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por Aline Rios
objETHOS
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Na semana em que o Supremo Tribunal Federal (STF) retomou a discussão sobre o marco temporal indígena que, inclusive, irá ditar os rumos sobre Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ que está sendo requerida pelo Governo de Santa Catarina, e também, quando vêm à tona novas informações sobre a execução da liderança quilombola e Yalorixá Maria Bernadete Pacífico, executada aos 72 anos com 22 tiros, sendo 12 deles em sua face, a organização Artigo 19 oportunamente publica o relatório Direito à Informação: memória e verdade), em que busca chamar a atenção para a estreita relação entre direito à informação, direito à verdade e reparação histórica.
No relatório de 75 páginas, lançado no Dia Internacional das Vítimas de Desaparecimentos Forçados, em 30 de agosto, a Artigo 19 busca expor o quanto o acesso aos arquivos nacionais públicos pode ser mais ou menos determinante para o reconhecimento e superação da ocorrência sistemática de violações dos direitos humanos no passado. O documento relaciona a questão à violência contra povos negros e indígenas no contexto brasileiro, mas também situa aspectos mais recentes, como a repressão durante a ditadura militar e o que chama de ‘violência embranquecedora’, que ainda é perpetrada contra as populações brasileiras não-brancas.
A Artigo 19 expressa no relatório que compreende o direito à informação como um direito humano fundamental, mas também de caráter instrumental, uma vez que passa por este a necessária efetivação de outros direitos. Em Direito à Informação: memória e verdade, a organização aponta a vinculação entre o direito à informação e o direito à verdade; sendo este entendido como a obrigação do Estado de publicizar informações sobre violações de direitos humanos ocorridas a qualquer tempo e que sejam relevantes para a reparação e o acesso à justiça.
Essa exposição da ‘verdade histórica’ teria, portanto, a pretensão de superar o negacionismo e o revisionismo, reclamando uma reescrita da história, mas também, reivindicando o redesenho de políticas públicas e superando a impunidade fincada no colonialismo e que ainda corrompe o sistema social, político e de justiça no Brasil.
Brasil profundo
E antes de ‘torcer o nariz’ para as questões aqui colocadas, carecemos de lembrar que há pouco tempo o país teve como mandatário da Presidência da República e representante da extrema direita e elites oligárquicas, um Jair Messias Bolsonaro que, sem qualquer pudor, cometeu o disparate de afirmar em rede nacional, durante entrevista ao programa Roda Viva (TV Cultura), que “(…) se for ver a história realmente, os portugueses nem pisavam na África, os próprios negros que entregavam os escravos”.
Tamanho despropósito, para se dizer o mínimo, em um país que ainda engatinha e esbarra em vários obstáculos para promover dispositivos como a Lei 10.639/2003, que versa sobre o ensino de história e cultura afro-brasileira na escola, que encarcera a população negra em massa, e que também é vergonhosamente um país em que mais se mata negras e negros, algo assim não poderia jamais ocorrer sem reprimendas. Mas, no Brasil profundo e, ao mesmo tempo, ‘raso’, ainda há quem diga que não existe racismo no país.
Quando transpomos o olhar para a questão indígena, não se pode esquecer da reiterada afirmação da primeira ministra dos Povos Indígenas da história do país, Sônia Guajajara, que sempre faz questão de enfatizar que “sem território, não existem povos indígenas”.
Para a Artigo 19, a preservação e acesso a documentos públicos no Brasil é essencial para passar essa história a limpo, uma vez que isso permitiria constatar como o Estado brasileiro tem agido nestes mais de 500 anos para promover ou contribuir para o esbulho das terras indígenas e, portanto, para o apagamento dessas identidades e extermínio de sua população.
Informar para superar
Assim como versa o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, profissionais do jornalismo, devidamente qualificados para o exercício da profissão com ética e compromisso social, devem atuar de maneira rigorosa na defesa dos direitos humanos e, por meio dessa, contribuir para o fortalecimento da democracia.
Dessa forma, considerando as 21 recomendações que a Artigo 19 faz a respeito do acesso às informações que se encontram em arquivos nacionais públicos, além de buscar esses dados para melhor contextualizar a oferta noticiosa à sociedade, o jornalismo pode e deve atuar para fortalecer esse sistema.
Uma atuação jornalística mais responsável e comprometida nesse sentido pode assegurar os meios para que as populações negras, quilombolas e indígenas possam reescrever suas histórias por si mesmas, mas também pode atuar: fiscalizando e vigiando o acesso aos arquivos públicos; divulgando a existência e o acesso a esses documentos; combatendo os obstáculos ao cumprimento da transparência no acesso a essas informações; cobrando medidas para promover a segurança informacional desses acervos; além de reivindicar a necessária redução da opacidade sobre os documentos de interesse público que se encontram em poder do Estado.
O jornalismo enquanto forma de conhecimento ancorada no presente e atravessada por contradições (GENRO FILHO, 1987), não pode se furtar à responsabilidade de lançar luz sobre o passado colonialista brasileiro e que, lamentavelmente, ainda chancela o silenciamento de vozes como a de Mãe Bernadete e, do grito sufocado dos nossos povos originários.
É preciso que se reconheça a violência historicamente praticada contra determinadas populações brasileiras, para que suas vítimas possam buscar e garantir a reparação destas, mas, principalmente, para que estas jamais voltem a se repetir.
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Referências:
CUNHA, Brenda. Et al. Direito à Informação: memória e verdade. 1ª Edição. São Paulo: Artigo 19, 2023.
GENRO FILHO, Adelmo. O segredo da pirâmide: para uma teoria marxista do jornalismo. Porto Alegre: Editora Tchê, 1987.
Contribuições para o desenvolvimento
da agricultura familiar
por Jean Marc von der Weid
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Introdução
Um esforço de planejamento de um programa para a promoção do desenvolvimento da agricultura familiar tem que ir além da identificação de políticas de curto prazo e pensar em mecanismos para prepararmos o futuro próximo ou remoto. Para isto, é necessário diagnosticar as ameaças ambientais, econômicas, sociais, financeiras e políticas que possam existir pairando sobre o presente e o futuro desta categoria social. A partir desta avaliação das condições externas é preciso fazer outro diagnóstico sobre as condições atuais da agricultura familiar para finalmente estudar o efeito das políticas públicas aplicadas nas últimas e sua relação com este último diagnóstico.
É o que vou tentar fazer como contribuição para os companheiros e companheiras do atual Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Para evitar cansar os interlocutores será uma série de artigos que eu tentarei manter tão curtos quanto possível.
