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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

02
Out23

Maioria apoia criminalizar Bolsonaro por pandemia

Talis Andrade
 
 
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• Povo quer prisão para Bolsonaro • Crimes da pandemia não devem ficar impunes • Epidemia de suicídios no Brasil

 

por Gabriel Brito

Num tempo em que muito se fala de jóias roubadas, a sociedade terá esquecido o grande crime do ex-presidente: sua negligência e sabotagem à Saúde Pública durante a pandemia? O Instituto Sou Ciência, ligado à Unifesp, realizou pesquisa para saber até que ponto os brasileiros responsabilizam Bolsonaro pelo desastre sanitário e defendem sua criminalização. Resultado: 62% dos brasileiros consideram o ex-presidente e o ministério da Saúde — chefiado na maior parte do período pandêmico pelo general Eduardo Pazuello — diretamente responsáveis pela alta taxa de infecções e mortes que assolaram o país. Ainda de acordo com o levantamento, 51% defendem sua responsabilização jurídica e penal, com base nos encaminhamentos do relatório final da CPI da pandemia, que para boa parte dos entrevistados serviu como plataforma de esclarecimento sobre os crimes contra a saúde pública do governo anterior.

Vale lembrar um dos estudos marcantes a respeito. Ainda em 2021, o trabalho Linha do tempo da estratégia federal de disseminação da covid-19,coordenado por Deisy Ventura, documentou centenas de decisões administrativas da gestão Bolsonaro que tiveram o claro viés de facilitar a disseminação do coronavírus em território nacional. A autora é , jurista e professora da Faculdade de Saúde Pública da USP.

 

Sabotagem, justiça e reparação

Na pesquisa do Sou Ciência, os cidadãos também foram inquiridos a respeito de quais seriam as melhores alternativas de compensação à sociedade pelos danos causados pelo governo negacionista. Como mostra matéria da Agência Brasil, os três itens mais mencionados foram: “criar uma Comissão da Verdade para apurar os crimes (44,7%); indenizar as vítimas, crianças que perderam pai e/ou mãe (39%); criar um Tribunal Especial para acelerar os julgamentos (38,3%)”. Outro aspecto importante da pesquisa é a diferença de adesão a vacinas entre eleitores de Bolsonaro e Lula, indício indireto da influência do ex-presidente na sabotagem da devida política sanitária para a pandemia. O relatório final da CPI da pandemia, encerrada em novembro 2021, pediu o indiciamento de 80 pessoas e imputou nove diferentes crimes a Jair Bolsonaro. Cabe à Procuradoria Geral da República dar seguimento ao processamento jurídico dos imputados. Em caso de omissão, a tarefa cabe ao conjunto do Ministério Público Federal. Caso nada seja feito por tais instituições, o tema pode parar no STF.

 

Um lado oculto da tragédia: suicídios aumentam no Brasil

Pesquisadores do Instituto Leônidas & Maria Deane, da Fundação Oswaldo Cruz no Amazonas (ILMD/Fiocruz Amazônia), analisaram dados de óbitos durante a pandemia a fim de analisar as taxas de suicídio do período e descobriram mais uma faceta invisível da tragédia: o aumento do número de suicídios no Brasil. “Houve 28% de suicídios além do esperado em mulheres com 60 anos ou mais da região sudeste”. No Norte e Nordeste, o aumento foi ainda maior — 32% e 61%, respectivamente, entre mulheres na faixa de 30 a 59 anos, informou a Agência Brasil. A pesquisa aponta que, num período particularmente grave da pandemia — entre os meses de julho e outubro de 2021–, registrou-se o ‘alarmante excesso de suicídios de 83% em mulheres com 60 anos e mais do Nordeste’”, agrega a reportagem. Neste mês, o ministério da Saúde promove a campanha Setembro Amarelo, que visa a prevenção do suicídio e orienta pessoas que pensam em tirar a própria vida a buscarem ajuda na Rede de Atenção Psicossocial do SUS, além de estratégias de acolhimento e ajuda ofertadas por outras ações e instituições.

 

As causas e as novas estratégias contra o suicídio

No final do mês, a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) promoverá a 60ª reunião de seu Conselho Diretor. Participarão do encontro gestores e autoridades de saúde dos países do continente. Segundo o presidente da OPAS, Jarbas Barbosa, a elaboração de novas políticas acerca do suicídio serão prioridade. A pandemia da COVID-19 exacerbou ainda mais os fatores de risco para o fenômeno, incluindo desemprego, insegurança financeira e isolamento social. “Continuaremos a apoiar a educação e o treinamento de profissionais de saúde e o fortalecimento dos sistemas nacionais de vigilância para informar o desenvolvimento de estratégias de prevenção ao suicídio adaptadas localmente”, afirmou Barbosa. Nos anos 2000, o continente americano é o único do mundo que observou aumento das taxas de suicídio na população, com alta de 17%.

 

Aborto livre: o México atrairá as norte-americanas?

Os movimentos feministas das América Latina comemoraram, na última quarta-feira (6/9), a descriminalização do aborto no México, por decisão da Suprema Corte. Mas vale acompanhar um possível desdobramento importante — e curioso. Acossadas pela justiça de seu próprio país (onde a Corte Suprema recuou da garantia do mesmo direito), mulheres norte-americanas cruzarão a fronteira para interromper a gravidez indesejada? Nos EUA, certos estados agora proíbem o procedimento mesmo em casos de violência sexual. Diante dos retrocessos sociais e culturais na maior economia do mundo, o antigo “quintal” será a alternativa? Vale conferir. Enquanto isso, a Igreja Católica do México usou de um argumento inusitado contra a decisão da Suprema Corte. Falou em “discriminação contra as mulheres que decidiram ter filhos”, supostamente preocupada com as possíveis chantagens dos empregadores, ou desvantagens das mães no mercado de trabalho.

 

Clima: diante dos desastres, governos omissos

Após mais um fracasso nos debates sobre políticas de contenção do colapso ambiental, desta vez na cúpula do G-20, na Índia, o mundo segue a contabilizar tragédias. Enquanto o Brasil se depara com os imensos desafios de reconstrução das cidades gaúchas destruídas pelo ciclone extratropical, a Líbia conta 150 mortes provocadas pela tempestade Daniel. Na abertura da 54a. Reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU, Volker Turk, comissário das Nações Unidas para o tema, lamentou o vazio de decisões da cúpula de Nova Déli e afirmou que, em relação aos efeitos do aquecimento global, “o futuro distópico já começou”. Enquanto isso, o Brasil, que celebrou o Dia do Cerrado nesta segunda, 11, vive intensamente os embates entre setores que visam a criação de uma economia sustentável com aqueles que ainda tentam reproduzir práticas cada vez mais destrutivas, como se pode ver na entrevista de Marina Silva à Agência Pública publicada no dia 6.

