Maria Leusa coordena a Associação de Mulheres Wakaborun e é ameaçada de morte por empresários do garimpo e garimpeiros devido à resistência aos invasores
A floresta doente
Por Daniel Camargos, da TI Munduruku (PA), e Julia Dolce || Fotos: Fernando Martinho/Repórter Brasil
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Isaías, de 11 anos, não anda, não fala e é carregado no colo pelo pai, que esculpiu em madeira uma poltrona para suprir a falta de cadeira de rodas. Os irmãos Hélio, 12, Vandir, 8, e Juliana, 5, também não andam, nem falam. Seus braços e pernas são atrofiados, e os joelhos estão inchados e com arranhões de tanto se arrastarem no chão.
Médicos, agentes de saúde e familiares buscam há anos explicação para um fenômeno que faz das aldeias habitadas pelosindígenasdo povoMunduruku, na divisa entre Pará e Mato Grosso, as que mais solicitam cadeira de rodas na comparação com outras terras indígenas. Além de crianças nascidas com malformações e atrasos no desenvolvimento, adultos estão cegos e relatam tremores e fraqueza.
Valdenilson Oyoy construiu um suporte para o filho, Isaías, enquanto aguarda o envio de uma cadeira de rodas pela Sesai
A principal suspeita é que eles estejam sofrendo as consequências da contaminação pelomercúrio. Com população estimada em 14 mil pessoas, os Munduruku vivem em um território invadido ilegalmente pelogarimpode ouro desde a década de 1980. A sanha pelo minério explodiu a partir de 2016 e não encontrou resistência do governo federal na gestão de Jair Bolsonaro. Com isso, aumentou também o consumo de mercúrio, que é usado para separar o ouro de impurezas, mas descartado sem qualquer preocupação ambiental.
“A cabeça das crianças está ficando mole e as mãos assim [retorcidas]”, afirma o cacique José Edilson Akay, da aldeia Nova Trairão, dobrando os dedos da mão direita. “Cabeça mole é criança doente por mercúrio. A gente fica com medo”, explica outro cacique, Luciano Saw, da aldeia Patawazal.
Hélio, Vandir e Juliana nasceram com malformação congênita. Juliana tem dificuldade para sustentar o pescoço, Vandir tem os dedos da mão contraídos e Hélio, os pés atrofiados
A contaminação por mercúrio ocorre principalmente pelo consumo de peixes, base da alimentação do povo Munduruku. O metal é despejado em rios e no solo pelo garimpo, ou então é queimado e evaporado durante o processo de separação do ouro, retornando por meio de chuvas. Nas mulheres grávidas, o mercúrio ultrapassa a placenta e contamina o feto em desenvolvimento até sete vezes mais do que as outras pessoas, causando danos irreversíveis.
“Por que esse fenômeno está acontecendo com tanta intensidade e frequência aqui na região do rio Tapajós?”, questiona o médico e pesquisador da Fiocruz Paulo Basta. “Está mais evidente do que nunca que a presença do garimpo no território tem provocado alterações importantes na saúde da população”, diz ele, que coordenaum estudo sobre os efeitos do mercúrioem mulheres Munduruku grávidas e em seus filhos. A equipe vai monitorar gestantes e bebês por três anos, acompanhando ao todo 250 recém-nascidos de dez aldeias diferentes.
O tempo dos Munduruku, contudo, é mais urgente que o tempo da ciência. Eles não podem esperar enquanto suas crianças adoecem com a exploração de ouro. O território é o segundo mais afetado pelo garimpo ilegal no Brasil, atrás apenas da Terra Indígena Kayapó e à frente do território Yanomami.
ARepórter Brasilrecebeu autorização de lideranças Munduruku, durante encontro da Associação de Mulheres Wakaborun, em março, para visitar cinco aldeias do Alto Tapajós e entrevistar indígenas adoecidos e seus familiares. O nome das crianças foi alterado para preservar suas identidades.
