duas vezes e mantém tanto uma legião fiel de seguidores quanto uma forte rejeição, volta à Presidência do Brasil depois de uma campanha marcada pela polarização. Neste vídeo, a repórter Nathalia Passarinho relembra algumas das cenas mais marcantes da trajetória de Lula – início na política, eleições perdidas, chegada à Presidência, prisão pela Lava Jato e, agora, sua volta ao Palácio do Planalto.

30
Dez23

Um roteiro de “A mais longa duração da juventude” para o cinema

Talis Andrade

O falecimento de Paulo Dantas, e de tantos  militantes históricos contra a ditadura, tem acendido na gente uma chama de urgência

 

18
Nov23

Exclusivo DCM: Flávio Bolsonaro usa polícia e MP do Rio para tentar prender youtuber Thiago dos Reis

Talis Andrade

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Murilo Graça, promotor

por Vinicius Segalla, DCM

O promotor do Ministério Público do Rio de Janeiro Alexandre Murilo Graça, da 3ª Promotoria de Investigação Penal Especializada, denunciou no último dia 26 o youtuber Thiago dos Reis à Justiça pelo suposto cometimento de três crimes, todos contra a honra do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). O membro do MP-RJ pede que Reis seja condenado a uma pena total de quatro anos e dois meses de prisão.

O motivo é um vídeo que o youtuber publicou em sua conta na plataforma digital, no dia 15 de maio deste ano, cujo título é: “AMIGO EXPÕE FLÁVIO BOLSONARO E ELO COM TERRORISTAS DE 8/1!! A CASA CAIU!!“

Assista ao vídeo abaixo, que a Justiça optou por não retirar do ar:

A publicação do vídeo, no qual Thiago dos Reis se limita a narrar fatos que haviam sido recentemente divulgados pela imprensa nacional, irritou o senador da República. 

No dia seguinte (no dia 16 de maio, portanto), dois advogados de Flávio Bolsonaro, Luciana B.P Pires e Alan Deodoro, foram à polícia e apresentaram uma extensa notícia crime, alegando que a honra do parlamentar havia sido irremediavelmente ferida pelo vídeo no Youtube.

Eles solicitaram investigações policiais e, ao final do consequente processo penal, que Thiago dos Reis fosse condenado por calúnia, injúria e difamação contra um servidor público, crimes que, juntos, geraram uma pena de quatro anos e dois meses de detenção do acusado.

Os advogados de Flávio escolheram o delegado Paulo Dacosta Sartori para apresentar a sua denúncia. Ele é o mesmo que, em 2020, abriu na Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática (DRCI) inquérito contra o influenciador digital Felipe Neto por “corrupção de menores”.

Pouco tempo depois, entretanto, a Justiça entendeu que a DRCI não possuía atribuição legal para investigar os supostos crimes e encerrou as investigações.

O mesmo delegado Sartori, em março de 2021, recebeu denúncia do vereador carioca Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) e instaurou inquérito policial contra o mesmo Felipe Neto, por ter chamado o então presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ) de “genocida” em uma postagem em suas redes sociais. 

O vereador Carlos Bolsonaro tinha pedido investigação de Neto com base na Lei de Segurança Nacional, criada durante a ditadura militar. No dia 18 daquele mês, porém, novamente a Justiça encerrou a investigação encampada pelo delegado. 

Na ocasião, a juíza Gisele Guida de Faria, da 38ª Vara Criminal, ainda viu “flagrante ilegalidade” praticada por Carlos Bolsonaro, porque ele “não integra o Ministério Público, não é militar responsável pela segurança interna, nem é Ministro da Justiça”, portanto não poderia exigir investigação em nome do presidente da República.

Já no inquérito aberto pelo delegado contra Thiago dos Reis, o investigado sequer foi ouvido. Foram enviadas duas cartas precatórias à polícia de São Paulo, pedindo que o youtuber fosse ouvido, mas ele sequer chegou a ser contatado pelas autoridades policias paulistas, conforme constam nos autos do processo. 

Ainda assim, o delegado Sartori concluiu suas investigações e, no dia 10 de outubro deste ano, apresentou seu relatório final ao Ministério Público fluminense, de apenas uma página, recomendando a denúncia do influenciador por três crimes supostamente cometidos contra a honra de Flávio Bolsonaro. 

O promotor que recebeu a denúncia, no dia 11 de outubro, foi Alexandre Murilo Graça, da 3ª Promotoria de Investigação Penal Especializada. É o mesmo promotor que, em janeiro do ano passado, enquanto era responsável pelas investigações do suposto crime de “rachadinha” no gabinete de Carlos Bolsonaro, achou por bem ir a uma festa na casa da advogada de Flávio Bolsonaro, a mesma Luciana B. Pires, responsável pela denúncia agora protocolada contra Thiago dos Reis. Por lá, posou para fotografias com a advogada e outros convidados do festejo.