14
Set23

A oportunidade de discutir o papel das Forças Armada

Talis Andrade

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Escândalos de corrupção. Gestão nebulosa. Ameaças ao Congresso e STF. CPMI dos atos terroristas de 8 de janeiro. Jandira Feghali  aponta nomes de generais golpistas. Aos poucos, a sociedade tem um conhecimento menos idealizado e mais real dos militares. Momento deve ser aproveitado para reafirmar o controle civil e garantir transparência

por Glauco Faria

Ainda não se sabe qual o teor da delação do ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, o tentente-coronel Mauro Cid, e o grau de comprometimento que seu depoimento pode trazer para alguns generais e oficiais das Forças Armadas tanto no caso das joias como também na preparação para a tentativa de golpe após os resultados das eleições presidenciais de 2022. A Operação Perfídia trouxe ainda um outro dano à imagem de um dos principais nomes do governo anterior, o general Walter Braga Netto, que teve o sigilo telefônico quebrado pela Justiça por conta de uma investigação a respeito de possíveis fraudes no processo de contratação de coletes balísticos.

Os dois casos abalam uma imagem que os militares sempre tentaram cultivar no imaginário popular, a de que, diferentemente dos políticos e civis de uma forma geral, a instituição estaria livre da corrupção, uma praga nacional, zelando sempre pelo interesse público. E podem ainda escancarar a falta de compromisso de parte do generalato com princípios básicos de qualquer regime democrático, como o simples respeito ao resultado eleitoral.

A maior parte dos golpes de Estado no mundo costuma contar com um sentimento antipolítica muito forte em meio à sociedade. Afinal, é necessário ter apoio de segmentos sociais não só para apear quem pode ser tido como adversário do poder, mas também para permanecer nele. E, em geral, desmoralizar o oponente por meio do exaurido lema da luta contra corrupção é uma das principais armas de quem quer usurpar o poder de modo ilegal.

No Brasil, foi assim que o udenismo combateu o segundo governo de Vargas, sem conseguir êxito por conta do suicídio do presidente. Mais adiante, o mesmo segmento se aliou aos integrantes das Forças Armadas – que já ensaiavam o golpe contra o governo getulista – para derrubar João Goulart em 1964, agora investindo pesadamente também em um anticomunismo radical, o que o unia mais ao ideário da caserna. Uma vez no governo, os militares buscaram passar durante boa parte do tempo uma imagem de busca pelo conhecimento técnico para governar, como se fossem quase apolíticos, apoiados em gestores tecnocratas civis para gerir a área econômica.

Em 2018, todos estes elementos que forjaram parte da história do autoritarismo e do golpismo no Brasil estavam presentes nas eleições presidenciais: o anticomunismo, o “técnico” que cuidaria da economia (sempre bem apoiado por parte da mídia tradicional e pelo chamado mercado) e também pelo discurso anticorrupção. Tudo embalado num discurso contrário à política e aos políticos, ainda que capitaneado por alguém que viveu quase três décadas praticamente inerte na Câmara dos Deputados.

Se os nomes dos partidos e das figuras que os representavam mudou nesta linha do tempo, parte dos protagonistas continuou vestindo farda. A falta de uma Justiça de Transição e a estrutura autoritária da sociedade brasileira fez com que durante muito tempo este militares saíssem incólumes, sem responder pelas suas ações como aconteceu nos países vizinhos. Isso os protegeu também de arcarem com os custos simbólicos, já que, para boa parte da população, os integrantes das Forças, uma vez no poder, não teriam praticado atos de corrupção como os presidentes civis.

Nada mais falso. É evidente que qualquer ditadura que se preze não só não tem transparência nos atos administrativos como pratica a censura e controla, por diversos meios, a possível eclosão de escândalos e divulgação de malfeitos.

Como lembrou o professor de História Pedro Henrique Pedreira de Campos, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Pedro Campos, nesta entrevista, “a ditadura militar foi um celeiro de corrupção”. Também autor do livro Estranhas Catedrais (Eduff), lançado em 2014, houve então “um ambiente extremamente propício de escalada dos interesses empresariais e privados sobre o Estado brasileiro, tendo em vista o cerceamento dos mecanismos de fiscalização e o aparelhamento do Estado por agentes do setor empresarial privado”.

“Os militares se locupletaram nesse processo. Eles se favoreceram muito na atuação empresarial naqueles anos. Era uma ditadura empresarial-militar e eles ganharam postos nas empresas e há várias denúncias de que eles recebiam propinas”, pontua.

 

Longe e perto dos holofotes

Após o fim da ditadura, os militares continuaram atuando no cenário político, mas de forma muito mais discreta, em especial para defender a história da própria instituição e, principalmente, seus generais. Nem mesmo os ex-políticos que haviam feito parte do regime defendiam publicamente as supostas virtudes do regime que se encerrava. A ausência na transição do trabalho de memória e justiça fez com que, décadas depois, o panorama mudasse e o regime autoritário passou a ser exaltado por parte da classe política e, obviamente, pelos integrantes das Forças Armadas abertamente. Mesmo a tortura, antes negada ou tratada dentro da seara de fatos isolados, agora era assumida orgulhosamente por muitos, com torturadores sendo elogiados inclusive por aquele que viria a se eleger presidente em 2018.

Mas é a eleição de 2018 que traz a farda de novo ao centro do palco. Relatório elaborado em 2021 pelo Tribunal de Contas da União (TCU) apontou que na gestão Bolsonaro o governo federal mais que dobrou o número de militares em cargos antes ocupados por civis. No último ano do governo Temer, 2.765 militares ocupavam cargos do governo federal e, em 2021, chegavam a 6.175.

Se havia ocupação na máquina do Estado, isto era ainda mais pronunciado em postos-chave da administração do Executivo. Em fevereiro de 2020, os militares controlavam oito dos 22 ministérios, proporção maior que a de alguns presidentes da ditadura.

