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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

18
Jul23

Spoofing: procuradores, delegados e mídia contra os “dissidentes”

Talis Andrade
 
05
Set20

Deltan? Que Deltan?

Talis Andrade

por Fernando Brito

- - -

O uso do cachimbo deixa a boca torta.

Tanto o procurador Deltan Dallagnol acostumou-se em ser o dono da “verdade judicial” que, ao reagir ao jornalista Reinaldo Azevedo por ter sido julgado e condenado numa ação de danos morais que lhe moveu pelo fato de a juíza (Sibele Coimbra) da causa ser casada com um procurador que com ele atuou, saiu-se com uma afirmação daquelas que minha avó  classificava como “de cabo-de-esquadra”.

Em nota, afirma: “”O procurador Deltan Dallagnol lamenta as agressões injustas do jornalista à juíza e ao Poder Judiciário. As especulações do jornalista sobre suspeição não têm qualquer base na realidade ou na lei. O procurador informa que não tem relação de amizade pessoal ou íntima com o procurador da República Daniel Holzmann e não recorda de ter tido qualquer contato com a sua esposa. O procurador informa ainda que tomou conhecimento pela imprensa, nesta data, de que a juíza seria esposa de seu colega de profissão.”

Ei, Dr. Deltan: Uma coisa é dizer que um procurador da República do Acre é apenas “seu colega de profissão”. A outra é dizer que é apenas isso o procurador Daniel, seu coordenador de grupo de Combate à Corrupção do MPF do Paraná, chefiando o senhor e outros três procuradores da República. O senhor quer que acreditemos que só agora soube, tendo um processo correndo durante meses, que a senhora juíza é mulher de seu companheiro no grupo integrado por apenas 5 procuradores?

Mas o caso é pior. Se imaginarmos que o senhor é tão distraído que não o percebeu, certamente não terá a cara de pau de afirmar que a Doutora Sibele não sabia que o marido era coordenador deste grupo seleto do qual Dallagnol faz parte.

Por acaso o senhor quer que acreditemos que ela, ao ler o nome Deltan Dallagnol ficou pensando: “ah, será que este Deltan é aquele que trabalha com meu marido? Não, não deve ser, Deltan Dallagnol é um nome muito comum, deve ser só coincidência….”

É evidente que o princípio ético foi violado e nada impediria que a própria juíza declinasse de conduzir a causa, em nome da insuspeição da Justiça. Pode não ter base explícita na lei, como em geral a Ética não o tem, mas é uma obrigação moral.

Mas falar em ética com Deltan Dallagnol, que se esconde em adiamento após adiamento para escapar da apreciação das queixas por seus desvios éticos, é o mesmo que falar de corda em casa de enforcado.

Porque ele acha que merece ser indenizado por criticas de natureza política “porque diretamente direcionadas e com o propósito de desqualificá-lo” feitas por um jornalista, mas acha que é perfeitamente cabível exibir um powerpoint apontando um ex-presidente da República como “chefe de quadrilha” e, mesmo inocentado desta acusação, achar que tudo o que fez é legal e moral.

05
Set20

Mulher de amigo e parceiro de Deltan me condena em ação movida por Deltan!

Talis Andrade

Juíza casada com amigo e parceiro de trabalho de Dallagnol me condenou em processo movido por... Dallagnol no, acreditem!, antigo Juizado de Pequenas causas . R$ 35 mil. Ou 35 k, a moeda em que ele dava suas palestras.

por Reinaldo Azevedo

- - -

Não faço proselitismo com questões judiciais que me envolvam, pouco importando se sou o querelante ou o querelado. Quando, no entanto, o devido processo legal pode estar sendo maculado, aí, meus caros, é, sim, o caso de romper o silêncio.

Reproduzo trecho da minha coluna na Folha desta sexta intitulada "Fui condenado pela mulher do amigo de Dallagnol". Volto em seguida.

*

(...)

O procurador da República Deltan Dallagnol, ex-coordenador da Lava Jato em Curitiba, decidiu me processar por danos morais. Escolheu um caminho que constitui o que considero um truque. Fui condenado a lhe pagar R$ 35 mil. (...) Sibele Lustosa, a juíza de direito que me condenou, é mulher do procurador da República Daniel Holzmann Coimbra, que trabalha com Dallagnol na Procuradoria da República no Paraná. São parceiros e amigos. Parece-me certo (...) que Sibele deveria ter-se dado por suspeita para julgar o caso.

(...)

Numa democracia, têm de valer as regras do jogo. Dispõe o inciso I do artigo 145 do Código de Processo Civil: "Há suspeição do juiz [quando] amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados". Obviamente, não sou inimigo da juíza Sibele, mas ela é mulher do amigo da outra parte.

(...)

RETOMO

Não é só o laço de amizade que incomoda nesse caso. Há um outro aspecto que, segundo entendo, agride fundamentos do bom direito.

Dallagnol acha que fui além do que me garante a liberdade de expressão? Recorrer à Justiça é um direito que também assiste procuradores da República — inclusive ele próprio, sempre tão loquaz nas redes sociais.

Ocorre que o doutor não escolheu o caminho da Justiça Comum. Preferiu apelar ao 6ª Juizado Especial Cível de Curitiba, que é o antigo Juizado Especial de Pequenas Causas, onde despacha a juíza Sibele.

Nesse caso, não tenho como apelar à segunda instância: o Tribunal de Justiça. O duplo grau de Jurisdição se dá numa Câmara Recursal, formada por juízes de primeira instância do Paraná. Caso confirmem a sentença, a única chance é apelar ao Supremo por intermédio de um Recurso Extraordinário.

Goste ou não o procurador de coisas que escrevi sobre a sua atuação, tratar uma questão que diz respeito à liberdade de expressão — uma garantia constitucional — e à eventual transgressão de seus limites como "pequena causa" escarnece, parece-me, de um direito fundamental.