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À época, a investigação conduzida por Murilo Graça se arrastava na 3ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal Especializada. Desde maio do ano anterior, quando o juiz Marcello Rubioli, da 1ª Vara Criminal Especializada do Tribunal de Justiça do Rio, quebrou o sigilo de Carlos, o promotor só havia colhido dois depoimentos, nos quais um dos ouvidos arguiu o direito de permanecer em silêncio e o outro negou a acusação. Murilo Graça até hoje não apresentou qualquer denúncia contra Carlos Bolsonaro.

Alexandre Murilo Graça é também o mesmo promotor que levou mais de um ano para denunciar os policiais acusados de matar a designer Kathlen Romeu, morta pela polícia do Rio em junho de 2021. 

Mesmo após investigações concluírem, em dezembro de 2021, que Kathlen Romeu, 24, foi morta enquanto estava grávida por um tiro que partiu de um PM e que policiais fraudaram a cena do crime, Alexandre Murilo Graça só resolveu denunciar após intensa pressão da sociedade e da família da vítima ter procurado a imprensa para denunciar o descaso do promotor.

Ao portal UOL, a mãe da vítima relatou como foi um de seus encontros com o promotor:

Vi o promotor agindo de forma totalmente diferente, parecia outro. Ele perguntou como poderia me ajudar e, quando eu comecei a falar, chorei. Chorei porque eu sou uma lágrima ambulante, uma tragédia ambulante. E a resposta dele foi: ‘Não adianta ficar chorando, porque eu não sou psicólogo.‘”

Mas, dessa vez, Alexandre Murilo Graça foi mais ágil em seu trabalho. Ele recebeu o relatório final do delegado Sartori no dia 11 de outubro, e levou nada mais e nada menos do que 15 dias para se convencer que Thiago dos Reis era culpado, e que tudo que a advogada Luciana Pires, cujas festas ele frequenta, estava 100% correta em suas argumentações.

A denúncia que o promotor apresentou à Justiça no dia 26 de outubro deste ano é praticamente uma cópia da representação que sua amiga encaminhou ao delegado Sartori.

Veja, aqui, trechos da denúncia, a que o DCM teve acesso.

Mas, como já está se tornando praxe nas ações do delgado Sartori e do promotor Murilo Graça, novamente a Justiça foi obrigada a intervir para que as autoridades públicas de investigações não fizessem as vezes de defensores de interesses privados. 

No dia 31 do mês passado, o juiz André Felipe Veras de Oliveira, da 2ª Vara Criminal do Rio de Janeiro, explicou ao promotor amigo da advogada de Flávio que não cabia a ele  – como de resto não coube anteriormente ao delegado Sartori – investigar ou denunciar o caso em questão.

É que o suposto delito – se delito fora – ocorrera em São Paulo, sendo assim, tanto o delegado quanto o promotor amigos dos Bolsonaro, são incompetentes para investigar e denunciar o youtuber.

Resultado: o caso foi transferido para a Justiça e para a promotoria paulista. O caso foi redistribuído para a promotora Lauraní Assis de Figueiredo, da 4ª Promotoria de Justiça Criminal da capital.

Prontamente, menos de uma semana após receber os autos (que, em São Paulo, receberam o número 0023092-51.2023.8.26.0050), a promotora publicou seu primeiro despacho sobre o tema. Ela afirmou serem “prematuras as informações colhidas” até agora, rejeitou a denúncia apresentada pelo seu colega carioca e solicitou que a Polícia Civil de São Paulo retome as investigações. Thiago dos Reis, agora, terá direito a se defender antes de ser denunciado por três crimes. 

O advogado criminalista André Lozano, professor de Direito Penal e Processual Penal e autor do livro “Populismo Penal: Comunicação, Manipulação Política e Democracia”, afirma que há indícios de quebra do princípio da impessoalidade nos casos em questão: “A atitude de sempre pedir instauração de inquérito e, coincidentemente ou não, os inquéritos serem destinados ao memso promotor, causa uma certa estranheza. Principalmente levando em conta as decisões posteriores da Justiça, que reformam as decisões tanto do delegado quanto do promotor. Tanto o delegado quanto o promotor devem pautar seu agir pela impessoalidade, não levando em consideração nem que é o investigado, nem que é a vítima.”

Enquanto isso, parlamentares bolsonaristas estão nos Estados Unidos para “denunciar” o atual governo federal por fazer uso de aparatos da Justiça para perseguir seus adversários políticos. Então, tá. 