No Planalto, o círculo de confiança do presidente era verde-oliva. Um levantamento feito pelo The Intercept e divulgado em agosto mostra ainda que Bolsonaro trouxe nada menos que 79 alunos da sua turma, graduados no mesmo ano ou que conviveram com ele nos quatro anos de curso na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), para seu governo. No rol, nomes como o do próprio Braga Neto, e o de Luiz Eduardo Ramos, ex-ministro da Casa Civil, das Secretarias Geral e de Governo, um dos articuladores da criação do malfadado orçamento secreto, talvez o mais emblemático retrocesso institucional ocorrido durante aquela gestão.

Com tal exposição e graças a mecanismos de transparência, fiscalização e controle que foram construídos e consolidados após o fim da ditadura, os militares passaram a se ver envolvidos de forma direta ou indireta em diversos casos de denúncias de corrupção ou similares, que envolviam desde episódios de negociações de compra de vacina com preços 1.000% maioresdo que os anunciados pelo fabricante, uso irregular de recursos voltados ao combate da pandemia e compra superfaturada de Viagra. Agora, sem possibilidade de o Executivo barrar investigações e com a tentativa de golpe do 8 de janeiro sendo apurada, mais nomes vêm à tona.

 

Transparência e isonomia

Se o envolvimento de militares no governo Bolsonaro traz para a sociedade uma imagem menos idealizada e mais real de que disciplina, hierarquia e uma dita tradição não impedem corrupção, o verdadeiro remédio que a combate precisa ser também aplicado à caserna. E aqui não se trata especificamente de punição, também necessária quando prevista em lei, e sim de prevenção.

Relatório produzido pelo grupo de transição do atual governoresponsabilizou as Forças Armadas pelo que considerou um verdadeiro apagão da transparência no governo federal durante a gestão Bolsonaro, com casos reiterados de descumprimento da Lei de Acesso à Informação. De acordo com o documento, houve uma “forte tendência de sempre ou quase sempre se considerar ‘pessoais’ informações sobre integrantes do Exército que não seriam informações pessoais para servidores civis”. Isso envolve o impedimento de se acessar, por exemplo, notas fiscais de compras públicas, documentos de pregões eletrônicos, empresas que firmaram contratos com a Força, e negativa de acesso à lista de passageiros e a custo de voos oficiais feitos pela Aeronáutica.

Por isso, mas não só, o controle civil sobre as Forças Armadas, como preconiza a Constituição, é essencial. Para garantir tratamento isonômico em relação ao resto da estrutura do Estado e garantir transparência nos atos. E, ainda mais fundamental, para não ter a democracia formal sob ameaça constante de um poder armado.

Ainda hoje existe uma tolerância muito grande à intromissão fardada em assuntos que não seriam do seu escopo. A interferência na vida pública talvez tenha tido uma de suas ilustrações mais vivas em um episódio de julho de 2021, da CPI da Covid, quando o então presidente do colegiado, senador Omar Aziz (PSD-AM), afirmou que “os bons das Forças Armadas devem estar muito envergonhados com algumas pessoas que hoje estão na mídia, porque fazia muito tempo, fazia muitos anos que o Brasil não via membros do lado podre das Forças Armadas envolvidos com falcatrua dentro do governo”.

Em seguida, o Ministério da Defesa chefiado por Braga Netto e os comandantes das Forças Armadas divulgaram nota oficial apontando que Aziz teria dado declarações “desrespeitando as Forcas Amadas e generalizando esquemas de corrupção”. “As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro”, dizia ainda o documento.

Mesmo com Aziz destacando que havia “bons” e separando uma “banda podre”, a reação institucional foi desproporcional e em tom intimidatório. O presidente da CPI cobrou uma posição do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que no mesmo dia da nota prestou homenagem às Forças Armadas, sem citar o episódio. Aziz reagiu: “Pode fazer 50 notas contra mim, só não me intimidem. Porque quando estão me intimidando, Vossa Excelência não falou isso, estão intimidando essa Casa aqui também. Vossa Excelência não se referiu à intimidação que foi feita pela nota das Forças Armadas.”

Generais também ameaçaram outras instituições, como à época em que o general Villas-Bôas, então comandante do Exército mandou recado ao Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o julgamento da prisão após condenação em segunda instância. O fato de, em ambos os casos, a resposta ter sido tímida ou nula do ponto de vista institucional, evidencia o tamanho da ingerência militar e a dimensão do problema que o Brasil ainda não resolveu.

A desconstrução da imagem de um poder infalível que a participação da caserna no governo Bolsonaro trouxe para muitos é positiva, apontando que militares, em especial os de alta patente, não podem estar acima da lei. A mudança de parte da opinião pública pode ser uma oportunidade para iniciar, ao menos, um outro tipo de cenário em que cumpra simplesmente o que se prevê na Constituição, onde o papel das Forças é desenhado. Sem isso, a tutela que nasceu já na construção da própria República seguirá como fardo que impede a construção de uma real democracia.

29
Jul23

Relatórios comprovam atuação criminosa de Bolsonaro em plena pandemia

Talis Andrade
Jair Bolsonaro fazendo propaganda da cloroquina (Foto: reprodução)

 

Documentos que estavam sob sigilo na Abin e GSI confirmam que Jair Bolsonaro escondeu alertas de especialistas em plena pandemia de Covid-19 que matou mais de 700 mil pessoas no país

 

04
Jul23

Antes tarde que nunca: enfim impõem-se limites a Bolsonaro

Talis Andrade

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Punição ao ex-presidente chega com anos de atraso, confirmando impressão de que o Judiciário brasileiro só se atreve a tocar em políticos em declínio. Uma democracia bem fortificada, porém, deveria agir mais cedo

 

 

por Thomas Milz

DW

Com 5 votos a 2, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) condenou Jair Messias Bolsonaro. A maioria dos juízes entendeu que o então presidente cometeu abuso de poder político em 18 de julho de 2022, quando disse mentiras sobre o sistema eleitoral brasileiro a embaixadores estrangeiros especialmente convidados. Segundo ele, as urnas teriam seriam fraudadas para favorecer seu principal adversário, Luiz Inácio Lula da Silva, e a Justiça Eleitoral seria parte da conspiração.

As fake news de Bolsonaro sobre as urnas supostamente manipuladas copiaram as de seu ídolo Donald Trump. E tanto nos Estados Unidos como no Brasil, uma multidão foi instigada pelas teorias da conspiração a invadir o Capitólio e a Praça dos Três Poderes, respectivamente. No caso de Bolsonaro, a violência de 8 de janeiro de 2023 fez com que o lento e preguiçoso TSE finalmente agisse rapidamente. Bolsonaro está fora do cargo há apenas seis meses.

