Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

O CORRESPONDENTE

25
Mar23

Autonomia do Direito: um antídoto contra a barbárie

Talis Andrade
 
 
 
Imagem
 
 
 
 

por Jefferson de Carvalho Gomes /ConJur

- - -

Recentemente o professor Lenio Streck nos brindou com duas importantes reflexões[2] sobre a tentativa do uso de uma roupagem jurídica para que se tente justificar todo e qualquer anseio autoritário que atente contra a democracia.

O cerne das importantes reflexões do professor caminham justamente no sentido de que todo ataque à ordem democrática, de natureza autoritária e totalitária, precede de uma pretensa maquiagem jurídica, com fins de legitimação do ilegitimável. Eis aí o motivo que tem feito com que o tema sobre o lawfare tenha crescido tanto nos últimos anos, pois é justamente a partir do sequestro semântico de conceitos jurídicos, que se tenta a todo o tempo aniquilar um pretenso inimigo — ou até mesmo o Direito — em nome de um pseudo "bem maior".

Em outro momento, neste mesmo espaço da Diário de Classe[3], tentei refletir um pouco sobre este fenômeno do lawfare. Ali, busquei tratar um pouco sobre o que seria isto — o lawfare e optei por filiar-me à concepção Streckiana acerca do conceito de lawfare[4], como "a construção fraudulenta do raciocínio jurídico para fins politicamente orientados".

A premissa de Streck sobre o lawfare é deveras importante para justamente compreender suas novas reflexões, trazidas no início deste texto. O mundo assistiu atônito aos lamentáveis episódios de depredação e tentativa de golpe de Estado, ocorridos em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023. A turba ensandecida entre tantos arroubos retóricos se julgava no Direito de se apossar dos espaços destinados ao Executivo, Legislativo e Judiciário, pois partiam de uma rasa concepção de que "Supremo é o povo", para usar uma entre tantas outras tentativas retóricas de justificar o injustificável.

Esta própria premissa, já parte de um grave equívoco interpretativo do parágrafo único, do artigo 1º, da Constituição da República. Mas será mesmo que este equívoco se dá pelo simples fato de toda uma coletividade ler e interpretar errado ou porque estas ideias vão sendo trabalhadas e postas ponto a ponto na cabeça da coletividade, até o ponto então que uma turba se sinta legitimada a atentar contra a democracia, afinal estariam eles amparados "juridicamente"?

Pois bem, como disse dois parágrafos acima, a primeira máxima dita amiúde pelo povo desordeiro seria a de que supremo é povo, tal concepção parte da máxima constitucional de que todo poder emana do povo, eis então o suposto ponto de legitimação que transforma o desejo reprimido em manifestação de histeria. E esta histeria somente existe, porque antes, como bem lembrou o professor Streck, ao colocar o dedo na ferida, existiu alguém, com uma representação simbólica — de jurista, por exemplo — que em algum momento disse que os absurdos praticados no dia 8 de janeiro seriam legítimos.

Outro exemplo deste sequestro semântico dos significados constitucionais é o rotineiro pedido de intervenção das Forças Armadas nos poderes legalmente constituídos, sob o falso e errôneo argumento de que o artigo 142, da Constituição autorizaria tal barbárie. Ora, a primeira parte do texto do artigo 142, já seria suficiente para rechaçar qualquer tese ou teoria golpista, mas ainda assim tenha quem diga que a Constituição atribuiu um pretenso poder moderador às Forças Armadas, quando em verdade o objetivo central desta mesma Constituição é que jamais tenhamos qualquer possibilidade de viver sob um governo militar e/ou de exceção, como experimentado de 1964 até 1984.

Esta explanação é para que possamos falar do que é mais importante e caro a nós neste momento: a preservação da autonomia do Direito, enquanto instrumento de salvaguarda da ordem democrática. Gilberto Morbach[5] explica assim a autonomia do Direito a partir da CHD, de Lenio Streck

O que significa defender a autonomia do fenômeno jurídico? Hermeneuticamente, também aqui é interessante explicar a partir de nosso tempo.Vivemos em época de profundos desacordos morais. Se há poucos consensos em sociedade, paradoxalmente, um deles é precisamente o fato de que discordamos entre nós mesmos. Somos muitos, são muitos nossos desacordos e a tendência é que isso acabe por se acirrar cada vez mais, e sociedades cada vez mais divididas e fragmentadas. Daí a importância da autonomia do direito. Daí a relação direta entre direito, império da lei e democracia. Em tempos de desacordos profundos, qualquer alternativa que não prescinda dos ideais democráticos passa, necessariamente, pela ideia de que esses desacordos não podem ser resolvidos arbitrariamente. A coordenação social precisa respeitar princípios regulatórios. Como já dizia Ortega y Gasset, onde não há um acatamento de certas posições últimas, o resultado é a barbárie. Sem uma instância que os regule, nossos desacordos tornam nossa condição análoga àquela de que falava Matthew Arnold em Dover Beach: a de ignorant armies, clashing by night on a darkling plain [exércitos ignorantes a lutar em uma planície escura].

Neste sentido, Lenio Streck[6] afirma que:

a autonomia deve ser entendida como ordem de validade, representada pela força normativa de um direito produzido democraticamente e que institucionaliza (ess)as outras dimensões com ele intercambiáveis (portanto, a autonomia do direito não emerge apenas na sua perspectiva jurisprudencial, como acentua, v.g., Castanheira Neves — há algo que se coloca como condição de possibilidade ante essa perspectiva jurisprudencial: a Constituição entendida no seu todo principiológico), apontando para a Constituição como fio condutor dessa intermediação, cuja interpretação deve ser controlada hermeneuticamente, evitando-se que o sentido a ser atribuído ao seu texto e ao conjunto normativo infraconstitucional vá além ou fique aquém desse fundamento normativo.

É justamente a partir desta concepção de autonomia do Direito, que busca-se defender que jamais qualquer pessoa que tenha passado por uma faculdade de Direito, não importa qual seja a sua predileção político-ideológica seja capaz de afirmar que em algum momento o Direito é capaz de autorizar as barbáries que o país vivenciou no último dia 8 de janeiro, pois entre tantas funções nobres que a autonomia do Direito possui, talvez a mais importante seja colocar freio em nossos instintos mais selvagens e primitivos.

É dizer: existe um limite! Ou até mesmo como aprendemos quando assistimos as aulas, lemos e escutamos o professor Streck: o Direito está para corrigir a moral e não a moral que está para corrigir o Direito. Ou seja, pouco importa o que o pensa o jurista A, B ou C, o importante é o que o Direito diz ou veda sobre determinados temas, e diante de toda a história institucional e constitucional brasileira, não é difícil imaginar que não há em nenhuma letra sequer de nossa Constituição, que autorize qualquer atentado à democracia!

E mais, legitimar qualquer atentado à ordem democrática implica em grave desonra a todos que um dia juraram cumprir e obedecer a Constituição — ou será que a máxima de que quem jura mente está valendo!? Por vezes somos postos em cenários ao qual não concordamos. É normal que de quatro em quatro anos passemos por um momento de (re)avaliar os rumos do país e escolhermos entre o novo — ainda que já não seja tão novo assim — ou a manutenção de um projeto político, e aí é que está a magia do poder democrático que só se constitui com a autonomia do Direito: a certeza de que não importa qual seja o resultado, daqui a quatro anos teremos novas eleições e por conseguinte uma nova oportunidade de escolher nossos representantes.

Portanto, que se pare de ouvir a voz das ruas e passe a se ouvir a voz da Constituição, pois se um dia a voz das ruas vencessem, elas mesmo seriam caladas pela sua vitória, pois com a ruptura que pregam, já não haveria mais Constituição para defender o direito de ninguém e aí com quem reclamar? Por isso, que em tempos de carnaval, o samba pode nos levar a refletir sobre algo, pois é certo que “meninos mimados não podem reger a nação[7].

E o samba aqui é útil, justamente para dar a interdisciplinaridade que nos é cara ao Direito, como o diálogo com a arte e sobretudo com a literatura, como bem alerta a professora Luísa Giuliani Bernsts[8]

O argumento apresentado pelo professor Lenio de que "todo o golpista sempre terá um jurista para chamar de seu", parte de uma provocação literária e se constrói fitando a nossa história recente (os golpes de 64 e contra o governo de Dilma Rousseff), em que os limites interpretativos foram violados em nome de interesses políticos autoritários e/ou antiemancipatórios. Esse tipo de interpretação (inautêntica) é o que torna ilegalidades legais no Brasil. Mas, como bem explora o artigo em comento, ainda que diante de tamanhos "esforços hermenêuticos", golpes de Estado não precisam ser expressamente proibidos para serem incompatíveis com os princípios constitucionais e, portanto, com o Estado Democrático de Direito. Mesmo que alguns tentem garantir — para usar a provocação do professor Lenio — que determinada forma de quebrar ovos seja a única correta, ela só se sustentaria como tal a partir do peso das justificações invocadas na construção de seu sentido e não pelo cumprimento formal de um rito. Esse sentido é (ou deveria ser) edificado da mesma forma que as histórias são fabricadas.

Como escrevi linhas acima: por mais que eventualmente não gostemos de alguma decisão do Judiciário ou até mesmo do resultado de uma ou outra eleição, que bom que ainda temos o Direito para conter os instintos primitivos.

O Direito tem salvado a democracia nos últimos anos, e torço para que continue salvando. Tentaram por à prova o Direito, no dia 8 de janeiro, mas que bom que ele ainda resistiu, e nos salvou mais uma vez. E cabe a nós, que juramos cumprir e obedecer a Constituição, continuar colocando o sino no pescoço do gato, antes que seja tarde e o canto da sereia trague o que temos de melhor: a democracia!