As ameaças
Estamos vivendo, aqui e no resto do mundo, sob a ameaça de uma série de crises que se aceleram e que se alimentam umas às outras. Sem querer estabelecer ordens de importância ou de causalidade, me limito a afirmar quais são estas crises: ambiental, que pode ser subdividida em aquecimento global, perda de biodiversidade, destruição de recursos naturais como solo e água, poluições de solo, águas e ar, e outros; energética; alimentar; sanitária e financeira.
Todas estas crises já estão impactando a vida (e provocando a morte), tanto humana como animal e vegetal no planeta. E estão em processo de aceleração acentuada, algumas chegando ao que os cientistas chamam de “não retorno”, ou seja, elas provocaram mudanças em suas dinâmicas que retroalimentam a evolução em curso, independentemente da ação humana.
É importante, em primeiro lugar, lembrar que este conjunto de fenômenos que alteram as condições de vida do planeta não fazem parte de uma evolução natural, como foram outras grandes mudanças em eras geológicas passadas. O que estamos vivendo é resultado da ação humana e seus impactos sobre as condições ambientais. Por isto mesmo alguns geólogos já denominaram a era atual de antropoceno ou a idade da ação humana. Outros analistas deram outro nome à era em que vivemos: capitaloceno, ou era do capitalismo.
E como estão atuando estes fenômenos? O aquecimento global já nos levou a um aumento da temperatura média do planeta de 1º C, desde o início da revolução industrial no século 18. Este número foi alcançado em 2015 e está se aproximando de 1,5º C muito mais rapidamente do que previsto pelos cientistas do IPCC. Nos relatórios anteriores, se apontava um cenário onde tal índice seria alcançado em meados do século, se tudo continuasse igual do ponto de vista da emissão de gases de efeito estufa.
Ocorre que a previsão era otimista (o que sempre acontece nos relatórios do IPCC, por mais que estejam anunciando tragédias) e, por outro lado, as condições pioraram, com uma aceleração do aumento de emissões de GEE acima do esperado, com exceção do breve hiato provocado pela pandemia da COVID. A data para batermos o limite definido no acordo de Paris para o aumento de temperatura, ultrapassando os 1,5º C, passou a ser meados dos anos 2030, sendo que os cientistas mais pessimistas ou mais realistas, já apontam para o ano de 2030, daqui a pouco mais de seis anos.
Os efeitos do aquecimento já estão sendo vividos na forma de grandes diferenciais de temperatura, com verões quentíssimos (como agora nos EUA e na União Europeia, onde os termômetros neste verão estão batendo um recorde atrás do outro e chegando nos 53º C) e com invernos gelados, também com recordes negativos.
Estas temperaturas elevadas são acompanhadas de uma enorme instabilidade climática, com chuvas diluvianas, tempestades de neve e granizo arrasadoras, tufões, ciclones e outras manifestações ambientais ocorrendo com maior intensidade e maior frequência. As ondas de calor provocam incêndios devastadores, mesmo sem a colaboração humana (e ela existe por todo lado, intencionalmente ou não), com destruição da biodiversidade e a intensa poluição do ar, às vezes muito longe dos locais onde eles são originados. Os incêndios há umas poucas semanas no meio oeste do Canadá, com a fumaça contaminando todo o nordeste dos EUA, de Chicago a Nova Iorque, são um bom exemplo. Outro foi a fumaça das queimadas da Amazônia fechando aeroportos em São Paulo, há dois anos.
Um outro efeito de altíssimo impacto é menos perceptível para o comum dos mortais, menos para aqueles que moram em ilhas com baixas altitudes: o aumento do nível dos oceanos. Pequenos países insulares estão desaparecendo, sinistro prenúncio do que vai ocorrer nas áreas costeiras do planeta.
Da última vez em que a Terra viveu com as atuais concentrações de GEE, o nível dos mares alcançou quase 10 metros a mais do que o nível atual. Por que não estamos com estes níveis mais altos agora? É só questão de tempo, infelizmente. O aumento da concentração de GEE não tem reflexo imediato no aumento da temperatura média do planeta, há um delay enquanto as grandes massas de terra e de água vão se aquecendo e as geleiras se derretendo.
Ou seja, mesmo se interrompermos as emissões totalmente e imediatamente, o aquecimento vai continuar por um tempo e o impacto no aumento do nível dos oceanos também. Para impedir este processo seria necessário não só parar de emitir GEE como conseguir retirar GEE da atmosfera. E muito. Mesmo nessa hipótese superotimista, os cientistas calculam que os mecanismos postos em marcha com o atual aquecimento não serão revertidos rápido o suficiente para que cidades como Nova Iorque, Cidade do Cabo, Marselha, Alexandria, Rio de Janeiro, Salvador, Recife e muitas outras escapem da inundação.
E enormes regiões de costas baixas na Índia, China, Bangladesh, Filipinas, Indonésia, entre outras menores, seriam alagadas, deslocando perto de um bilhão de pessoas. E quanto mais GEE for emitido daqui para frente, mais as temperaturas subirão e mais cidades e áreas costeiras desaparecerão. E mais áreas agricultáveis serão inutilizadas. E mais destruição será provocada por mais e mais potentes ciclones e tufões e incêndios.
É uma visão trágica para o futuro, mas já é horrível no presente de muita gente.
Não vou me estender sobre quem é culpado pelas emissões de GEE. Todo mundo sabe que o CO2emitido pela queima de combustíveis fósseis é o principal responsável do aquecimento global, sendo que Estados Unidos, União Europeia, China e Rússia tem a maior responsabilidade nestas emissões. E que o uso para movimentar carros, aviões, navios é a maior fonte de emissões. Mas é preciso lembrar que muito CO2 é emitido em vários outros empreendimentos, já que o petróleo é utilizado em quase todas as atividades industriais, quer como combustível quer como matéria prima para produtos plásticos, cosméticos, farmacêuticos, alimentares, informáticos e muitos outros.
É importante notar que a agricultura convencional, a do agronegócio, também emite CO2 em grandes quantidades, sendo uma das maiores fontes de emissões de CO2 fora dos combustíveis fósseis, isto porque ela é responsável pelo desmatamento em larga escala. Neste quesito, o Brasil e a Indonésia são os maiores responsáveis, colocando-os como quinto e sexto entre os maiores emissores de CO2. Finalmente, a agricultura é a principal responsável pela emissão do segundo gás mais importante na geração do efeito estufa: o metano. Há menos metano sendo emitido e se acumulando na atmosfera, mas ele tem um poder aquecedor 300 vezes maior do que o etano. É ainda a agricultura a responsável pelo terceiro em importância dos gases de efeito estufa, o óxido nitroso.