Por uma semana, a reportagem percorreu os rios Kabitutu, Kadiriri e Tapajós acompanhada de caciques e guerreiros do povo Munduruku – ameaçados de morte pelos garimpeiros por resistirem à exploração. A cada desembarque, chamou atenção o número de pessoas com problemas motoras ou neurológicas em pequenas aldeias, como Karo Muybu, Jardim Kaburuá, Curimã, Pombal e Saw Bimuybu.
Daniel Karu (no alto), de 5 anos, é mudo. Diogo Poxo (acima), 8, também não fala, nem consegue escrever na escola. Quando tenta brincar, cai no chão
“É a primeira vez que uma equipe de reportagem vem aqui”, disse o agente indígena de saúde Amarildo Kaba, da aldeia Jardim Kaburuá. O próprio Amarildo sente dores que se assemelham às características da contaminação por mercúrio. “Muita cãibra nas pernas, fui ficando sem força, passou um tempo comecei a amolecer. Não descobri o que é até hoje”.
Os sintomas são semelhantes aos narrados por Josiel Poxo a respeito do filho, Diogo Poxo, 8 anos. “Ele começou a chorar e não levantou mais. Ficava contraindo as mãos e a perna foi afinando. Não conseguia brincar”, recorda o pai. O menino chegou a ficar três meses deitado o dia inteiro, mas voltou a andar. “Só que ele não consegue escrever na escola e não consegue falar. Hoje, ele até brinca, mas cai”, descreve Josiel.
Na mesma aldeia, Rosita Tawe diz que o filho, Daniel Karo, de 5 anos, não fala nada. “Tem alguma coisa na garganta que deixa ele assim”. O menino já foi atendido por um médico, mas a mãe não sabe o que provoca a mudez.
As traduções das entrevistas são feitas pelas jovens de coletivos audiovisuais Wakabourun e Daok, de diferentes regiões da Mundurukânia – como eles se referem ao território formado pelas Terras Indígenas (TIs) Sai Cinza, Munduruku, Sawre Muybu, Sawre Bap´in. Praia do Índio e Praia do Mangue no vale do rio Tapajós, que se estende do norte do Mato Grosso ao Pará.
As jovenssão o braço armado – com câmeras, celulares e drones– da resistência ao garimpo. Estão produzindo um documentário sobre a contaminação por mercúrio cujo título é “Awaydip Tip Imutaxipi”, ou “A floresta doente”, em português. Não há síntese melhor.
Jovens dos coletivos audiovisuais Wakaborun e Daok denunciam a invasão do território com câmeras, celulares e drones. Estão produzindo documentário sobre a contaminação por mercúrio
“Deus levantou Bolsonaro”, disse Zequinha Marinho no 7 de Setembro; candidato ao governo do Pará atua ao lado de Éder Mauro como interlocutor de garimpeiros e madeireiros em Brasília (Foto: João Laet/Repórter Brasil)
Matar passou a ser um símbolo político do Bolsonarismo. Matar índio. Matar negro. Matar favelado. O evangélico eleitor de Bolsonaro faz vista grossa para o “Não matarás” (Ex 20,13). Apenas cisma com o aborto.
Nesta eleição não vote em deputado homicida. O Congresso parece um coito do cangaço. Tem até serial killer, o psicopata que matou mais de três pessoas.
A ditadura militar de 1964 registra a presença nojenta, viscosa, de militares e policiais serial killers como os coronéis Ustra, Paulo Manhães, os delegados Fleury, Pedro Seelig.
