Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

O CORRESPONDENTE

11
Jan22

Natália Bonavides irá à Justiça contra Ratinho por recusa do direito de resposta

Talis Andrade

 

natalia.jpeg

Natal, 9 janeiro 2022

Apresentador, que ameaçou metralhar a deputada federal, sustentou os ataques e reforçou o discurso de ódio bolsonarista, machista, misógino, antifeminista e preconceituoso

 
 
 
- - -

A deputada federal Natália Bonavides (PT) teve direito de resposta negado pelo apresentador Ratinho, que defendeu, durante um programa na sua rádio, Massa FM, “eliminá-la” com uma metralhadora.

A recusa de Ratinho foi encaminhada à Procuradoria Parlamentar da Câmara no último dia 4. À Revista Fórum, a assessoria de comunicação da parlamentar disse que irá à Justiça contra a negativa feita pelo apresentador.

Segundo Natália, a recusa ao direito de resposta “evidencia as mentiras contadas no programa e mostra a necessidade urgente de enfrentar a intolerância e o preconceito”.

A recusa em divulgá-la é uma confirmação daquilo que foi dito. E não esqueçamos: foram crimes!”, afirma a deputada.

 

Machista valentão, Ratinho sustentou ataques feitos à deputada

 

No texto, por meio de sua advogada, o apresentador sustenta os ataques feitos à parlamentar e argumenta que os comentários foram feitos apenas para “manifestar sua contrariedade” ao Projeto de Lei da petista que propõe alterar os termos “marido e mulher” na celebração de casamentos civis. [Esta informação de Ratinho é mentirosa. É uma informação falsa. A deputada Natalia Bonavides jamais quis alterar os termos "marido e mulher" nos casamentos civis. Essa informação inverídica de Ratinho visa indispor a deputada com as pessoas de diferentes religiões, apelando inclusive para o fanatismo. 

Além disso, segundo sua defesa, Ratinho “fez uma crítica” com “linguajar popular”, sobretudo “porque julgava que existiam questões mais sérias, graves e urgentes para serem tratadas no país e que precediam o debate sobre a denominação utilizada ao final de uma cerimônia matrimonial”. 

[Ratinho criticou a atuação parlamentar da deputada. Que ele trata de besterol. "Que existem questões mais sérias, graves e urgente". Natalia Bonavides trata, sim, dos mais sérios problemas nacionais. Trabalha para garantir direitos à classe trabalhadora. Atuação que Ratinho como empresário e grileiro e escravocrata condena.

Natalia luta para assegurar condições dignas de trabalho, moradia, educação, acesso à saúde e qualidade de vida. "E em tempos tão difíceis como o que vivenciamos com a pandemia, não podíamos deixar de apresentar a maior quantidade possível de propostas para proteger a maioria da população, principalmente os mais vulneráveis. Os principais exemplos dessa produção são a prorrogação da Lei Aldir Blanc, de incentivo a cultura, a aprovação do Vale Gás, que garante desconto de 50% no preço do gás de cozinha para famílias de baixa renda e a aprovação do Despejo Zero, que impede pessoas de serem despejadas de suas casas em plena pandemia"

Pode ser uma imagem de 1 pessoa e texto que diz "NATÁLIA NO CONGRESSO EM FOCO 2021 Melhor Deputada do RN za Melhor Deputada do Nordeste Eleita uma das 20 melhores deputadas do Brasil *votação popular NATÁLIA DEPUTAD த N I BONAVIDES E"

Natalia é atuante no cenário nacional, mas não esquece o Estado que representa, o Rio Grande do Norte, e tudo faz em defesa do povo potiguar. Denunciou Natália: "A Prefeitura do Natal tomou mais uma vez os pertences, colchões e lençóis da população em situação de rua que se organiza nos arredores do Baldo. O prefeito Álvaro Dias, ao invés de tirar o pouco que essas famílias têm, tem que garantir moradia e proteção!"Pode ser uma imagem de 5 pessoas, pessoas em pé, pessoas sentadas, ao ar livre e texto que diz "MOVIMENTO AUA"Pode ser uma imagem de 2 pessoas, pessoas em pé e texto que diz "Natália Bonavides @natbonavides Acionamos a justiça para impedir que a Prefeitura de Natal continue tomando roupas, colchões, documentos e comida das pessoas em situação de rua que vivem no Baldo. Álvaro Dias, com seu espírito natalino, só demonstra ojeriza ao povo. Basta dessa política covarde! NATÁLIA BONAVIDES"

Outro exemplo: "Tivemos um encontro lindo com Manuela D'Ávila em novembro, no La Luna, em Natal. Debatemos violências políticas contra as mulheres e compartilhamos vivências. Saímos com a certeza ainda maior de que a luta das mulheres seguirá ousando mudar os rumos da história, que lugar de mulher é onde ela quiser, inclusive na política, e que machistas, fascistas e racistas não passarão!".Pode ser uma imagem de uma ou mais pessoas, pessoas em pé e ao ar livre

É isso aí: a luta das mulheres contra os machistas e os misóginos do tipo dos Ratinhos preconceituosos, antifeministas, ameaçadores e assediadores.  Natalia  sempre defendendo os mais pobres, os mais desamparados. 

No dia 9 último, esteve no 5° Encontro de Juremeiros de Natal. A atividade reuniu lideranças das religiões de matrizes africanas de todo o Rio Grande do Norte. A Jurema é uma das religiões tradicionais dos povos afro-ameríndios brasileiros e tem origem em uma guerreira indígena.Image

A supremacia branca do Paraná, que os Ratinhos representa, defende "metralhar" Natalia Bonavides. No Encontro com os juremeiros, Natália declarou:

7 de janeiro marca o dia da liberdade de cultos no Brasil. A data foi instituída em 1890 e é assegurada pela Constituição Federal de 1988. Apesar disso, os dados de intolerância religiosa só crescem no país. 
 
A maior parte das agressões são contra religiões de matrizes africanas, como o Candomblé e a Umbanda. Isso revela o caráter racista que tem como pano de fundo o processo histórico de exclusão e criminalização das religiões de matriz africana no Brasil. 
 
A religião foi a primeira forma de organização social do povo negro no período escravocrata brasileiro e sua preservação é mais uma forma de resistência.
 