Computando todas as fontes de GEE, alguns cálculos apontam para a agricultura como o setor com as maiores emissões, direta ou indiretamente, algo perto de 35%. O setor agroalimentar como um todo, envolve (além da agropecuária propriamente dita) a produção dos insumos, a industrialização dos produtos agrícolas e seu transporte e a formação de lixo orgânico derivado das sobras da alimentação caseira, em restaurantes ou nos mercados, lixo esse que, lançado em rios ou em depósitos ao ar livre, emite toneladas gigantescas de metano. Segundo alguns cálculos, o conjunto dos impactos diretos e indiretos do setor agroalimentar como um todo chega a pouco mais de 50% das emissões de GEE, bem acima das emissões provocadas pelo uso de gasolina e óleo diesel nos transportes terrestres, aéreos e marítimos.
O aquecimento global impacta a agropecuária de forma brutal. Cada grau Celcius a mais na temperatura média do planeta tem repercussões muito significativas nas áreas cultivadas e de pastagens. Lembremos que a temperatura média planetária significa um balanço entre temperaturas muito baixas nos polos e muito altas nos trópicos. Uma temperatura média anual de 17,5º C no planeta implica em uma temperatura média de até 40º C nos verões das áreas mais quentes dos trópicos. Nas zonas produtoras tropicais ou temperadas, 1º C de aumento médio anual derruba a produtividade das culturas em valores que vão de 10 até 25% segundo o produto e a região. Isto sem levar em conta os efeitos indiretos do aquecimento, gerando instabilidade na oferta hídrica e na ocorrência de fenômenos atmosféricos como ciclones, tufões, geadas, secas e inundações.
Em um planeta com perto de 1 bilhão de pessoas passando fome, estas mudanças provocadas pelo aquecimento serão dramáticas. Sim, há cálculos que indicam que haverá um aumento de produção nas zonas mais frias, mas há um acordo que ela não compensará as perdas nas áreas mais quentes.
Tomando o Brasil como exemplo, podemos esperar que os impactos serão totalmente negativos pois nos encontramos inteiramente dentro da zona tropical ou subtropical. Já estamos vivenciando este processo, com os impactos cada vez maiores dos verões mais quentes em todo o território. Por outro lado, estamos muito ameaçados pelo processo de desmatamento na Amazônia, que se aproxima perigosamente do momento em que a floresta ainda existente perde as condições de se reproduzir e inicia uma degradação “natural” no caminho de tornar-se uma savana seca ou mesmo uma zona desértica (como acontece no Saara ou no Atacama, desertos que estão na mesma latitude da Amazônia).
A destruição da floresta Amazônica não tem apenas (e já é muito) um impacto no aquecimento global, ela vai anular o fluxo da umidade gerada por este ecossistema e que irriga naturalmente toda a nossa agricultura do centro-oeste, do sudeste e do sul. Já o desmatamento do Cerrado está impactando o fluxo de água nos grandes rios gerados nesse bioma e que se dirigem para o norte, o Tocantins e o Araguaia, com efeitos significativos na geração de energia elétrica.
Saindo da ameaça representada pelo aquecimento global caímos na ameaça da crise energética. Os combustíveis fósseis que tanto contribuem para a geração de GEE estão em processo acelerado de desaparição. Não vou me estender neste tópico, que tratei em outros artigos, limitando-me a apontar para a crise anunciada para meados desta década (nos próximos dois a três anos!), quando os preços do petróleo e do gás deverão voltar aos patamares dos anos 2000, que levaram à crise financeira de 2008. Se precisamos chegar rapidamente a zerar as emissões de GEE, a crise da produção de petróleo poderia ser uma boa notícia. Entretanto, o mundo não se preparou para uma queda brusca na oferta de petróleo que será acompanhada por um aumento também brusco dos preços desta oferta residual. O choque da crise do petróleo vai se fazer sentir em toda a cadeia produtiva mundial, além de impactar os meios de comunicação.
Para completar este cenário crítico é preciso lembrar da ameaça representada pela paulatina desaparição das reservas de fósforo e de potássio em todo mundo. Estes elementos são essenciais para a vida das plantas. No modelo do agronegócio eles são aplicados no solo ou nas folhas sob a forma de adubos químicos solúveis. Este procedimento é de imensa ineficiência, pois calcula-se que menos de 50% dos insumos sejam aproveitados pelas culturas, enquanto o resto é levado pelas águas de chuva ou de irrigação e vão parar em rios, lagos, aquíferos e lençóis freáticos ou mar, com enorme impacto na eutrofização destas reservas hídricas.
Implicações destas ameaças para a agricultura
A ação destes diferentes fenômenos sobre a produção e distribuição de alimentos no mundo (e no Brasil) vai ser a de reduzir a oferta global de alimentos e torná-los mais caros pelo aumento dos custos de adubos, agrotóxicos e transportes, além do efeito da lei da oferta/procura. Avalia-se que o comércio internacional vai ser reduzido, quer porque muitos países vão priorizar o abastecimento interno frente à escassez, quer porque o custo do transporte vai ficar muito mais elevado. É um movimento de contra-globalização, revertendo uma tendência dominante desde o pós-guerra mundial.
No caso brasileiro, já temos problemas com o abastecimento interno de alimentos, já que somos, cada vez mais, um país centrado na produção e exportação de milho e soja (para ração) e carnes. Importamos muito do que consumimos e estamos em pleno processo de mudança dos hábitos alimentares entre os consumidores de menor renda, abandonando produtos como arroz e feijão, milho (fubá) e mandioca e aderindo ao consumo de processados e ultra processados, com base no trigo (pão e massas). Do ponto de vista de uma dieta recomendável estamos muito mal na fita e os efeitos sobre a saúde pública são pesados.
Com as crises citadas se abatendo sobre nós teremos dificuldades de importar o necessário, tanto para a dieta ideal como para a atual dieta deletéria predominante. Teremos que fazer uma brutal conversão da nossa agricultura tanto no direcionamento dos produtos para o mercado interno como no modo de produzi-los.
Vai ser necessário controlar os desmatamentos, não só da Amazônia e do Cerrado (os ecossistemas mais ameaçados e com efeitos mais devastadores), mas em todos os biomas. Esta não só vai ser a nossa principal contribuição para conter o acúmulo de GEE na atmosfera, como pode ser importantíssimo para retirar GEE da atmosfera, se adotarmos a política de reflorestamento maciço. E, é claro, para manter em atividade os “rios voadores” que garantem a nossa produção nas áreas mais importantes da nossa agricultura.
A mudança no modo de produzir vai se impor, tanto pelo aumento do custo dos insumos industriais (adubos químicos e agrotóxicos, quase tudo importado atualmente) como pela necessidade de conter a emissão dos GEE emitidos pelo agronegócio (além do CO2), o metano e o óxido nitroso. Resta saber se vamos nos antecipar às crises e organizar uma transição à tempo ou se vamos esperar que tudo desabe para ver como resolver.