Ainda assim, o Judiciário reagiu tarde demais. Durante mais de 30 anos, permitiu-se que o populista de direita realizasse sua sabotagem contra a democracia sem ser perturbado, primeiro no Congresso e depois no Palácio do Planalto. Ele agrediu verbalmente seus adversários, pediu o assassinato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e insultou Dilma Rousseff da pior forma possível durante a votação do impeachment, dedicando seu voto ao repugnante carrasco Brilhante Ustra.

Mesmo como presidente ele disseminou notícias falsas sem ser incomodado, destruindo deliberadamente a confiança de milhões de pessoas nas instituições e causando milhares de mortes adicionais pelo coronavírus. E ninguém impediu o incendiário. O fato de o Judiciário ter se oposto às fantasias golpistas do então presidente no final de seu mandato deve-se exclusivamente ao presidente do TSE, Alexandre de Moraes, que não se deixou intimidar por Bolsonaro e sua turba raivosa.

Bolsonaro não poderá disputar eleições por oito anos. Isso se a sentença proferida nesta sexta-feira (30/06) resistir a eventuais recursos da defesa, inclusive ao Supremo Tribunal Federal (STF). O próprio Bolsonaro parece ter pouca esperança, como mostra seu discurso de vítima. A iniciativa de parlamentares leais a ele de apresentar uma lei especificamente para salvar seu direito de disputar eleições também promete pouco sucesso.

 

Registro indigno para o cargo de presidente

 

Até a derrota apertada para Lula em outubro passado, Bolsonaro não apenas havia vencido todas as eleições que disputou, mas também ajudou toda a sua família – filhos e ex-mulheres – e numerosos aliados a obter vitórias nas urnas. E, assim, garantiu-lhes acesso a todos os benefícios da democracia brasileira: levou dezenas de parentes e associados a cargos estatais bem remunerados, por meio dos quais eles provavelmente tiveram que ceder parte de seus salários ao clã Bolsonaro. Os casos de parasitismo conhecidos como "rachadinha" precisam ser urgentemente investigados pelo Judiciário. Será que as Cortes se atreverão?

Bolsonaro ainda é alvo de outros 15 processos no TSE relacionados à campanha eleitoral de 2022. Mas o ex-militar também tem que responder por suas fake news sobre a covid-19, pelo escândalo do desvio de joias no valor de milhões de dólares e por tentativa de subversão. É um registro completamente indigno para o cargo de presidente que Bolsonaro tem a mostrar depois de quatro anos no comando do país. O Judiciário poderia ter poupado a democracia brasileira se tivesse agido de forma mais rápida e consistente. De qualquer forma, o julgamento proferido agora ainda pode quebrar o gelo e dar coragem aos demais juízes para condenarem Bolsonaro em outras ações.

 

Políticos intocáveis em seu auge

 

Contudo, permanece a impressão de que os tribunais só se atrevem a tocar em políticos que estão em declínio. Já havia sido o caso de Lula, que não foi prejudicado pelo escândalo do Mensalão em 2006, quando sua popularidade era alta. Então em 2017, quando o político aposentado estava manchado por anos de fogo constante da mídia em torno do escândalo da Lava Jato, vieram as condenações. Como os ventos políticos voltaram a favorecer Lula, ele não tem nada a temer do Judiciário. É claro que isso cheira a oportunismo.

Também entre os apoiadores de Bolsonaro, há a sensação de que o Judiciário não está agindo tão cegamente – e, portanto, imparcialmente – como deveria. Para eles, a condenação de Bolsonaro é mais uma prova da suposta corrupção do sistema.

Esse é o reflexo de o judiciário não ter tomado medidas consistentes contra Bolsonaro anos atrás. Como diz o ditado: é preciso cortar o mal pela raiz.

Ao final de seu voto, o presidente do TSE Alexandre de Moraes proclamou o resultado que, com placar de 5x2, tornou Jair Bolsonaro (PL) inelegível até 2030.

29
Jun23

Reconquistas na saúde

Talis Andrade
 
 
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Nísia Trindade fica!  A urgente reafirmação do SUS e da saúde como um direito

 

por Amélia Cohn

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De 2016 a 2022 o SUS foi alvo de ataques contra sua viabilização financeira, seus princípios de universalidade, equidade e integralidade. No primeiro governo pós-golpe de 2016, com o impedimento de Dilma Roussef, por meio da desconstrução do SUS: mantinha-se o seu arcabouço, mas o corroía por dentro, como no jogo dos palitos da infância de muitos de nós.

O jogo consistia em retirar palitos de um conjunto jogado aleatoriamente sem mexer os demais, para que se lembrem. Asfixia-se orçamentariamente o SUS com o teto de gastos no orçamento federal, e em consequência se precarizam as relações de trabalho dos profissionais de saúde e privatiza-se a administração direta dos serviços estatais de saúde. Programas de saúde são excluídos ou drasticamente reduzidos, tudo em nome da eficiência do mercado versus ineficiência do Estado, e da responsabilização privada das famílias pela sua saúde, segundo a clássica cartilha neoliberal.

A partir de 2019 o jogo político embrutece, e a saúde torna-se um dos seus principais alvos, seja pelo volume de recursos que envolve, pela capilaridade social do SUS, pelos interesses econômicos abarcados pela saúde, o governo de Jair Bolsonaro (2019-2022) ataca a saúde, historicamente objeto dos desejos dos governantes. O ataque é frontal e brutal contra o SUS. E justamente quando somos atingidos (e não de surpresa, pois teríamos tido três meses “de vantagem” com relação aos países desenvolvidos para nos prepararmos) pela epidemia do SARS-CoV 19. A tragédia foi avassaladora. Mais de 700 mil mortos. E que seriam milhares a mais, não fosse exatamente a resistência e a capacidade do SUS, mesmo sucateado e boicotado, reagir.

Esse sucateamento durante a gestão de Jair Bolsonaro não ocorreu somente no que diz respeito à supressão de boa parte dos programas, do esvaziamento de outros, mas também no que tange à demolição virulenta do Ministério da Saúde. Seus quadros técnicos foram expurgados e no seu lugar foram nomeados, em sua imensa maioria, militares ignorantes na área da saúde, mas com fortes convicções privatistas e lucrativas do que deveria ser a política desse ministério.

Por exemplo, saúde da mulher, nem pensar, pois era contrária aos valores do modelo “da família exemplar”. Educação sexual de crianças e adolescentes tampouco, pois isso incitaria ao sexo precoce dos adolescentes, e por aí vai. Em nome da moral e dos bons costumes, um ministro da saúde que só ouviu falar e foi ver do que se tratava o SUS após sua nomeação, um militar da área de logística do exército, toma as rédeas da saúde em plena pandemia.