14
Set23

A oportunidade de discutir o papel das Forças Armada

Talis Andrade

jus julgamento final justiça deus.jpg

 

Escândalos de corrupção. Gestão nebulosa. Ameaças ao Congresso e STF. CPMI dos atos terroristas de 8 de janeiro. Jandira Feghali  aponta nomes de generais golpistas. Aos poucos, a sociedade tem um conhecimento menos idealizado e mais real dos militares. Momento deve ser aproveitado para reafirmar o controle civil e garantir transparência

por Glauco Faria

Ainda não se sabe qual o teor da delação do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, o tentente-coronel Mauro Cid, e o grau de comprometimento que seu depoimento pode trazer para alguns generais e oficiais das Forças Armadas tanto no caso das joias como também na preparação para a tentativa de golpe após os resultados das eleições presidenciais de 2022. A Operação Perfídia trouxe ainda um outro dano à imagem de um dos principais nomes do governo anterior, o general Walter Braga Netto, que teve o sigilo telefônico quebrado pela Justiça por conta de uma investigação a respeito de possíveis fraudes no processo de contratação de coletes balísticos.

Os dois casos abalam uma imagem que os militares sempre tentaram cultivar no imaginário popular, a de que, diferentemente dos políticos e civis de uma forma geral, a instituição estaria livre da corrupção, uma praga nacional, zelando sempre pelo interesse público. E podem ainda escancarar a falta de compromisso de parte do generalato com princípios básicos de qualquer regime democrático, como o simples respeito ao resultado eleitoral.

A maior parte dos golpes de Estado no mundo costuma contar com um sentimento antipolítica muito forte em meio à sociedade. Afinal, é necessário ter apoio de segmentos sociais não só para apear quem pode ser tido como adversário do poder, mas também para permanecer nele. E, em geral, desmoralizar o oponente por meio do exaurido lema da luta contra corrupção é uma das principais armas de quem quer usurpar o poder de modo ilegal.

No Brasil, foi assim que o udenismo combateu o segundo governo de Vargas, sem conseguir êxito por conta do suicídio do presidente. Mais adiante, o mesmo segmento se aliou aos integrantes das Forças Armadas – que já ensaiavam o golpe contra o governo getulista – para derrubar João Goulart em 1964, agora investindo pesadamente também em um anticomunismo radical, o que o unia mais ao ideário da caserna. Uma vez no governo, os militares buscaram passar durante boa parte do tempo uma imagem de busca pelo conhecimento técnico para governar, como se fossem quase apolíticos, apoiados em gestores tecnocratas civis para gerir a área econômica.

Em 2018, todos estes elementos que forjaram parte da história do autoritarismo e do golpismo no Brasil estavam presentes nas eleições presidenciais: o anticomunismo, o “técnico” que cuidaria da economia (sempre bem apoiado por parte da mídia tradicional e pelo chamado mercado) e também pelo discurso anticorrupção. Tudo embalado num discurso contrário à política e aos políticos, ainda que capitaneado por alguém que viveu quase três décadas praticamente inerte na Câmara dos Deputados.

Se os nomes dos partidos e das figuras que os representavam mudou nesta linha do tempo, parte dos protagonistas continuou vestindo farda. A falta de uma Justiça de Transição e a estrutura autoritária da sociedade brasileira fez com que durante muito tempo este militares saíssem incólumes, sem responder pelas suas ações como aconteceu nos países vizinhos. Isso os protegeu também de arcarem com os custos simbólicos, já que, para boa parte da população, os integrantes das Forças, uma vez no poder, não teriam praticado atos de corrupção como os presidentes civis.

Nada mais falso. É evidente que qualquer ditadura que se preze não só não tem transparência nos atos administrativos como pratica a censura e controla, por diversos meios, a possível eclosão de escândalos e divulgação de malfeitos.

Como lembrou o professor de História Pedro Henrique Pedreira de Campos, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Pedro Campos, nesta entrevista, “a ditadura militar foi um celeiro de corrupção”. Também autor do livro Estranhas Catedrais (Eduff), lançado em 2014, houve então “um ambiente extremamente propício de escalada dos interesses empresariais e privados sobre o Estado brasileiro, tendo em vista o cerceamento dos mecanismos de fiscalização e o aparelhamento do Estado por agentes do setor empresarial privado”.

“Os militares se locupletaram nesse processo. Eles se favoreceram muito na atuação empresarial naqueles anos. Era uma ditadura empresarial-militar e eles ganharam postos nas empresas e há várias denúncias de que eles recebiam propinas”, pontua.

 

Longe e perto dos holofotes

Após o fim da ditadura, os militares continuaram atuando no cenário político, mas de forma muito mais discreta, em especial para defender a história da própria instituição e, principalmente, seus generais. Nem mesmo os ex-políticos que haviam feito parte do regime defendiam publicamente as supostas virtudes do regime que se encerrava. A ausência na transição do trabalho de memória e justiça fez com que, décadas depois, o panorama mudasse e o regime autoritário passou a ser exaltado por parte da classe política e, obviamente, pelos integrantes das Forças Armadas abertamente. Mesmo a tortura, antes negada ou tratada dentro da seara de fatos isolados, agora era assumida orgulhosamente por muitos, com torturadores sendo elogiados inclusive por aquele que viria a se eleger presidente em 2018.