Mas como produzir de forma sustentável no formato das mega plantações que hoje dominam a agricultura brasileira? A alternativa conhecida para o modelo agroquímico e motomecanizado é a agroecologia. O agronegócio pode adotar esta proposta? Dificilmente, já que a característica do modelo agroecológico é o uso da biodiversidade, tanto a agrícola como a natural, para substituir o uso de insumos químicos externos e controlar pragas, doenças e invasoras restabelecendo o equilíbrio ambiental. Substituir plantações em monocultura de soja, para dar um exemplo, ocupando dezenas de milhares de hectares, por sistemas diversificados com vários produtos agropecuários dividindo os espaços produtivos inibe o uso de maquinário em grande escala. E é nesta super produtividade do trabalho que reside o lucro do agronegócio.
Quando a crise provocada pela queda do sistema soviético abalou a agricultura cubana a resposta do governo foi distribuir as terras das grandes monoculturas estatais de cana de açúcar em lotes atribuídos a neocamponeses familiares. Não teremos alternativa senão fazer o mesmo ou viver com uma crise gigante, social e econômica, atingindo a maioria da população. A fome é um estopim para a instabilidade social e política e, em outros países, levou a movimentos de revolta, nos idos dos anos 2000.
Exemplos em todo o mundo apontam para a agricultura familiar em pequena escala como a mais bem adaptada para incorporar os princípios da agroecologia. Mas substituir o agronegócio pela agricultura familiar agroecológica implica em radicalizar muito (e corrigir muito) o processo de reforma agrária iniciado por Fernando Henrique Cardoso e seguido nos mesmos moldes por Lula (Dilma Rousseff reduziu a reforma a quase nada, e Michel Temer/Jair Bolsonaro liquidaram a fatura). Avalia-se que foram assentados perto de um milhão de famílias entre 1994 e 2016 e que mais da metade abandonou seus lotes por falta de condições de produção e de escoamento das safras, por endividamento e falência ou por falta de infraestruturas econômicas e sociais básicas. Para preparar a agricultura do futuro precisaremos fazer muito mais e muito melhor do que no passado.
Segundo alguns cálculos, uma agricultura centrada na produção familiar agroecológica implantada em todo o espaço rural brasileiro implicaria em garantir terra e muitos outros fatores produtivos e sociais para 20 milhões de famílias dotadas com 10 hectares cada uma. É um desafio gigante para o nosso futuro, implicando em forte recampesinação da nossa população. Quando nos damos conta de que a evasão rural não foi contida pelos governos populares e que o número de agricultores familiares caiu perto de 10% entre os censos agrários de 2006 e 2017 podemos medir o tamanho do desafio.
Para nos prepararmos para estas crises temos que pensar no que é possível fazer desde já, visando mitigar os impactos quando eles ocorrerem (continua)
A Profª. Leonilde Servolo de Medeiros, coordenadora do Núcleo de Pesquisa, Documentação e Referência sobre Movimentos Sociais e Políticas Públicas no Campo, do CPDA/UFRRJ, publicou, pela Consequência Editora, o livro Ditadura, conflito e repressão no campo: a resistência camponesa no estado do Rio de Janeiro que reúne os resultados da pesquisa, financiada pela Faperj Conflitos e repressão no campo no estado do Rio de Janeiro 1946-1988.
Embora haja uma produção acadêmica bastante vigorosa, em especial no âmbito da História e das Ciências Sociais, a respeito das ações do regime empresarial militar, enfatizando a repressão sobre as organizações de esquerda, movimento estudantil, mundo das artes e da cultura, são ainda relativamente poucos os estudos sobre a experiência da classe trabalhadora no contexto da violência e repressão que se sucedeu ao golpe. Com a criação de um grupo de trabalho específico sobre a violência contra trabalhadores e outro para tratar de camponeses e indígenas no âmbito da Comissão Nacional da Verdade (CNV), ficou evidente a necessidade de pesquisas mais aprofundadas sobre os efeitos, diretos ou indiretos, da ditadura sobre o mundo do trabalho.
O livro, com prefácio do Professor Afrânio Garcia, traz uma análise de diferentes situações de conflito no estado do Rio de Janeiro e preenche uma importante lacuna não só sobre a história do Estado, mas das diferentes faces das relações da ditadura empresarial militar com o meio rural brasileiro.
Vitorioso o golpe de Bolsonaro, os camponeses seriam novamente perseguidos, expulsos de suas terras, e os índios iriam parar nos campos de concentração
A CPI do MST, ora encenada na Câmara dos Deputados, deixa visível o ódio de classe, o ódio racial dos descendentes dos emigrantes campesinos europeus, supremacistas brancos, contra os camponeses de origem negra e de origem indígena.
A ditadura militar, iniciada em 1964, criou diferentes campos de concentração, campos de extermínio para o genocídio dos povos indígenas e negros.
Vídeo: Capacho de Tarcísio quase chora na cpi contra o MST
A deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) acionou nesta sexta-feira (4) a Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente do colegiado por ofensas machistas e gordofóbicas
Os constantes ataques machistas desferidos pelo presidente da CPI do MST, Coronel Zucco (Republicanos-RS), e o relator Ricardo Salles (PL-SP), contra as mulheres de esquerda no colegiado estão servindo apenas para acentuar atitudes desprezíveis dos dois bolsonaristas. Não encontra eco na sociedade e nem nas normas jurídicas.
Por isso, a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP), mais uma vez, acionou nesta sexta-feira (4) a Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Zucco por ofensas machistas e gordofóbicas.
Na sessão desta quinta-feira (3), o presidente do colegiado se dirigiu a deputada dessa forma: “A senhora pode, também, daqui a pouco, tomar qualquer atitude, ficar mais calma. A senhora está nervosa, deputada? Quer um remédio? Ou quer um hambúrguer?”.
“Pedirei que a PGR anexe o caso à investigação já em curso contra o Zucco por violência política de gênero contra mim. Eu procuro responder à altura, acho que é pedagógico para que as demais mulheres não baixem a cabeça. Não vou retroceder”, afirmou a deputada.
Leia mais: CPI do MST visa barrar mobilização que o governo precisa para fazer mudanças
Ao avaliar a repercussão do caso, a deputada do PSOL foi taxativa: “O tiro da CPI do MST saiu pela culatra e restou aos bolsonaristas apenas a baixeza dos ataques misóginos.”
Percebendo o desgaste, o presidente do colegiado pediu para retirar sua manifestação das notas taquigráficas e disse que não agiu dessa forma contra a parlamentar.
“Não é verdade que o senhor nunca foi indecoroso ou desrespeitoso comigo e com as demais parlamentares desta comissão. E isso não sou eu que afirmo, mas a Procuradoria-Geral da República que, neste momento, tem um inquérito aberto para apurar a conduta”, respondeu Sâmia.