No Congresso e assembléias legislativas temos parlamentares que, nesta campanha presidencial, ameaçaram matar Lula. Na lista aparecem homicidas e arruaceiros prontos para o golpe, para a guerra civil de Bolsonaro, que já anunciou o Brasil precisa matar uns 30 mil políticos, para o progresso de sua imobiliária, e expansão do Escritório do Crime sediado no Rio das Pedras, rio de sangue do senhor capitão, pistoleiro de aluguel, Adriano Magalhães da Nóbrega, que na cadeia, recebeu "ao menos duas visitas" do presidente e seu filho mais velho, o senador Flávio Bolsonaro, relata Juliana Dal Piva.
Os parlamentares que ameaçaram matar Lula: Marcio Tadeu Anhaia de Lemos, Eliezer Girão Monteiro, André Luiz Vieira de Azevedo, Paulo Adriano Lopes Lucinda Telhada, Washington Lee Abe, Otoni de Paula Junior, Carla Zambelli, Junio Amaral. Não sei qual alma sebosa tem a marca de Caim.
Ex-delegado, Éder Mauro (PL-PA) assume ter executado várias pessoas e camufla atuação contrária aos povos do campo e ao meio ambiente com discurso moralista; candidato é alvo de 101 denúncias em ouvidoria por sua atuação como policial
Depois de rezar e cantar o hino nacional, o deputado federal Éder Mauro (PL-PA), candidato à reeleição, começa seu discurso dizendo que, caso a esquerda volte ao poder, o incesto será legalizado, “para que o pai possa casar com a filha”. É umamentirausada pelo ex-delegado ao longo da campanha e que voltou a ser repetida, em Belém (PA), em ato de comemoração ao 7 de Setembro. Mas o tom moralista, ao lado da atuação como policial com pretensão de justiceiro, serve para camuflar outra faceta dopolítico: a de ruralista que atua sistematicamente contra omeio ambientee os povos do campo.
Éder Mauro, 61 anos, foi delegado da Polícia Civil do Pará por 30 anos, entre 1984 e 2014, quando foi eleito deputado federal pela primeira vez. Já disse que “matou muita gente”, masfez uma ressalva: “todos eram bandidos”. Por sua atuação como policial, foi alvo de pelo menos 101 denúncias na Ouvidoria do Sistema Integrado de Segurança Pública e Defesa Social (Sieds) do Pará, que incluem acusações de assassinatos, torturas e invasões de domicílio, segundo levantamento obtido pelaRepórter Brasil. O ex-delegado foi citado norelatório final da ‘CPI das Milícias’ da Assembleia Legislativa do Pará, em 2015, mas acabou não sendo indiciado.
O político usa um emoticon de caveira no Instagram para ostentar seu posto de líder da bancada da bala na Amazônia. Mas a análise de sua atuação na Câmara sugere que poderia trocar a imagem por um boi: o deputado é o terceiro pior colocado noRuralômetro 2022, ferramenta desenvolvida pelaRepórter Brasilque avalia a atuação da Câmara em temas como meio ambiente, povos indígenas, quilombolas e trabalhadores rurais. O ranking, que está em sua segunda edição, possibilita saber a “febre ruralista” de cada parlamentar. Nele,Éder Mauro arde com temperatura de 40,9°C.
Na atual legislatura, Mauro foi o único deputado com atuação 100% negativa para o meio ambiente e os povos do campo, segundo as 22 organizações que avaliaram as votações e os projetos de lei usados para pontuar os parlamentares no Ruralômetro. Em todas as 17 votações que participou, o ex-delegado foi contrário à agenda socioambiental, apoiando a regulamentação de atividades econômicas em terras indígenas, a ampliação da posse de armas no campo, a dispensa do licenciamento ambiental para diversos empreendimentos e a liberação de agrotóxicos cancerígenos. Também foram classificados como negativos os três projetos de lei de sua autoria compilados pela ferramenta.
Amazônia na mira
A pauta ambiental foi apenas figurante no 7 de Setembro, quando o deputado desfilou em cima de uma aparelhagem de som pelo bairro Umarizal, o mais nobre de Belém. Somente um discreto cartaz em um caminhão fazia uma referência à temática. “A Amazônia é dos brasileiros, não dos piratas estrangeiros”, dizia.