Quando o ministro Celso de Mello, do Supremo, concedeu duas liminares suspendendo o julgamento de Dallagnol pelo Conselho Nacional do Ministério Público, escreveu em uma delas: 

"qualquer medida que implique a inaceitável proibição ao regular exercício do direito à liberdade de expressão dos membros do "Parquet" revela-se em colidência com a atuação independente e autônoma garantida ao Ministério Público pela Constituição de 1988."

E na outra:

"Há que se considerar, por isso mesmo, que um Ministério Público independente e consciente de sua missão histórica e do papel institucional que lhe cabe desempenhar, sem tergiversações, no seio de uma sociedade aberta e democrática, constitui a certeza e a garantia da intangibilidade dos direitos dos cidadãos, da ampliação do espaço das liberdades fundamentais e do prevalecimento da supremacia do interesse social"

Que coisa!

Dallagnol tem poder de polícia, eu não. Dallagnol pertence ao ente que detém o monopólio da ação penal, eu não. Dallagnol pode mandar investigar pessoas, eu não. Dallagnol pode denunciar pessoas, eu não. Dallagnol pode conceder entrevistas — não deveria poder — tratando simples investigados como condenados, eu não...

Isso faz dele um homem de Estado. A reforma administrativa que vem aí mantém intocado o MPF, com todos os seus privilégios, porque se trata, considera-se, de uma "carreira de Estado".

Justamente porque concentra todo esse poder, entendo que só deveria falar nos autos, já que suas atribuições fazem dele uma autoridade. Mas ele sempre atuou sem levar em consideração certos limites. E, a triunfar a vontade de Celso de Mello, nem ele nem seus pares terão qualquer pejo em demonizar, se necessário, até mesmo os colegas de tribunal do ministro.

No dia 22 de julho, criticando decisão de Dias Toffoli, presidente do STF, escreveu nas redes sociais:

"Independentemente de sua motivação, a qual não se questiona, tem por efeito dificultar a investigação de poderosos contra quem pesam evidências de crimes."

Um procurador considera que apenas exercita a liberdade de expressão ao afirmar que decisão do presidente da corte constitucional beneficia criminosos. E tem a certeza de que nada acontecerá. Porque tal certeza o acompanhou por longos seis anos. Só o recurso da defesa de Lula ao CNMP teve o julgamento adiado 42 vezes — até que viesse a prescrição.

COM O JORNALISMO, É DIFERENTE

O que reivindica para si, pelo visto, não vale para jornalistas que não têm poder nenhum -- aos menos para um jornalista que tem a ousadia, que talvez pretende que seja vista como imprudência, de criticar a sua atuação.

Como se vê, não tive a sorte de encontrar um Celso de Mello no 6ª Juizado Especial Cível de Curitiba. Em vez disso, topei com a juíza que é mulher de seu amigo e parceiro. 

INTIMIDAÇÃO

Recorrerei da decisão enquanto recurso houver. Ser um crítico da Lava Jato já me custou dois empregos, com o vazamento canalha de uma conversa com uma fonte que, como é público, notório e conhecido, nada trazia de suspeito, impróprio, inconveniente ou ilegal. Atrevi-me, numa conversa privada, a críticar uma reportagem de um veículo -- no caso, a Veja -- que então hospedava meu blog.

Agora, vem essa ação, com as características acima elencadas. Sim, meu blog e meu programa de rádio integraram o consórcio de veículos que publicaram reportagens sobre a Vaza Jato.

A operação também não engole o fato de que, não sendo eu um jornalista ou militante de esquerda, conhecido por ser um crítico histórico do PT, tenha ousado pôr o dedo na ferida: Lula foi condenado sem provas. E segue sem resposta meu desafio para que me digam em que página da sentença de Sergio Moro elas aparecem.

Fiz, como todo mundo, minhas escolhas e tenho as minhas convicções, que não escondo de ninguém. O meu compromisso fundamental, pouco importando minhas afinidades eletivas, é com o estado democrático e de direito, exigindo que se cumpram as formalidades e as regras do devido processo legal.

E, como fica a cada dia mais claro, esses pilares são incompatíveis com a Lava Jato. Por isso eu virei um alvo.

Não vou desistir. Não busco o berço do herói. Busco um país que valham as regras do jogo.

Os dias andam rombudos, sim. Como digo na minha coluna na Folha, o "fumus boni juris" se transformou, por aqui, numa fumaça tóxica "em que se misturam voluntarismo, direito criativo e, muitas vezes, corporativismo e compadrio."

O jeito é enfrentar.

Considero que se trata de mais uma concertação que busca intimidar também a imprensa. "Ah, Reinaldo, você é o único processado por um procurador da Lava Jato". Deve ser verdade. Mas entendo que "a liberdade é, e será sempre, a liberdade de quem discorda de nós". Vejam só! Citei Rosa Luxemburgo, uma comunista! No caso, ela estava discordando de Lênin...

Por óbvio, ninguém esperava que Dallagnol fosse processar um jornalista que concorda com ele, não é mesmo?

A íntegra da coluna na Folha está aqui.

 

04
Set20

Mulher de amigo de Deltan condena Reinaldo Azevedo a pagar danos morais

Talis Andrade

 

ConJur - O jornalista Reinaldo Azevedo informa nesta sexta-feira (4/9), em sua coluna na Folha de S.Paulo, que foi condenado indenizar o procurador Deltan Dallagnol, na quantia de R$ 35 mil. A juíza que assina a decisão é Sibele Lustosa Coimbra, mulher de Daniel Holzman Coimbra, amigo de Deltan Dallagnol e colega dele na "força tarefa" de Curitiba. Veja a certidão de casamento de Sibele e Daniel.