Mas é a eleição de 2018 que traz a farda de novo ao centro do palco. Relatório elaborado em 2021 pelo Tribunal de Contas da União (TCU) apontou que na gestão Bolsonaro o governo federal mais que dobrou o número de militares em cargos antes ocupados por civis. No último ano do governo Temer, 2.765 militares ocupavam cargos do governo federal e, em 2021, chegavam a 6.175.

Se havia ocupação na máquina do Estado, isto era ainda mais pronunciado em postos-chave da administração do Executivo. Em fevereiro de 2020, os militares controlavam oito dos 22 ministérios, proporção maior que a de alguns presidentes da ditadura.

No Planalto, o círculo de confiança do presidente era verde-oliva. Um levantamento feito pelo The Intercept e divulgado em agosto mostra ainda que Bolsonaro trouxe nada menos que 79 alunos da sua turma, graduados no mesmo ano ou que conviveram com ele nos quatro anos de curso na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), para seu governo. No rol, nomes como o do próprio Braga Neto, e o de Luiz Eduardo Ramos, ex-ministro da Casa Civil, das Secretarias Geral e de Governo, um dos articuladores da criação do malfadado orçamento secreto, talvez o mais emblemático retrocesso institucional ocorrido durante aquela gestão.

Com tal exposição e graças a mecanismos de transparência, fiscalização e controle que foram construídos e consolidados após o fim da ditadura, os militares passaram a se ver envolvidos de forma direta ou indireta em diversos casos de denúncias de corrupção ou similares, que envolviam desde episódios de negociações de compra de vacina com preços 1.000% maioresdo que os anunciados pelo fabricante, uso irregular de recursos voltados ao combate da pandemia e compra superfaturada de Viagra. Agora, sem possibilidade de o Executivo barrar investigações e com a tentativa de golpe do 8 de janeiro sendo apurada, mais nomes vêm à tona.

 

Transparência e isonomia

Se o envolvimento de militares no governo Bolsonaro traz para a sociedade uma imagem menos idealizada e mais real de que disciplina, hierarquia e uma dita tradição não impedem corrupção, o verdadeiro remédio que a combate precisa ser também aplicado à caserna. E aqui não se trata especificamente de punição, também necessária quando prevista em lei, e sim de prevenção.

Relatório produzido pelo grupo de transição do atual governoresponsabilizou as Forças Armadas pelo que considerou um verdadeiro apagão da transparência no governo federal durante a gestão Bolsonaro, com casos reiterados de descumprimento da Lei de Acesso à Informação. De acordo com o documento, houve uma “forte tendência de sempre ou quase sempre se considerar ‘pessoais’ informações sobre integrantes do Exército que não seriam informações pessoais para servidores civis”. Isso envolve o impedimento de se acessar, por exemplo, notas fiscais de compras públicas, documentos de pregões eletrônicos, empresas que firmaram contratos com a Força, e negativa de acesso à lista de passageiros e a custo de voos oficiais feitos pela Aeronáutica.

Por isso, mas não só, o controle civil sobre as Forças Armadas, como preconiza a Constituição, é essencial. Para garantir tratamento isonômico em relação ao resto da estrutura do Estado e garantir transparência nos atos. E, ainda mais fundamental, para não ter a democracia formal sob ameaça constante de um poder armado.

Ainda hoje existe uma tolerância muito grande à intromissão fardada em assuntos que não seriam do seu escopo. A interferência na vida pública talvez tenha tido uma de suas ilustrações mais vivas em um episódio de julho de 2021, da CPI da Covid, quando o então presidente do colegiado, senador Omar Aziz (PSD-AM), afirmou que “os bons das Forças Armadas devem estar muito envergonhados com algumas pessoas que hoje estão na mídia, porque fazia muito tempo, fazia muitos anos que o Brasil não via membros do lado podre das Forças Armadas envolvidos com falcatrua dentro do governo”.

Em seguida, o Ministério da Defesa chefiado por Braga Netto e os comandantes das Forças Armadas divulgaram nota oficial apontando que Aziz teria dado declarações “desrespeitando as Forcas Amadas e generalizando esquemas de corrupção”. “As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro”, dizia ainda o documento.

Mesmo com Aziz destacando que havia “bons” e separando uma “banda podre”, a reação institucional foi desproporcional e em tom intimidatório. O presidente da CPI cobrou uma posição do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que no mesmo dia da nota prestou homenagem às Forças Armadas, sem citar o episódio. Aziz reagiu: “Pode fazer 50 notas contra mim, só não me intimidem. Porque quando estão me intimidando, Vossa Excelência não falou isso, estão intimidando essa Casa aqui também. Vossa Excelência não se referiu à intimidação que foi feita pela nota das Forças Armadas.”

Generais também ameaçaram outras instituições, como à época em que o general Villas-Bôas, então comandante do Exército mandou recado ao Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o julgamento da prisão após condenação em segunda instância. O fato de, em ambos os casos, a resposta ter sido tímida ou nula do ponto de vista institucional, evidencia o tamanho da ingerência militar e a dimensão do problema que o Brasil ainda não resolveu.