Cartaz era das poucas referências à Amazônia no ato em Belém; silêncio contrasta com a forte atuação do bolsonarismo paraense nos retrocessos ambientais (Foto: João Laet/Repórter Brasil)
Estrela da extrema-direita paraense em campanha pela reeleição, o candidato prefere flertar com o eleitorado evangélico e conservador, que o tietava de verde e amarelo pelas ruas de Belém. Prioriza a mesma estratégia em suas redes sociais, onde possui quase 450 mil seguidores. Declarando guerra contra pedófilos e comunistas imaginários, Éder Mauro vai deixando pelo caminho não apenas as vítimas de sua atuação na polícia: como defensor dogarimpo, o ex-delegado atira para matar contra o futuro da Amazônia.
Protagonista da parada paramilitar, a caminhonete que puxou a aparelhagem de som de Éder Mauro recebeu também o senador e candidato ao governo do Pará Zequinha Marinho (PL-PA) que, em seu discurso, disse que Bolsonaro foi uma escolha do “pai celestial”.
Além de devotos do presidente, Zequinha Marinho e Éder Mauro estão unidos pela defesa do garimpo. Pastor da Assembléia de Deus, o senador é um dos principais lobistas para legalização da exploração mineral em terras indígenas, como mostrou aRepórter Brasilemjulho do ano passadoe emfevereiro deste ano. “Chama o Zequinha” se tornou uma frase repetida por quem busca sua ajuda para atividades ilícitas,revelou a Públicaem agosto.
Éder Mauro, por sua vez, é autor de projetos de lei que favorecem o garimpo, dos quais dois estão na base de dados doRuralômetro. O PL 5.248 permite que órgãos municipais possam fazer o licenciamento ambiental de lavras garimpeiras de pequeno porte, fragilizando a fiscalização, e o PL 5.822 quer autorizar o garimpo em reservas extrativistas.
Na mesma época, Zequinha e Éder repetiram a dobradinha ao articular umareunião de garimpeiros do Sul do Pará com a cúpula do governo Bolsonaro. O intuito do encontro era acalmar protestos de representantes do setor após uma operação ambiental destruir máquinas usadas pelo garimpo ilegal.
Já acostumado a se posicionar na Câmara a favor dos ruralistas, Mauro decidiu tornar-se um deles em 2020, com a compra de uma fazenda de 300 hectares no município de Bujaru, no nordeste do Pará.A transação é investigada pela Polícia Civildo estado por suspeita de fraude, pois a área foi registrada em 2018 em nome de uma pessoa que já estava morta havia 15 anos. Avaliada em R$ 2,8 milhões, a fazenda Bênção Divinal foi adquirida por Mauro por R$ 330 mil e ajudou a dar corpo ao seu patrimônio, que quintuplicou desde que entrou para a política. Na eleição de 2014, o então delegado declarou bens que somavam R$ 595 mil, valor que subiu para R$ 2,9 milhões no atual pleito.
Rogério Barra, filho de Éder Mauro, entrou para a política apadrinhado pelo pai e é candidato a deputado estadual; jingle de campanha trata os dois como os “deputados do Bolsonaro” (Foto: João Laet/Repórter Brasil)
Entre os doadores da sua campanha neste ano está Walacy da Silva Moraes. O valor de R$ 12 mil doado diz respeito ao uso de uma caminhonete pela campanha do ex-delegado. O doadorfoi preso em 2014acusado justamente de participar de uma organização criminosa especializada em roubar esse tipo de veículo no Pará. Moraes é réu pela acusação e responde em liberdade. Parte dos processos a que a reportagem teve acesso mostram que Éder Mauro estava à frente da investigação do grupo quando era delegado. Questionado sobre a doação e sobre sua relação com Moraes, o deputado não respondeu.