Sigamos em defesa a concretização do respeito a diversidade religiosa.Pode ser uma imagem de 2 pessoas, pessoas em pé e texto que diz "NATÁLIA BONAVIDES É A DEPUTADA FEDERAL DE MAIOR PRODUÇÃO LEGISLATIVA DO RN! NATÁLIA BONAVIDES 199 PROPOSTAS DEPUTADO2 169 PROPOSTAS DEPUTADO3 54 PROPOSTAS NATÁLIA DEPUTADA BONAVIDES I PT"
São inúmeras as ações legislativas de Natalia Bonavides. 
 
Policlínica Regional de Canguaretama vai beneficiar 27 municípios de toda a região!
Com R$ 2,5 milhões em recursos destinados por Natalia, a população terá um importante equipamento de saúde, que contribuirá com a melhoria dos serviços como consultas em mais de 20 especialidades.
 
O edital de obras já foi lançado e logo a população vai contar com a estrutura da policlínica.
 
A unidade contará com equipe multiprofissional, sendo ofertado o serviço de apoio técnico especializado através da enfermagem, serviço social, psicologia, fisioterapia, nutrição, fonoaudiologia, farmácia clínica e terapia ocupacional.
 
Bem que faz falta uma Natalia Bonavides no governo do Paraná. O único feito nacionalmente visível foi transformar ginásios e colégios em escolas cívico-militar, para agrado palaciano, adulador, cortesão a Bolsonaro que patrocina, regiamente, os programas de Ratinho. Contra tal absurdo lembro a crítica de uma liderança estudandil:Image
 
 

Que diabo para Ratinho é "linguajar popular"? É espalhar informações falsas, usar termos chulos? Abusar dos fake news? Quem é mais mentiroso Ratinho ou Bolsonaro?]

“Essa crítica [o termo certo é o assédio terrorista de metralhar] foi realizada na condição de um cidadão comum, sem qualquer pretensão de destratar as mulheres, realizar ameaças ou prejudicar a autora do projeto de lei, até mesmo porque o Interpelado sequer a conhecia”, diz a advogada de Ratinho.

[Na frase "sequer a conhecia" o desrespeito, a desconsideração à luta de parlamentar que tem o reconhecimento da imprensa livre, dos jornalistas que não recebem grana do Gabinete do Ódio.

Depois da fala para os fanáticos de metralhar é exibida uma foto de Natália Bonavides, e Ratinho emendou: “Feia do capeta também”.Pode ser uma imagem de 1 pessoa e texto que diz "VITÓRIA! Congresso aprova projeto de Natália Bonavides para suspender despejos na pandemia. NATÁLIA BONAVIDES"

"Feia do capeta"? ]

Além da Procuradoria da Câmara, a Casa acionou a Polícia Legislativa. Depois das ofensas e incitações de Ratinho contra a deputada, a polícia começou a apurar os ataques que a petista tem recebido nas redes sociais.

 

Relembre o caso

 

Durante o programa “Turma do Ratinho”, ao vivo, um locutor leu uma notícia sobre um Projeto de Lei da petista que propõe alterar os termos “marido e mulher” na celebração de casamentos civis. A ideia é trocar a frase “vos declaro marido e mulher” por “firmado o casamento”, já que há uniões civis de pessoas homossexuais e transexuais que não se enquadram nas definições de “marido e mulher”.

Ratinho, então, reagiu atacando a deputada. “Natália, você não tem o que fazer? Vá lavar roupa, vai fazer algo, a lavar as caixas do seu marido, a cueca dele. Isso é uma imbecilidade. A gente tem que eliminar esses loucos. Não dá pra pegar uma metralhadora?”, disparou o apresentador. Logo depois, na transmissão ao vivo do programa nas redes sociais, foi exibida uma foto de Natália Bonavides e Ratinho emendou: “Feia do capeta também”.

À Fórum, a parlamentar afirmou que o comunicador bolsonarista colocou sua vida e sua integridade física em risco e que, por isso, tomará medidas cabíveis na Justiça. “O apresentador Ratinho utilizou uma concessão pública para me atacar e cometeu crimes ao fazer isso. Vamos acioná-lo judicialmente, inclusive criminalmente”, disse Natália.

Notícias relacionadas

 

27
Nov20

Desinformação e violência na política: as armas contra Manuela D'Ávila

Talis Andrade

manuela e filha.jpg

Revolução Laura: Reflexões sobre maternidade e resistência | Amazon.com.br

 

Helena Martins

Manuela D'Ávila (PCdoB), que despontou nestas eleições como favorita na disputa pela prefeitura de Porto Alegre, enfrenta mais um momento desafiante em sua trajetória política. De acordo com pesquisa Ibope divulgada nesta terça-feira, 24, Sebastião Melo (MDB) tem 49% e Manuela, 42%. Quando considerados os votos válidos, são 54% e 46%, respectivamente. A margem de erro, os sempre imponderáveis últimos dias de campanha e o resultado concreto das urnas podem levar a mudanças, claro. Mas contra Manuela, que terminou o primeiro turno apenas 2% atrás do adversário, pesam as campanhas de desinformação com teor explicitamente misógino.

Nas redes, crescem ataques pessoais combinados a conteúdos que buscam gerar medo na sociedade, a partir da mobilização de temas como o comunismo. O machismo fica nítido ao se observar o que circula em plataformas como o WhatsApp contra Manuela, imagens que opto por não expor aqui para reduzir a circulação da desinformação, ainda que sejam facilmente encontradas na internet. Muitas expõem e manipulam fotos da candidata, com ênfase em seu corpo e rosto. A aparência é o foco dos ataques. Tenta-se imputar a ideia de irresponsável. Em uma montagem são acrescidas tatuagens com rostos de líderes como Che Guevara e Lênin e uma frase que questiona o que seria a prefeitura liderada por ela. É feito também contraponto com o que seria a mulher ideal. Manuela tem tido sua imagem frequentemente comparada à de Michele Bolsonaro. Esta, sim, é apresentada como "recatada e do lar".