O truque de ganhar com gol de mão e jogando em casa é uma característica lavajatista. Dallagnol tem "processado" jornalistas na própria Procuradoria da República de Curitiba. O atalho do Juizado também foi o tiro certo de Dallagnol para condenar a União por supostas ofensas do ministro Gilmar Mendes.

Em seu texto, Reinaldo mostra como a tática estrangula as chances de defesa das vítimas: a chance de recorrer da sentença agora se resume a uma Câmara Recursal, que faz as vezes de Tribunal de Justiça, com uma última possibilidade de apelação diretamente ao Supremo Tribunal Federal.

"Não descarto que a juíza Sibele possa estar convencida de que sou culpado e de que o parceiro e amigo de seu marido tem razão na sua demanda. Mas o Código de Processo Civil protege querelantes, querelados e juízes dessa situação vexatória", afirma Reinaldo na coluna.

Ele se refere ao inciso I do artigo 145 do Código de Processo Civil, que diz que um juiz é suspeito quando "amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados".

Em causa própria

O uso criativo da via dos Juizados Especiais é antigo. Em 2009, quando o Conselho Nacional de Justiça, em mau momento, vedou pagamento de adicionais a juízes que fizessem jornada dupla — militando em mutirões do TJ-SP — a tática já foi usada. Muito embora a notícia não emitisse juízo de valor nem citasse nomes, os juízes Jayme Garcia dos Santos e Leandro Jorge Bittencourt Cano entenderam ter sido chamados de mercenários, por ter desistido do mutirão (leia aqui a notícia).

A dupla pediu indenização por dano moral no juizado especial de Guarulhos, onde os juízes trabalhavam. O colega Ricardo José Rizkallah deu-lhes razão — o que foi ratificado por outros colegas, agora pela Turma Recursal. Rizkallah estribou-se em um detalhe. A previsão feita pelo TJ-SP, de que uma das câmaras de mutirão seria extinta, não se confirmou. Logo, haveria um erro de informação. Não da notícia, óbvio. Veja aqui a decisão.

04
Set20

Reinaldo aponta suspeição de juíza que o condenou no caso Dallagnol

Talis Andrade

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247 – O jornalista Reinaldo Azevedo aponta a suspeição da juíza que o condenou num processo movido por Deltan Dallagnol. "O procurador da República Deltan Dallagnol, ex-coordenador da Lava Jato em Curitiba, decidiu me processar por danos morais. Escolheu um caminho que constitui o que considero um truque, já chego lá. Fui condenado a lhe pagar R$ 35 mil", escreve ele, em sua coluna, na Folha de S. Paulo.

"Sibele Lustosa, a juíza de direito que me condenou, é mulher do procurador da República Daniel Holzmann Coimbra, que trabalha com Dallagnol na Procuradoria da República no Paraná. São parceiros e amigos. Parece-me certo — razão por que submeto o caso ao escrutínio de leitores, juízes do Paraná, do Supremo e do Conselho Nacional de Justiça — que Sibele deveria ter-se dado por suspeita para julgar o caso", afirma.

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06
Dez19

Xadrez das suspeitas sobre os filhos de Januário, por Luis Nassif

Talis Andrade

É nesse clima de absoluta promiscuidade, de falta ampla de transparência, que começaram a vicejar as suspeitas de uso abusivo do poder

O poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe absolutamente.

Lord Acton

Capítulo 1: a denúncia

A denúncia de pagamento de propinas a um procurador da Lava Jato de Curitiba surgiu da Operação Patron, última etapa da Lava Jato no Rio de Janeiro. Portanto, não foi levantada por adversários da operação. As informações são de reportagem da UOL.

Duas evidências consolidaram as suspeitas:

Desde janeiro de 2018, a Lava Jato Rio investigava as suspeitas de corrupção levantadas nos depoimentos dos doleiros. A mensagem de Messer foi capturada apenas após sua detenção, em 30 de julho de 2019.

No seu depoimento, Juca Bala informou que os pagamentos foram feitos de 2005/2006 até 2013 a dois advogados do doleiro Clark Setton, um dos quais era Figueiredo Bastos, até então um advogado obscuro que se tornou estrela das delações premiadas em Curitiba, ao lado do colega Adriano Bretas.

Na coletiva sobre a operação, em 2018, a Polícia Federal se recusou a participar, alegando ordens de Brasília.

No período em que as supostas propinas eram pagas, ainda não existia a Lava Jato, mas o grupo de Curitiba, procuradores e delegados, já estavam fortemente consolidados em torno da primeira das operações, o caso Banestado.

 

As delações de Tony e Juca resultaram em dezenas de anexos analisados pelos procuradores Eduardo Ribeiro El Hage e Rodrigo Timóteo Costa e Silva, do MPF do Rio de Janeiro.  As informações sobre Paludo foram consolidadas em um relatório e remetidas à Procuradoria Geral da República dias atrás.

Na coletiva de 2018, em que anunciaram a Operação, os procuradores sabiam que estavam diante de uma operação explosiva. Trataram-na como “a maior operação de lavagem de dinheiro desde a Operação Banestado”.

Segundo o procurador Eduardo El Hage, coordenador da força tarefa da Lava Jato no Rio: “Se pensarmos que a Operação Lava-Jato em 2014 começou com a colaboração de um doleiro, podemos prever o que será dessas prisões dos doleiros que estão sendo feitas hoje. O potencial realmente é explosivo. Temos provas substanciais contra todos eles. A peça está bem robusta. Esperamos que, no futuro, tenhamos outros desdobramentos da operação de hoje”.

Segundo os delatores, a contrapartida das propinas seria as autoridades fecharem os olhos para as atividades das famílias de Marcos Matalon e Dario Messer, em torno das quais operavam outros 15 doleiros.