A desconstrução da imagem de um poder infalível que a participação da caserna no governo Bolsonaro trouxe para muitos é positiva, apontando que militares, em especial os de alta patente, não podem estar acima da lei. A mudança de parte da opinião pública pode ser uma oportunidade para iniciar, ao menos, um outro tipo de cenário em que cumpra simplesmente o que se prevê na Constituição, onde o papel das Forças é desenhado. Sem isso, a tutela que nasceu já na construção da própria República seguirá como fardo que impede a construção de uma real democracia.

12
Set23

Documentário: ”Vozes do silêncio. Nem perdão nem esquecimento”. Assista, legenda em português

Talis Andrade

 

Jair de Souza traduziu e legendou o documentário ”Vozes do silêncio: Nem perdão, nem silêncio”, da RT. A legendas em português podem ser acionadas no canto inferior direito, em configurações.

 

Vozes do silêncio: Nem perdão, nem esquecimento

por Jair de Souza

VioMundo

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Estamos chegando ao dia 11 de setembro.

Para os mais jovens, queria retroceder 50 anos na história, pois exatamente neste mesmo dia no ano de 1973, a América Latina e o mundo sofreram um dos mais destruidores golpes de parte das forças mais retrógradas, mais anti-humanas, mais pró-imperialistas que a humanidade já tinha tido o horror de conhecer: o golpe militar comandado por Augusto Pinochet que derrubou o governo socialista de Salvador Allende no Chile.

Foi o marco de uma nova etapa da monstruosidade do grande capital no intuito de extirpar pela raiz toda e qualquer ameaça proveniente das maiorias populares que pudesse ameaçar os privilégios das classes dominantes.

Foi a primeira iniciativa orquestrada pelas instituições capitalistas a nível planetário de implantar o neoliberalismo de maneira organizada e permanente.

Depois de muitos anos de sofrimento e luta, o povo chileno ainda está engajado numa luta ferrenha na busca de sanar as mazelas que os anos de ditadura cravaram em sua sociedade.

Como lição muito importante, precisamos entender que os efeitos nocivos deixados pela passagem de um governo deste tipo não se limitam aos anos em que essas forças permanecem visivelmente no comando do aparelho de Estado.

Até hoje, as maiorias populares do Chile estão padecendo as agruras surgidas com a tomada de poder pelos militares em 1973.

As forças democráticas chilenas estão empenhadas na luta para que os crimes cometidos por essa ditadura não venham a ser esquecidos e, muito menos, os criminosos perdoados.

Esquecer e perdoar fatos e criminosos que tantas desgraças causaram significa abrir a porta para a repetição dos mesmos.

Para nós brasileiros o documentário acima, Vozes do silêncio: Nem perdão, nem esquecimento,  tem um valor adicional, pois ele nos remete à nossa própria realidade e aos nossos embates com as forças do bolsonarismo. Conforme os próprios próceres bolsonaristas deixam patente, o modelo pinochetista lhes serviu de inspiração em nosso país.

Em outras palavras, o pinochetismo é a fonte de inspiração para o bolsonarismo.

Assim, entender bem o que está por trás do pinochetismo nos leva a compreender melhor nossa própria realidade.

No documentário Vozes do silêncio: Nem perdão, nem esquecimento vamos observar que as classes dominantes recorrem a forças de extrema direita do tipo do pinochetismo e do bolsonarismo naquelas fases da história em que eles sentem que as estruturas de dominação tradicionais já não estão dando conta de manter os movimentos populares subjugados.

O pinochetismo não vacilou em matar para se fazer impor, assim como o nazismo também não.

E, devemos ter clareza, o bolsonarismo é fruto da mesma árvore. Em outras palavras, tanto o pinochetismo como o bolsonarismo se inspiraram sempre em seus antecessores da Alemanha hitlerista.

Neste muro, está escrito: ‘Mesmo que os passos toquem este local por mil anos, não vão apagar o sangue dos que aqui caíram’. Entre eles, o do compositor, músico e ativista político chileno Victor Jara, que aí foi fuzilado, em 16 de setembro de 1973. Fotos: Reprodução de imagem do documentário ”Vozes do silêncio” e Wikipedia

 

Muitos argumentam que não é correto equiparar bolsonarismo e pinochetismo com o nazismo, o qual teve seus campos de concentração e suas câmaras de gás. O que podemos responder quanto a isto é que se o bolsonarismo não chegou a tanto foi porque não encontrou condições para ali chegar.

Não há limites de tipo humanitário para as tropas de choque do grande capital.

Aqueles que diante da morte de mais de 700.000 pessoas não se sentem perturbados já que não são coveiros não teriam nenhuma reticência em aplicar métodos similares de extermínio aos de seus inspiradores germânicos. Não tenhamos dúvidas disso.

Espero que aproveitemos a comemoração (comemorar não é celebrar) deste novo aniversário da tragédia chilena para estudar e tirar lições desse acontecimento.