“Eu já tinha visto esse tipo de ironia nas redes sociais, por parte do relator da CPI, Ricardo Salles, mas nunca vindo do Zucco. Ele já havia me silenciado, cortado meu microfone, mas nunca agido desta forma tão truculenta, publicamente. Eu denuncio e seguirei denunciando sempre que houver violência política de gênero”, completou.
Solidariedade
A deputada recebeu solidariedade dos colegas de parlamento. A líder do PCdoB na Câmara, Jandira Feghali (RJ), diz que esse é o modus operandi daqueles que não têm argumento, não têm educação e não respeitam os espaços democráticos.
“A velha prática de desqualificação. Deputado bolsonarista prática gaslighting, gordofobia e fortalece mais uma vez a misoginia na CPI do MST contra deputadas de esquerda. Não precisamos de remédio, não precisamos nos acalmar, tampouco de hambúrguer. Queremos respeito, punição e cadeia para criminosos. Nossa solidariedade à deputada”, disse.
“Deixo um abraço e minha solidariedade à colega Sâmia pelos ataques machistas e misóginos sofridos na CPI do MST. A violência política de gênero é o recurso que sobra aos politicamente inaptos. Parabéns por sua luta e pelo trabalho corajoso na CPI, querida deputada!”, reagiu o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (Sem partido-AP).
A terceira edição do Salão da Pâtisserie francesa, que acontece de 17 a 19 de junho em Paris, acolhe em 6.000 m² os melhores confeiteiros da França e apenas um estrangeiro: o chef glacier - também conhecido como sorveteiro - brasileiro Francisco Sant'Ana. Em parceria com o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), Sant'Ana traz à terra da gastronomia o que há de melhor no Brasil, com frutas e matérias-primas orgânicas produzidas nos assentamentos do MST.
Paloma Varón, da RFI, em Paris
Para Zakari Benkhadra, fundador e diretor do Salão, convidar Francisco para um evento essencialmente francês foi natural, devido à excelência do brasileiro: "Eu conheço o Francisco há dez anos. Nos encontramos quando eu era diretor-geral da Escola Nacional Superior de Pâtisserie e ele veio estudar nesta escola, onde ficou três anos. Ele adorou, virou parte da nossa família, encontrou os melhores chefs da França na nossa escola e estabeleceu uma ótima relação com eles. Então ele rodou todo o país para aprender as técnicas e o savoir faire de cada região, de cada chef".
"Depois, ele voltou ao Brasil para fundar a sua própria escola de chef glacier, a Escola do Sorvete. Eu tive a honra e o privilégio de visitar sua escola duas vezes e a achei formidável. Eu fiquei muito orgulhoso de Francisco ter realizado isso em São Paulo. Ele sempre teve uma preocupação com o natural, o orgânico, o sustentável, o local, então esta parceria com o MST vem ao encontro de seu ideal", continua o diretor do evento, sobre seu ex-pupilo.
Para Francisco, "é uma honra ser convidado ao salão em Paris e poder contar um pouco de sua história com produtos nacionais". A Escola de Sorvete, que forma de 500 a 600 alunos por ano, "demonstra o meu amor pelo sorvete e pelos produtos naturais".
Ele conta que a parceria com o MST surgiu quando já tinha fundado a Escola do Sorvete e era cliente do movimento. "Eu já comprava os produtos deles há um bom tempo e o [João Pedro] Stédile ficou encantado com a Escola do Sorvete. Então pensamos juntos: por que não fazer uma sorveteria popular, uma sorveteria que venha da agricultura familiar, que tenha produtos orgânicos, que seja única no mundo? Porque não existe uma sorveteria com ideologia, a nossa vai ser a única no mundo, tratando sempre o homem do campo com o respeito que ele merece".
Para Benkhadra , "Francisco é alguém que vai à fonte para buscar o melhor. E eu acho que o fato de ele destacar os bons produtos do Brasil para um público apaixonado pela confeitaria é extraordinário", completa, sem esconder o orgulho.
Francisco, que antes de ser sorveteiro estudou Geografia na USP, já trabalhou com sua arte de fazer sorvetes em países como Espanha, França, Rússia, Itália, El Salvador e Azerbaijão, conta a sua rotina atualmente no Brasil.
"Eu dou aulas presenciais por seis meses por ano e nos outros seis meses dou aulas on-line e passo os dias nos diferentes assentamentos do MST, nos laticínios, nas zonas de produção de fruta, tudo para criar um produto único no mundo. A Gelado do Campo vai ser a primeira loja de sorvete de um movimento popular no mundo: do campo ao freezer", diz, confiante.
Francisco, que voltou da França para o Brasil há oito anos, diz que tem planos de expandir este projeto em parceria com o MST para a capital francesa.
"Eu vim para o salão cheio de polpa de cupuaçu, cajá, manga, etc. e já pensando na possibilidade de a médio, longo prazo abrir uma loja em Paris também. Eu acho que seria incrível Paris receber uma loja com produtos da agricultura familiar brasileira, com os nossos chocolates, as polpas exóticas, juntando com o leite daqui", completa o chef, que estudou a arte do sorvete na França e também na Itália.
Francisco aposta nos seus produtos com valor agregado para deixar os parisienses, habituados ao melhor no universo dos doces refinados, com água na boca. "Os franceses gostam muito da manga e do maracujá do Brasil, mas eu trouxe nesta bagagem uvaia, cupuaçu, jabuticaba... Por exemplo, jabuticaba não existe aqui. Para explicar, eu mostro uma foto, e as pessoas se surpreendem... jabuticaba é uma coisa tão nossa! E temos produtos dos diferentes biomas brasileiros, nos quais o MST atua".
Além disso, Sant'Ana utiliza um copinho biodegradável feito de mandioca. "Já fui mandioca" é o nome do copinho, que é comestível e, segundo ele, se decompõe em três dias se exposto ao ambiente. "É uma tecnologia 100% brasileira", celebra.
Sâmia Bonfim enumerou os crimes pelos quais o ex-ministro do Meio Ambiente é investigado, entre eles corrupção e prevaricação; ela teve o microfone cortado e questão de ordem foi considerada “subjetiva” pelo presidente da comissão
por Bruno Stankevicius Bassi
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Composta majoritariamente por membros da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) foi instalada na última quarta-feira (17) na Câmara. A CPI, que pretende criminalizar a luta pela terra no Brasil, será presidida pelo deputado Tenente-coronel Zucco (Republicanos-RS) e terá como relator o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles (PL-SP) — ambos membros ativos da frente ruralista.