Os fatos corroboravam as suspeitas. Apesar de ser conhecido como o “doleiro dos doleiros”, Messer passou praticamente incólume por todas as operações, incluindo a do Banestado, a mais abrangente sobre o mercado de doleiros. E, até alguns meses atrás, era figura carimbada nas praias do Leblon, no Rio de Janeiro.

Capítulo 2: a prisão de Messer

No dia 3 de maio de 2018 foi deflagrada a Operação Câmbio, Desligo, desdobramento da Operação Calicute, da Lava Jato Rio. Foram cumpridos 44 mandados de prisão preventiva e 4 de prisão temporária.

Messer e seus doleiros operavam a partir do Uruguai, com enormes dificuldades para extradição. Os ventos começaram a mudar no início de 2018. O Uruguai conseguira sair do enquadramento de paraíso fiscal. Para evitar que fosse reenquadrado, aceitou cooperar com as autoridades brasileiras. Através dessa cooperação, foram presos dois doleiros ligados a Messer, Barbosa e Claret.

Messer foi incluído na Difusão Vermelha da Interpol. Mas não foi encontrado nem na mansão paraguaia nem na cobertura do Leblon. Nem sua ex-esposa Rosane foi encontrada. A Polícia Federal encontrou apenas quilos de papel triturado, indicando que ele fora alertado pouco antes da deflagração da Operação Câmbio, Desligo.

Presos, Barbosa e Claret aceitaram a delação premiada. Contaram que Messer era o cabeça dos negócios, tendo direito a 60% dos lucros com a lavagem. Até 2013, tinha um banco em Antiqua e Barbado, o EVG, para atender a clientela.

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Dario Messer

 

No inquérito da operação, o nome Messer foi mencionado 677 vezes, incluindo o de Rosane Messer. Diego Candolo era o doleiro responsável por pagamentos a Paulo Roberto Costa, Nestor Cerveró. E Diego trabalhava diretamente com Dario Messer. Era incompreensível não ter sido incomodado pela Lava Jato de Curitiba.

Foi pedida sua prisão pela Lava Jato Rio, mas ela só ocorreu no dia 31 de julho de 2019, em São Paulo. Messer foi detido no bairro Jardins, na zona oeste de São Paulo, de acordo com a Polícia Federal.

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Dan Wolf Messer

 

Com a operação, a família de Messer fechou acordo de delação premiada. Foi aplicada multa de R$ 270 milhões de reais a Dan Wolf Messer, filho de Dario. As multas totais chegaram a R$ 370 milhões.

Na entrevista que deu sobre a prisão de Messer, o procurador regional da República José Augusto Vagos foi indagado porque outras operações não tinham conseguido capturar Messer. A resposta foi objetiva: “Devido ao seu poder econômico e sua influência no submundo do crime”.

As operações anteriores foram a Banestado e a Lava Jato de Curitiba. Como o poder econômico e a influência de Messer garantiram que passasse incólume por elas?

E, aí, se entra em um campo nebuloso, o do poder absoluto conferido à Lava Jato de Curitiba, pelo qual todos os pecados podiam ser perdoados.

Capítulo 3: a poderosa República de Curitiba

A Lava Jato começou em 2014, mas sua equipe – incluindo o procurador Januário Paludo, atuou no caso Banestado. Naquela Operação, os alvos principais foram os doleiros do período.

O maior deles, Dario Messer, saiu incólume. O doleiro detido foi Alberto Yousseff, peixe pequeno perto de Messer. Sua delação mirou um concorrente de Messer, Antônio de Oliveira Claramunt, o Toninho Barcelona.

Yousseff saiu do acordo com um patrimônio entre US$ 20 milhões e US$ 25 milhões. Logo voltou ao mercado. Intrigado com o renascimento rápido do doleiro, o delegado federal Gerson Machado decidiu investigar e indagou dele a razão de ter preservado o patrimônio. Sua resposta foi a de que nenhuma autoridade havia lhe perguntado. Gerson Machado alertou pessoalmente o juiz Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol. Nada fizeram. Yousseff continuou na ativa até 2014. Messer permaneceu intocado.

Os anos de cooperação na Banestado, mais a blindagem da mídia, forjaram um grupo de delegados e procuradores com poderes absolutos, que não mais respondiam aos comandos de Brasília. Sem nenhuma espécie de controle externo, sem nenhuma prática de compliance, ser honesto ou não passou a depender da convicção pessoal de cada um, não de modelos de controle e regulação.

Dentro da PF, quem ousasse questionar os métodos do grupo era imediatamente esmagado pela reação da própria PF, dos procuradores e do juiz Sérgio Moro. Foi o que aconteceu com o delegado Gerson Machado, pressionado de tal maneira que soçobrou vítima de uma depressão profunda e de uma tentativa de suicídio.

O mesmo ocorreu no episódio dos dois grampos clandestinos colocados no fumódromo e na cela do doleiro Alberto Yousseff.

Os grampos foram localizados no dia 30 de março de 2014. Houve uma sindicância presidida pelo delegado Maurício Moscardi Grillo que concluiu que o aparelho era antigo e não funcionava. O resultado da sindicância foi aceito pelo juiz Sérgio Moro.

Os grampos foram colocados na cela por ordem do delegado Igor Romário de Paula, chefe da Delegacia Regional ao Crime Organizado e de sua esposa Daniele Gossenheimer Rodrigues, chefe do Núcleo de Inteligência Policial. Quem colocou foi o agente Dalmey Fernando Werlang, 32 anos na PF, especialista em monitoramento.

Quando a história se tornou pública, Dalmey constatou que não havia autorização judicial para a colocação do grampo. Convocado pela CPI da Petrobras, reiterou esse questionamento.