Foi com este espírito que me dediquei a traduzir e legendar este vídeo-documentário, que considero uma das peças mais bem-feitas para retratar em pouco tempo o significado daquele trágico acontecimento.

30
Ago23

Ditadura brasileira: procura-se justiça histórica. O caso Eloá Guimarães

Talis Andrade

 

Urariano Mota entrevista Elizabeth Guimarães (segunda parte)

 

Você quer uma reparação histórica da violência que ela sofreu.

Elizabeth – E da família. Ficamos todos presos e desmantelados. Minha mãe se dedicou o resto da vida dela, tias, irmãos, todos. E agora eu também vejo que o trauma sofrido por ela se transformou em diagnóstico de doença mental. E tem influência até hoje nos meus sobrinhos, na quarta geração, porque eles fazem perguntas, e cada um tem uma história, um pedaço, um pedacinho de história. Então isso precisa reintegrar a família, a história, para que esse trauma não seja modificado em outras oportunidades.

 

O que você quer a partir do levantamento desses fatos, dessa tragédia realmente, é uma justiça histórica.

Elizabeth – Exato. O reconhecimento do que ela foi vítima. Uma jovem daquela época. O pânico daqueles anos é inesquecível. Depois da prisão, quando minha irmã estava com o passaporte, se preparando para ir ao Canadá, entrou em crise.

 

Que tipo de crise?

Elizabeth – Quando ela chegou no Rio de Janeiro, ela ficou escondida. Em casas de parentes e parentes. Por quê? Ela não sabia, não sabíamos se alguma polícia vinha atrás dela, depois da prisão.

 

Elizabeth – Logo depois da prisão. Não conseguia dormir. Nunca mais recuperou o equilíbrio. Ela tentou suicídio várias vezes. Cortava os braços. Não sabemos se ela chegou a ser estuprada na prisão, porque tem uma parte do trauma que vira amnésia. Mesmo as descrições do pântano não eram completas.

 

Então a violência é mais grave. Não é só o que fizeram com ela na prisão. Destruíram para sempre a vida dela.

Elizabeth – Claro. Nunca mais voltou a ser a mesma. Houve época em que voltava um surto de “normalidade”. Olha aqui as fotos, tinha períodos “bons”, olha aqui um sorriso lindo, aberto, no princípio, depois ela foi ficando assim, e morreu do coração. Ela faleceu em 2001.

 

Arrastando um desequilíbrio mental de 1969 a 2001.

Elizabeth – Nas fotos, você vê uma doente mental, feliz, enganosamente feliz. Tomando remédio pesado.

Versos de um poema de Eloá Guimarães:

“A cada ponto que eu dava, na paciente arte de bordar
meu coração e minha mente, numa viagem de regressão
buscavam tecendo a lã, uma infinita reorganização de ideias, sentimentos,
migalhas perdidas no passado,
o retorno de uma consciência mais clara,
uma alma mais clara”.

 

11
Jul23

Terrorista George Washington e o plano para explodir o Aeroporto de Brasilia na véspera do Natal (parte 3)

Talis Andrade

O outro Girão general senador

por Denise Assis
EXCLUSIVO Portal Brasil 247
 
- - -

(Continuação) George tentou também contato com o senador Eduardo Girão (Novo-CE) -, que hoje integra a CPMI do 8 de janeiro. Na época (dia 11/12) o terrorista lhe enviou mensagens com cobranças sobre a atuação e uso dos CACs, (Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador) no golpe. Vamos nos lembrar que um dos planos ventilados na época que antecedeu a posse do presidente Lula foi a do uso de um “Sniper” para alvejá-lo na subida da rampa.

eduardogirão

 

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Não se tem notícia de um retorno do senador Eduardo Girão, que é também radical de direita. (Basta lembrar da cena dele tentando entregar para o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, em uma audiência, um feto de cera, para provocar uma discussão sobre aborto).

 

Sabe-se, no entanto, que ele foi um dos que bateu pé para a criação da CPMI. Convém também, trazer de volta a organização, feita por ele, de uma audiência pública em desagravo ao deputado - hoje preso -, Daniel Silveira (PTB-RJ), que contou com os terroristas George Washington e seu cúmplice, Alan dos Santos, na plateia. (Na época, a mídia publicou que “foi pedido sigilo” sobre quem os havia convidado. Depois, soube-se que o convite partiu do senador Girão). Em reportagem do site Metrópoles, George Washington aparece na foto, de camisa xadrez.

 

Recentemente, no dia 13 de junho, em matéria para a Agência Senado, Girão afirmou, em pronunciamento no Plenário, que o governo “invadiu” a CPMI do 8 de Janeiro e “não deixou a oposição votar e aprovar uma série de requerimentos que iriam elucidar a verdade”. Por “verdade”, ele quer fazer prevalecer a ideia de que o governo se omitiu propositalmente no golpe do dia 8, para se “vitimizar”. A tese não se sustenta, mas ele esbraveja afirmando que a maioria da comissão rejeitou requerimentos que solicitavam, por exemplo, acesso a imagens do Itamaraty e do Ministério da Justiça e Segurança Pública no dia do ataque. 