Uma postagem afirma que Manuela trocou 'o crucifixo no ânus por um escapulário católico' e agora, apenas por ser campanha eleitoral, vale-se de 'roupas recatadas'. Há ainda uso de uma fotografia de Manuela aos 15 anos, acompanhada do seu pai, insinuando que se tratava de seu namorado. Em outra, aparece a adolescente sozinha. A exposição vem acompanhada de uma legenda dizendo que Manuela odeia a foto, e convidando os outros a divulgá-la com o intuito de atacar a sua aparência "Só de marra vamos compartilhá-los ao máximo", diz o texto.

No Twitter, circula áudio atribuído à coordenação da campanha de Sebastião Melo (MDB), que lidera as pesquisas de intenção de voto no segundo turno da disputa à prefeitura de Porto Alegre, em que Manuela é chamada de "vadia". Divulgado pelo ativista Luiz Muller e por veículos como a Fórum, no áudio diz-se que: "Se entrar essa vadia ai vai ser um problema muito sério para a cidade". A autoria não foi confirmada.

Ataques envolvendo corrupção, suposta ditadura venezuelana e atrocidades atribuídas a regimes comunistas são lançados contra a candidata. Exemplo disso, circula boato de que ela teria sido presa por conta da delação da Odebrecht, processo já arquivado pelo Ministério Público. Com mais de 130 mil visualizações em apenas sete horas de disponibilização na segunda, 23, vídeo do canal Giro de Notícias intitulado "A PRISÃO DE MANUELA D'AVILA, O MAIOR ATAQUE DA MÍDIA NO BRASIL, POLÍCIA FAZ LIMPEZA". O conteúdo também está sendo compartilhado no WastApp, de acordo com o Radar da agência de verificação Aos Fatos.

Uma hashtag #ManuzuelaNão sintetiza essa vertente de ataques. Após o assassinato de João Alberto Freitas, morto por asfixia por seguranças do Carrefour, e os protestos em repúdio à execução na última sexta-feira, 20, Manuela também passou a ser responsabilizada. É o caso do conteúdo apresentado como notícia no portal Terra Brasil Notícias, que tem como lema "Deus acima de tudo e de todos". Link que destaca o título "Irresponsável: Comunista Manuela D'Ávila usou redes sociais para convocar protestos que terminaram em violência" tem sido compartilhado, assim como post adulterado de Manuela sobre o caso, no qual ela convocaria os protestos.1 - Captura do portal Terra Brasil Notícias - Captura do portal Terra Brasil Notícias

Captura de tela da divulgação de uma notícia do portal Terra Brasil Notícias sobre Manuela Imagem: Captura do portal Terra Brasil Notícias

 

Merece destaque o uso de adjetivo não só pejorativo, como contrário ao que o patriarcalismo diz ser esperado de uma mulher (responsabilidade, cuidado). Não é o mesmo tipo de ataque que vemos, por exemplo, no caso de Guilherme Boulos (PSOL), na disputa para a prefeitura de São Paulo.

A violência de gênero é explícita - ataques a candidatos homens são diferentes

O mesmo site Terra Brasil Notícias publicou: "Boulos" vira motivo de piadas nas redes após dizer que problema da previdência é número baixo de funcionários públicos". No Twitter, ganhou repercussão tweet em que Boulos teria escrito defender abrigar moradores de rua na casa de quem tem quartos vagos, o qual foi postado por uma conta falsa. Ainda no primeiro turno, como abordado aqui, acusação falsa de que teria contratado empresas fantasmas ganhou lastro. São, pois, temas relacionados ao conteúdo político, não aos atributos pessoais, muito menos ao corpo do candidato.

Embora se tratem ambos de políticos que abraçam visões de mundo de esquerda, há uma abordagem diferente, que leva a crítica para a dimensão pessoal no caso das campanhas arquitetadas contra Manuela. É o que vemos no texto também identificado pela Aos Fatos em grupos do WhatsApp: "A comunista patricinha, no primeiro turno vinha 'pagar de boa moça', acusava os adversários de fazer campanha suja contra ela, a mesma inclusive em seus lixos de propagandas na teve, disse que ela era contra isso, pois tinha projeto. Como todo mundo sabe, ELA TRAÍ, e agora ELA vem fazer no horário eleitoral a mesma coisa que ela julgava errado antes. Assim é o PT, PSOL, PCdoB e PDT, usam mulheres, usam vidas negras, usam todo mundo para chegar no poder. E você vai cai nisso, ou vai dar um "tapa de luva" nestes lixos e votando 15 em Melo".

O compartilhamento do link e a referência à "traição" mostram ainda a retroalimentação que se dá entre as mídias e também expressa como as violências contra as mulheres na política são recorrentes e perpetuadas, inclusive pela ausência de responsabilização. Como costuma ocorrer nas campanhas de desinformação, as agressões na rede são alimentadas por amplificadores, como o candidato Rodrigo Maroni (Pros), que no último debate do primeiro turno disse que Manuela "mentia e dissimulava". "Tu é patricinha mimada, poderia estar comprando bolsa no shopping. Se eu fosse abrir a boca, eu não acabaria com a carreira, mas com tua vida, Manuela", afirmou. No primeiro debate entre candidatos, Maroni, ex-noivo da pcdobista, também havia desferido ataques machistas contra ela, acusando-a de traição, o que foi amplamente repercutido na mídia.Por Que Lutamos - Um livro sobre amor e liberdade Em Portugues do Brasil:  Amazon.es: Manuela DAvila: Libros

O impacto eleitoral das campanhas de desinformação

Dadas a opacidade das plataformas digitais e a diversidade de canais de comunicação, é difícil precisar o volume dos ataques e seus impactos. Entretanto, a resposta judicial, sempre menor do que o que realmente ocorre, pois as investigações dependem dos conteúdos serem encontrados e denunciados, permite-nos traçar contornos do quadro. Ainda no primeiro turno, quando Manuela aparecia na liderança das pesquisas de intenção de votos, a Justiça Eleitoral determinou que Facebook, Instagram, Twitter e YouTube retirassem do ar meio milhão de compartilhamentos de conteúdo falso contra ela. O somatório refere-se a apenas dez postagens denunciadas. Não é inexpressivo.