A reação do MPF se deu através do procurador da República do Paraná, Daniel Holzmann Coimbra, um dos responsáveis pelo controle externo da PF. Em vez de investigar as denúncias, Holzmann acusou o delegado Mário Fanton e o agente Dalmey de serem “dissidentes” e de caluniarem colegas de trabalho. A representação foi vazada para o jornal Estado de São Paulo antes mesmo de ser protocolada na 1a Vara Federal. A denúncia foi rejeitada pelo juiz Danilo Pereira Junior, da 14ª Vara Federal de Curitiba.

A ação da PF contra os delegados profissionais, taxados de “dissidentes” foi extensamente coberta por um trabalho excepcional do repórter Marcelo Auler.

Os Policiais Federais envolvidos nos dois casos compõem, hoje em dia, o comando maior da Polícia Federal de Sérgio Moro.

A blindagem da mídia

O segundo ponto de blindagem foi o apoio integral dado pela mídia, que se transformou em mera repassadora de releases da Lava Jato.

A denúncia da suspeita de suborno do procurador Januário Paludo, apesar de divulgada pela UOL, por exemplo, foi vetada pelo Globo, Estadão e Folha, porque a Lava Jato se tornou um instrumento de política estreita.

É nesse quadro, de poder absoluto, sem estar submetida a nenhuma forma de controle, até que o Supremo Tribunal Federal se levantasse, que a Lava Jato passou a recorrer abundantemente ao instituto da delação premiada, podendo definir livremente perdão e punição e valor das multas aos réus.

A opinião pessoal dos procuradores poderia fazer uma multa de US$ 15 milhões cair para um terço ou vice-versa. Ou poderia incluir ou excluir suspeitos de um inquérito.

Esse modelo permitiu criar o mais rentável campo da advocacia do período, o dos advogados especializados em delação premiada, cujo único atributo era ter a confiança dos procuradores da Lava Jato. A maior ou menor simpatia por um advogado, o tornaria cobiçado pelos réus, dispostos a pagar honorários milionários para amenizar sua situação.

É nesse clima de absoluta promiscuidade, de falta ampla de transparência, que começaram a vicejar as suspeitas de uso abusivo do poder.

Capítulo 4: a milionária indústria da delação premiada

Com blindagem total, tendo direito de atropelar os limites legais sem serem questionados, com a imprensa sendo transformada em mera repassadora de releases, e sonegando qualquer informação contrária, a Lava Jato começa a negociar as delações premiadas.

Ao longo de todo o período, as negociações foram amplamente subjetivas. Nada era questionado, despertando inúmeras suspeitas quanto aos critérios adotados.

Messer x Meinl Bank

Segundo o advogado Tacla Duran, Dario Messer tinha acesso direto aos sistemas da Odebrecht, usando o codinome Flexão.  Marco Bilinski, Vinícius Borin e Luiz França também eram operadores da Odebrecht, através do Meinl Bank. Eles teriam movimentado US$ 2,6 bilhões até 2014, exclusivamente para a Odebrecht. Já Dario Messer teria movimentado US$ 1,6 bilhão para vários clientes .

Bilinski, Brin e França recebiam 4% sobre as operações da Odebrecht feitas através do banco.

Com a movimentação de 1,6 bilhão de dólares, a comissão do grupo foi de cerca de 64 milhões de dólares. O banco recebia mais 2% pela movimentação oficial do dinheiro, o que representaria mais 32 milhões. No total, portanto, estima-se que os três, mais Olívio Rodrigues, o quarto sócio — além dos dois sócios ocultos — receberam 96 milhões de dólares de comissão, o que corresponde a 326 milhões de reais.

  • A Lava Jato de Curitiba multou os proprietários do Meinl Bank em R$ 1 milhão por cabeça, ou R$ 3 milhões no total. E a 8 anos de reclusão da seguinte maneira: 1 ano em regime aberto diferenciado, devendo se recolher em casa das 20 hs às 6 da manhã; 6 meses em regime aberto, com recolhimento integral apenas nos finais de semana e feriados, mas sem a necessidade de uso da tornozeleira eletrônica; de 3 a 6 anos com prestação de serviços à comunidade à razão de 6 horas por semana.
  • Já a Lava Jato do Rio multou a família Messer em mais de R$ 350 milhões.

A desproporção era evidente.

Caso João Santana

João Santana e Mônica Moura foram condenados por Sérgio Moro a 7 anos de prisão. Ficaram cinco meses presos e passaram para regime domiciliar onde ficarão um ano e meio.

A partir de abril de 2019, poderão circular, tendo apenas a obrigação de se recolher à noite, aos finais de semana e feriados, além de prestar 22 horas semanais de serviços à comunidade, por mais um ano e meio. Na terceira fase, permanecerão nessas condições por mais um ano, mas já sem a tornozeleira.

Segundo declarações da Tacla Duran, Mônica deixou de declarar duas contas offshore e uma conta laranja. E os procuradores fizeram vista grossa.

As transferências internacionais são realizadas pelo sistema Swift, que exige informações obrigatórias, como os dados bancários dos beneficiários de transferência (banco, agência e conta) e o Código Swift do banco destinatário da remessa – o Standard Chartered Bank Limited. Para confirmar a informação, bastaria a Lava Jato ter solicitado dados do banco correspondente americano, que registrou a operação e expediu o Swift. Nada foi feito.

Seu advogado era Rodrigo Castor de Mattos, irmão do procurador Diogo Castor de Mattos, integrante da força-tarefa da Lava Jato.

O maior feito de Rodrigo Castor de Mattos foi no dia 17 de agosto de 2017, quando conseguiu do juiz Sérgio Moro a liberação de R$ 10 milhões para o casal Santana, de uma conta na Suíça.