Procurado pelaRepórter Brasil, Moraes confirmou o empréstimo da caminhonete para a campanha de Mauro. Ao ser questionado sobre o processo que corre na Justiça, a ligação caiu, e o empresário não voltou a atender o telefone nem respondeu às perguntas enviadas por mensagem
Liberdade de opressão
Um triciclo preto ornado com caveiras e correntes era palco de selfies de apoiadores de Éder Mauro. “Bolsonaro e os candidatos dele defendem a liberdade e a livre expressão”, elogiou um homem fantasiado de Capitão América.
Adotando a mesma estratégia de Jair Bolsonaro, Mauro abusa dessa “liberdade de expressão” para capturar a atenção com polêmicas e desviar dos assuntos mais importantes, como as acusações de corrupção envolvendo sua família – irmão do ex-delegado, Amaurivaldo Cardoso Barra foi exonerado em março deste ano da Secretaria Nacional de Pesca apósoperação da Polícia Federal que investigou fraudes no órgão público.
Homem infantalizado e fantasiado de Capitão América que participa do 7 de Setembro em Belém diz que Bolsonaro e seus candidatos defendem a liberdade de expressão (Foto: João Laet/Repórter Brasil)
Em seus oito anos no Congresso, mulheres de esquerda foram os alvos preferidos de seus ataques. Em um desses bate-bocas, Mauro acusou a deputada federal Vivi Reis (PSOL-PA) de defender “indígenas fake” (questionar a legitimidade do movimento indígena é uma das obsessões do ex-delegado nas redes sociais). Ao rebater, a parlamentar disse que fake era a peruca dele, em referência à franja com fios mais negros que a asa da graúna. O penteado do bolsonarista rendeu-lhe o apelido de “peruquinha” entre seus inimigos políticos.
Em outra ocasião, chamou a deputada Maria do Rosário (PT-RS) de “Maria do Barraco”, ao que ela rebateu chamando-o de “assassino”. “Infelizmente, já matei, sim, e não foram poucos, foi muita gente”, contestou Éder Mauro.
“Estou respondendo um monte de processo na Justiça por homicídio, invasão de propriedade e alguns por tortura, mas nenhum por corrupção”, reiterou em entrevista recente a umpodcast paraense.
A fama de justiceiro e o orgulho em dizer que matou muitas pessoas contrasta com a ausência de condenações de Éder Mauro, que já foiabsolvido de duas acusações de tortura pelo STF. Advogados, defensores de direitos humanos e líderes comunitários foram procurados pela reportagem para saber sobre o passado policial do ex-delegado, mas quando o assunto da entrevista é revelado, quase ninguém fala abertamente. A justificativa: “medo”.
A especialista em marketing eleitoral e digital, Bruna Lorraine, processa Éder Mauro por agressão: “Quem vota nele quer se autoafirmar, fortalecer um tipo de macheza” (Foto: João Laet/Repórter Brasil)
Entre as poucas pessoas dispostas a falar sobre Éder Mauro em Belém está Bruna Lorrane, especialista em marketing eleitoral e digital. Em 2019, durante uma eleição para uma associação de bairro, ela e o deputado apoiavam diferentes candidatos. “O candidato dele estava perdendo e queria encerrar a votação antes do horário. Eu não deixei, fiquei na porta para impedir a entrada e fui agredida”, relata Bruna, que diz ter ficado com o corpo repleto de hematomas e está processando Mauro pela agressão.
“As pessoas gritavam dizendo que era covardia bater em mulher e o Éder Mauro respondia: ‘não tem mulher nenhuma para eu bater aqui’”, lembra Bruna, que é transexual. Após a agressão ganhar onoticiário paraense, passou a ser atacada por uma horda virtual da extrema direita.