Some-se a isso ainda o fato de campanhas de desinformação contra Manuela serem antigas e permanentes. Após dividir chapa com Fernando Haddad (PT) à presidência da República nas eleições de 2018, marcadas pelo fenômeno da desinformação e intolerância nas redes sociais, Manuela chegou a criar o instituto E Se Fosse Você?, uma organização não-governamental, e lançou o livro "E Se Fosse Você? Sobrevivendo às redes de ódio e fake news".

manoela livro.jpg

 

Estas campanhas desinformativas podem ajudar a explicar a alta rejeição de Manuela - 38%, de acordo com a pesquisa Ibope de 14 de novembro, um dia antes do primeiro turno. Em uma curta campanha eleitoral, mitigar efeitos ou mesmo mudar entendimentos acerca da candidata não é tarefa fácil, ainda mais quando a artilharia inimiga não dá trégua. Essa perseguição já era apontada como empecilho para a corrida eleitoral de 2020. Em artigo publicado neste Observatório em 31 de outubro, Céli Pinto sentenciava que o segundo turno em Porto Alegre contaria com a participação de Manuela e que não seria fácil. Entre os motivos, o fato de a candidata ser vítima desse tipo de violência política.

mulher violencia.jpg

 

Não é difícil concluir, e este Dia Internacional de Luta Contra a Violência à Mulher (25/11) vem para nos alertar mais sobre isso: campanhas de desinformação permeadas por misoginia são as principais armas utilizadas contra Manuela D'Ávila. Elas representam um grande entrave para que a parlamentar, que já acumula mandatos e experiência política, consiga alcançar a prefeitura de Porto Alegre. Uma situação que evidencia a violência que atravessa as vidas das mulheres que ocupam a política. Muitas têm seus corpos enfatizados, seus atos ignorados, suas opiniões diminuídas, seus espaços cortados. Com menos de uma semana para o pleito, parece difícil que haja tempo e condições para reverter a situação, até porque ela tem raízes na cultura e nas instituições.Bahia Notícias / Cultura / Notícia / Manuela d'Ávila lança novo livro em  Salvador na próxima segunda-feira - 05/11/2019

Livros

Manuela D'Ávila tem três livros publicados. O primeiro, Revolução Laura, foi lançado em março de 2019, e consiste num relato de suas experiências pessoais e políticas, vividas desde o nascimento de sua filha. Após o lançamento, percorreu o Brasil proferindo palestras.

O segundo livro, Por que lutamos?, foi lançado pela editora Planeta em outubro de 2019. Voltado para meninas e jovens. A publicação aborda didaticamente o feminismo.

Em agosto de 2020, Manuela lançou seu terceiro livro, E se fosse você?, sobre redes de ódio e notícias falsas, contando com o prefácio de Felipe NetoNa publicação, ela aborda casos de figuras públicas alvo das redes de produção de notícias falsas e conta como lida com esse tipo de conteúdo difamatório elaborado a seu respeito.

10
Nov20

TRE determina que Facebook retire do ar meio milhão de compartilhamentos de notícias falsas sobre Manuela (vídeos)

Talis Andrade

ImageImage

Fábrica de notícias falsas comandada pelo Gabinete do Ódio e falanges e sicários nazistas e fascistas que propagam injúrias e difamações. A verdade salva e liberta e evita a eleição de políticos da direita volver

fake news onda de mentiras.jpg

 

O juiz Leandro Figueira Martins, da 161ª Zona Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul (TRE-RS), determinou nesta segunda-feira (9) a retirada do ar de 529.075 compartilhamentos de notícias falsas publicadas no Facebook a respeito da candidata à Prefeitura de Porto Alegre Manuela D’Ávila.

Segundo a campanha de Manuela, a decisão se refere, principalmente, a 50 links de postagens diferentes que foram feitas desde 2018. A decisão também vale para publicações feitas no Instagram, Twitter e Youtube, o que eleva o total de links compartilhados para 89.

Martins determinou que as plataformas devem retirar as postagens do ar em 24 horas.

Coordenadora de redes sociais da campanha de Manuela, Marina Lopes saudou a decisão. “Lutamos por eleições limpas, livres de mentiras e das redes de ódio”, disse.

Marina Lopes destaca ainda que, com a proximidade das eleições de 15 de novembro, o volume de notícias falsas contra Manuela aumentou consideravelmente nos últimos dias. Por trás dessa indústria de boatos, de informações falsas, de mentiras, de injúrias, de calúnias, de meias-verdades, correm rios de dinheiro, cuja origem precisa ser investigada e denunciada.

 
Manuela
@ManuelaDavila

1 ano tem 525.600 minutos, só essa semana nós derrubamos 529.075 compartilhamentos de Fake News produzidas para me atacar: é 1 fake por min. Vocês têm ideia da dimensão disso? Não vamos deixar o ódio vencer em Porto Alegre! Se vir alguma postagem falsa denuncie

Vocês arrasam: olhem que massa o presente que ganhei do freitas.paz. Os Simpsons já previram que vai dar Manu PrefeitaImage
 
#AgoraÉManuela65

#AgoraÉManuela

 

07
Nov20

De quantos estupros se compõe um estupro?

Talis Andrade

assédio suicídio Kavehadel.jpg

 

Um estupro foi registrado no país a cada oito minutos em 2019

 
por Wilson Gomes /Cult
- - -

O mundo está assim agora: a gente vai dormir na terceira década do século 21, mas no outro dia acorda lidando com problemas do início do século 20, quando não com questões e mentalidades que faziam parcamente sentido em algum ponto bem remoto do passado. Acho que era a isso que o filósofo Ernst Bloch chamava de acontemporaneidade, com o alfa privativo mesmo. Não é que as coisas sejam extemporâneas, fora do seu devido tempo, é que comportamentos e mentalidades típicas de temporalidades diferentes convivem e colidem, hoje, apesar de tudo. 

O fato é que há certas formas arcaicas de pensar e de existir que teimam em não ir embora e ficam nos assombrando, mesmo quando incompatíveis com o estágio esperado de progresso histórico e de evolução da humanidade. Mais que incompatíveis, são desmoralizantes, uma vez que jogam na nossa cara que a natureza humana reluta em abrir mão de comportamentos que hoje nos desumanizam, nos rebaixam. Olhando-nos no espelho e vendo tantas sobras de fases atrasadas, brutas e imorais da humanidade, quem acredita que o ser humano é fundamentalmente bom e pode melhorar tem um momento de ceticismo e vergonha. Muita vergonha.