O desastre não se faz esperar e os resultados catastróficos são bem conhecidos. O ministro seguinte segue a mesma política, mas talvez por ser formado em medicina e ter que preservar seu diploma não permanece muito tempo no governo. E vem então um outro ministro, também médico e dono de poderosa rede de saúde em um estado do Nordeste, e aprofunda a política de destruição do ministério da saúde e do SUS, chegando a propor em 2022 que fosse criado um outro formato de atendimento na assistência médica, a Open Health, que disponibilizaria todas as informações dos usuários dos serviços de saúde, públicos e privados, entre si, visando “maior eficiência” do subsetor privado de saúde. Significativo que fosse uma proposta inspirada do Open Banking, em vigor desde 2021 no país.

No setor da política científica, incluída aí a da área da saúde, o mesmo foi feito. Não só via desfinanciamento do ensino público, da pesquisa e da formação de pesquisadores, mas também via promoção do descrédito da ciência em prol da crença. E com isso campanhas de boicote à vacinação – contra Covid e demais enfermidades contagiosas – e a promoção de utilização de medicamentos ineficientes para o combate do vírus. Destrói-se o PNI, Programa Nacional de Imunizações, que pela sua excelência fez o país ser reconhecido internacionalmente como modelo de cobertura vacinal da população. Cloroquina e ivermectina, recusadas até pelas emas do Planalto, são distribuídas entre os yanomamis. E o Brasil passa então a ser reconhecido internacionalmente não pelos êxitos e conquistas graças aos 30 anos de construção do SUS, mas pela letalidade das políticas de saúde a partir de 2016, e aprofundada a partir de 2019.

O que restou desses anos de políticas de abate social? Ao lado de altas taxas de mortalidade durante a pandemia, a aguda falta de cobertura vacinal, a ignorância sobre a violência advinda das agressões sexuais, no geral de origem doméstica, que redundam em altas taxas de gravidez dentre nossas adolescentes, da alta  da mortalidade materna, a visibilidade do SUS pelo seu lado positivo e afirmativo: a resistência de nosso sistema público de saúde no atendimento aos acometidos pela Covid, sobretudo por parte não só de iniciativas estaduais e municipais exemplares (o governo federal fez-se presente pela sua ausência e irresponsabilidade diante dessa “gripezinha”), mas sobretudo dos recursos humanos, que demonstraram seu compromisso com a saúde enquanto um bem público.

É oportuno registrar um fato inédito: enquanto no Amazonas faltava oxigênio nos hospitais por absoluta inoperância (proposital?) do Estado nacional, os ricos da região alugavam aviões para serem transportados para as capitais do sudeste do país, sobretudo São Paulo, para serem tratados pelo setor privado. Até que este, superlotado, avisa que não atenderá mais esses pacientes potenciais; e ainda é levado a pedir socorro ao SUS porque sua infraestrutura não estava mais dando vazão à sua demanda. Pela primeira vez que se tem notícia o setor privado recorre ao SUS.

Mas diante desse quadro de horror, tem-se a vitória de Lula, e em 2023 tem início o novo governo. Evidencia-se então um giro de 180o na direção da política de saúde no país. É nomeada Nísia Trindade, historiadora de formação, e primeira mulher a ocupar o posto na história brasileira. Embora importante, não se trata aqui de enfatizar a questão de gênero aí implicada, e sim o seu perfil profissional, que em termos de definição das políticas de saúde que o ministério está e irá definir, revela-se estratégico.

Nísia Trindade desenvolveu sua trajetória profissional com a experiência de ensino em escola pública, e posteriormente como pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz. Destacou-se por seus trabalhos acadêmicos, mas sobretudo por seu perfil de “construtora” de instituições. Destacou-se como militante institucional na Fiocruz, conseguindo até ser nomeada a primeira presidente da instituição mesmo com a ferrenha oposição do então chefe de governo, e consolidou as ideias, fundamentos e propostas da Reforma Sanitária a partir dessa instituição.

Não se poupou de participações em encontros e eventos da saúde e em defesa do SUS, mas deles participou com um mescla de expertise no campo e militante institucional com enorme capacidade de “costura” (o termo pode pegar mal por ser uma mulher…) entre distintos interesses e disputas de poder sem, no entanto, se identificar como uma personalidade da política do sistema brasileiro. Não disputou cargos eletivos por partidos políticos, nem executivos em governos da administração direta.

E por que esse seu perfil é trazido à baila? Exatamente porque é ele que, associado à sua habilidade na micropolítica, permite que a ministra avance na agenda da reconstrução do SUS, uma vez que não disputa forças políticas no interior do campo político que compõe o governo, e com isso fazendo com que, de um lado, as disputas pela pasta se situem fora do campo de sua atuação, e de outro, libera-a para enfrentar as grandes questões e disputas de interesses econômicos no interior do próprio setor.

Mas tem mais: Nísia Trindade inicia sua gestão já com atuações imediatas de reconstrução e de retomada de programas de saúde caras ao movimento sanitário e aos defensores do SUS. Mesmo quando, após a lei 8080/1990 se tratava de começar a construir o SUS, talvez não se tenha visto anteriormente uma experiência no Ministério da Saúde de tantas ações imediatas após a posse do titular da saúde.

Não são somente os programas que são retomados; essa retomada se dá a partir de uma nova linha sistemática de sua articulação: tendo como carro chefe o Complexo Econômico Industrial da Saúde enquanto vetor de desenvolvimento, esses programas são retomados com o traço de se buscar a transversalidade entre eles, e deles com os demais programas, econômicos e sociais. Isso, embora sempre buscado na construção do SUS, agora não se trata mais de adendos ao acesso à saúde, mas de como articulá-los entre si. Toma-se como exemplo, aqui, a Farmácia Popular, que ao disponibilizar acesso gratuito às mulheres de medicamentos anticonceptivos, por exemplo, estreita as relações das usuárias do SUS com o programa Saúde da Mulher. Esse é somente um exemplo.

De fala mansa, mas de atitudes firmes e ações consistentes, a ministra da saúde vai avançando na busca da governabilidade e da governança com os principais sujeitos envolvidos – representantes do legislativo e do executivo – no que diz respeito diretamente à saúde e ao SUS. Já no que diz respeito ao fato de a pasta da saúde ter sido historicamente sempre o objeto do desejo das forças políticas privatistas e retrógadas, essa questão fica por conta da macro política, das negociações entre Executivo e Legislativo. O presidente Lula tem dado sinais de apoio à ministra em vários momentos; não há, porém, como fazer com que esse apoio explícito se garanta sem uma forte mobilização social de apoio ao SUS e ao que ele representa em termos de avanço na ordem democrática do país.