 
 
Imagem
 
 

Bibliografia:

BERNSTS, Luísa Giuliani. Fabricando a nossa (melhor) história: a narrativa literária e o Direito. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-fev-11/diario-classe-fabricando-nossa-melhor-historia-narrativa-literaria-direito

CARVALHO GOMES, Jefferson. Lawfare: Quando a lei (ou seu uso estratégico) aniquila o Direito. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2021-ago-21/diario-classe-lawfare-quando-lei-ou-uso-estrategico-aniquila-direito;

CRIOLO. Menino Mimado. Disponível em: https://www.letras.mus.br/criolo/menino-mimado/;

MORBACH, Gilberto. Autonomia do direito e teoria da decisão: a CHD de Streck. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-set-07/autonomia-direito-teoria-decisao-chd-streck

STRECK, LENIO LUIZ. No Brasil, todo golpista tem um jurista pra chamar de seu. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2023/02/no-brasil-todo-golpista-tem-um-jurista-para-chamar-de-seu.shtml

_____________________. Jurista de estimação. Folha de S.Paulo. Caderno Ilustrada Ilustríssima. C8. Publicado em 12/02/2023.

_____________________. Enciclopédia do golpe - Vol. 1. Bauru: Canal 6, 2017. p. 119.

_____________________. Autonomia do direito e decisão judicial. Disponível em: https://estadodaarte.estadao.com.br/autonomia-direito-decisao-judicial/

[2] Cf. No Brasil, todo golpista tem um jurista pra chamar de seu. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2023/02/no-brasil-todo-golpista-tem-um-jurista-para-chamar-de-seu.shtml. Cf. Jurista de estimação. Folha de São Paulo. Caderno Ilustrada Ilustríssima. C8. Publicado em 12/02/2023.

[3] CARVALHO GOMES, Jefferson. Lawfare: Quando a lei (ou seu uso estratégico) aniquila o Direito. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2021-ago-21/diario-classe-lawfare-quando-lei-ou-uso-estrategico-aniquila-direito

[4] STRECK, Lenio Luiz. Enciclopédia do golpe - Vol. 1. Bauru: Canal 6, 2017. p. 119.

[5] MORBACH, Gilberto. Autonomia do direito e teoria da decisão: a CHD de Streck. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-set-07/autonomia-direito-teoria-decisao-chd-streck

[6] STRECK, Lenio Luiz. Autonomia do direito e decisão judicial. Disponível em: https://estadodaarte.estadao.com.br/autonomia-direito-decisao-judicial/

[7] CRIOLO. Menino Mimado. Disponível em: https://www.letras.mus.br/criolo/menino-mimado/

[8] BERNSTS, Luísa Giuliani. Fabricando a nossa (melhor) história: a narrativa literária e o Direito. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2023-fev-11/diario-classe-fabricando-nossa-melhor-historia-narrativa-literaria-direito

 
Imagem
 
 
20
Fev23

A autonomia do Banco Central é compatível com a Constituição?

Talis Andrade
www.brasil247.com - { imgCaption }}

 

Resumo: resta saber se o presidente do Banco Central é o superego da nação

 

 

Por Lenio Luiz Streck /ConJur

= = =

O tema "independência ou autonomia do Banco Central" está na ordem do dia. O novo governo faz fortes críticas à atuação do BC. Afinal, a taxa de juros no Brasil é o dobro da inflação, desbordando do que ocorre com as demais taxas do mundo (vide EUA e União Europeia).

Para além da economia, o que o Direito pode dizer? Gilberto Bercovici foi quem melhor tratou do assunto no artigo Sobre o Banco Central Independente [1]. O artigo tem de ser lido. Por juristas, economistas, jornalistas e jornaleiros.

Bercovici reconstrói a história institucional do fenômeno. Mostra o fator "privatização dos bancos estaduais" ocorrida na década de 90 como elemento primordial da centralização da autoridade monetária no Banco Central. Diz também que o problema desse processo de reestruturação da política monetária foi o fato de que a recomposição da capacidade de intervenção pública se esgotou na tentativa de controle sobre os gastos públicos. Fala também da bizarrice que foi a equiparação da função de presidente do Banco Central do Brasil à de ministro de Estado em 2004. Isso gerou uma certa confusão institucional: um presidente de autarquia federal vinculada ao Ministério da Fazenda (artigo 8º da Lei 4.595/1964) se torna equiparável a ministro de Estado, ou seja, com as mesmas prerrogativas de função daquele que supostamente é seu superior hierárquico na administração pública, o ministro da Fazenda.

Mas vinha coisa mais complexa pela frente: a tão falada autonomia do Banco Central (Lei Complementar 179, de 24 de fevereiro de 2021). Pela nova legislação, o presidente e a diretoria do Banco Central passam a ter mandatos fixos e não coincidentes com o mandato do presidente da República, que perde o poder de nomear e demitir os ocupantes dessas funções quando bem entender.

Bercovici chama a essa entidade um "Frankenstein" na estrutura administrativa brasileira: uma autarquia não subordinada ao presidente ou a nenhum ministro, um órgão que paira no ar, sem vínculos, sem controles.

Esse é o busílis.

O Supremo Tribunal teve a chance de dar um fim nesse Frankenstein. Porém, na Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI 6.696, decidiu pela constitucionalidade.

Passa um pequeno período de tempo e surgem fatos novos. Taxa de juros estratosférica que coloca em polos opostos o novo presidente eleito e o presidente do Banco Central.

O ponto que se põe é: qual seria o dispositivo constitucional que daria suporte à lei que concede autonomia ao Banco Central? Ao argumento de que ele deve ser autônomo para estabilizar a economia, cabe perguntar: a golpe de caneta monetária o presidente do BC tem mais capacidade do que toda a equipe econômica de um presidente da República? A Constituição estabelece quem deve cuidar da economia. E nisso está inserida a estabilidade e a responsabilidade social para com a população.

Examinando o texto constitucional, temos que ali estão determinadas as normas para a consecução de políticas públicas que devem visar a erradicar a pobreza e fazer justiça social (por exemplo, artigo 3º). Isso sem considerar o próprio cerne daquilo que chamamos de "Constituição Econômica".

Parece que esquecemos que a nossa Constituição tem o claro perfil dirigente. A CF/88 é compromissória e dirigente, filha das Constituições dirigentes do segundo pós-guerra, mormente se pensarmos em países periféricos como o Brasil.

Lembro que nos anos 90 cunhei a tese de uma CDAPP — Constituição Dirigente Adequada para Países Periféricos, na esteira da já então criticada Constituição Dirigente tratada pelo constitucionalista J J Gomes Canotilho.

Dizia eu, então, no que fui acompanhado por Gilberto Bercovici, Martonio Barreto Lima e Marcelo Cattoni, que a nossa Constituição, a par das críticas ao dirigismo original feito pelo próprio Canotilho, continuava dirigente [2]. Mais: de minha parte, a tese do dirigismo constitucional continua válida enquanto não resolvermos o triângulo dialético propugnado pelo próprio Canotilho, inspirado em Johan Galtung (falta de segurança, pobreza e falta de igualdade política). A Constituição ainda vale. E nela nada consta sobre Banco Central independente ou autônomo. Banco Central aparece oito vezes no texto da Constituição. Nenhuma vez sequer se insinua a sua autonomia ou independência para além do poder do presidente da República — basta ver que o regime continua sendo o presidencialista.

Trata-se de analisar o papel do Estado na economia. E o do governo. Enquanto não resolvermos esses problemas (pobreza, segurança e igualdade política), ainda precisamos de forte atuação estatal para a consecução desses objetivos constitucionais. Isto é, aqui no Brasil a Constituição que dirige não morreu. E por isso precisamos de uma Constituição que diga o que fazer. Que resgate compromissos. Que resgate as promessas modernas até hoje incumpridas. E a nossa diz claramente como fazer isso. Quer queiramos, quer não queiramos. A Constituição é um fato. Ou ela vale apenas quando se fala em imunidades e isenções?

Não parece adequado à Constituição um organismo como o Banco Central autônomo, cujo presidente, sem mandato popular, sem legitimidade, estabeleça as diretrizes do desenvolvimento econômico. Porque, no fundo, é isso que acontece. O Banco Central manda mais que o presidente.

O Brasil é uma República representativa. Presidencialista. Elege-se o presidente para elaborar políticas públicas. Que devem ser compatíveis e obedecer a Constituição. Ora, se o presidente do Banco Central resolver triplicar a taxa de juros em relação ao índice inflacionário (duplicada já está) e isso gerar mais pobreza, quer dizer que a atuação do presidente do Banco Central é inconstitucional, porque a Constituição diz o contrário. Pior: a culpa e responsabilidade serão debitadas na conta de quem foi eleito presidente. Da República. E não do Banco Central. Sei que parece uma platitude dizer isso. Mas por aqui há que se dizer o óbvio — que se esconde no anonimato.

Tem-se a impressão de que estamos no mundo de paroxismos. Ocorre uma disputa quase fratricida nas eleições. Quase ocorreu um golpe. Elege-se o presidente. E quando ele quer fazer cumprir, para o bem e para o mal, sua plataforma de governo, o presidente do Banco Central atua como superego da nação.

Resta saber se o Banco Central pode tanto a ponto de ser esse superego, espécie de grilo falante do sistema político-econômico.

Numa palavra final, retomo Bercovici, para dizer que, para além de toda a questão constitucional, o problema da "independência" do Banco Central é menos jurídico e essencialmente político. A pergunta que deve ser feita é: Banco Central independente de quem?

Ao que parece, o BC é independente do sistema político e de todo e qualquer controle democrático — com o que se volta à questão constitucional.

Por último, alguém dirá que essa questão já está decidida pelo STF. Respondo, dizendo: mas o STF não disse que o modelo anterior era inconstitucional. Consequentemente, então, na pior das hipóteses, a Constituição admitiria mais de uma possibilidade de configuração. Além disso, o fato de o STF dizer por último não significa que esteja sempre certo. E decisões não são eternas.