Outra vítima de Éder Mauro e seus discípulos é o coordenador da campanha da candidata a deputada federal Nice Tupinambá (PSOL), Richard Callefa. Ativista do movimento LGBTQIA+ no Pará, Callefa foi eleito coordenador do diretório de estudantes da maior universidade privada do estado em 2019. Depois da eleição, Mauro criticou o ativista em suas redes sociais, o que o tornou alvo até de ameaças de morte. “Ele estimulou o ódio”, lembra.
Atacado por Éder Mauro, Richard Callefa sofreu ameaças virtuais e chegou a ser coagido nas ruas de Belém (Foto: João Laet/Repórter Brasil)
Livre para ser candidato, Éder Mauro pega carona no bolsonarismo. Ou melhor: vai na garupa do presidente, como fez namotociata realizada em Belém em 17 de junho. Ambos sem capacete, desrespeitando a lei e aplaudidos pelos apoiadores. Nesta quinta-feira (22), Bolsonaro irá de novo à capital paraense fazer campanha. Dessa vez, se não quiser cometer nova infração de trânsito, o ex-delegado poderá trocar a moto pela caminhonete emprestada pelo réu que investigou.
[Não eleja serial killer deputado. Não seja cúmplice. Ame o próximo. Ame o Brasil. Os bolsonaristas recomendam matar os invasores de propriedade. Consideram o pior crime. Mas consideram um ofício honroso invadir terra de índio e terra de quilombola. Que negro não é gente, "não serve nem pra procriar" escravos. Índio não é gente. Apenas um "projeto"]
Equipe foi abordada por policiais do Brasil colônia, um deles empunhando uma metralhadora, a pedido da mineradora Brazil Iron - Foto: Fernando Martinho/Repórter Brasil
‘Brazil Iron’ chamou policiais munidos de armamento pesado para apreender imagens produzidas pela reportagem investigativa que apura a denúncia de contaminação da Chapada Diamantina
por Hora do Povo
A mineradora inglesa ‘Brazil Iron’, em Piatã, na Chapada Diamantina (BA), alvo de muitas críticas por parte da população residente no entorno da mineradora, chamou a polícia para apreender gravações da equipe da ‘Repórter Brasil’, que aguardava um pedido de entrevista na sede local na última segunda-feira (28).
A tentativa de intimidação da equipe ocorreu enquanto os repórteres aguardavam autorização para realizar entrevista na sede da empresa. Ao chegarem ao local, os profissionais foram levados pelo gerente de logística da Iron Brazil , Roberto Mann, a uma sala de reuniões onde havia dois executivos ingleses da empresa, quando eles justificaram as razões da entrevista e as informações que necessitavam obter. O gerente pediu que aguardassem. Tudo seguia dentro da normalidade e até café foi servido aos profissionais.
Roberto Mann, capataz de gravata
Os jornalistas aguardaram por cerca de uma hora até que dois policiais, um deles empunhando uma metralhadora, entraram na sala de reunião, alegando que estavam ali a pedido da mineradora. Disseram que receberam a denúncia de que os repórteres teriam invadido a empresa nos dias anteriores – acusação que não se confirmou. A Iron Brazil também havia solicitado a apreensão das imagens produzidas pela reportagem, de acordo com os policiais.
“Os repórteres foram, surpreendentemente, pressionados pela empresa e pela PM enquanto aguardavam para ouvir o posicionamento da Brazil Iron dentro de suas instalações”, explicou Leonardo Sakamoto, diretor da Repórter Brazil. Para ele, “é uma clara tentativa de intimidação ao trabalho jornalístico, de cerceamento da liberdade de imprensa, que não pode ser aceita”, sustenta.