O que a experiência desses quase seis meses de governo Lula mostra é que negociar a saúde em nome da governabilidade é dar tiro no pé, pois a direita é insaciável, e o próprio setor privado da saúde, não fosse a sua financeirização, também está vendo sua lucratividade, no que diz respeito estritamente à assistência médica, diminuir.  E segundo, e fundamental, a saúde é um bem público de consumo coletivo inegociável. O terceiro ministério em termos orçamentários, com a capilaridade que conquistou na construção do SUS, sobretudo nos governos petistas, será sempre objeto do desejo das forças políticas retrógadas. Mas é necessário que fique claro para a sociedade que a saúde é inegociável!

O desafio, portanto, consiste em como fazer com que o SUS e o direito à saúde, sobretudo neste momento que passam a ser alvo da ganância insaciável do que há de mais retrógado em nosso país, mobilizem a sociedade em sua defesa, tornando também os movimentos sociais transversais em suas demandas. No período mais recente o país foi palco de forte mobilização social pela saúde, haja vista as mais de 100 conferências livres realizadas a partir da iniciativa Frente pela Vida, e em breve haverá a realização da 17a Conferência Nacional de Saúde. Eventos promissores em termos da mobilização social. Mas que não impediram, por exemplo, que no “Conselhão”, dos 11 representantes da área da saúde indicados somente uma represente os ideais do SUS e da saúde como um direito, os restantes sendo do setor privado.

É inegável que a saúde aumentou sua mobilização nesse período. Resta agora estourar a bolha e fazer com que ela seja apropriada também pelos demais movimentos sociais e suas lideranças. Somente com forte apoio da sociedade e das lideranças dos distintos movimentos sociais poderá a ministra da saúde seguir os passos que vem dando de forma competente, e o executivo resistir aos avanços gananciosos dos representantes do mercado da saúde. E que os não pobres da classe média alta para cima não se fiem no mercado da saúde para garantir assistência médica para si. Esse já dá fortes mostras de ser incapaz de cobrir as necessidades da saúde mesmo dos 25% da população brasileira coberta por ele! Suas filas de espera para a realização de exames de média e alta complexidade já competem com aquelas do SUS.

Mais que nunca, o SUS para todos representa garantia do direito à saúde de toda a população! Nísia Trindade fica!

04
Mai23

Por que Bolsonaro falsificou o atestado de vacina?

Talis Andrade

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Porque defendia a imunidade de rebanho, realizou uma estratégia de propagação da Covid-19, militarizando o Ministério da Saúde, retardando a aquisição de vacinas, propagando e distribuindo medicamentos ineficazes

 

Enquanto o país se aproxima do pico da pandemia do novo coronavírus, os brasileiros esperam que o presidente Jair Bolsonaro seja "sensível" e "perceba a dimensão" da crise.

É essa avaliação do jurista Joel García Hernández, o presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, órgão ligado à OEA (Organização dos Estados Americanos), em entrevista exclusiva à BBC News Brasil no dia 1 de maio de 2020.

"É tempo de reconhecer a magnitude do problema e tomar medidas. Não ajuda politizar neste momento. Essa é hora de todos os atores do país estarem unidos em torno de um objetivo comum: lidar com a questão de saúde. Ninguém quer que uma crise de saúde se transforme numa crise de direitos humanos", diz. "Essa é a nossa preocupação no hemisfério."

Para Hernández, que também é relator para o Brasil no órgão internacional, a pandemia não é o momento para "politizar problemas".

O Ministério da Saúde informou nesta 3ª feira (2 maio 2023) que foram registradas 339 mortes por covid-19 na última semana epidemiológica (23-29 abril). Ao todo, são 701.833 vítimas da doença no Brasil desde o início da pandemia. Foram contabilizados 38.553 novos casos no mesmo período. No total, o país soma 37.487.971 diagnósticos confirmados.

Ricardo Senra perguntou para Hernández:

Quando avisado que o Brasil tinha mais de 5 mil mortes, mais que o registrado na China, o presidente Jair Bolsonaro respondeu: 'E daí? O que você quer que eu faça?". Como vê a maneira como o brasileiro tem lidado com a crise?

O presidente tem sido descrito como um negacionista do coronavírus - alguém que não segue orientações da ciência quando o tema é a pandemia. Poucos líderes mundiais têm essa postura: ele não suporta medidas de isolamento forçado e diz que pessoas deveriam voltar ao trabalho. Como vê?

- Bolsonaro é alvo de uma nova queixa apresentada ao Tribunal Penal Internacional (TPI) por crimes contra a humanidade graças a seu comportamento da pandemia de coronavírus. Este é o segundo conjunto de acusações no TPI - o primeiro destaca "políticas genocidas" em relação à população indígena. Algumas pessoas têm associado o termo genocida ao presidente. Ele se aplica?

Veja aqui as respostas  de Hernández. 

Quatro anos depois o Brasil descobre que o presidente Bolsonaro fraudou o cartão de vacina. Um crime menor, cometido por um genocida. Fica explicado que o presidente realizou um programa de sabotagem à vacinação da Covid-19, motivado pela crença da imunidade de rebanho, e pela execução de uma estratégia de propagação do vírus, que motivou milhares de mortes. Um genocídio historiado no relatório da CPI da Covid. Vide tags

03
Abr23

Militares gastaram R$ 703,4 mil da Covid em salgados e carnes nobres, aponta TCU

Talis Andrade
 

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por Jéssica Sant'Ana /Globo


Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) constatou que os militares gastaram R$ 703,4 mil que deveriam ser usados para o reforço alimentar da tropa empregada em ações de enfrentamento ao Covid-19 em coquetel e carnes nobres.

Segundo a auditoria, foram gastos:

 

  • R$ 255.931,77 com salgados típicos de coquetel, sorvetes e refrigerantes, que, muito provavelmente, não teriam sido utilizadas para o reforço alimentar da tropa empregada na Operação Covid-19; e
  • R$ 447.478,96 com carnes bovinas de cortes nobres, filé mignon e picanha.

 

Questionados, o Ministério da Defesa e o Exército não tinham se manifestado até a última atualização desta reportagem.