Isto é, o presidente da República pode entender, e o Congresso também, que esse modelo de "independência" do Banco Central criou um problema do ponto de vista político e econômico.

Ou, ironicamente, a possibilidade de rever decisões que afetam estruturalmente a vida das pessoas seria inconstitucional?

Por isso, diante do problema criado, cabe alterar o modelo de Banco Central. Isso porque a alteração do modelo não é inconstitucional. Ao contrário, tornar-se-ia adequado ao modelo constitucional compromissório e dirigente inscrito na Constituição do Brasil.

= = =

[1] In Revista Fórum de Direito Financeiro e Econômico. ano 11 – nº 21 | mar./ago. 2022

[2] Recomendo a leitura deste artigo que trata da Constituição Dirigente Invertida, em que cito os três autores: https://www.conjur.com.br/2016-out-27/senso-incumom-rumo-norundi-bordo-cdi-constituicao-dirigente-invertida 

www.brasil247.com - { imgCaption }}
14
Fev23

A tutela militar e seus limites

Talis Andrade

 

henfil militares .jpeg

 

Os nexos, ao longo do desenvolvimento capitalista brasileiro, entre tutela militar e relações com as classes populares em democracias liberais restritas

 

por Lúcio Flávio Rodrigues de Almeida /A Terra É Redonda 

Dois aspectos adquirem enorme importância na atual crise política brasileira: uma forte expansão do neofascismo que até deixa saudades de quando, uns cinco anos atrás, discutimos sobre a existência de uma onda conservadora no Brasil;  o debate sobre a tutela militar quase cai na boca do povo.

Inevitável não é, mas, pelo que temos visto e vivido, é bastante provável que, especialmente no caso de uma intensificação das contradições internas à formação social brasileira e um aprofundamento da crise econômica mundial em um jogo geoestratégico complicadíssimo, este país constitua um cenário bastante favorável ao crescente entrelaçamento – e mesmo à fusão – da forte presença política dos militares com o avanço do neofascismo.

Este artigo, longe de abordar a questão em toda a sua complexidade, o que implicaria levar em conta, por exemplo, dimensões corporativas específicas das Forças Armadas, centra o foco, de modo ainda bastante genérico, nas relações, ao longo do desenvolvimento capitalista brasileiro, entre tutela militar e as classes populares em democracias liberais restritas.

 

Passado e presente da tutela militar

 

Segundo diversos estudiosos, a tutela militar se constituiu com a formação do Estado independente a partir de 1822-24 e jamais se foi. Até porque, apesar do debate, não temos um conceito suficientemente claro de tutela militar, deixo, neste momento, de discuti-la no interior de formações sociais pré-capitalistas e apenas registro uma dúvida teórica que, no Brasil atual, tem imediatas implicações políticas: a distinção qualitativa entre o Estado escravista moderno e o Estado burguês não deveria ser mais considerada ao falarmos de uma bicentenária tutela militar?

Creio que, se traçarmos esta linha de continuidade muito direta, corremos o risco de legitimar posições que, de um modo ou de outro, justificam a proeminência militar na política contemporânea com a referência a um passado mítico de um povo apático, inclusive em razão de determinações raciais, e, portanto, incapaz de se conduzir. Centro o foco no período marcado pela presença de um Estado nacional brasileiro cuja existência coincidiu com a da forma de governo republicana ao longo de 121 anos de História.

Mesmo assim, assinalo um problema: a questão da tutela militar no Brasil se escancara a céu aberto quando se trata de democracias liberais de massas, pois, em se tratando de ditaduras militares, corre-se o sério risco (não a inevitabilidade) de ficar a meio caminho do truísmo e da redundância. O que, ironicamente, não impede que, nas constituições ditatoriais brasileiras, artigos mais diretamente relacionados com o papel das Forças Armadas lhes atribuem um papel mais subalterno ao Executivo. Já as Cartas Magnas das duas democracias liberais de massas neste país, 1945-1964 e desde 1989, trazem o registro da tutela militar: artigos no.177 e 142 das Constituições de 1946 e 1988, respectivamente.

Estranho país no qual a simples aceitação da democracia é acompanhada do aviso constitucional de que as Forças Armadas estão de olho e prontas para agir. Neste texto, centro o foco em alguns aspectos das relações entre o ramo militar da burocracia do Estado brasileiro e a Presidência frente às lutas das classes populares.

 

Transição de capitalismo e lutas político-ideológicas

 

No período 1945-1964, militares atuavam em todas as frentes de disputa a respeito da política de Estado. O principal eixo da discórdia girava em torno da implementação de políticas necessárias ao desenvolvimento nacional brasileiro, o que, de tão genérico, beirava o consensual. Em termos objetivos, estava em disputa a continuidade da política de desenvolvimento capitalista industrial (dependente) implementada durante a Era Vargas (1930-45). Em torno desta é que se manifestavam interesses e variantes ideológicas contraditórios no interior da classe dominante, entre camadas da classe média e segmentos do aparelho estatal em um período marcado, do início ao fim, pela ascensão política das classes populares.

Comparados aos atuais 38 anos do regime atual, os 19 daquela democracia foram de prender o fôlego.

As contendas não se limitaram aos debates orais e escritos dentro e fora dos partidos políticos, no parlamento, na imprensa e, ao longo dos anos 1950, na intelectualizadíssima Revista do Clube Militar. Beiraram as vias de fato quando, na undécima hora, o general Lott liderou o famoso “golpe da legalidade” (11/11/1955) que assegurou a posse da dupla Kubitschek e Goulart, legitimamente eleita mas contestada pelos adversários civis (udenistas) e militares adeptos do candidato derrotado, general Távora.

Questionamento da vitória eleitoral, longe de invenção tucana, foi fortíssimo em relação a dois importantíssimos presidentes brasileiros: Vargas, em 1950, e Kubitschek em 1955, quando o general Lott deu o “golpe da legalidade”, sem falar no risco de confronto armado produzido pelo veto dos três ministros militares à posse do vice-presidente João Goulart na esteira da renúncia de Jânio Quadros. Enfim, em todas as eleições presidenciais do período, houve sempre um militar (em 1945, dois) entre os candidatos mais votados.

Nestes breves 19 anos de vida, ocorreu formidável ascensão das lutas operárias e também, a partir de 1955, o ingresso promissor das ligas camponesas na luta política. E, no frigir dos ovos, esta ebulição sociopolítica desembocou na montagem de um capitalismo industrial dependente que deixou para traz o debate sobre a vocação agrária da economia brasileira. Neste processo, os conflitos no interior do ramo militar da burocracia de Estado foram decisivos. O que justifica o recurso à noção de tutela militar.

 

Lutas de trabalhadores e transição transada

 

A crise da ditadura militar foi marcada por uma extraordinária presença das lutas operárias e populares que até hoje deixam registros nos nomes de partidos, movimentos e entidades de representação corporativa de trabalhadores e segmentos da classe média, produção cultural, sem falar nas atividades que, perdidas na memória, requerem pesquisa. Houve momentos em que pessoas de classe média, ao encherem o carro de compras no supermercado, reservavam um pouco delas para doarem ao fundo de greve.

Todavia, essas lutas que encantaram boa parte do mundo não conseguiram dirigir o processo de transição. Um dos resultados da transição transada – expressão do saudoso Florestan Fernandes – é a Constituição Cidadã com este famoso artigo 142. Ela mal completou 35 dias e ocorreu forte intervenção do Exército na cidade de Volta Redonda para reprimir a greve dos trabalhadores da Companhia Siderúrgica Nacional (o chamado Massacre de Volta Redonda). Cinco anos depois, a empresa foi privatizada. Tropas do Exército também atuaram contra a greve dos Petroleiros em maio de 1995 (governo FHC), com impactos importantíssimos para as lutas dos trabalhadores neste país. E, expressando a virada das relações sociais, as operações de GLO, estritamente de acordo com o famoso artigo 147, foram transmitidas de governo a governo. Ou seja, a atual democracia (restrita) brasileira nasceu com o selo da tutela militar.

 

A tutela e seus limites

 

Durante o interregno Temer, no bojo da reafirmação da hegemonia da grande finança, pari passu com as derrotas das classes populares, liquidou-se o que restava da “herança varguista” e,  em meio à crise do sistema partidário, a cena política foi inflada de agremiações reacionárias e conservadoras ligadas a setores da burguesia interna rural e urbana. E um grupo de generais passou a intervir ostensiva e simploriamente na implementação de políticas estatais, como a econômica, externa, cultural, de costumes e eleitoral.

Neste último caso, bloqueou a candidatura Lula e se envolveu diretamente na de Jair Bolsonaro. Estas políticas foram apresentadas como racionais, voltadas para a defesa da lei e da ordem e a regeneração nacional, o que implicaria profundo combate à corrupção. E, no geral, receberam apoio entusiástico do conjunto da classe dominante brasileira, amplos setores da classe média e todos os grandes meios de comunicação.

Com o mesmo apoio, então bem mais emocionado e com maior penetração nas classes populares, emergiu a candidatura vitoriosa de Jair Bolsonaro e se configurou uma relação entre militares e política que, salvo melhor juízo, não tem precedentes na história deste país.

Estabeleceu-se um governo fascista profundamente atentatório à democracia liberal, atrelado ao financismo, voltado para a exportação de bens primários e refratário a políticas de desenvolvimento industrial e de apoio à pequena produção rural e urbana. O modo de exercício da hegemonia do capital financeiro levou à defesa objetiva, sob o nome de responsabilidade fiscal, de uma política econômica de aspectos genocidas, atentados constantes à democracia liberal, política internacional desastrada e política sanitária catastrófica, sempre com o envolvimento do referido grupo predominante no interior das Forças Armadas.