No despacho, dizia Moro:

A Defesa juntou elementos aptos a demonstrar de que concordou com a repatriação e o perdimento dos valores bloqueados na Suíça, de USD 21.657.454,03, e que assinaram todos os documentos necessários à efetivação dessas medidas. O MPF confirmou que os acusados tomaram as providências necessárias para a repatriação e perdimento dos valores mantidos na Suíça. 

(…) Não é justo, a ver do Juízo, penalizar os colaboradores, que fizeram a sua parte no que se refere ao acordo, retendo em bloqueio judicial valores que não foram perdidos no acordo de colaboração.

(…) Resolvo, considerando os dois argumentos opostos, liberar parcialmente o valor bloqueado, especificamente dez milhões de reais, a serem transferidos da conta 650.005.86400410-4 para conta a ser indicada pelos acusados e seus defensores.

Obviamente tal soma não se destinava ao sustento do casal. Em prisão domiciliar, poderiam receber R$ 100 mil por vez.  Era evidente que os R$ 10 milhões se destinavam ao pagamento de honorários dos advogados, justamente Rodrigo, irmão do procurador Diogo, da Lava Jato.

A Procuradoria da Lava Jato nada falou contra a decisão. O veto veio da Procuradoria da Fazenda que considerou “descabida” a decisão de Moro. Após a manifestação da Fazenda, Moro voltou atrás.

Em circunstâncias similares, Moro negou a liberação de R$ 1,8 milhão ao ex-Ministro Antônio Palocci, para pagamento de impostos.

O caso Zucolotto

O episódio mais grave, e documentado, foi o de Carlos Zucolotto com o advogado Tacla Duran. Zucolotto enviou uma mensagem a Tacla propondo redução de sua multa de US$ 15 milhões para US$ 5 milhões. US$ 5 milhões seriam pagos por fora, a título de honorários.

Dez dias depois da conversa, Tacla recebeu e-mail dos procuradores Carlos Fernando Lima e Roberson Pozzobon, com a proposta de delação.

Segundo Tacla, o esquema seria simples. Na sentença, seria mencionada a multa de US$ 15 milhões e indicada uma conta sem reservas. No acordo estaria definido que, não encontrando fundos na conta, a multa seria reduzida paa US$ 5 milhões.

Moro e a esposa Rosangela – que já havia trabalhado no mesmo escritório de advocacia de Zucolotto – saíram publicamente em defesa do amigo.

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É nesse quadro de ausência absoluta de compliance que surge o caso Dario Messer, e as suspeitas de suborno a policiais e procuradores, visando fechar os olhos para sua atividade.

Capítulo 5: a auto-regulação das corporações

Como fica agora? Com todo esse histórico de falta de transparência, de critérios mal explicados para os acordos de delação, de falta de resposta às suspeitas mais graves, como as formuladas por Tacla Duran, como se comportará o MInistério Público Federal, à luz dessas novas suspeitas?

Terá condições de se impor uma auto-regulação, que paire acima da solidariedade corporativa? Sem sonegar a Paludo a presunção da inocência e o direito à plena defesa, conseguirá submeter o caso a uma investigação isenta? Ou se entregará ao corporativismo mais abjeto, como foi o caso dos delegados da Polícia Federal de Curitiba?

Em jogo está não o futuro da Lava Jato, mas o da própria respeitabilidade do MPF. A República de Curitiba se apropriou de um poder maior que o do próprio MPF e da PGR. É hora do rio voltar ao seu leito normal, mesmo que expondo os detritos desses tempos de libação.

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Caro Nassif, acho que só faltou uma informação: a de que Messer foi preso logo após o escândalo da Itaipu envolvendo diretamente Bolsonaro. Na época foi visto como uma espécie de "queima de arquivo", tentativa de calar alguém que poderia entregar os negócios feitos no Paraguai. Preso, ou seja, controlado, suas delações respingam em Curitiba e silenciam completamente sobre suas conexões paraguaias. Acho que falta esse capítulo para o quadro ficar mais completo.

O silêncio cúmplice e desonesto da grande mídia a respeito desse escândalo revela que vai ser difícil ele resultar em uma investigação séria. Esperar o que da PF que, hoje, demonstra obedecer cegamente a Moro? E do próprio MPF? Para todos, mídia, PF e MPF, com o apoio incondicional de, ao menos, instâncias inferiores da "justiça", o mais importe é manter intocada a Operação Delenda Lula e o PT. Para isso é imprescindível que todos os envolvidos continuem parecendo vestais imaculadas aos olhos do público, anestesiado pela opinião publicada.

— Edson J
 
 

 

29
Abr18

Lebbos rica carcereira de rosto escondido do presidente operário

Talis Andrade

No golpe militar de 1964 os juízes que condenaram Dilma Roussef, que seria depois eleita duas vezes presidenta do Brasil, escondem o rosto. 

dilma_rousseff_tribunal_militar.jpg

 

 

Nenhum gesto provavelmente é mais universal, impulsivo e intenso que o de cobrir o rosto com as mãos. E a expressão física de uma emoção que não há quem já não tenha tido o desprazer de experimentar e que, além disso, costuma manifestar-se traiçoeiramente, quando menos se espera — a vergonha. Por incrível que pareça, só há pouco tempo os psicólogos se deram conta, constrangidos, de que nunca haviam encarado a vergonha com a atenção que ela merece. Tampouco os cientistas sociais podem vangloriar-se de saber muita coisa sobre o papel dela na vida em sociedade, além do fato de ser em algumas culturas um poderoso detonador de comportamentos extremados.

 

Por que a juíza Carolina Moura Lebbos esconde a cara? O único retrato seu conhecido é um 3x4 de sua carteira de estudante.

juizinha_ Lebbos.jpg

 

 

Pelo que se sabe não existem motivos cultural árabe ou religioso muçulmano, apenas medo de ser sequestrada, que a juíza herdou uma imensa fortuna do pai, o banqueiro, empresário e médico Elie Lebbos.  