Responsável por “passar a boiada” durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), Salles é um dos nomes mais questionados da CPI por sua relação explícita com o poder econômico e pelo beneficiamento escancarado de infratores ambientais, conforme descrito pelo De Olho nos Ruralistas em relatórios e reportagens ao longo dos últimos anos: de sua ascensão política patrocinada pelo empresário David Feffer, da Suzano, ao financiamento de campanha por usineiros e madeireiros beneficiados por sua gestão à frente do Ministério do Meio Ambiente, transformado por Salles em um balcão de negócios, como mostrou o dossiê Ambiente S/A.
Os conflitos de interesses em série foram citados pela deputada Sâmia Bonfim (PSOL-SP), durante a sessão inaugural da comissão, para tentar impedir a posse de Salles na relatoria.
Logo após o ex-ministro ser chamado para compor a mesa diretora, a parlamentar apresentou uma questão de ordem baseada no artigo 5º, inciso VIII, do Código de Ética da Câmara, que impede que parlamentares relatem matérias “de interesse específico de pessoa física ou jurídica que tenha contribuído para o financiamento de sua campanha eleitoral“.
Na justificativa, Sâmia enumerou os crimes de corrupção, prevaricação, advocacia administrativa e organização criminosa, pelos quais Salles responde no Supremo Tribunal Federal (STF). O caso se refere ao envolvimento do ex-ministro em um esquema de tráfico de madeira ilegal no Pará, revelado pela Operação Akuanduba, da Polícia Federal.
Na sequência, a deputada cita a apuração deste observatório sobre os financiadores de campanha de Salles, mas teve o microfone cortado. A questão de ordem foi dispensada pelo presidente da CPI, que a considerou “subjetiva”.
Confira abaixo, o vídeo da série De Olho no Congresso que aponta quem são os patrocinadores do relator da CPI do MST:
A criação de uma CPI para criminalizar as ocupações de latifúndios por camponeses sem terra, indígenas e quilombolas era um sonho antigo da FPA. Desde o governo de Michel Temer (MDB), líderes ruralistas tentam, sem sucesso, emplacar a comissão.
Com Bolsonaro, a perseguição viria através do governo federal, que — em plena pandemia de Covid-19 — enviou a Força Nacional de Segurança Pública para reprimir militantes do MST no Sul da Bahia e da Liga dos Camponeses Pobres em Rondônia. Sob a batuta do ex-secretário de Assuntos Fundiários Nabhan Garcia, aquele governo promoveu o maior programa de reconcentração fundiária da história recente: o Titula Brasil, que distribuiu mais de 300 mil títulos individuais, em uma modalidade que permite a venda da terra para terceiros. Especialistas ouvidos à época pelo De Olho nos Ruralistas, afirmam que, a longo prazo, o processo deve levar a um enfraquecimento dos assentamentos da reforma agrária no país.
Após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em outubro, as atenções da FPA voltaram-se novamente à CPI. Por meio do Instituto Pensar Agro (IPA), braço logístico que liga os parlamentares aos empresários do agronegócio, a frente ruralista impulsionou uma campanha nas redes sociais para atacar camponeses e indígenas. A “Semana do Combate à Invasão de Terras” foi lançada poucos dias antes do início do Abril Vermelho, mês em que o MST promove ações de solidariedade, encontros e também ocupações de latifúndios improdutivos e escritórios públicos, para pautar a reforma agrária.
O lobby ruralista deu resultado: em 26 de abril, o presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) — ele próprio um membro da FPA — acatou o requerimento do deputado Tenente-coronel Zucco, dando autorização para a CPI ser instalada.
Além de Zucco na presidência e Ricardo Salles na relatoria, a comissão conta com outros 28 membros da FPA. Entre os 25 titulares já designados pelos respectivos partidos, 16 são integrantes da bancada ruralista. Faltam ainda duas nomeações: do Podemos e do PSB. Dos 19 suplentes conhecidos, doze pertencem à frente.
A lista inclui onze dirigentes da FPA. Dois deles são membros da mesa diretora: o “vogal” Kim Kataguiri (União-SP) — cargo equivalente ao de conselheiro — e o vice-presidente da frente na Câmara Evair de Melo (PP-ES). Eles ocupam a 1º e a 3ª vice-presidência da CPI. O segundo posto da comissão está com o Delegado Fabio Costa (PP-AL), ruralista e membro da “tropa de choque” de Arthur Lira na Câmara.
Além deles, figuram entre os titulares: Caroline de Toni (PL-SC), coordenadora jurídica da FPA; Domingos Sávio (PL-MG), vice-presidente da FPA para a região Sudeste; Hercílio Coelho Diniz (MDB-MG), líder da Comissão Trabalhista; e Lucas Redecker (PSDB-RS), da Comissão de Inovação.
Entre os suplentes estão Alceu Moreira (MDB-RS), ex-presidente da FPA e líder da Comissão de Política Agrícola; Marcos Pollon (PL-MS), da Comissão de Segurança no Campo; e os “vogais” Diego Garcia (Republicanos-PR) e Rodolfo Nogueira (PL-MS) — este último autor de quatro requerimentos na CPI até agora.
Foto principal (TV Câmara/Reprodução): deputada Sâmia Bonfim apresentou requerimento para impedir a posse de Ricardo Salles como relator da CPI do MST
| Bruno Stankevicius Bassi é coordenador de projetos do De Olho nos Ruralistas. |
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Nesta terça-feira (30 maio), o relator da CPI do MST, deputado Ricardo Salles (PL-SP), aquele que sugeriu “ir passando a boiada", repetiu a cena de truculência do deputado tenente-coronel Zucco (Republicanos-RS) contra Sâmia Bomfim (PSOL-SP) e cortou o microfone da deputada quando ela dizia que os barracos onde integrantes do movimento social residiam foram invadidos e que a polícia abusou da autoridade. O MPF considera que houve violência política de gênero contra a parlamentar, e acionou a Procuradoria-Geral da República (PGR). Os jornalistas Renato Rovai e Dri Delorenzo comentam o caso.
Para as crianças e adolescentes Sem Terrinha a terra é uma fonte de alimento, um lar e um sustento para suas famílias, por isso aprendem desde cedo a valorizar e a lutar por esse recurso tão vital!
MANIFESTO DAS CRIANÇAS SEM TERRINHA
Quem são vocês? Os Sem Terrinha outra vez!
O que que traz? A vitória e nada mais!
Essa onda pega? Essa onda já pegou!
Pra anunciar: que o Sem Terrinha já chegou!
Nós, Crianças Sem Terrinha, realizamos o nosso Encontro Nacional. Estamos bem felizes!!!