O que seria uma simples disputa eleitoral abriu a espaço para, na ausência de qualquer inimigo real ou potencial, um surto de descoordenação nos (e entre os) diversos segmentos do ramo repressivo do Estado (Forças Armadas, Polícias Militares, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal). E o centro do palco foi ocupado personagens movidos à violência cega e formulações simplistas quase sempre expressadas por meio de escasso repertório de xingamentos idiotizastes. Aguardemos as pesquisas sobre a inserção social dos que vandalizaram a Praça dos Três Poderes.

Se, mesmo nos casos clássicos, a ascensão de fascismos passou pela impregnação (e posterior comando) do aparato repressivo do Estado, a ascensão do bolsonarismo, cujo líder já foi declarado nada afeito à carreira castrense, mas é admirado pela base da tropa, sinaliza o risco de preocupante mutação da tutela militar no Brasil.

 

12
Fev23

Espetáculo de circo traz arte, cultura, dança e política brasileiras aos palcos de Paris

Talis Andrade

Maíra Moraes no espetáculo '23 Fragments de ces derniers jours" (23 fragmentos dos últimos dias), em cartaz no Teatro Silvia Monfort, em Paris, até 18 de fevereiro de 2023.
Maíra Moraes no espetáculo '23 Fragments de ces derniers jours" (23 fragmentos dos últimos dias), em cartaz no Teatro Silvia Monfort, em Paris, até 18 de fevereiro de 2023. © João Saenger

Democracia, passinho, Constituição de 1988, forró, demarcação de terras indígenas, frevo, racismo e maracatu. Um espetáculo de circo, um mergulho (auto)reflexivo, uma sopa de Brasil. Tudo isso está no palco do espetáculo bilíngue de circo "23 fragments de ces derniers jours" (23 fragmentos dos últimos dias), em cartaz em Paris até 18 de fevereiro, no Teatro Silvia Monfort.

Idealizado pela "circógrafa" francesa Maroussia Diaz Verbèke e pelo coletivo Instrumento de Ver, de Brasília, o espetáculo incita a refletir sobre o momento histórico atual no Brasil.   

Maroussia contou à RFI sobre o processo de criação.

"O processo se deu em duas partes. A primeira, no Brasil, quando o coletivo Instrumento de Ver, de três mulheres artistas, me convidou para um festival de circo que elas organizam. Em seguida, a gente começou a trabalhar juntas com a pesquisa que elas já desenvolviam sobre objetos, e a nossa relação artística funcionou muito bem", explica.

Mas a situação política e artística no Brasil começou a se deteriorar muito, relembra, e ela então propôs continuar o trabalho na França, por meio de residências artísticas.

Destruição e fragmentos

"Eu cheguei ao Brasil no final de 2018. Foi um momento difícil para o país. Logo começou o governo de Bolsonaro e eu acompanhei o momento que, pelo menos no aspecto cultural, foi uma destruição", conta. 

"Então, a gente trabalhou, nesse início, com essa ideia de destruição, de fragmento, do tempo quebrado... É por isso que no espetáculo tem uma forte pulsação, necessária para enfrentar a situação que estávamos vivendo, porque a gente fez (um trabalho de) resistência lá no Brasil."

"A segunda parte do projeto foi desenvolvida na França, com a minha companhia, que se chama 'Le troisième cirque' (O Terceiro Circo), e eu convidei três artistas masculinos dançarinos, porque antes mesmo de conhecer o coletivo, eu já tinha um amor pelo Brasil, para onde já fui várias vezes e tive a chance de descobrir um pouco da cultura, do Carnaval e das danças brasileiras".

A circógrafa - palavra de vem de "circografia", neologismo que ela mesma criou para definir a escritura e a realização de um espetáculo de circo - tenta explicar em palavras o seu arrebatamento pelo Brasil, sua cultura e o Carnaval.

"É difícil explicar um amor. A gente ama antes de saber o porquê. Eu acho que as culturas francesa e brasileira são muito complementares. E eu encontrei no Brasil uma coisa que me faltava na França, que tem a ver com o prazer de viver, o prazer de estar juntos", sublinha a circógrafa francesa.

Lucas Cabral Maciel no espetáculo "23 Fragments de ces derniers jours" (23 fragmentos dos últimos dias), em cartaz no Teatro Silvia Monfort, em Paris, de 8 a 18 de fevereiro de 2023.
Lucas Cabral Maciel no espetáculo "23 Fragments de ces derniers jours" (23 fragmentos dos últimos dias), em cartaz no Teatro Silvia Monfort, em Paris, de 8 a 18 de fevereiro de 2023. © João Saenger

 

Carnaval como libertação

O carnaval é também um ponto de virada na trajetória do contorcionista e dançarino Lucas Cabral Maciel. Ele explica o poder do Carnaval sobre os corpos e como trouxe isso para o espetáculo. 

"Tem um momento no espetáculo em que a gente relata como o meu primeiro encontro com o Carnaval teve um efeito muito forte em mim. O Carnaval de Recife, em particular, com a força da música e do frevo e como aquilo realmente tirou uma trava que estava estabelecida há muito tempo em mim de não poder dançar, eu não me permitia. E foi o Carnaval que me permitiu, pois o Carnaval é a festa em que tudo pode, onde você pode ser, em teoria, pelo menos na fantasia, o que você quiser", reflete Lucas, que tem raízes pernambucanas, mas cresceu entre Salvador e Maceió. 

E eu acho muito importante que a gente entenda que Carnaval não é evento. Carnaval é significado. Carnaval é momento, é todo um sentido para quem vive, é uma maneira de afirmar a existência. Então, quando você vive isso e coloca os pés lá, é muito poderoso. E a gente tem de trazer um pouco dessa ideia para cá", conta Lucas, que dança frevo no espetáculo.

André Oliveira e Marco Motta no espetáculo « 23 Fragments de ces derniers jours » (23 fragmentos dos últimos dias), em cartaz no Teatro Silvia Monfort, em Paris, de 8 a 18 de fevereiro de 2023.
André Oliveira e Marco Motta no espetáculo « 23 Fragments de ces derniers jours » (23 fragmentos dos últimos dias), em cartaz no Teatro Silvia Monfort, em Paris, de 8 a 18 de fevereiro de 2023. © João Saenger

 

Racismo

E, por falar em corpos, o racismo é um dos temas tratados pelo dançarino e artista baiano Marco Motta, que mora há 13 anos em Madri.

"Eu falo de racismo dentro do show e sobre a questão linguística, do racismo no idioma e também sobre os corpos da gente. A forma como a gente se expressa com o corpo, por exemplo, varia dependendo da cultura de onde a gente vem", reflete Marco. 

"Eu faço breakdance, que é uma dança da diáspora africana norte-americana, e um pouco de capoeira, que é da diáspora africana no Brasil", explica o dançarino.   

O espetáculo já foi apresentado na Suíça, na Bélgica e em outras cidades francesas. O dançarino carioca André Oliveira, que estreia no circo com esta peça, conta como tem sido a recepção do público na Europa:

"São coisas que eles não conhecem, em geral. É interessante trazer essa vivência do nosso corpo brasileiro, da minha vivência na favela, com a minha dança, para o outro lado do mundo", conta. 

Julia Henning e André Oliveira no espetáculo "23 fragmentos dos últimos dias", em cartaz no Teatro Silvia Monfort, em Paris, até 18 de fevereiro.
Julia Henning e André Oliveira no espetáculo "23 fragmentos dos últimos dias", em cartaz no Teatro Silvia Monfort, em Paris, até 18 de fevereiro. © João Saenger

 

Circo e política

Além do Carnaval e das danças típicas brasileiras, os 23 fragmentos destes últimos dias tratam de temas políticos atuais. Julia Henning, uma das fundadoras do coletivo Instrumento de Ver, de Brasília, criado em 2002 na capital federal, explica que o circo e a política andam de mãos dadas.

"A gente sempre lidou com o momento histórico, que é o que a gente entende como sendo o circo, a contemporaneidade, que não tem a ver exatamente com uma estética, mas tem a ver com o diálogo com o seu tempo e estar aberto às influências do momento; não estar desconectado do mundo", explica.

"Quando a Marisa chegou, a gente não hesitava em passar muito tempo discutindo sobre o assunto. E durante todo o processo de criação, a gente teve que manter a energia mesmo assim, porque foi depressivo, sim, para quem trabalha com cultura", diz Julia, referindo-se ao governo Bolsonaro (2019-2022).  

"Arte em geral é política. Desde que a gente começou, nós sempre estivemos abertas às influências do que está acontecendo no mundo, o que está acontecendo com a gente e como trazer isso para a cena", conclui.  

Maíra Moraes, artista circense desde os 18 anos e cofundadora do Instrumento de Ver, acrescenta: "No sistema de produção cultural do Brasil, a gente se reveza em todas as funções. A gente passa de artistas, acrobatas, para produtoras, para quem divulga, para quem limpa... Somos só nós três e temos que dar conta de tudo o que o coletivo precisa para sobreviver. Então, é inevitável a gente estar realmente por dentro de todos os movimentos".

Béatrice Martins, acrobata desde os 5 anos, a terceira integrante do coletivo Instrumento de Ver, resume o espetáculo: 

"É um espetáculo brasileiro. Fala sobre o Brasil, tem músicas totalmente brasileiras. Trazemos, além das acrobacias, danças típicas do Brasil. A gente trouxe toda essa brasilidade para o espetáculo aqui na França, um calorzinho brasileiro", fala.

Béatrice Martins e Lucas Cabral Maciel dançam no espetáculo 23 fragmentos dos últimos dias, em cartaz até 18 no fevereiro no Teatro Silvia Monfort, em Paris.
Béatrice Martins e Lucas Cabral Maciel dançam no espetáculo 23 fragmentos dos últimos dias, em cartaz até 18 no fevereiro no Teatro Silvia Monfort, em Paris. © João Saenger

 

Esperança e arte

As artistas do coletivo, que são também cocriadoras deste espetáculo,  frisam o jeito brasileiro de encarar as mazelas do dia a dia sem perder a esperança.