 

Sincronicidade em 82: Lula apontava injustiças; Carolina nascia

 

por Marcelo Auler

 

Certamente não foi premonição, mas – mais do que mero acaso -, talvez a chamada sincronicidade, ou, a “coincidência significativa”. Ocorreu na segunda-feira, 4/10/1982.

 

Em São Paulo, o ex-líder metalúrgico, Luiz Inácio Lula da Silva, na sua primeira disputa eleitoral – ao governo do Estado -, denunciava na Folha de S. Paulo as injustiças de um sistema “penal alienado”, orientado para afastar da convivência social quem colocasse em risco os privilégios das elites.

 

Em Curitiba, na mesma data, vinha ao mundo, no seio de uma família da “elite” da cidade, Carolina Moura Lebbos. Ela, 35 anos depois, como juíza federal e com uma interpretação que aparentemente faz de uma lei letra morta, mantém o ex-metalúrgico que ascendeu socialmente e atingiu à Presidência da República, em quase isolamento. Situação não prevista nem mesmo na sentença – amplamente discutível - que sequer transitou em julgado. Faz isso ao impedir as visitas daqueles com os quais aquele metalúrgico – hoje, um ex-presidente preso -, forjou relações de amizades mais antigas do que todo o tempo de vida que ela contabiliza.

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No dia em que a juíza Carolina Moura Lebbos nasceu, Lula denunciava injustiças do sistema penal, na Folha.

 

Como definiu nesta terça-feira (24/04)  Nabil Bonduki em artigo na Folha de S.Paulo – Solitária ‘chic’ de Lula fere a resolução da ONU sobre o encarceramento – após um processo com um roteiro que seguiu “o calendário eleitoral”. Lula foi recolhido à Polícia Federal em “um regime prisional que tem o claro objetivo de impedir o contato de Lula com o mundo externo. O Judiciário impede visitas, salvo advogados e familiares, impondo-lhe um regime de semissolitária, que parece ter dois objetivos combinados: impedir que ele possa ter contatos políticos com amigos e tentar levá-lo à depressão. O regime contraria as Regras de Mandela, normas que devem reger o sistema penal, aprovadas pela Assembleia Geral da ONU em 2015, com a participação ativa do Brasil”.

 

Na entrevista à mesma Folha, em 1982,  em que abordava a questão da criminalidade nas camadas populares e criticava leis e códigos que, no seu entendimento, apenas beneficiavam a elite, Lula expôs, como registra o jornal daquela data, uma situação que vivencia 35 anos depois:

 

“Semelhante situação é agravada por um sistema penal alienado e orientado no sentido de apenas afastar da convivência social aqueles que, segundo critérios de uma legislação elitista, atravessaram as linhas traçadas por determinados códigos de conduta, previamente estabelecidos pelas próprias elites e no resguardo exclusivo de seus privilégios“.

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Lula, em 1982, no dia em que a juíza Carolina nasceu, denunciou a injustiça que hoje ela lhe aplica

 

Filha de um casal de médicos bem sucedidos – seu pai, Elie Lebbos, libanês naturalizado brasileiro, atendia, entre outros, ao ex-deputado federal paranaense José Janene; sua mãe, Marina Vieira Moura Lebbos, descendeu de uma ativa família de cardiologistas em Curitiba – Carolina não aparenta ter passado por dificuldades para conquistar o título que hoje possui.

 

Desde o seu ingresso na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR) encontrou portas abertas, mesmo antes de se formar, em 2005. Estagiou Inicialmente em um escritório de advocacia (2000/01) depois no Tribunal de Justiça do Estado, em dois momentos (2001/03 e 2004/06).

 

No interregno desta sua passagem pelo Tribunal, por dois anos estagiou na Procuradoria da República de Curitiba. A mesma que Lula acusa de tê-lo perseguido, lhe atribuindo crimes que não ficaram provados.

 

Formada em 2005, na OAB do Paraná registrou-se com a matrícula 40323. Com este cadastro, segundo o site Escavador, aparecem 57 processos indexados. Destes, 30 no Estado do Paraná, além de 27 em tribunais fora do Estado, inclusive Brasília.

 

Ingressou na magistratura federal em julho de 2011, atuando como substituta na Vara Federal de Mafra (SC). Depois, antes de chegar ao seu posto atual, passou ainda pela Vara Federal da Ponta Grossa (PR). Em março deste ano, ao seu salário de R$ 27.500,13 juntou outros R$ 5.261,73 a título de verbas indenizatórias. Na página da Justiça Federal do Paraná (JF-PR) não se especifica que benefícios recebeu. Nas verbas indenizatórias se incluem os auxílios moradia, pré-escola, transporte, alimentação, saúde, natalidade e ajuda de custo em geral. Mas na página de transparência da JF-PR não há especificação do que foi pago ao servidor. Com tais auxílios, a juíza praticamente compensou os descontos de praxe – Imposto de Renda, previdência, etc. – percebendo líquidos R$ 27.327,93, ou seja, apenas R$ 172,20 a menos.

 

Mesmo sendo juíza substituta – a titularidade só virá com tempo de exercício do cargo – ela divide com o titular da 12ª Vara Federal, Danilo Pereira Júnior, todos os processos. Ambos acumulam a Vara de Execução Penal. Na ausência de um, outro responde por todos os feitos. Como ocorre agora, já que o titular está afastado do juízo por responder, nas férias do titular, pela diretoria do fórum federal.

