DONO OU SÓCIO de nove empresas em endereços valorizados e cujos capitais sociais ultrapassam os R$ 40 milhões de reais, Francisco Emerson Maximiano omitiu em sua declaração de imposto de renda que tem participação em seis delas. São justamente as mais valiosas e com negócios com o governo federal, como a Precisa Medicamentos e a Global Gestão em Saúde. As informações constam em documentos da Receita Federal entregues à CPI da Covid, analisados pelo Intercept.

A Precisa está no olho do furacão após a denúncia apresentada pelo deputado federal Luís Miranda, do DEM do Distrito Federal, sobre irregularidades na compra da vacina Covaxin. O político diz que o irmão dele, um servidor do Ministério da Saúde, sofreu pressão para aprovar o negócio, aparentemente suspeito.

O detalhe que mais causou alarme foi a nota fiscal para o pagamento antecipado de 45 milhões de dólares do Ministério da Saúde a uma empresa que não aparecia no contrato, a Madison Biotech, sediada em Singapura, um paraíso fiscal. Miranda levou as suspeitas para Jair Bolsonaro, e o presidente teria respondido que se tratava de “rolos” de Ricardo Barros, deputado federal pelo PP do Paraná e líder do governo na Câmara.

A Precisa fez a intermediação do negócio entre o governo e a farmacêutica indiana Bharat Biotech, fabricante da Covaxin. A empresa de Maximiano já estava na mira de autoridades mesmo antes de Miranda colocar a boca no mundo. Ela é suspeita de vender testes de covid-19 superfaturados e em quantidade superior à necessária ao governo do Distrito Federal, comandado por Ibaneis Rocha, do MDB.

Apesar dos vários negócios suspeitos que o rodeiam, ele informa oficialmente às autoridades tributárias levar uma vida frugal, de acordo com documentos.

Da declaração pessoal de imposto de renda dele, entregue à Receita Federal com atraso em 7 de junho passado e que faz parte do acervo da CPI,  constam rendimentos de apenas R$ 52 mil em um ano. O valor equivale a uma renda mensal de R$ 4,3 mil, montante que Maximiano gastou em apenas uma compra de supermercado, em Brasília, no dia 27 de março de 2020, segundo os documentos da comissão, requisitados pelos senadores a partir da quebra de sigilo fiscal do empresário.

O pagamento no débito foi feito na Super Adega, mercado que oferece vinhos e bebidas luxuosas em Brasília. Essas informações constam nos extratos bancários da conta do empresário no C6 Bank. Já descontados os gastos daquele dia, o saldo dessa conta corrente estava em R$ 19.620,66.

Para conseguir os extratos de Maximiano, CPI quebrou o sigilo fiscal do empresário.

 

O histórico de movimentação revela ainda pagamentos à vista em lojas de luxo, como R$ 3 mil na Prada, R$ 1,9 mil na Burberry, em São Paulo, e R$ 890 na Casa Ouro, em Brasília.

Os documentos revelam gastos aparentemente incompatíveis com a renda declarada do empresário.

 

Em outro documento da quebra de sigilo, um termo de refinanciamento de uma moto, identificamos um endereço em que Maximiano declarou ter residência em Brasília. A casa indicada fica no Setor de Mansões Dom Bosco, no Lago Sul. Como o próprio nome do bairro indica, é uma das áreas nobres da capital federal.

A moto é uma BMW R 1200 GS Adventure. Em resposta à CPI, a montadora indicou que pelo veículo, entre janeiro de 2020 e maio de 2021, Maximiano já pagou R$ 38 mil em carnês emitidos pelo Santander. O modelo, do ano 2019, custa em torno de R$ 85,4 mil, segundo a tabela Fipe.

Documento sobre financiamento de moto BMW de alto padrão revelou endereço declarado de Maximiano em bairro de mansões de Brasília.

Maximiano tinha depoimento marcado na CPI para a quinta-feira. Mas, na quarta-feira, conseguiu um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal que lhe dá o direito de ficar calado perante os senadores, e a audiência foi adiada. Como ele é investigado pela CPI e pela Polícia Federal por causa dos testes vendidos ao DF, ganhou o direito de não produzir provas contra si mesmo. A nova data ainda do depoimento ainda não foi anunciada.

Francisco Emerson Maximiano

Francisco Emerson Maximiano. Foto: Reprodução

Endereços top

Na declaração de imposto de renda pessoa física de 2021, Maximiano declarou ser sócio da Frasdec Assessoria e Consultoria de Investimentos, 6M Participações e de uma empresa individual com o nome dele – além da Drogaria Interfarmácia, já extinta. A empresa que leva o seu nome tem como endereço um condomínio de luxo no Morumbi, bairro de classe alta na zona sul da capital, e é considerada inapta pela Receita Federal por omissão de informações.

Mas um levantamento da Receita Federal que também está em posse da CPI revela que ele também é sócio ou dono da Precisa Medicamentos, Global Gestão em Saúde, Primares Holding e Participações, Farmaserv, BSF Gestão em Saúde e SaúdeBank Assessoria Estratégica e Financeira.

A Global, por exemplo, é uma sociedade anônima com capital social de mais de R$ 26 milhões e da qual ele é listado na Receita Federal como presidente.

Com isso, Maximiano consegue o prodígio de repetir em 31 de dezembro de 2020 o patrimônio que possuía 365 dias antes: exatos R$ 288.991,29. Mas é improvável que o valor seja verdadeiro.

Deixar de declarar participações em empresas na declaração de imposto de renda não configura uma fraude tributária. Mas os senadores da CPI podem querer perguntar a Maximiano porque ele deixou de informar isso à Receita e também se não recebeu nenhum pagamento isento ou sujeito a tributação exclusiva de empresas como a Precisa (capital social de quase R$ 13 milhões e negócios de R$ 15, 7 milhões com o Ministério da Saúde), a BSF Gestão em Saúde (capital social de R$ 2 milhões, que não tem negócios com o  governo federal) ou a própria Global.