"A esperança está viva e tem a ver com arte. Parece com coisa inocente, mas é com a esperança que a gente constrói as coisas. E é matando a esperança que a gente destrói as coisas. A esperança é a única arma que a gente tem de construção de um novo mundo. E não é tão utópico, mas algo mais pragmático mesmo: eu preciso saber aonde eu quero chegar para construir os caminhos para ir até lá. Então, a esperança tem um lugar importantíssimo agora", completa Julia Henning.

O espetáculo "23 fragmentos dos últimos dias" deve ser apresentado no Rio de Janeiro e em São Paulo em meados de 2023. 


 
13
Set22

A Constituição foi "estapeada" no dia 7 de setembro

Talis Andrade

Livro - 30 anos da CF em 30 julgamentos | Casas Bahia

 

 

por Lenio Luiz Streck

- - -

1. Meu namoro e casamento com a Constituição

Em 6 de outubro de 1988 fiz meu primeiro controle difuso de constitucionalidade. Recebi uma pilha de "Processos Judicialiformes" (os jovens nem imaginam o que seja isso) e escrevi que a Lei 4.611 não estava recepcionada. O juiz acatou a suscitação e passei a trabalhar sem o entulho da velha Lei.

Começava ali meu namoro com a Constituição. Porque com o constitucionalismo eu já estava enrabichado de há muito. Cambicho, como se chama enamorado em gauchês! Afinal, fizera mestrado bem antes, em 1983-84.

Na Introdução do meu livro 30 anos da Constituição em 30 julgamentos, escrevo a trajetória do Direito de lá para cá. Minha ode à Constituição e à Jurisdição constitucional está ali, "esculpida em carrara". Minha ode a essa balzaquiana. A Constituição é paradigma. Não só limita: constitui.

É isso. Sempre disse que a Constituição constitui. Cheguei a brincar com a palavra: A Constituição constitui-a-ação! Algo do tipo "como fazer coisas com a Constituição" imitando John Austin (how to do things with words).

 

2. As canções que escrevi pra você, Constituição!

As dezenas de livros que escrevi são minhas canções para a Constituição. Parafraseando o disco de Maria Bethânia (das músicas de Roberto Carlos), As Canções que você fez pra mim, poderia dizer "As canções que fiz pra você, Constituição". Porque você é a razão da existência do Direito. Por isso você tem cláusulas pétreas. Por isso construímos um quarto do pânico da democracia, para nos protegermos quando chegarem os bárbaros. Para nos protegermos quando a choldra vier atirando fogos e pregar o fechamento do STF. A Constituição nos constitui. Percebem a força dessas palavras?

Mas exatamente por isso estou em pânico institucional. A chave do quarto do pânico não está conosco. Está com o invasor.

 

3. Tantas lutas já travadas e, agora... a Constituição foi estapeada em um dia em que deveria ser enaltecida

Como diz Ferrajoli, e isso está em livros meus dos anos 90: garantismo é fazer democracia no e pelo Direito. Porque a Constituição é norma. Não é uma folha de papel. Não é política. Bebe na política, na moral, mas o Direito é que limita a política e não o contrário.

Constituição, meus caros. A constituição que constitui. Que funda o paradigma da filtragem institucional da política e da moral. O Direito sob sua melhor luz que nos coloca sob nossa melhor luz. Sei que não é fácil: há anos luto contra o desencantamento do Direito, tomado por ceticismo e teorias políticas de poder que lhe tiram o mínimo de autonomia.

No Brasil tudo é épico. Tudo é renhido. E tinha que ser, como na luta pela presunção da inocência, por margem apertada.

Meus textos são canções desafinadas cantadas por um menestrel que, jurassicamente, acredita no constituir da Constituição. Sim, com muita honra,

"hoje eu ouço as canções que fiz para a Constituição".

Algumas mais tristes. Com sofrências. Algumas em dueto. E algumas árias.

Tristemente, vemos o presidente da República fazendo palanque político usando a estrutura pública para campanha eleitoral no 7 de setembro. Tudo transmitido ao vivo e em cores. Até o porteiro de qualquer tribunal sabe que a lei eleitoral veda esse tipo de procedimento.

O problema é: o direito consegue dar uma resposta? As instituições funcionam?

O ex-ministro Ayres Brito disse muito bem: Bolsonaro violou a Constituição sob vários ângulos. "Nossa Constituição foi estapeada", conclui.

Pronto. Nada mais precisa ser dito. Ele disse o quantum satis.

26
Jul22

O vexame tenebroso do capitão

Talis Andrade

Crédito: Clauber Cleber Caetano/PR(Crédito: Clauber Cleber Caetano/PR)

 

Editorial Istoé

por Carlos José Marques 

 

Até quando o País vai suportar tantos desaforos? Quantos crimes de responsabilidade serão passíveis de remissão a um mandatário que planeja ardilosamente um golpe de Estado para se perpetuar no poder? Por que, efetivamente, as autoridades constituídas nada fazem contra o festival de delinquências emanadas diretamente do Planalto por aquele que deveria ser o primeiro a defender a Constituição do País e a zelar por nossa democracia? Está na hora do basta! Definitivo, audível, veemente. Um brado nacional, que ecoe a absoluta indignação com essa avalanche de desmandos, afrontas e desprezo aos princípios republicanos mais elementares. Não dá para ser indulgente com a cruzada insana e golpista em curso. O presidente enxovalha o Brasil. Emporcalha a reputação de uma Nação digna e soberana, construída duramente ao longo de séculos. Ele não reúne mais a menor condição de se manter no cargo que ocupa. O Congresso e o Supremo Tribunal têm o dever cívico de fazer alguma coisa. Não podem parecer coniventes, omissos ou insensíveis diante da incitação à desordem e ao desmantelamento legal, orquestrados pelo mandatário. Não é passível de aceitação que uma corriola de parlamentares mal intencionados e muito bem pagos controle o regimento para brecar demandas de impeachment que se mostram inevitáveis e amplamente justificáveis. Há de se restabelecer o bom-senso na política nacional, sob pena de estarmos mergulhando numa espiral de autoritarismo sem fim e sem instrumentos lá na frente para coibir tantos abusos. Como é possível aceitar que o chefe da Nação convoque embaixadores representativos dos principais países parceiros para um festival de fake news patético, levantar desconfianças rasas e infundadas sobre o sistema eleitoral em vigor, pilar de nossa liberdade e do voto? O que ele quer é, definitivamente, anular o resultado que não lhe agrade. Diz isso e arquiteta diuturnamente os meios para alcançar tal objetivo. Inclusive apelando a militares aliados que estrategicamente aboletou em cargos para lhe dar respaldo. Bolsonaro é um acinte intolerável à estabilidade institucional. Seus movimentos e declarações não guardam qualquer lógica razoável. Dignos de uma mente doentia e perversa. Nem é preciso gastar tempo para explicar a um trangressor que em mais de 20 anos de operação das urnas eletrônicas – modelo invejado pelo mundo inteiro – não houve sequer um único registro de fraude computado. Ele não quer ouvir. Nem aceitar. O motor de suas ignomínias é o temor da derrota iminente, que pode significar também condenações em série pelas barbaridades cometidas no seu governo. Jair Messias Bolsonaro é o retrato do desespero diante da possibilidade de ser o primeiro presidente não reeleito após a redemocratização.

 

Image

 

Também pudera! Com o novo gesto tresloucado aprofundou ainda mais a imagem de pária junto à comunidade internacional. Os diplomatas presentes foram unânimes em expressar o desprezo pelo ato. Nenhum dos participantes, ao final da cerimônia e da fala do anfitrião, sequer fez menção de aplaudi-lo, ainda que fosse de forma protocolar. O silêncio ensurdecedor na sala deu o tom do vexame. Nenhum cumprimento ou aperto de mão para aquele que acabara de encenar uma sabotagem ao próprio País. O teatro burlesco montado no Palácio da Alvorada vai ficar para a história como o dia da grande vergonha. Nunca antes em tempos modernos um chefe de governo brasileiro convocou diplomatas para destilar mentiras e ameaçar a democracia. O Brasil passou constrangimento e humilhação inclassificável por impossição daquele que deveria estar tratando dos problemas mais candentes como a fome que castiga 33 milhões por aqui, a inflação descontrolada e o desemprego. Ao sair de suas motociatas para disparar infâmias, Bolsonaro galgou mais um estágio na sanha ditatorial que acalenta. É um caudilho clássico em gestação e precisa ser urgentemente contido.

Image

 

Um grupo de 43 procuradores dos 26 estados e do Distrito Federal decidiu, a bom termo, encaminhar ao procurador-geral da República ofício formal no qual eles pedem providências imediatas contra a conduta criminosa do capitão do Planalto. Augusto Aras, o PGR atual, não é dado a contrariar aquele que parece considerar como chefe supremo. Certamente driblará a demanda. Delegados e peritos da Polícia Federal também fizeram abaixo-assinado defendendo a lisura e a eficiência das urnas eletrônicas. São vozes importantes que começam a impor a saudável prática dos pesos e contrapesos diante das arbritariedades em andamento. Bolsonaro não aceitará perder o certame eleitoral. Mas nem ele, nem ninguém, pode sobrepor suas vontades pessoais ao desejo da maioria em um ambiente de Estado de Direito. Já chega de arruaça e prepotência. Se o presidente da República é um claro perigo à Carta Magna e ao processo democrático, que seja apeado do cargo o quanto antes. O Brasil tem de reagir!Image

ImageImageImageImageImage

Charge colorida tem apenas uma quadro e mostra Augusto Aras e Lindôra Araújo, caracterizados como os heróis “Super Gêmeos”, como macacões roxos. Os dois exclamam: "Super procuradores ativar!" e tocam seus punhos fechados. Aras grita: “Forma de um poste!” e Lindôra grita: “Forma de uma gaveta!”A charge, sob o título "Centopeia Humana", tem apenas um quadro e  mostra as silhuetas de seis pessoas, todas em posição de quatro, com a cabeça encostando nas nádegas de quem está à frente. Por último na fila está Aras, sucedido pelo ministro da Defesa Paulo Sergio Nogueira, que tem a sua frente o candidato o vice-presidente Braga Netto, que é sucedido por Ciro Nogueira, depois Arthur Lira e, por fim, o presidente da República. O título da charge faz alusão a um famoso filme de terror.