Desde 1994, todos os anos, fazemos em nossos estados a Jornada Nacional das Crianças Sem Terrinha. Há algum tempo, preparamos o Encontro, conversamos com muitas crianças sobre como é a vida em nossos assentamentos e acampamentos. A gente brinca, grita, canta, estuda e também luta. Por isso, viemos para esse Encontro gritando: “Sem Terrinha em Movimento: brincar, sorrir, lutar por Reforma Agrária Popular!”.
O Encontro é um espaço pra gente conhecer muitas crianças Sem Terrinha e crianças de outros movimentos populares do campo e da cidade do Brasil e de outros países. Já conhecemos a história de luta das crianças da Palestina, da Síria, do Haiti, de Cuba e da Venezuela. Queremos que todas as crianças do Brasil e do mundo possam ser felizes e livres, soltar pipa, jogar bola, brincar de roda e estudar.
Fizemos esse Manifesto das Crianças Sem Terrinha, para juntas com as demais crianças, lutarmos por nossos direitos e crescermos num mundo sem desigualdade social e sermos felizes.
SOMOS SEM TERRINHA!
Sou Sem Terrinha do MST,
acordo todo dia pra Lutar, você vai ver!
Somos Crianças Sem Terrinha do MST! Somos filhos e filhas das famílias Sem Terra, moramos nos acampamentos e assentamentos de Reforma Agrária. Junto com nossos pais ocupamos terra para ter alimentos, casa para morar, lugar de brincar e ser feliz.
Ajudamos nossa família com os trabalhos da roça e a cuidar dos animais. Gostamos de comer os alimentos que plantamos. Queremos alimentação saudável nas escolas do campo, com lanches de qualidade. Gostamos de morar e dormir na roça!
Participamos das atividades, de lutas e reuniões e estudamos no campo.
Ser Sem Terrinha é muito legal! Brincamos na Ciranda Infantil, tomamos banho de rio, soltamos pipa, pulamos corda, brincamos de esconde-esconde, pega-pega, jogamos bola, donas da rua e até bolinhas de gude.
Gostamos da natureza, de olhar para o céu, brincar com as nuvens, sentir o vento. Gostamos de aprender como uma semente germina na terra, como que a plantinha cresce, como a terra pode ser linda e nos dar alimentos gostosos.
Por tudo isso, organizamos esse nosso Encontro Nacional pra dizer que temos o direito de viver bem. E vamos lutar pelos nossos direitos, junto com nossos pais, com o MST e com outras crianças do Brasil e do mundo.
LUTAMOS PRA SER FELIZ!
Ser criança é ser feliz
Pra ser feliz tem que brincar
pra brincar tem que sorrir,
pra sorrir tem que lutar!
Lutamos por terra e Reforma Agrária Popular, que é dividir a terra, para que as famílias possam ter educação, saúde e cultivar alimentos saudáveis. Em nossos assentamentos e acampamentos já temos a produção de alimentos orgânicos, agroecológicos e tem até agroflorestas, com muita coisa bonita pra ver e pra comer. Produzimos diversos alimentos gostosos e sem veneno: banana, feijão, macaxeira, melancia, arroz, cana de açúcar, legumes, etc.
Estamos aprendendo a preservar o meio ambiente, a cuidar melhor do lixo e vamos cuidar das matas, das florestas e dos nossos assentamentos e acampamentos.
Ainda não fizeram a Reforma Agrária do jeito que precisa, mas nós vamos ajudar a fazer!
É preciso melhorar nossas condições de vida no campo e também na cidade. Nós queremos que as crianças da cidade também comam comida sem veneno!
Lutamos por nossos direitos, que não são cumpridos: nossas estradas são ruins e esburacadas; o transporte escolar quase sempre quebra e entra muita poeira; muitas escolas estão sendo fechadas e outras são longe de nossas casas; falta material e temos poucos livros pra ler.
As escolas do campo precisam ter melhores condições. Queremos que sejam construídas quadras de esportes, refeitório e parquinho infantil, que o pátio das escolas seja grande pra podermos brincar. A alimentação das escolas precisa melhorar, ter mais produção da reforma agrária e da agricultura camponesa familiar.
Queremos que nossas escolas sejam bonitas e agradáveis, que tenham hortas, aulas de espanhol, biblioteca, música, dança, teatro, desenho, pintura, que sejam seguras e boas de estudar. Queremos assistir filmes e poder fazer passeios pra conhecer outros lugares, outras artes, outras pessoas. Lutamos para garantir uma educação que faça parte da vida do campo, nos respeite como crianças e que respeite as populações do campo e da cidade.
Lutamos contra os preconceitos, o desrespeito com as pessoas e por igualdade de direitos.
Com nossos pais e com o Movimento, lutamos por escola; moradia digna; cooperativas; acesso à luz, água boa e encanada; postos de saúde também com tratamento natural; transporte escolar. Nós queremos tudo isso para que todo mundo tenha uma vida digna.
Lutamos por terra, escola, saúde e educação, desses direitos não abrimos mão!
SEM TERRINHA EM MOVIMENTO:
BRINCAR, SORRIR, LUTAR POR REFORMA AGRÁRIA POPULAR!
MST se destacou nos últimos anos por ser o maior produtor de arroz orgânico da América Latina
Celso Rigo, empresário gaúcho dono da indústria de beneficiamento de arroz Pirahy Alimentos, fez a maior doação individual da campanha para as eleições de 2022 do deputado federal Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS). O dinheiro somou um total de R$ 60 mil.
O que chama atenção, no entanto, é o fato de Zucco ter sido um dos deputados que sugeriu a criação da CPI do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Isso porque, curiosamente, o MST se destacou nos últimos anos por ser o maior produtor de arroz orgânico da América Latina.
Segundo o Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga), o MST é o maior produtor de arroz orgânico da América Latina há mais de 10 anos. A Pirahy Alimentos, indústria de Rigo, é dona da marca de arroz Prato Fino, a terceira maior beneficiadora do grão no Rio Grande do Sul.
Rigo não foi o único a doar para a campanha de Zucco. André Gerdau, CEO da Gerdau, a maior empresa brasileira produtora de aço, também doou R$ 25 mil à campanha de Zucco.
A Gerdau nutre uma relação com MST marcada por acontecimentos como o fechamento, em 2016, de uma fábrica da Gerdau/Açonorte, em Recife (PE), que foi ocupada por aproximadamente 200 militantes sem-terra.
As doações individuais são permitidas por lei e não são consideradas ilegais. Os montantes doados por Rigo e Gerdau foram registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e estão disponíveis para consulta na plataforma DivulgaCandContas, administrada pela Corte.
Já a CPI do MST foi proposta por Zucco e pelos deputados federais Kim Kataguiri (UB-SP) e Ricardo Salles (PL-SP). O objetivo da comissão é criminalizar ocupações de terra feitas pelo movimento. Na última quarta-feira (15), a CPI alcançou o número mínimo de assinaturas para ser instalada, em uma ação liderada pela bancada ruralista.