Como não se sentir repugnado com o fato de que ainda em 2020 pelo menos metade da humanidade, as mulheres, tenham medo da outra metade, os homens, e tenham boas razões para temê-la? Falei “pelo menos metade” pois também as crianças, de ambos os sexos, poderiam basear em dados empíricos o medo do predador masculino, apesar de séculos de humanismo cristão, de Iluminismo e de democracia liberal. 

Dados, por certo, não faltam. A 14ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostra que no Brasil se estupra com uma frequência assombrosa. Um estupro foi registrado no país a cada oito minutos em 2019. “Registrado”, quer dizer, consignado em boletins de ocorrência por quem conseguiu coragem e teve recursos para tanto. Ninguém sabe quantos estupros, de fato, ocorrem, mas o número deve ser muito maior. Não é inquietante que no tempo que você leva para ler esta coluna pelo menos uma mulher ou menina esteja sendo estuprada no Brasil? Tem mais. 58% das vítimas de estupros registrados no ano passado eram crianças de até 13 anos. A maioria nem estava na rua ou exposta a estranhos, pois em 84% dos casos a própria casa é o suplício das mulheres e o estuprador é um conhecido da vítima, um familiar ou uma pessoa da sua confiança.  

É assustador e revoltante para todos os que creem em uma sociedade baseada em igualdade, liberdade e respeito à dignidade humana, os que estão convencidos de que cada um tem o direito de buscar a felicidade e de viver a sua vida como melhor lhe pareça. Mas gostamos de achar, para o conforto da nossa consciência, que somos um mar de civilização e respeito, com algumas ilhas eventuais de brutalidade e selvageria moral. Será mesmo?

Não faz muitas semanas e estávamos discutindo o caso de Robinho, o jogador de futebol, condenado na Itália por ter abusado sexualmente, em grupo, de uma garota bêbada em uma boate italiana. Não foram pouco os que saíram em defesa do jogador, alegando que, afinal, uma moça que se coloca em certas situações não teria o direito de alegar estupro quando recuperasse a consciência e percebesse que serviu aos caprichos sexuais dos machos que a cercavam. Candidamente, o jogador alegou absoluta inocência, pois, afinal, “tão somente” enfiou o pênis na boca de uma menina inconsciente; sexo, explicou, é apenas quando há penetração vaginal. Multidões correram em socorro do argumento do jogador, coitadinho, tão garoto, tão inconsciente, tão vítima da messalina italiana. 

Esta semana, uma nova história bizarra nos mesmos moldes veio à tona com a divulgação de uma sessão online de julgamento de um caso de estupro em Santa Catarina. Diferentemente da Itália, o acusado não foi condenado. O que se destaca no caso são as cenas de constrangimentos e humilhações da vítima a que todos puderam assistir em mídias digitais. Uma moça que havia sido abusada sexualmente em uma boate de ricos, depois de drogada e inconsciente, foi atacada ferozmente e humilhada pelo advogado do réu, sem que tenha sido devidamente defendida pelo juiz do caso. Independentemente do que eu pense da sentença, foi infame o que foi feito naquela sessão do tribunal à moça que foi buscar justiça. Assim como foi definitivamente infame o modo como todos se comportaram com ela naquele julgamento.

O que aconteceu naquele tribunal foi gravíssimo no presente e para o futuro. Chama-se vitimização secundária ou revitimização, e consiste em submeter a pessoa estuprada a ondas sucessivas de humilhação e dor. A segunda vitimização costuma se dar na família ou na própria delegacia – e as delegacias de mulheres foram criadas como forma de reconhecer e mitigar o fato. A terceira vitimização pode acontecer na opinião pública, seja na esfera pública tradicional, produzida pela cobertura dos jornais que muitas vezes transforma a vítima em culpada, quanto nas formas não tradicionais das mídias digitais, onde os feios, sujos e malvados concorrem para ver quem tira mais pedaços de quem teve a ousadia de denunciar o violador e ir buscar o amparo da Lei. 

Às vezes temos ainda uma outra onda de revitimização, ainda mais repugnante quando se dá, como neste caso, no espaço institucional onde a vítima deveria ter do seu lado a força do Estado e não ser violada e humilhada sob o olhar complacente de quem deveria fazer-lhe justiça.

 

Já é suficientemente grave
para o Estado de Direito a
vitimização secundária nas
delegacias de polícia e na
esfera pública, mas a
revitimização em um
tribunal é um escândalo.

 

 

O curioso deste caso é que enquanto uma parte da sociedade ficou chocada com os eventos e pediu que os envolvidos fossem responsabilizados, outra parte refazia o processo na esfera pública para condenar a moça estuprada. Como tudo no Brasil, de vacina a jogos de futebol, até os estupros foram politizados e se tornaram objeto de polarização, mesmo que nada tenha a ver com política partidária. Agora, se você é de esquerda, de centro, e até da direita civilizada, fica do lado de quem sofreu o estupro e acha que haverá justiça se houver condenação e punição social; se você é bolsonarista, transforma o estuprador em vítima e o estuprado em réu, como nos dois exemplos acima. 

Foi assim que Rodrigo Constantino, por exemplo, o comentarista que se tornou a voz mais engajada do bolsonarismo em mídias digitais, 600 mil seguidores no Twitter, 300 mil no Facebook, legiões de fãs na Jovem Pan, na Record e em mais uns três veículos da imprensa, fez da causa o seu palanque. Em lives e tuítes, condenou as “feministas amargas lutam [que] pelo ‘direito’ de tomar todas num quarto com homens, consentir em fazer sexo bêbada, e depois bancar a vítima de estupro, sem aceitar ainda a opinião dos outros de que tem comportamento indecente”, disse. 

Para este lado moral e político do Brasil, do qual Constantino é a face mais visível e abusada, há mulheres respeitáveis e há as outras, que não têm o direito de alegar terem sido estupradas mesmo não tendo concordado com o sexo a que foram submetidas, posto que se colocaram em situações que “a decência” não autorizaria. Não é que os bolsonaristas defendam o estupro. Antes, creem demonstrar isso cabalmente uma vez que defendem a castração química dos violadores e o porte de armas para mulheres como forma de impedir o estupro. Os que defendem que o estupro é um tipo penal que não se aplica a todas as relações sexuais não consentidas com qualquer mulher, mas apenas com as mulheres que obedecem ao código de decência do bolsonarismo. 