LEIA TAMBÉM:

Com relação às carnes nobres, os auditores relataram que as normas internas do Exército autorizam a compra de cortes bovinos nobres, porém, considerando o contexto pandêmico, as aquisições infringiram os princípios da razoabilidade e do interesse público.

"Constatou-se que tais aquisições, por terem sido realizadas no contexto de crise social e econômica vivenciada pelo Brasil, com recursos oriundos de endividamento da União, de crédito extraordinário e ignorando opções mais vantajosas, infringiram os princípios da razoabilidade e do interesse público, previstos no art. 2º da Lei 9.784/1999", diz trecho da auditoria.

O relatório do tribunal também constatou uso de recursos destinados às ações de enfrentamento à Covid para manutenção de bens imóveis das Forças Armadas, sem que fossem preenchidos os requisitos de imprevisibilidade e urgência exigidos para a aplicação de recursos de crédito extraordinário.

"(...) não foi apenas isso que se observou, tendo sido realizadas obras de reforma de grande vulto em várias unidades, como adaptação de instalações para construção de alojamentos e de salas de instrução e a realização de troca de pisos e de telhado em alojamentos que se encontravam em uso", diz outro trecho da auditoria.

Os auditores também identificaram que a aprovação de parte das despesas informadas pelo Ministério da Defesa teve documentação comprobatória insuficiente.

A auditoria do TCU fiscalizou, ao todo, R$ 15.688.800,53 aplicados pelas Forças Armadas em ações de combate à Covid-19.

Ao analisar as conclusões da auditoria na última quarta-feira (29) , os ministros do TCU decidiram fazer recomendações e ciências ao governo.

21
Mar23

Pátria Voluntária: mais um rolo de Michelle

Talis Andrade
 
Charge: Fredy Varela

 

Por Altamiro Borges

Paparicada pelo chefão do PL – o que tem gerado ciumeira no maridão que fugiu para os EUA –, Michelle Bolsonaro não está com essa bola toda para disputar a presidência da República ou outro cargo eletivo. O seu telhado de vidro é enorme. Na semana passada, o site Metrópoles revelou que “uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União encontrou uma série de ilegalidades no programa Pátria Voluntária, chefiado pela ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro”. 

Segundo documento obtido com exclusividade pelo site, o TCU “constatou que o programa, que obtinha arrecadações privadas e as direcionava para entes privados, não respeitava o princípio da impessoalidade orçamentária e não usava critérios objetivos, amparados pela legislação, para definir quem recebia doações. Por considerar que o modelo de gestão adotado era ilegal, o tribunal chegou a indicar que recomendaria a extinção do programa”. 


Ingerência sobre o destino dos recursos

De acordo com o relatório assinado pelo ministro Antônio Anastasia, “o programa de voluntariado era uma maneira de agentes públicos promoverem arrecadações para, depois, terem uma ingerência sobre o destino de recursos privados sem autoridade para isso. Em tese, os recursos eram geridos pela Fundação Banco do Brasil (FBB). A auditoria descobriu, porém, que no Conselho de Solidariedade, criado na pandemia, o governo Bolsonaro definiu a destinação de algumas arrecadações. Além disso, o TCU verificou que os beneficiários das doações eram escolhidos pela Casa Civil”. 

“Embora a arrecadação dos recursos financeiros e a sua gestão sejam de competência da FBB, a seleção das entidades beneficiárias era efetuada no âmbito da Casa Civil”, escreveu o ministro, apontando a grave ilegalidade. No programa, não havia “critérios objetivos e isonômicos para a seleção de instituições sociais a serem beneficiadas com recursos financeiros oriundos de doações privadas”. Os gestores do programa tampouco tinham respaldo legal para administrar os recursos. 


Negociatas na compra de vacinas para Covid
 
Esse não é o único caso escabroso envolvendo a ex-primeira dama – que já tinha o apelido de Micheque, em alusão aos R$ 89 mil em cheques que recebeu do miliciano Fabrício Queiroz, e que agora passou a ser chamada também de MisSheik, em referência às joias de R$ 16,5 milhões que recebeu da ditadura saudita. No início de 2021, no pico das mortes na pandemia do coronavírus, por exemplo, ela foi denunciada por suposto envolvimento nas negociatas para a compra de vacinas. 

Na ocasião, a revista Veja publicou que “uma nova leva de mensagens do cabo da PM Luiz Paulo Dominguetti, em poder da CPI da Pandemia, insere um novo personagem na nebulosa negociação de vacinas superfaturadas com o governo. Trata-se da primeira-dama Michelle Bolsonaro”. O militar citou o reverendo Amilton Gomes de Paulo, que operava como lobista no Ministério da Saúde e “atuou para aproximar os supostos vendedores das vacinas do gabinete presidencial”. 

“Dominguetti comenta assustado sobre os avanços do reverendo. 'Michele [sic] está no circuito agora. Junto ao reverendo. Misericórdia', escreve. O interlocutor se mostra incrédulo diante do nome da primeira-dama. 'Quem é? Michele Bolsonaro?'. E Dominguetti retorna: 'Esposa sim'”. O depoimento bombástico faz parte do relatório da CPI do Genocídio, que infelizmente foi esquecido – para a sorte da hoje “presidenciável” ex-primeira-dama. Mas ele pode ser recuperado em uma futura campanha eleitoral.
 
Imagem
 
05
Dez22

‘Quero ir além’: advogado Kakay quer responsabilizar criminalmente Moro e procuradores da Lava Jato

Talis Andrade

 

Kakay ainda revela que delatores da Lava Jato estariam prontos para denunciar a operação e dizer que foram coagidos a falar

 

 

por Ana Livia Esteves /Jornal GGN

Nesta sexta-feira (2), o advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, mais conhecido como Kakay, pediu a condenação de juízes, procuradores e “advogados cooptados” pela Operação Lava Jato durante evento do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) realizado em Recife, Pernambuco.

“A Lava Jato só acaba quando o Moro, os procuradores e advogados forem responsabilizados”, disse Kakay à Sputnik Brasil. “Eu sustento que desde o início que a Lava Jato […] instrumentalizou o Judiciário e o Ministério Público pra atingir o poder.”

02
Dez22

Anistia nunca mais

Talis Andrade

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Na América Latina quem deixou impunes os crimes do passado viu eles se repetirem

 

por Vladimir Safatle

- - -

Muitas vozes alertam o Brasil sobre os custos impagáveis de cometer um erro similar àquele feito há 40 anos. No final da ditadura militar, setores da sociedade e do governo impuseram o silêncio duradouro sobre os crimes contra a humanidade perpetrados durante os vinte anos de governo autoritário. Vendia-se a ilusão de que se tratava de astúcia política.