MPFederal on Twitter: "Ficou acertado que ainda hoje a CPI enviará à PGR,  de forma separada, a parte da documentação referente a pessoas cujas  investigações devem tramitar perante o Supremo Tribunal Federal (

Gilmar Fraga: surrealismo jurídico | GZHImageImageImage

Image

Image

 

 

ImageImageImageImageImageImage

 

Follow Elaine Nascimento Pe's (@elaineconst) latest Tweets / Twitter

Image

07
Jun22

"Se a jurisprudência está fazendo algo novo, é levar a sério a Constituição"

Talis Andrade

justiça vaccari.jpg

 

REVOLUÇÃO PENAL

Por Danilo Vital e Thiago Crepaldi

 

A perplexidade com que a sociedade brasileira tem recebido os recentes e incisivos julgamentos das turmas criminais do Superior Tribunal de Justiça tem levantado no ministro Marcelo Navarro Ribeiro Dantas um questionamento: será que os que as contestam sabem que se tratam de direitos previstos já nas leis e na Constituição do Brasil?

São garantias que todo cidadão goza e que, por um motivo ou outro, por vezes não saíam do papel. Se agora o STJ decidiu dar-lhes efetividade, tanto melhor. Nesses casos, aponta o ministro, não há novidades.  “Se há alguma coisa de novo é que finalmente se está levando a Constituição a sério”, diz, em entrevista ao Anuário da Justiça Brasil 2022, que será lançado pela ConJur.

Integrante da 5ª Turma do STJ, ele elogia a harmonização não planejada que tem havido com a 6ª Turma e relata elogios sobre a mudança na forma como se deve aplicar o Direito Penal e Processual Penal no Brasil. A ideia é simples, mas de difícil execução: é possível ter eficiência na persecução penal sem necessariamente desrespeitar garantias fundamentais.

"Não adianta a gente falar que eficiência é prender ou condenar mais gente. Eficiência é prender e condenar mais culpados. E se você tem um nível de condenação alto e no meio tem muita gente inocente? Não faz sentido. A gente precisa de um processo penal que preserve as regras do jogo, que são principalmente as regras da Constituição e, obviamente, as regras da lei penal e processual penal. Buscar a eficiência deve ser uma meta no Judiciário, mas essa eficiência não pode sacrificar os direitos básicos do cidadão", defende.

 

Danilo Vital e Thiago Crepaldi entrevistam 

Marcelo Navarro Ribeiro Dantas

 

caricatura-ministro-stj-marcelo-navarro1.png

ConJurHá uma evidente mudança de postura nas turmas criminais do STJ. Se antes uma poderia ser taxada de mais legalista ou garantista que a outra, hoje nota-se um alinhamento de posições. A que se deve essa alteração?

Ribeiro Dantas — Nada disso foi planejado. Aconteceu naturalmente, com a renovação do tribunal. Estamos sempre em contato via grupos de aplicativos de mensagem. Quer dizer, de alguma maneira você está sempre conversando com os colegas, e se sai uma decisão no Supremo ou um caso novo, alguém coloca no grupo para compartilhar. Então existe mais essa interação. E também pela questão das afetações. Nós nos adaptamos a esse sistema, que eu acho muito bom: toda vez que temos alguma coisa que pode discrepar do que se fez antes ou, quando há uma percepção de que o entendimento das turmas pode ser a hora de mudar, nós levamos para a seção. Quando um ministro traz uma novidade, ele mesmo, ao colocar no sistema, faz um autodestaque, ou seja, chama a atenção dos colegas para aquele processo, não porque haja algum problema nem nada, mas porque está incluindo algum fator decisório novo que talvez não seja exatamente na linha do que era feito antes. E isso é interessante, primeiro porque é uma honestidade intelectual da parte de quem leva o argumento. E também para você ver se seria voto vencido, ou melhorar um argumento. Então esse uso mais intensivo dos sistemas eletrônicos ele acaba fazendo com que haja uma maior harmonização.

 

ConJurAs estatísticas levantadas pelo Anuário da Justiça mostram uma aproximação de entendimentos entre as duas turmas.

Ribeiro Dantas — Essa harmonização é importante porque isso é o que hoje se prega na doutrina processual. O Código de Processo Civil diz expressamente "os tribunais organizarão a sua jurisprudência de modo a mantê-la íntegra, coerente e estável". E isso, embora não conste no Código de Processo Penal, pode ser aplicado porque não colide com nenhuma disposição em contrário e nem com nenhum princípio. Talvez seja ingênuo pensar assim que, só por causa de um dispositivo da lei processual, isso possa mudar toda a nossa cultura de sermos rebeldes aos nossos procedentes. O juiz brasileiro tem uma cultura em que tudo é em nome da liberdade de julgar, e cada um continua produzindo as decisões conforme melhor lhe parece. Nós temos que criar essa cultura da estabilidade, da coerência e da integridade da jurisprudência. Eu fico então muito satisfeito que as turmas criminais estejam mais alinhadas. Isso é importante porque, se elas estivessem desalinhadas, nós estaríamos à mercê da sorte. Claro que as turmas existem para que haja entendimentos diferentes e para que haja debate, mas não podem estar em total descompasso. Fico muito feliz em saber que estatisticamente isso está se comprovando.

 

ConJurOs efeitos são claramente positivos.

Ribeiro Dantas — Eu acho que ambas as turmas da 3ª Seção estão fazendo um trabalho bem interessante. Já ouvi isso de alguns penalistas e de alguns processualistas penais, reconhecendo que o setor de jurisprudência criminal do STJ está mudando a maneira como se aplica o Direito Penal e Processual Penal no Brasil, e eu fico muito satisfeito de estar participando dessa área do tribunal nesse momento tão rico. É importante, também, a construção de uma convivência muito harmônica, muito agradável entre os ministros da 3ª Seção e, principalmente, entre os ministros da 5ª Turma. Nós gostamos de estar no nosso ambiente de julgamento e nos respeitamos muito como colegas. Isso contribui e tem um valor. É de um aspecto meta jurídico, mas que, com certeza, contribui para o andamento do nosso trabalho.

 

ConJurAmbas as turmas têm julgado no sentido de garantir direitos fundamentais em relação a ações policiais. A questão da invasão do domicílio sem autorização judicial e do correto reconhecimento pessoal têm sido balizadas a cada caso. Como equilibrar esses entendimentos sem passar a ideia de que se está inviabilizando o trabalho policial?

Ribeiro Dantas — Nós achamos que é, sim, possível ter eficiência no processo penal respeitando as garantias da Constituição. Até porque não adianta a gente falar que eficiência é prender ou condenar mais gente. Eficiência é prender e condenar mais culpados. E se você tem um nível de condenação alto e no meio tem muita gente inocente? Não faz sentido. A gente precisa de um processo penal que preserve as regras do jogo, que são principalmente as regras da Constituição e, obviamente, as regras da lei penal e processual penal. Buscar a eficiência deve ser uma meta no Judiciário, mas essa eficiência não pode sacrificar os direitos básicos do cidadão. Por que é que a inviolabilidade do domicílio existe para o cidadão de classe média e alta, mas não para o pobre que mora em comunidade, porque a polícia mete o pé na porta dele e está já dentro de casa? Então a questão aí não é dizer que inviabilizou a investigação policial. Isso está na constituição. O direito à inviolabilidade do domicílio está na constituição. A jurisprudência não está fazendo nada de novo. Se há alguma coisa de novo é que finalmente se está levando a Constituição a sério. Eu acho que uma grande parte dessas perplexidades que às vezes se tem é que as pessoas nunca pensaram nisso, nunca pararam para ver que são coisas que estão garantidas desde sempre, às vezes até antes da Constituição de 1988, mas que por muitas vezes ficaram apenas no papel. Se agora a Justiça está realmente colocando essas garantias para valer, acho que isso é um avanço.

 

ConJurÉ positivo, de uma forma geral.

Ribeiro Dantas — O caso por exemplo do uso de câmeras para filmar a ação da polícia e que vários estados do Brasil estão fazendo isso. A tecnologia avançou e a câmera é pequena o suficiente para se usar na lapela e barata o suficiente para que não seja de outro mundo. Isso é uma garantia para as pessoas e para os policiais também. Porque os policiais também sofrem quando exercem a sua atividade e, muitas vezes, fica a palavra do policial contra a palavra da pessoa que foi parada. Está tudo filmado e todos ficam garantidos. São coisas que finalmente estão acontecendo e que deveríamos ter discutido isso muito antes. Se agora que estamos discutindo, então melhor. Isso vai ter um efeito também na qualidade do trabalho da polícia, porque ela não vai ficar mais só atrás de perseguições ou de entrar na casa de alguém que supostamente tenha praticado algum ato delitivo. A polícia vai ter que se dedicar a um trabalho de investigação sério, vai ter que se aperfeiçoar com cursos sobre investigação, sobre interrogatório, vai poder se dedicar a investigar um grande crime e não apenas pegando os pequenos delinquentes. Acho que é isso que a sociedade quer.

 

ConJurNão foram poucas as vezes que, no STJ, se apelou para um maior respeito à jurisprudência formada. Ainda é possível fazer algum tipo de apelo para os tribunais locais?