Depois finge-se não se entender por que tantas vítimas de estupro sofrem caladas, às vezes por ano, mas não denunciam o crime. Denunciar para serem julgadas e revitimizadas? Ou por que tantas vítimas não resistem à violência do estupro somada à projeção das outras violações que sofrerão por consequência, e se suicidam. No Brasil do século 21, infelizmente, por causa de dessa mentalidade, um estupro é sempre composto de muitos estupros. 

- - -

Thalia foto blusa laranja.jpg

O delegado, o promotor, o juiz esqueceram o suicídio de Thalia Mendes Meireles, 16 anos. O caso se deu no Maranhão. Não culparam o boto cor-de-rosa. E sim a 'baleia azul', que estava na onda.

A menina foi estuprada quando tinha onze anos.

Depois de muitos estupros, preferiu a morte. Deixou um lindo poema em prosa como carta de despedida:

thalia carta 1.jpg

Thalia carta-2.jpg

Thalia carta -3.jpg

Thalia carta -4.jpg

Thalia carta final -5.jpg

thalia mendes nova foto.jpg

 

05
Nov20

Veja a íntegra da audiência de Mariana Ferrer em julgamento sobre estupro

Talis Andrade

Quatro homens, doutores da lei, contra uma garota de 23 anos

 

ConJur - O jornal O Estado de S. Paulo divulgou nesta quarta-feira (4/11) a íntegra da audiência do processo em que a influencer Mariana Ferreira Borges, conhecida como Mariana Ferrer, acusa o empresário André Aranha de estupro.

O caso ganhou repercussão depois que o The Intercept noticiou o processo, afirmando que o juiz havia aceitado a tese de "estupro culposo" contra André, expressão que não foi usada por nenhuma das partes.

ribs estupro culposo.jpg

 

Na sentença, o juiz determinou que, como não foi possível determinar a vulnerabilidade da vítima (já que os exames toxicológicos mostraram que ela não estava alcoolizada nem drogada), e como não existe "estupro culposo", valeria o princípio in dubio pro reo. Aranha foi absolvido.

Em trechos da audiência divulgados pelo site, o advogado de Aranha, Cláudio Gastão da Rosa Filho, apresentou fotos produzidas por Mariana e publicadas em seu perfil no Instagram que ele classificou como "ginecológicas", dizendo, entre outras coisas, que "jamais teria uma filha" do "nível de Mariana". Ele também afirmou que Ferrer estava fazendo um "showzinho" e que o seu "ganha pão era a desgraça dos outros".

A enorme repercussão fez com que a OAB de Santa Catarina informasse que já encaminhado um ofício ao advogado pedindo informações preliminares para prosseguir na apuração do caso.

O Conselho Nacional de Justiça também se mobilizou: o conselheiro Henrique Ávila pediu apuração sobre a conduta do juiz Rudson Marcos, por não ter impedido o advogado de humilhar a influencer.

O mesmo foi dito sobre o promotor do caso, Thiago Carriço de Oliveira, e o Conselho Nacional do Ministério Público esclareceu que já estava com um procedimento aberto de investigação desde outubro.

estupro mariana_ale.jpg

 

Veja aqui a íntegra do vídeo:

 

05
Nov20

A falácia do estupro culposo

Talis Andrade

O advogado e o estuprador

por Regina Abrahão

- - -

A forma mais fácil de definir estupro é a ocorrência de situação sexual sem o consentimento de quem o sofre. A falta de consentimento pode se dar pela negativa ou pela falta de discernimento da vítima em concordar que esta situação sexual aconteça. Homens, mulheres e crianças podem ser vítimas, apesar de mulheres serem as mais atingidas. Uma pessoa pode não ter discernimento para concordar com o sexo por vários motivos: não ter idade legal para consentir, não possuir condições cognitivas para discernir (como deficiências sérias) ou estar sob efeito de substâncias que lhe alterem a capacidade mental.

Neste último caso se enquadrou uma jovem modelo e influencer em mais um caso deste crime repugnante. A jovem, que trabalhava na recepção dos convidados em festa vip foi drogada, conduzida a um espaço reservado e estuprada. O crime, porém, não terminou após o estupro. O caso teve inúmeras irregularidades em sua condução: troca de agentes policiais, de promotor, vídeos apagados, depoimentos mudados.  Por fim, a mesma justiça que deveria acolher a vítima e punir o agressor terminou por criar uma figura até agora inexistente na norma jurídica, perigosíssima e criminosa: O estupro onde o criminoso não tem intenção de estuprar.

A figura do crime culposo é aquela onde não houve a intenção do resultado obtido. Uma pessoa caminha apressada pela rua, derruba outra e a queda causa ferimentos, um objeto derrubado sem querer de andar alto que atinge um transeunte, um acidente causado por falha nos freios que causa uma morte. São casos dolosos, ou seja, onde não havia a intenção de causar dolo. O crime de estupro não pode, portanto, ser considerado culposo (quando não há intenção de ser praticado) já que para ocorrer precisa da explícita disposição do autor. Estupros não ocorrem por desejo, necessidade, amor ou sentimentos. Ocorrem pelo desrespeito e desprezo pela vítima, pela sensação de poder sujeitar alguém pela força. Estupradores são sempre criminosos sem caráter nem humanidade, independente de classe social, idade, gênero, cultura. Um estupro é e será sempre um crime bestial.

A moça em questão foi e seguiu sendo violentada, Primeiro pelo autor. Depois, pela justiça, que determinou a proibição e cancelamento de suas páginas em redes sociais. E continuou sendo violentada num processo em que foi agredida, humilhada, exposta e por fim, injustiçada. O mesmo advogado que já defendeu Sara Winter e Olavo de Carvalho fez do agressor vítima e da vítima culpada pela agressão. O juiz se absteve de conduzir um julgamento justo e o promotor validou o discurso da defesa. O criminoso é rico e influente, e a justiça foi sensível ao seu status. Um caso escandaloso e descabido, que reverbera no mundo todo, como se tornou comum tamanhos são os descalabros no Brasil de hoje.