 

Quem os conhece considera que o titular é mais garantista que a substituta. Foi Danilo, por exemplo, quem recusou uma denúncia do procurador da República de Curitiba, Daniel Coimbra, em setembro de 2015, pela qual acusou dos crimes de calúnia o delegado federal Mario Renato Castanheira Fanton e o agente de Polícia Federal Dalmey Werlang. Coimbra acatara uma representação feita pelos principais delegados da Operação Lava Jato contra os dois colegas que os apontaram como responsáveis, ou conhecedores, do grampo ilegal instalado na cela de Alberto Youssef, em março de 2014, quando a Operação teve início, tal como reportamos em Calúnia na PF-PR: juiz rejeita denúncia e critica MPF.

 

Ao barrar as visitas a Lula, passando por cima do que prescreve a Lei da Execução Penal, onde está previsto que um preso tem direito a receber amigos, além de familiares e advogados, Carolina acabou ganhando notoriedade. Mundial.

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O impedimento do ingresso na Polícia Federal do prêmio Nobel da Paz, Adolfo Pérez Esquivel, e do teólogo Leonardo Boff, na semana passada, repercutiu na imprensa do mundo. Os dois, diga-se, conhecem e convivem com Lula desde o final dos anos 70, portanto, bem antes de Carolina vir ao mundo.

Nas decisões que barraram todas as visitas a Lula, exceção a familiares e advogados, colocando-o na semissolitária a que Bonduski se referiu acima, a juíza fez a interpretação da lei da sua forma. Alegou, entre outros motivos, a enxurrada de pedido de visita, como se o preso fosse, digamos, um João ninguém, e não um líder reconhecido mundialmente. No despacho de segunda-feira (23/04) ela expõe:

Em duas semanas da efetivação do encarceramento chegaram a este Juízo requerimentos de visitas que abrangem mais de uma dezena de pessoas, com anuência da defesa, sob o argumento de amizade com o custodiado. A análise desses pleitos tem como fundo questão de direito comum, que impõe a deliberação conjunta.

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Após serem impedidos de entrar na Polícia Federal, em Curitiba, Esquivel, 86 anos, e Boff, 79 anos, saem abraçados como amigos que se conhecem há mais de três décadas. (Foto: Marianne Spiller) 

 

A prisão do apenado implica a privação do seu direito à liberdade de locomoção. Limitam-se, também, os direitos cujo exercício tenha por pressuposto essa liberdade de ir e vir (limitações implícitas, inerentes à pena de prisão). E, ademais, há restrições justificadas pela própria execução da pena, em especial ante as peculiaridades ínsitas ao ambiente carcerário (limitações implícitas, inerentes à execução da pena). 

 

O artigo 41, inciso X, da Lei n. 7.210/1984 prevê como direitos do preso “visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados”. O parágrafo único deste dispositivo, no entanto, estabelece não se tratar de direito absoluto. Na linha do acima consignado, limitações implícitas inerentes à execução da pena levaram o legislador a conferir ao diretor do estabelecimento competência para restringi-lo. A ele cabe, considerando as peculiaridades do local de custódia, analisar a extensão de eventual necessidade de restrição e, em vista disso, determinar o regime adequado de visitação para os detentos“.

 

Como exposto na ilustração acima, a restrição prevista no artigo único da Lei é admitida quando justificada “por um ato motivado do diretor do estabelecimento”.  Na decisão ela alega  que na Polícia Federal “apenas familiares são autorizados a visitar os detentos, sem prejuízo do acesso aos advogados”.

 

Talvez ela desconheça, mas não foi o que aconteceu ao longo da Lava Jato. Para citar um exemplo, basta rever o que disse em depoimentos e no livro Assassinato de Reputações II, a contadora Meire Poza. Sem nenhum parente preso, ela esteve na carceragem da PF em Curitiba convencendo amigos a delatarem. Ou seja, regras, ali também, têm exceções.

 

Que houvesse restrições ao dia marcado para visitas a Lula – quinta-feira – ou mesmo ao número de pessoas a visitá-lo por vez. Mas, dizer que tais visitas influenciarão o funcionamento daquele órgão chega a ser exagerado. Ainda mais se tratando de visitas como um prêmio Nobel da Paz, ou uma ex-presidente da República. Sem citar outros muitos exemplos.

 

A decisão só caracteriza aquilo que todos já compreenderam. A pena de Lula é superior à que foi estabelecida nas sentenças – discutíveis e sem trânsito em julgado, rememore-se. Além de encarcerado, querem submetê-lo à semissolitária, muito provavelmente para não só retirá-lo do cenário político. Mas também para levá-lo a uma depressão.

 

A rigidez da decisão acabou atingindo outro Poder. No que pese a juíza alegar que inexiste motivação para a “inspeção” anunciada pela Comissão Externa criada pelo presidente da Câmara, e ainda que tal comissão não tenha os poderes previstos para Comissões Parlamentares de Inquérito, ela foi criada por ato do presidente daquela Casa Legislativa. A questão é saber se tal ato pode ser contestado por um juízo, que não o Supremo Tribunal Federal, foro ao qual, quer como deputado e, mais ainda como presidente de um dos Poderes da República, Rodrigo Maia está afeto. Este tende a ser o próximo debate, a partir da visita que deputados prometem fazer nesta terça-feira à sede da Polícia Federa, em Curitiba.

 

Agradecimentos: O Blog, na busca por notícias exclusivas e com enfoques diferentes, durante 16 dias esteve em São Bernardo do Campo (SP) e em Curitiba (PR) acompanhando o noticiário em torno do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Isso foi possível graças à ajuda dos leitores e colaboradores que contribuíram para nossas despesas com doações, como sempre acontece. Agradecemos a todos e, em especial, a Ivete Caribé da Rocha, que nos acolheu na capital paranaense e a todos que nos ajudaram direta ou indiretamente. Esperamos continuar merecendo a atenção e o apoio de nossos de leitores e seguidores. Doações ao Blog podem ser feitas na conta especificada neste quadro.

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