Como o crime não se configurou, a empresa então tentou apreender as imagens captadas. Confiscar material jornalístico é uma ação ilegal e só pode ocorrer mediante autorização judicial, o que não aconteceu. Orientados pelos advogados da organização, os repórteres Daniel Camargos e Fernando Martinho se recusaram a entregá-las. Como não houve acordo entre empresa e jornalistas, todos foram conduzidos para a delegacia, no centro da cidade, liberados algumas horas depois. [Isso tem nome: condução coercitiva. A censura mais eficaz: a prisão do jornalista. A solução final: o assassinato do jornalista]
A Brazil Iron, fundo de investimentos que detém a Oakmont Mineração, atua no país desde 2011. A companhia possui, ao todo, 24 processos de mineração de ferro e manganês, concentrados na região do município de Piatã, na Bahia. A empresa, com sede no Reino Unido, anunciou para este ano a construção de um novo ramal ferroviário. Os 120km de linha férrea serão conectados ao entroncamento da Ferrovia Integração Oeste Leste (Fiol) com a Ferrovia Centro Atlântica (FCA), em Brumado (BA), informou a Brazil Iron.
Enquanto isso, cerca de 150 famílias moradoras das comunidades quilombolas do Mocó e Bocaina, na zona rural de Piatã, localizada na Chapada Diamantina (a 558 km de Salvador), denunciam estar respirando poeira de minério de ferro devido à ação da empresa. Muitos inclusive estão deixando de plantar devido à contaminação de rios e afluentes da região, que desembocam no Rio de Contas, uma das maiores bacias hidrográficas da Bahia.
“Nós estamos respirando poeira com resíduos de pó de mineração dia e noite. As comunidades consomem a água das nascentes que estão recebendo a lama das carretas e os resíduos de pó com ferro. Algumas pessoas estão deixando de plantar suas hortaliças com medo da contaminação. Muitas vezes as plantas amanhecem com gotas pretas do pó de ferro”, contou uma moradora, que não quis se identificar por temer represálias.
Comunidades quilombolas de Piatã sofrem com impactos da mineradora Brazil Iron
“Tem uma nascente [do Bocaína] que é bem abaixo da mineração. Ela traz água para as pessoas que ficam mais próximas do morro. Nos períodos de chuva, desce uma lama que entra na nascente e só sai barro. Não tem condições de tomar essa água. Temos idosos com problemas respiratórios que já tiveram que ir para o hospital por causa da poeira”, disse outra moradora.
Os moradores reclamam também que além da poluição do ambiente, a comunidade tem sofrido com a poluição sonora. Quando a Brazil Iron assumiu a mineração do local, em 2108, a empresa passou a trabalhar sem interrupção, o que gera um grande barulho por causa do maquinário.
“Como eles trabalham 24 horas por dia, a quantidade de poeira é enorme, a poluição sonora é enorme. E chegou em um momento que a gente não está mais suportando”, desabafou a moradora.
Os moradores também reclamam que os veículos pesados usados pela empresa ocasionalmente obstruem as vias de acesso à comunidade e têm provocado deterioração do sistema viário da região, como é o caso do trecho da BA-148 que liga Seabra a Piatã e Rio de Contas.
Manifestação quilombola contida pela polícia amiga dos colonos ingleses
Em setembro, durante audiência no Ministério Público da Bahia para discutir os problemas, a empresa anunciou a criação de uma ouvidoria no seu website para receber as reclamações dos moradores, mas até o momento não há informações sobre alguma providência para minimizar os danos causados à população.
Assim, em outubro, cerca de 30 moradores fizeram uma manifestação na região do Tijuco, às margens da BA-148. Cartazes e panfletos foram confeccionados e distribuídos para informar e sensibilizar os trabalhadores da Brazil Iron. Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a manifestação foi desproporcionalmente dissipada pela Polícia Militar, que fora informada para atuar fazer a segurança dos manifestantes.
Segundo informação da CPT-Bahia, a própria instalação da mineradora no munício suscita dúvidas quanto à legalidade, já que não houve consulta prévia, livre e informada às comunidades quilombolas, com registro na Fundação Palmares, como é indicado na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). O Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) e demais instâncias já foram acionadas, mas a situação tem se arrastado por meses. Parem a devastação ambiental