“Ficou muito claro o teatro, o circo que querem fazer dessa CPMI. Eles querem fazer uma investigação seletiva, só do que lhes interessa, e nós, da oposição, que iniciamos essa CPMI, que fomos lutar por ela, com o povo brasileiro junto, tivemos nossos requerimentos, praticamente todos, rejeitados. Mas nós aprovamos os deles! Por quê? Uma prova de que a gente quer a verdade!” A “verdade” a que se refere é a versão absurda, por exemplo, sobre a viagem do presidente Lula a Araraquara (SP), onde prestou solidariedade às vítimas das chuvas que arrasaram a cidade, atitude que o ex-governo que ele defende nunca fez. Ao que parece, o senador se arrependeu de lutar por uma CPMI que de todo ângulo que se olha, não vai beneficiar à oposição. 

George Washington apela também às FAs, se colocando à disposição para “matar ou morrer”, conforme declarou ao ser preso pala Polícia Civil - DF.                       

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Mensagens enviadas ao perfil das forças armadas no Instagram (continua)

 

02
Jul23

Celso de Mello se solidariza com PUC-SP contra homenagem a Erasmo Dias

Talis Andrade
 
notice

Estudantes presos por Erasmo Dias herói de Tarcisio de Freitas

 

Forum - Em 22 de setembro de 1977, há exatos 40 anos, 3.000 policiais do Estado de São Paulo, em harmonia com o regime militar em vigor no país, invadiram a Pontifícia Universidade Católica e interromperam uma atividade pública dos estudantes.

O coronel Erasmo Dias (1924-2010), então secretário de Segurança Pública de São Paulo, comandou pessoalmente a operação

No caso da PUC, pode-se dizer que o coronel foi quase “jantado” pela reitora da PUC, Nadir Kfouri (1913-2011). Quando estendeu a mão para saudá-la, a reitora afirmou que não cumprimentava assassinos e virou as costas.

A ação resultou na detenção de 854 pessoas, levadas ao Batalhão Tobias de Aguiar. Delas, 92 foram fichadas no Deops (Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo) e 42 acabaram processadas com base na Lei de Segurança Nacional, acusadas de subversão.

A despeito disso, o ato dos alunos saiu vitorioso: tornou-se bandeira da resistência pacífica contra os militares e impulsionou o processo de reconstrução da UNE (União Nacional dos Estudantes), então na ilegalidade.

Em junho de 1977, a tentativa de realizar o terceiro Encontro Nacional dos Estudantes em Belo Horizonte foi frustrada pelas forças militares, que cercaram a UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), sede da reunião.

Uma reconvocação em 21 de setembro daquele ano, em São Paulo, também acabou sendo impedida. No dia seguinte, a PUC amanheceu cercada por agentes do governo, mas cerca de 70 alunos conseguiram realizar ali uma sessão secreta, no final da manhã, na qual foi eleito um comitê para retomar as atividades da UNE.

Pela noite, em ato com quase 2.000 pessoas, os alunos comemoraram a realização do encontro e anunciaram suas deliberações. Cerca de 20 minutos depois, às 21h50, tropas invadiram o campus.

“Foi uma cena assustadora. Os policias batiam com cassetete e jogavam diversos tipos de bomba. A PUC parecia uma praça de guerra”, relata Beatriz Tibiriça, uma das estudantes processadas.

Enquanto empreendia suas buscas, a polícia depredou salas de aula e outras instalações da universidade. Os estudantes detidos foram conduzidos em fila indiana e de mãos dadas ao estacionamento.

“E os agentes davam pancada quando a fila parava. Ninguém imaginava que uma violência daquele grau pudesse ocorrer contra uma manifestação pacífica”, conta Anna Bock, professora de psicologia da PUC. Seis estudantes sofreram queimaduras.

Além do barulho das bombas, um outro som ficou na lembrança de muitos dos alunos. “Eu quero a Veroca e o Marcelo”, bradava Dias.

Referia-se ao jovem casal Vera Paiva e Marcelo Garcia e Souza (1954-1984), ambos líderes do DCE (Diretório Central dos Estudantes) da USP.

Nenhum dos dois estava lá -naquela noite, ajudavam estudantes de outros Estados a saírem de São Paulo.

“Além de minha atuação no DCE, acho que ele me procurou por causa de meu pai”, avalia Vera. Ela é filha do deputado Rubens Paiva, morto pela ditadura em 1971.

Após triagem na PUC, 854 pessoas foram transferidas para o Batalhão Tobias de Aguiar. Por volta das 5h30 do dia 23, os estudantes começaram a ser liberados.