Mariana é a vítima, mas não só ela. O risco é imenso. Todas nós, mulheres, fomos agredidas e vitimadas. O perigo de este argumento criar jurisprudência e ser usado em outros julgamentos é real, já que poderá ser utilizado por  advogados inescrupulosos em julgamento de outras agressões semelhantes. Reverter este julgamento, pressionar o judiciário, trabalhar a opinião pública é urgente e indispensável. Ainda mais em tempos de obscurantismo como o que estamos vivendo (e sofrendo), abrir essa brecha é garantir a impunidade para este crime hediondo e desumano.

Toda a nossa solidariedade a Mariana, todo nosso repúdio à quadrilha composta pelo estuprador, promotor, juiz e demais que deturparam a lei norteados pelo machismo, misoginia e pelo poder do capital.Image

Imageancelmo.jpg

Criado em junho, o abaixo-assinado "Justiça por Mariana Ferrer" quebrou agora há pouco o recorde de adesões de uma petição brasileira no site Change.org, em 2020. Leia a notícia completa no blog do Ancelmo Gois, no O Globo. 

culposo estupro impunidade.jpg

culposo estupro.jpg

 

04
Nov20

Caso Mariana Ferrer: desmerecer a vítima é comum em casos de estupro, relatam advogados

Talis Andrade

vítima advogado do estuprador.jpg

Advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho xingou a promoter Mariana Ferrer durante audiência

 

Leandro Machado e Letícia Mori /BBC News

- - -

O processo criminal envolvendo o empresário André Camargo de Aranha e a promoter Mariana Ferrer, no qual ele foi acusado de estuprá-la, causou indignação nas redes sociais nessa terça-feira (03/11).

Segundo Ferrer, o estupro ocorreu em dezembro de 2018 durante uma festa em um clube de luxo em Florianópolis. Ela diz que havia bebido e que, posteriormente, foi dopada e estuprada por Aranha. Ele nega o crime. O empresário foi inocentado pela Justiça, a pedido do Ministério Público, órgão responsável pela acusação.

Um dos pontos que causaram indignação nas redes sociais foi a forma como Cláudio Gastão da Rosa Filho, advogado do empresário, tratou Mariana Ferrer durante uma audiência por videoconferência. O vídeo da reunião foi divulgado pelo site The Intercept Brasil.

estupro culposo .png

 

Em determinado momento, o advogado mostra fotos de Mariana Ferrer, publicadas nas redes sociais antes do caso e que nada têm a ver com o processo. "Peço a Deus que meu filho não encontre uma mulher como você. Teu showzinho você vai lá dar no teu Instagram, para ganhar mais seguidores. Você vive disso."

"Tu trabalhava no café, perdeu emprego, está com aluguel atrasado sete meses, era uma desconhecida. É seu ganha-pão a desgraça dos outros". Em outro ponto, Rosa Filho mostra outra imagem de Mariana Ferrer. "Essa foto extraída de um site de um fotógrafo, onde a única foto chupando o dedinho é essa aqui, e com posições ginecológicas."

Em seguida, a promoter começa a chorar e pede respeito. "O que é isso? Nem acusado de assassinato é tratado como estou sendo tratada, pelo amor de Deus. Nunca cometi crime contra ninguém", diz.

Para Juliana Sa de Miranda, sócia da área penal do Machado Meyer Advogados, o ataque à vitima tem sido corriqueiro em casos de violência sexual no Brasil. "É comum a tentativa de desconstrução da imagem da vítima nos crimes de estupro e assédio sexual. Fala-se da roupa, do comportamento da vítima, na tentativa de convencer o juiz de que ela consentiu com o ato. A vítima muitas vezes acaba tendo que se defender pois passa a se sentir acusada e não mais uma vítima", diz Juliana.

Mariana Zopelar, advogada criminalista da banca Fenelon Costódio Advocacia, afirma que, em muitos casos, há uma tentativa de julgamento da vítima a partir de características que nada tem a ver com o processo. "Repudio esse tipo de excesso antiético. Muitas vezes, a tentativa é pegar um elemento exterior sobre quem é a vítima, o que ela fazia, para tentar mostrar que houve consentimento", diz.

"Infelizmente é comum se desmerecer a vítima como tese de defesa em crimes sexuais", afirma uma juíza de direito criminal do Estado de SP, que atua há quase 30 anos na área e foi ouvida pela BBC News Brasil. "É comum se tentar inverter o ônus da prova, mas ao nível que chegou esse caso eu nunca presenciei", diz a juíza.

"É uma estratégia que existe infelizmente quando a vítima é vulnerável", afirma o advogado criminalista, Yuri Carneiro Coelho, professor de direito penal e processo penal da Faculdade Nobre e UNEF. "Nesse caso foi filmado, mas isso às vezes ocorre sem ser filmado e acaba não tendo essa repercussão."

No entanto, a professora de direito Maíra Zapater diz que não é correto afirmar que seja comum o uso dessa estratégia sem uma pesquisa sobre isso. "Eu não generalizaria sem uma pesquisa em mãos demonstrando esse dado. O advogados de defesa que são super sérios não merecem ser colocados nesse balaio", afirma a criminalista.

A reportagem tentou três vezes falar com o advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho, mas não obteve retorno.

estuprador riquinho.jpg

André Camargo de Aranha foi acusado de estupro em boate de luxo em Florianópolis

 

'Advogado não poderia ter agido daquele jeito'

O que o advogado Rosa Filho fez na audiência — falando do passado da vítima e a xingando — não deveria ter acontecido, dizem juristas.

"É algo que não deveria ter sido permitido porque as coisas que ele estava falando não tinham absolutamente nada a ver com o processo", afirma Maíra Zapater, professora de direito penal e processo penal da Unifesp.

Para a juíza criminal ouvida pela BBC News Brasil, a atitude de Rosa Filho extrapolou os limites do permitido em uma audiência.

"Infelizmente, existe essa tese que as defesas levantam que a culpa é da vítima. Mas nesse caso foram extrapolado todos os limites. (Se você humilha a pessoa dessa forma), a atitude do advogado deixa de ser defesa e passa a ser crime de injúria e difamação."

Zapater, que estuda crimes sexuais, explica que em crimes de estupro, a acusação precisa demonstrar que aconteceu um ato sexual e que houve dissenso da vítima, ou seja, que ela não queria aquele ato.