Ribeiro Dantas — Pode ser alguma ingenuidade minha de achar que em algum momento vamos conseguir uma adesão maior aos nossos precedentes. Eu preciso acreditar nisso, porque é uma cultura em construção. Volta e meia algum profissional do Direito, algum autor que escreve um artigo ou um livro acerca dos precedentes e diz: “Olha, aqui no Brasil os precedentes são diferentes dos precedentes nos Estados Unidos, na Inglaterra; aqui no Brasil criaram o precedente fast food; aqui se quer fazer um precedente no presente para resolver situações do futuro”. Tudo bem. O que existe é que eles vêm de uma cultura secular de uso dos precedentes que nós não temos. Embora tenha os assentos da Casa de Suplicação, os pré-julgados antigos e as súmulas, apesar disso a nossa cultura segue sendo a cultura da liberdade de julgamento, da liberdade de cada juiz julgar como melhor lhe parece. E a questão da formação de um sistema brasileiro de precedentes começa a partir da Emenda Constitucional 45, de 2004. Então é algo novo. Alguns tribunais têm uma dificuldade maior em aceitar, mas eu quero crer que os juízes vão começando a se informar com novas ideias. Hoje isso começa a ser ensinado desde a faculdade e, naturalmente vai melhorar. Talvez não com a rapidez que nós desejaríamos, mas a tendência é melhorar. Não sei se eu sou um pouco mais esperançoso, ou mais ingênuo, mas é isso.

 

ConJur — A 5ª Turma tem dois precedentes muito relevantes sobre apelação contra condenação do tribunal do júri contrária às provas. Um deles trata sobre como analisar essa apelação e o outro é sobre o veto à condenação com base só no inquérito. Por que esse tema segue tormentoso no Brasil?

Ribeiro Dantas — Houve uma pacificação interna no STJ pela 3ª Seção. Essa absolvição supostamente contrária à prova dos autos é a chamada absolvição por clemência. Na doutrina, há uma divisão. Tem autores que dizem que ela é uma decorrência lógica da modificação que foi feita no Código de Processo Penal em 2008 [Lei 11.689/2008]. Antes, você tinha aquela série interminável de quesitos que podiam se desdobrar em tantas outras séries dependendo de cada pequena característica do delito. Aquilo era muito complicado. O jurado, no geral é uma pessoa comum do povo e ele se enrolava. Então o legislador de 2008 reduziu os quesitos para cinco, sendo que três deles eu pessoalmente chamo de quesitos principais: materialidade de que o fato aconteceu, autoria — se o réu fez mesmo ou ao menos atuou como partícipe — e se ele merece ser absolvido. A pergunta é: esse terceiro, se o réu merece ser absolvido, precisa estar em harmonia ou não com os dois primeiros? E aí nós temos duas normas principais: uma é o Código de Processo Penal, que diz que é possível haver apelação referente ao decido pelos jurados se for manifestamente contrária à prova dos autos. E nós temos um dispositivo da Constituição que diz que o júri é mantido com as seguintes características: a soberania de vereditos. Então os vereditos são soberanos e é por isso que o tribunal não pode reformar. Então essa questão segue tormentosa. Internamente, ele está pacificada. Mas no Supremo isso não foi decidido. Esse é um tema que está aqui no STJ pacificado, mas temos que ver ainda o que o Supremo vai decidir.

 

ConJurE o caso do veto à condenação com base só em provas colhidas no inquérito?

Ribeiro Dantas — A questão é o chamado standard da prova. Esse é um tema que está há muito tempo em outros países, principalmente nos de tradição anglo-saxônica. Usamos o patamar de que, para uma condenação pelo júri, uma simples prova colhida num inquérito sem contraditório não deveria surtir o mesmo efeito. Também temos colocado que uma coisa é o nível de provas que se exige para pronunciar ou despronunciar um réu, mas a prova condenar deve ser maior. Eu acho que o Direito Processual Penal no Brasil está deslanchando, justamente por esse nível de detalhe a que nós estamos chegando. Não temos um código novo. Ele não aconteceu na esfera do processo penal como aconteceu na esfera do processo civil. Ou seja, não houve uma renovação completa, mas a doutrina e a jurisprudência estão a todo vapor tentando suprir as possíveis deficiências da legislação.

 

ConJurHá quem defenda o tribunal do júri como algo ultrapassado e que não traz uma verdadeira justiça. Em sua opinião, deve ser mantido como é?

Ribeiro Dantas — - Já tiveram alguns aprimoramentos. Essa lei de 2008 mudou muito como o júri era feito. A discussão de ser contra ou a favor, a meu ver, é uma discussão inútil, porque o júri é consagrado constitucionalmente e, para muitos autores, ele está no núcleo imodificável da Constituição, então ele é uma cláusula pétrea. Não adianta alguém vir amanhã com uma emenda para abolir o júri, porque provavelmente o Supremo declararia inconstitucional. Então o júri, pelo menos com aqueles quatro lineamentos básicos que a Constituição traz, dos crimes dolosos contra a vida, supremacia dos vereditos, entre outros, vai ter que continuar existindo. É melhor tentar debater como melhorar, isso sim. E isso se pode fazer através de aperfeiçoamentos providenciais em cima da legislação.

 

28
Mai22

Entenda as etapas que compõem a estratégia golpista do governo e as chances de prosperar

Talis Andrade

henfil militares .jpeg

 

por Christian Lynch
Insight Inteligência

O sistema político de 1988 foi construído deliberadamente contra a herança autoritária do regime militar. A Constituição que lhe serve de baliza jurídica consagrou uma arquitetura institucional pautada por princípios e valores capazes de comportar governos liberais democráticos, como o de Collor de Mello e Fernando Henrique; social-democratas, como o de Lula e Dilma; e conservadores, como o de Sarney e Temer.

A crise de legitimidade do sistema representativo tornada aguda entre 2013 e 2018 tornou possível, porém, a emergência de uma direita radical, inimiga do Estado de Direito da Nova República.

FANTASMA DO GOLPE – Desde então, o fantasma do golpe tem assombrado nossa democracia. O questionamento do resultado da eleição presidencial de 2014 por Aécio Neves foi denunciado como “tentativa de golpe”; a Lava Jato, como um conjunto de sucessivos “golpes” em formas jurídicas (o “lawfare”); e o impeachment de Dilma Rousseff, como “golpe parlamentar”.

A própria eleição de Bolsonaro teria sido possível graças ao “golpe” da cassação dos direitos políticos de Lula pelo STF, intimidado pelo então comandante do Exército.

Por fim, marcado por um populismo reacionário, sustentado na exploração da desconfiança crônica da legitimidade das instituições, tendo por modelo de bom governo justamente o regime militar, o governo Bolsonaro é obviamente incompatível com o sistema constitucional de 1988. Não pode governar, portanto, senão tentando burlá-lo.

“GOLPISMO” – Desde então, o “golpismo” se tornou conceito básico do vocabulário político, verdadeira ideia-força associada ao modus operandi do novo governo. Ele faz parte da estrutura lógica de governos autoritários, que não reconhece limitações às condições de sua sobrevivência e reprodução.

Eles não são orientados pela doutrina do Estado de Direito, mas pela Razão de Estado, que preconiza a possibilidade de desrespeito à lei pelo governante em nome do valor supremo da “segurança nacional” (na verdade, a sua própria).

Da doutrina da Razão de Estado se extraem duas técnicas: a do segredo de Estado, que autoriza a supressão da publicidade dos atos governamentais pela imposição do sigilo, e o golpe de Estado, ação violenta e fulminante destinada a neutralizar os inimigos da segurança nacional (isto é, do governante).

Embora relacionados todos à arquitetura golpista do governo Bolsonaro, os termos “golpe” ou “golpismo” têm sido empregados para designar três fenômenos que têm sido confundidos, mas que cumpre distinguir para melhor compreender a cena política.

CULTURA AUTORITÁRIA – O primeiro desses significados remete às ações praticadas rotineiramente com o objetivo de implantar um programa de governo incompatível com a Constituição e enraizar uma cultura autoritária na administração e na sociedade. São “os golpes nossos de cada dia”.

Eles são praticados à luz de um legalismo autocrático que ignora os valores, princípios e precedentes jurídicos, substituindo-os por uma interpretação formalista e seletiva do texto da lei de modo a favorecer a expansão das prerrogativas presidenciais. Governa-se por decretos ilegais, na esperança de torná-los fatos consumados pela lentidão do Congresso e do Judiciário.

Aparelham-se os órgãos administrativos, com nomeação deliberada de pessoal inadequado e conivente. Vandalizam-se órgãos da educação, da cultura, da ciência, da saúde, dos direitos humanos e do meio ambiente, transformados em um misto de cabide de emprego e depósito de lixo. O sigilo é imposto a todos os atos cuja publicidade prejudique a administração. Ao mesmo tempo, neutralizam-se pela cooptação e pela intimidação as instituições encarregadas de controlar os malfeitos do governo, como o Ministério Público, a Polícia Federal, o Tribunal de Contas e o Poder Judiciário.

“NAS QUATRO LINHAS” – Todas esses atos são apresentados pelo legalismo autocrático como constitucionais. É o que Bolsonaro afirma quando diz “jogar dentro das quatro linhas” — ainda que com farta distribuição de catimbas, faltas, agressões e outras jogadas desleais por ele praticadas, sob o olhar complacente de um juiz por ele designado e devidamente comprado.

O segundo sentido da palavra “golpe” remete à sombra do “golpe de Estado” clássico. Dentro da arquitetura golpista, ele visa justamente a desestimular pela ameaça velada de uma ruptura democrática a resistência da sociedade civil e das instituições de controle aos “golpes nossos de cada dia”.

Este golpe se daria menos à maneira de 1964, que elevou os militares ao poder — função exercida já pela eleição de 2018 — do que à de 1968, que pelo AI-5 “legalizou” de vez a razão de Estado identificada com a oligarquia militar.