Segundo reportagem da Folha publicada no dia 24 de setembro de 1977, o comandante da PM naquela época, o coronel Francisco Batista Torres de Mello, procurava tranquilizar parentes dos alunos.

“Pode ficar tranquila, minha senhora. Ninguém está sendo maltratado. Imagine a senhora se iríamos bater nos meninos”, disse a uma mãe.

Hoje, aos 92 anos, Torres de Mello diz que a invasão foi um erro. “Não havia necessidade, a violência não leva a nada. Nós tentamos evitar, mas não houve tempo. Somos treinados para a guerra, mas preferimos a paz. Seria tão bom se todo mundo se amasse, se compreendesse.”

Em 1978, o inquérito contra os alunos foi arquivado. No ano seguinte, o Congresso de Reconstrução da UNE foi realizado em Salvador, sem represálias policiais.

A passagem dos 40 anos da invasão da PUC-SP foi marcada por um ato realizado no Patio da Cruz, no campus da Rua Monte Alegre, no dia 22 de Setembro de 2017

 

Gesto Despresivel de afronta

 

ConJur - O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, voltou a expressar seu apoio à Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo contra a homenagem ao coronel do Exército Antônio Erasmo Dias.

A instituição de ensino classificou como um "acinte" a iniciativa do governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) de nomear entroncamento de rodovia em Paraguaçu Paulista, em homenagem ao antigo militar que invadiu o campus da universidade, na região oeste da capital paulista, em 1977. Celso de Mello já tinha parabenizado a PUC pelo repúdio.

A homenagem foi sancionada pelo governador na quarta-feira (28/6). Celso de Mello afirma que a sanção é um "gesto desprezível de afronta à comunidade acadêmica e administrativa da PUC/SP". 

O jurista recorda que o homenageado cometeu atos truculentos em um período sombrio marcado pelo "declínio ostensivo das liberdades públicas e no qual os direitos básicos da cidadania foram acintosamente transgredidos pelos curadores do regime ditatorial que brutalmente sufocou aqueles que se opunham, com justo motivo, à supressão das liberdades e à vulneração da dignidade humanas pelo aparato de poder".

 

A manifestação de Celso de Mello

 

"A sanção pelo Governo do Estado de São Paulo ao projeto de lei que homenageia o falecido coronel do Exército Erasmo Dias , atribuindo seu nome a um viaduto sobre a rodovia "Manílio Gobbi",  que fica em Paraguaçu Paulista, sua terra natal, representou gesto desprezível de afronta à comunidade acadêmica e administrativa da PUC/SP, cujo "campus" (o "campus" Monte Alegre, em Perdizes) foi vilipendiado, em 22/09/1977, por abusiva invasão perpetrada por ordem de Erasmo Dias, então Secretário de Segurança Pública paulista, a que se seguiram atos de violência arbitrária, como a prisão de muitas centenas de pessoas que ali se reuniam, pacificamente, com o objetivo de discutir a recriação da UNE e de reivindicar a redemocratização do Brasil , então sob tutela de governos militares despojados de legitimidade política pela ausência de consentimento dos governados!!! 

Tais atos foram cometidos com truculência por forças da repressão em um período  sombrio (e ominoso) da ditadura militar (1964-1985), em que se registrou o declínio ostensivo das liberdades públicas e no qual os direitos básicos da cidadania foram acintosamente transgredidos pelos curadores do regime ditatorial que brutalmente sufocou aqueles que se opunham , com justo motivo, à supressão das liberdades e à vulneração da dignidade humanas pelo aparato de poder que, naquele período, controlava e dirigia o aparelho de Estado e seus mecanismos de coerção!!!! 

As  memoráveis jornadas da luta histórica contra a ditadura castrense , nas quais a PUC/SP ocupa posição de relevo, e a restauração da ordem democrática em nosso País, com o florescimento das liberdades fundamentais e a consequente dissolução do "reino das sombras" e de seus temíveis instrumentos de repressão, mostram-se essencialmente incompatíveis com a homenagem legislativa (Lei estadual nº 17.700, de 27 de junho de 2023) que o governo de  Tarcísio de Freitas agora presta a quem serviu a um regime autocrático que menosprezou os princípios nucleares que informam, dão consistência e conferem suporte legitimador ao modelo político-jurídico estruturante  do Estado democrático de Direito!!! 

De novo, e como cidadão de uma República fundada em bases democráticas e edificada com apoio nos princípios ético-jurídicos da liberdade e da dignidade humanas, ponho-me solidário, uma vez mais, com a justa indignação manifestada pela Reitoria da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo."

Em 22 de setembro de 1977 a PUC-SP a polícia militar reprimiu violentamente os estudantes que faziam um ato em frente ao teatro TUCA. Comandados pelo Coronel Erasmo Dias a universidade foi invadida e depredada, mais de 1000 estudantes foram presos. O vídeo traz cenas históricas e entrevistas da Reitora Nadir Gouvêa Kfouri e Dom Paulo Evaristo Arns.

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