No caso da acusação de estupro feita por Mariana Ferrer, não há controversária de que houve um ato sexual. Há provas para comprovar o ato que ela diz que aconteceu e o laudo pericial mostra que houve penetração, ejaculação e rompimento do hímen.

"A dúvida no caso é se ela consentiu ou não", explica Zapater. Mariana diz que estava embriagada e não se lembra — então seria o caso de estupro de vulnerável.

"Porque tudo isso é relevante para entender a conduta do advogado? Porque o que ele fez na audiência não tem nada a ver com o processo", afirma Zapater. "O fato de ela tirar fotos e colocar no Instagram, o fato de ela ser virgem ou não ser virgem, o fato de ela ter qualquer conduta antes do caso não é relevante para essa produção de prova (em relação a ela ter consentido ou não). Aquilo não deveria ter sido permitido porque o advogado estava extrapolando o que dizia respeito aos autos, não tinha nada a ver com o processo", diz Zapater.

A professora da Unifesp lembra que Mariana Ferrer não está no processo como acusação, não tem advogado de defesa.

"A gente não sabe até que ponto aquilo estava sendo usado pelo advogado para confirmar preconceitos prévios que o promotor tivesse, que o juiz tivesse", diz Zapater.

"Em geral, o Brasil é tão punitivista, tão acusatório, é um país que prende muito, mas quando se fala de crimes quando a mulher é vítima, toda essa preocupação com a inocência do acusado aparece. Principalmente quando o que se tem como prova é a palavra da vítima", afirma Zapater.

A professora de processo penal afirma que tanto o MP quanto a Justiça desconsideraram que Ferrer disse que estava embriagada e não tinha capacidade de consentir. Desconsideraram também elementos apresentados por ela que corroboram sua versão.

"E quando a gente junta isso com a declaração do advogado, fica uma demonstração do quanto ainda existe uma mentalidade machista que julga a conduta de mulheres que são vítimas de crimes sexuais", afirma Zapater.

 

O que o juiz deveria ter feito?

A juíza criminal ouvida pela BBC News Brasil sob anonimato explica que durante a audiência o juiz exerce poder de polícia, ou seja, pode delimitar o que vai ser discutido e a forma que vai tomar aquele processo.

Em tese, explica, o juiz poderia tomar providências para que a vítima não passasse por humilhações.

"Aquela audiência ia dar problema, porque se o juiz põe o advogado para fora depois ele poderia ser ser representado por cerceamento de defesa. Mas em tese ele poderia dizer 'doutor, vamos nos ater aos autos', ele poderia em tese tomar providências para que a vítima não passasse por tudo aquilo", afirma.

"Caberia tanto ao juiz reprimir quanto ao membro do Ministério Público pedir para que o juiz tomasse providências", afirma o criminalista Yuri Carneiro Coelho.

A Corregedoria Nacional de Justiça instaurou uma apuração sobre a condução do juiz do TJ-SC na audiência, a pedido do conselheiro Henrique Ávila, do Conselho Nacional de Justiça. "O que assistimos foi algo repugnante. É preciso que o órgão correcional apure os fatos", afirmou.

O senador Fabiano Contarato (Rede-SC) também entrou com representação contra o promotor do caso no Conselho Nacional do Ministério Público.

Zapater explica que, embora o advogado de defesa possa fazer perguntas para a vítima, ela não estava ali para ser interrogada nem era acusada de nada.

"O advogado pode ser submetido a um processo disciplinar pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Estado dele ou Ferrer pode entrar com um processo de danos morais contra ele", explica.

cafe de la musique.jpg

cafe mariana.jpg

boate de luxo.jpg

Caso aconteceu em boate de luxo na praia de Jurerê Internacional, em Florianópolis


"Eu não tenho dúvidas que a postura do advogado extrapolou o limite do que se considera aceitável para o direito de defesa", afirma Carneiro Coelho. "Nesse caso ele transformou um ato de defesa em um ato do humilhação pública."


'Estupro culposo?'

O juiz Rudson Marcos afirmou na sentença que não havia provas para comprovar que a promoter estava alcoolizada ou que André Camargo de Aranha soubesse da ausência de capacidade de resistência de Ferrer.

O juiz não diz que houve "estupro culposo", termo que foi parar entre os assuntos mais comentados no Twitter após a video da audiência ser publicado pelo site The Intercept. Um crime culposo é um crime cometido sem dolo, ou seja, sem intenção.

O uso do termo "estupro culposo" estava em uma passagem citada pelo juiz para explicar porque para se configurar estupro de vulnerável "é necessário que a vítima, por qualquer motivo, não tenha condições físicas ou psicológicas de oferecer resistência à investida do agente criminoso".

O termo faz parte do livro Direito Penal esquematizado, volume 3: parte especial, de Cleber Masson, em que o autor citado pelo juiz teria escrito "como não foi prevista a modalidade culposa do estupro de vulnerável, o fato é atípico".

O termo acabou entre os assuntos mais comentados no Twitter porque não existe a modalidade de 'estupro culposo' no ordenamento jurídico brasileiro — ou seja, não é possível cometer esse crime sem intenção. Mas o trecho citado pelo juiz não questiona isso, justamente afirma que não existe estupro culposo, explicam os juristas.

estupro mariana.jpg

 

"O que o juiz alegou é que não havia provas de que o réu soubesse que Ferrer não estava em condições de resistir ao ato sexual", explica a advogada criminalista Mariana Zopelar, que analisou a sentença do caso.

Ou seja, o que o juiz afirma é que, ainda que Ferrer estivesse embriagada, não era visível e o acusado não teria como perceber isso. Por isso, disse o juiz, o caso seria um "erro de tipo", ou seja, que não é possível provar que a conduta de André Camargo de Aranha se encaixa nos tipos penais que descrevem estupro e estupro de vulnerável no código penal.

Como o próprio Ministério Público (que faz a acusação) pediu a absolvição do réu, o juiz não poderia tê-lo condenado, explica Zapater.

mariana ferrer estupro culposo nando.jpeg

 

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2023
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2022
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2021
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2020
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2019
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2018
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2017
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
Em destaque no SAPO Blogs
pub