TERATOLOGIA –  Sua pedra de toque reside na interpretação teratológica do art. 142 da Constituição, que em um momento de instinto suicida teria conferido ao próprio presidente da República, na condição de comandante-em-chefe das Forças Armadas, um “poder moderador” que o capacitaria em caso de crise com outros poderes impor sua vontade sobre os demais, na qualidade de “supremo guardião da Constituição”.

Para tornar a ameaça mais verossímil, Bolsonaro não só incentivou manifestações por uma “intervenção militar constitucional” (sic), como tenta transmitir a impressão de que o endosso ao seu governo por alguns generais significaria adesão irrestrita das Forças Armadas à sua pessoa.

Afinal, não se desfecha um golpe de Estado sem a participação ativa dos quartéis. Daí que cole sua imagem à dos militares, participando de formaturas, oferecendo-lhes cargos em penca e convertendo o Ministério da Defesa em um “ministério da ameaça de golpe”, encarregado de suscitar “questões militares” sempre que em defesa da vontade contrariada do presidente.

NA ALÇA DE MIRA – O principal alvo do golpismo é o STF que, na condição de verdadeiro guardião da Constituição, se tornou uma pedra no sapato no projeto bolsonarista de expansão da cultura autoritária.

O terceiro sentido da palavra “golpe”, por fim, remete à insurreição como forma de resistência do povo à fraude de sua vontade soberana. Enquanto o populista moderado alega, em caso de derrota, que o povo foi enganado pelas elites, radicais como Bolsonaro vendem a tese da fraude para reforçar a tese do complô das instituições contra a vontade popular.

Daí a necessidade de deslegitimar sua eventual derrota, difundindo a desconfiança nos métodos de apuração eleitoral. A traição à vontade do povo pelas instituições — mais uma vez, o Poder Judiciário — legitimaria uma insurreição à maneira da invasão da sede do Capitólio norte-americano em janeiro de 2021.

“POVO ARMADO” -Também aqui o Ministério da Defesa tem se prestado ao papel de instrumentalizar a suposta competência técnica dos militares para dar credibilidade à possibilidade de fraude.

Mas o protagonista deste golpe não seriam os generais do Alto Comando, e sim “povo armado” por Bolsonaro pelos clubes de tiro, bem como militares de baixa patente, principalmente policiais. Este seria o povo encarregado de “resistir à opressão” em defesa de sua “liberdade”.

Estes são os três golpes possíveis de Jair Bolsonaro. Nenhum, porém, passa sem severas complicações. O primeiro, de sabotagem contínua do Estado de Direito, encontra resistências não só dentro dos poderes Legislativo e Judiciário, como no Ministério Público Federal e na própria administração.

O segundo, voltado para a eliminação da autonomia dos demais poderes por uma espécie de AI-5, não é do interesse de quase ninguém.

 

ai5.jpg

NOVO AI-5? – O regime de exceção não é do interesse da classe política, que ficaria sob a contínua tutela de um autocrata desequilibrado. Também não é da maioria dos generais da ativa, ciosos da preservação de sua autonomia institucional e já satisfeitos com seu retorno ao jogo político, do qual não sairão tão cedo, seja quem vencer a eleição de 2022.

Mais provável é sem dúvida a tentativa de insurreição contra os resultados eleitorais, a fim de barganhar alguma forma de indulto ou anistia à cúpula bolsonarista. Mas também aqui o “golpe” tende a encontrar a oposição da própria classe política, cujas lideranças teriam questionadas suas próprias eleições em caso de alegação de fraude. A começar pelo Centrão, que espera “lavar a égua” depois de turbinado pelo orçamento secreto.

Trinta anos de rotina democrática não passam em vão. [Publicado em 28 de maio de 2022 por Tribuna da Internet]

AI 5_zedassilva.jpg

18
Mai22

ONU é alertada sobre ameaça 'sem precedentes' a cortes brasileiras e risco autoritário pós-eleições

Talis Andrade

democracia constituicao por vaccari.jpeg

 

por Mônica Bergamo

- - -

O relator especial para a Independência de Juízes e Advogados da ONU, Diego Garcia, recebeu na noite de terça-feira (17) um documento em que cerca de 80 professores e juristas brasileiros alertam para "uma campanha sem precedentes de desconfiança e ameaças" contra cortes superiores no país.

O texto afirma que a independência judicial no Brasil enfrenta desafios não vistos desde a redemocratização pós-ditadura militar (1964-1985). Diz, ainda, que as eleições deste ano e a continuidade democrática estão ameaçadas diante dos ataques promovidos pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados.

O ofício foi elaborado pelo Observatório para Monitoramento dos Riscos Eleitorais no Brasil (Demos), integrado por pesquisadores do direito e da ciência política como Emílio Peluso Neder Meyer, Clara Iglesias Keller, Estefânia Maria de Queiroz Barboza e Diego Werneck Arguelhes.

"Bolsonaro tem investido fortemente para deslegitimar as eleições. Ele tem afirmado repetidamente —sem nunca fornecer nenhuma evidência— que o sistema de votação eletrônica que o país adotou nos anos 1990 está aberto à manipulação deliberada", afirmam os pesquisadores.

"Aqueles que acreditam que a democracia no Brasil está suficientemente garantida e protegida e que as instituições estão perfeitamente funcionando estão enganados. Não é exatamente fácil ver quando a linha entre democracia e ditadura foi atravessada, e o Brasil pode estar cruzando essa linha nos próximos meses", seguem.

O documento pede à ONU que realize uma visita oficial ao Brasil para mapear os ataques à independência judicial e ouvir magistrados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e do STF (Supremo Tribunal Federal), além de membros da sociedade civil. E solicita que sejam cobradas explicações do governo brasileiro.

Assinam o ofício nomes como Fernando Limongi, Gisele Cittadino, Christian Lynch, Conrado Hübner Mendes, Fábio Shecaira, Katya Kozicki, Lenio Luiz Strek, Marcos Nobre, Natalia Pires de Vasconcelos, Rachel Herdy, Rafael Mafei, Thomas Bustamante e Vera Karam de Chueiri.

A iniciativa ainda é apoiada por 28 entidades e grupos de pesquisa, como o Washington Brazil Office, o Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo (Laut) e o Laboratório de Estudos de Segurança e Defesa da UFRJ.

Os signatários também relatam à ONU que o governo Jair Bolsonaro incentiva ataques públicos a instituições e violência contra adversários políticos, além de minar a resolução pacífica de conflitos eleitorais.

Eles lembram que as eleições brasileiras são fiscalizadas pela Justiça Eleitoral desde a década de 1930, e que, entre 2018 e 2021, o país caiu cinco pontos no índice geral da Freedom House, organização de defesa de direitos humanos que mede a liberdade política em territórios do mundo inteiro.

"Bolsonaro testa os limites das instituições, incentivando seus apoiadores a agir contra os tribunais e seus juízes, erodindo o apoio às instituições de uma forma que fortalece sua própria agenda iliberal e autoritária", alertam.

"Bolsonaro tem apoiado a desinformação e as falsas acusações de fraudes nas eleições de 2018, mesmo que ele próprio tenha sido o vencedor", destacam.

O documento relembra episódios como os atos golpistas do 7 de Setembro, que ocorreram no ano passado e contaram com ampla participação do presidente, e o indulto concedido por ele ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) após condenação pelo Supremo.

O mais recente impasse entre o TSE e as Forças Armadas em torno do pleito de 2022 também é relatado à ONU.

ditadura nunca mais jorge omau.jpeg

11
Abr22

O Brasil em pânico institucional

Talis Andrade

 

 

benett ai 5.jpg

Lenio Luiz Streck
Fórum da Liberdade RS pergunta: você é livre para discordar? Minha Resposta: Sim, mas não para mentir e fazer fake News.. Não para pregar AI-5 e pedir fechamento do STF. Há rádios no RS que fazem isso todos os dias, em nome da liberdade de opinião. Estarão no fórum! Da liberdade!Charge: Passando a mão. Por Aroeira
Min.Rosa Weber dizendo para a AGU que ela - AGU - não deve se comportar como advocacia de governo! A AGU podia dormir sem essa. Como é fácil desfigurar instituições no Brasil. Quando será resgatada a função da AGU? Veja-se a procuradoria da UFPB defendendo o reitor. E assim vai.
Charge do Zé Dassilva: Bíblia | NSC Total
Leio que reuniões do Ministério da Educação eram consagradas pelos pastores Arilton e Gilmar! É! Banho de descarrego. Eles iam lá para isso! Senha para ingresso: “em o nome”. Contra-senha: “ do senhor Jesus”. Brasil progride com fé. Demais!!!
Charge do Zé Dassilva: Milagre!!! | NSC Total
Fabiano faz a pergunta fatal! Aliás, Deltan deve muitas respostas. Por ex, sobre os dólares debaixo da banheira! Quem falou disso foi a mãe dele nos diálogos Intercept. Mãe não mente! Mãe é sagrada!

dallagnol doudo por jaba no ceará .jpeg

Fabiano Silva
Mas você constituiu um fundo para isso Delta! Aliás, a fundação era para isso? Para ajudar na sua campanha!? Pq no contrato estava escrito que era para patrocinar interesses políticos no combate à corrupção. Era para te patrocinar? Conta para a gente

dd fundação .jpg

Polícia Federal pede prazo para o caso “Bolsonaro e divulgação da fake de que vacina tem relação com AiDS”. Realmente, muito “complexa” a investigação. Será que Bolsonaro falou isso? Céus. Que dúvida atroz! Prova pericial? Esse Brasil só reiventando! É a “Independência” da PF…!

benett  ai 5.jpg

 

Image

moro rasgou constituição para prender lula ele

 
 
 

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2022
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2021
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2020
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2019
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2018
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2017
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
Em destaque no SAPO Blogs
pub