Declarações ocorreram em reunião ministerial do governo Jair Bolsonaro, cujas imagens foram divulgadas pelo ministro do STF Celso de Mello
Durante a reunião ministerial do dia 22 de abril de 2020, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, alertou os ministros sobre o que considerava ser uma oportunidade trazida pela pandemia da Covid-19: para ele, o governo deveria aproveitar o momento em que o foco da sociedade e da mídia está voltada para o novo coronavírus para mudar regras que podem ser questionadas na Justiça, conforme vídeo divulgado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello.
Segundo ele, seria hora de fazer uma “baciada” de mudanças nas regras ligadas à proteção ambiental e à área de agricultura e evitar críticas e processos na Justiça. "Tem uma lista enorme, em todos os ministérios que têm papel regulatório aqui, para simplificar. Não precisamos de Congresso", disse o ministro do Meio Ambiente.
O material integra o inquérito que investiga suposta interferência do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal, após denúncias do ex-ministro da Justiça Sergio Moro.
Depois da divulgação do vídeo, o ministro se justificou em uma rede social. "Sempre defendi desburocratizar e simplificar normas, em todas as áreas, com bom senso e tudo dentro da lei. O emaranhado de regras irracionais atrapalha investimentos, a geração de empregos e, portanto, o desenvolvimento sustentável no Brasil", disse Salles.
Declarações de Salles
Salles começou sua fala comentando uma apresentação do ministro da Casa Civil. "Presidente, eu estava assistindo atentamente a apresentação do colega, ministro Braga Neto, e na parte final ali no slide as questões transversais está o Meio Ambiente, mas eu acho que o que eu vou dizer aqui sobre o meio ambiente se aplica a diversas outras matérias", explicou Salles.
Na sequência, ele citou o momento de foco da imprensa na pandemia. "Nós temos a possibilidade nesse momento que a atenção da imprensa está voltada exclusiva quase que exclusivamente pro COVID, e daqui a pouco para a Amazônia, o General Mourão tem feito aí os trabalhos preparatórios para que a gente possa entrar nesse assunto da Amazônia um pouco mais calçado, mas não é isso que eu quero falar", disse o ministro.
"A oportunidade que nós temos, que a imprensa está nos dando um pouco de alívio nos outros temas, é passar as reformas infralegais de desregulamentação, simplificação, todas as reformas que o mundo inteiro nessas viagens que se referiu o Onyx certamente cobrou dele, cobrou do Paulo, cobrou da Teresa, cobrou do Tarcísio, cobrou de todo mundo." - Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente
Na fala seguinte, Salles explica os itens que teriam sido cobrados dos representantes do governo nas viagens internacionais, diz que elas podem ser feitas em atos de governo e que as mudanças são mais questionadas dentro do Ministério do Meio Ambiente.
"A segurança jurídica, da previsibilidade, da simplificação, essa grande parte dessa matéria ela se dá em portarias e norma dos ministérios que aqui estão, inclusive o de Meio Ambiente. E que são muito difíceis, e nesse aspecto eu acho que o Meio Ambiente é o mais difícil de passar qualquer mudança infralegal em termos de infraestrutura, é instrução normativa e portaria, porque tudo que a gente faz é pau no judiciário, no dia seguinte", disse o ministro.
"Então pra isso precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de COVID e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas. De IPHAN, de ministério da Agricultura, de ministério de Meio Ambiente, de ministério disso, de ministério daquilo. Agora é hora de unir esforços pra dar de baciada a simplificação, é de regulatório que nós precisamos, em todos os aspectos." - Ricardo Salles
Salles, que é advogado, citou a importância da participação da Advocacia-Geral da União (AGU) neste esforço. "E deixar a AGU - o André não tá aí né? E deixar a AGU de stand by pra cada pau que tiver, porque vai ter, essa semana mesmo nós assinamos uma medida a pedido do ministério da Agricultura, que foi a simplificação da lei da Mata Atlântica, pra usar o Código Florestal. Hoje já está nos jornais dizendo que vão entrar com medidas, com ações judiciais e ação civil pública no Brasil inteiro contra a medida. Então pra isso nós temos que estar com a artilharia da AGU preparada pra cada linha que a gente avança ter uma coisa", disse o ministro.
"Mas tem uma lista enorme, em todos os ministérios que têm papel regulatório aqui, para simplificar. Não precisamos de Congresso. Porque coisa que precisa de Congresso também, nesse fuzuê que está aí, nós não vamos conseguir aprovar." - Ricardo Salles
"Agora tem um monte de coisa que é só, parecer, caneta, parecer, caneta. Sem parecer também não tem caneta, porque dar uma canetada sem parecer é cana. Então, isso aí vale muito a pena. A gente tem um espaço enorme pra fazer", afirmou Salles.
MST se destacou nos últimos anos por ser o maior produtor de arroz orgânico da América Latina
Celso Rigo, empresário gaúcho dono da indústria de beneficiamento de arroz Pirahy Alimentos, fez a maior doação individual da campanha para as eleições de 2022 do deputado federal Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS). O dinheiro somou um total de R$ 60 mil.
O que chama atenção, no entanto, é o fato de Zucco ter sido um dos deputados que sugeriu a criação da CPI do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Isso porque, curiosamente, o MST se destacou nos últimos anos por ser o maior produtor de arroz orgânico da América Latina.
Segundo o Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga), o MST é o maior produtor de arroz orgânico da América Latina há mais de 10 anos. A Pirahy Alimentos, indústria de Rigo, é dona da marca de arroz Prato Fino, a terceira maior beneficiadora do grão no Rio Grande do Sul.
Rigo não foi o único a doar para a campanha de Zucco. André Gerdau, CEO da Gerdau, a maior empresa brasileira produtora de aço, também doou R$ 25 mil à campanha de Zucco.
A Gerdau nutre uma relação com MST marcada por acontecimentos como o fechamento, em 2016, de uma fábrica da Gerdau/Açonorte, em Recife (PE), que foi ocupada por aproximadamente 200 militantes sem-terra.
As doações individuais são permitidas por lei e não são consideradas ilegais. Os montantes doados por Rigo e Gerdau foram registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e estão disponíveis para consulta na plataforma DivulgaCandContas, administrada pela Corte.
Já a CPI do MST foi proposta por Zucco e pelos deputados federais Kim Kataguiri (UB-SP) e Ricardo Salles (PL-SP). O objetivo da comissão é criminalizar ocupações de terra feitas pelo movimento. Na última quarta-feira (15), a CPI alcançou o número mínimo de assinaturas para ser instalada, em uma ação liderada pela bancada ruralista.
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