Um país “que tem pressa”, diziam, não poderia desperdiçar tempo acertando contas com o passado, elaborando a memória de seus crimes, procurando responsáveis pelo uso do aparato do Estado para a prática de tortura, assassinato, estupro e sequestro. Impôs-se a narrativa de que o dever de memória seria mero exercício de “revanchismo” – mesmo que o continente latino-americano inteiro acabasse por compreender que quem deixasse impunes os crimes do passado iria vê-los se repetirem.

Para tentar silenciar de vez as demandas de justiça e de verdade, vários setores da sociedade brasileira, desde os militares até a imprensa hegemônica, não temeram utilizar a chamada “teoria dos dois demônios”. Segundo ela, toda a violência estatal teria sido resultado de uma “guerra”, com “excessos” dos dois lados. Ignorava-se, assim, que um dos direitos humanos fundamentais na democracia é o direito de resistência contra a tirania. Já no século XVIII, o filósofo John Locke, fundador do liberalismo, defendia o direito de todo cidadão e de toda cidadã de matar o tirano. Pois toda ação contra um Estado ilegal é uma ação legal. Note-se: estamos a falar da tradição liberal.

Os liberais latino-americanos, porém, têm essa capacidade de estar sempre abaixo dos seus próprios princípios. Por isso, não é surpresa alguma ouvir o ministro do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli declarar, em pleno 2022, pós-Bolsonaro: “Não podemos nos deixar levar pelo que aconteceu na Argentina, uma sociedade que ficou presa no passado, na vingança, no ódio e olhando para trás, para o retrovisor, sem conseguir se superar (…) o Brasil é muito mais forte do que isso”.

Afora o desrespeito a um dos países mais importantes para a diplomacia brasileira, um magistrado que confunde exigência de justiça com clamor de ódio, que vê na punição a torturadores e a perpetradores de golpes de Estado apenas vingança, é a expressão mais bem-acabada de um país, esse sim, que nunca deixou de olhar para o retrovisor. Um país submetido a um governo que, durante quatro anos, fez de torturadores heróis nacionais, fez de seu aparato policial uma máquina de extermínio de pobres.

 

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Alguns deveriam pensar melhor sobre a experiência social de “elaborar o passado” como condição para preservação do presente. Não existe “superação” onde acordos são extorquidos e silenciamentos são impostos. A prova é que, até segunda ordem, a Argentina nunca mais passou por nenhuma espécie de ameaça à ordem institucional. Nós, ao contrário, enfrentamos tais ataques quase todos os dias dos últimos quatro anos.

Nada do que aconteceu conosco nos últimos anos teria ocorrido se houvéssemos instaurado uma efetiva justiça de transição, capaz de impedir que integrantes de governos autoritários se auto-anistiassem. Pois dessa forma acabou-se por permitir discursos e práticas de um país que “ficou preso no passado”. Ocultar cadáveres, por exemplo, não foi algo que os militares fizeram apenas na ditadura. Eles fizeram isso agora, quando gerenciavam o combate à pandemia, escondendo números, negando informações, impondo a indiferença às mortes como afeto social, impedindo o luto coletivo.

É importante que tudo isso seja lembrado neste momento. Porque conhecemos a tendência brasileira ao esquecimento. Este foi um país feito por séculos de crimes sem imagens, de mortes sem lágrimas, de apagamento. Essa é sua tendência natural, seja qual for o governante e seu discurso. As forças seculares do apagamento são como espectros que rondam os vivos. Moldam não apenas o corpo social, mas a vida psíquica dos sujeitos.

Cometer novamente o erro do esquecimento, repetir a covardia política que instaurou a Nova República e selou seu fim, seria a maneira mais segura de fragilizar o novo governo. Não há porque deleitar-se no pensamento mágico de que tudo o que vimos foi um “pesadelo” que passará mais rapidamente quanto menos falarmos dele. O que vimos, com toda sua violência, foi o resultado direto das políticas de esquecimento no Brasil. Foi resultado direto de nossa anistia.

A sociedade civil precisa exigir do governo que se inicia a responsabilização pelos crimes cometidos por Jair Bolsonaro e seus gerentes. Isso só poderá ser feito nos primeiros meses do novo governo, quando há ainda força para tanto. Quando falamos em crimes, falamos tanto da responsabilidade direta pela gestão da pandemia, quanto pelos crimes cometidos no processo eleitoral.

O Tribunal Penal Internacional aceitou analisar a abertura de processo contra Jair Bolsonaro por genocídio indígena na gestão da pandemia. Há farto material levantado pela CPI da Covid, demonstrando os crimes de responsabilidade do governo que redundaram em um país com 3% da população mundial contaminada e 15% das mortes na pandemia. Punir os responsáveis não tem nada a ver com vingança, mas com respeito à população. Essa é a única maneira de fornecer ao Estado nacional balizas para ações futuras relacionadas a crises sanitárias similares, que certamente ocorrerão.

Por outro lado, o Brasil conheceu duas formas de crimes eleitorais. Primeiro, o crime mais explícito, como o uso do aparato policial para impedir eleitores de votar, para dar suporte a manifestações golpistas pós-eleições. A polícia brasileira é hoje um partido político. Segundo, o pior de todos os crimes contra a democracia: a chantagem contínua das Forças Armadas contra a população. Forças que hoje atuam como um estado dentro do Estado, um poder à parte.

Espera-se do governo duas atitudes enérgicas: que coloque na reserva o alto comando das Forças Armadas que chantageou a República; e que responsabilize os policiais que atentaram contra eleitores brasileiros, modificando a estrutura arcaica e militar da força policial. Se isso não for feito, veremos as cenas que nos assombraram se repetirem por tempo indefinido.

Não há nada parecido a uma democracia sem uma renovação total do comando das Forças Armadas e sem o combate à polícia como partido político. A polícia pode agir dessa forma porque sempre atuou como uma força exterior, como uma força militar a submeter a sociedade. Se errarmos mais uma vez e não compreendermos o caráter urgente e decisivo de tais ações, continuaremos a história terrível de um país fundado no esquecimento e que preserva de forma compulsiva os núcleos autoritários de quem comanda a violência do Estado. Mobilizar a sociedade para a memória coletiva e suas exigências de justiça sempre foi e continua sendo a única forma de efetivamente construir um país.

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