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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

26
Set21

Promotora nazista mostra a essência de classe do judiciário

Talis Andrade

Promotora do MP-DF comprova tendência nazifascista do governo - Correio do  Brasil

Extrema direita: Olavo de Carvalho e Marya Pacheco

 

por Causa Operária

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Dentro da classe média há uma grande parcela que vê o judiciário como o pilar da democracia. As publicações de Marya Olímpia Ribeiro Pacheco, promotora do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), em suas redes sociais, mostram o quão tolo este modo de ver o Judiciário é.

Autodeclarada militante virtual (ou o que quer isso signifique) do presidente Jair Bolsonaro, Marya Pacheco, discípula de Olavo de Carvalho, publicou sete cartazes de conteúdo nazista, e louvação a Adolf Hitler.

O objetivo desta casta não são ideias abstratas como o direito ou a justiça, mas a execução de interesses pessoais e a manutenção das estruturas de poder e opressão sobre a população.

Se contra a personalidade mais popular do país, Lula, desmandos e arbitrariedades de todo o tipo foram realizados, pior ainda é feito com a camada mais pobre da sociedade. O Monitor da Violência publicou, em 19 de fevereiro de 2020, levantamento onde 31% dos mais de 710 mil presos brasileiros não haviam sido julgados. E este número deve ser até “comemorado”, pois no ano anterior 35,9% dos presos ainda aguardava julgamento.

Isto mostra que o judiciário do Brasil segue o protocolo de prender para depois julgar. Similar ao que a polícia brasileira faz, atira e depois pergunta.

Não é possível dizer que o judiciário brasileiro é democrático. É um completo e total contrassenso!

Diferentemente dos poderes executivo e legislativo, o judiciário vive à margem da sociedade. Seus membros não são eleitos pelo povo e, por isso, não tem como obrigação atender os anseios de justiça dos milhões de pobres e miseráveis, mas sim a seus interesses próprios: pessoais e de casta privilegiada.

Tanto o caso de Marya Pacheco quanto o da camarilha que comanda a nauseabunda Lava Jato mostram o caráter de classe da máquina judiciária brasileira. Pode se afirmar, sem medo de ser leviano, que a justiça brasileira é uma justiça para poucos. Enquanto isso, a imensa maioria da população se vê refém destes mandarins que vociferam termos em latim.

A única alternativa é o fim do MP e de outras estruturas da justiça como vemos hoje, assim como da Polícia Militar.

No lugar do aparelho jurídico e de repressão, deve ser realizado um mecanismo para que juízes e promotores sejam eleitos pela população. Somente desta maneira será possível garantir um judiciário que seja justo sobretudo com o povo. Do modo que tem-se hoje, a justiça serve apenas aos mais ricos.

 
20
Jul21

Anuário: Letalidade policial é recorde no país; negros são 78% dos mortos

Talis Andrade

carne negra policia.jpeg

 

 

Por Igor Mello /Prerrô

Mesmo com a pandemia de covid-19 restringindo a movimentação de pessoas, nunca as forças policiais brasileiras mataram tanto quanto em 2020, segundo dados do Anuário de Segurança Pública.

A publicação, organizada pelo FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública), destaca que os negros foram as maiores vítimas de policiais — correspondem a 78,9% das 6.416 pessoas mortas por policiais no ano passado. O número de mortos por agentes de segurança aumentou em 18 das 27 unidades da federação, revelando um espraiamento da violência policial em todas as regiões do país.

Desde 2013, quando a publicação foi lançada, o aumento no número de mortes decorrentes de intervenção policial foi de 190%.

Mortes por intervenção policial no Brasil, por ano - Editoria de Arte - Editoria de Arte

A pesquisadora Samira Bueno, diretora executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e uma das responsáveis pela elaboração do Anuário, atribui o recorde de letalidade policial a uma escalada da violência na sociedade brasileira. Para ela, o apoio do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) a ações policiais violentas é um sintoma desse quadro ao mesmo tempo que o alimenta.

“É evidente que isso serve como estímulo [para os policiais matarem]. E me parece que essa politização da polícia e essa excessiva militarização da política estimulam esse aumento.”

camelo polícia e os invisíveis os pobres os ma

 

Rio e Amapá: destaque no ranking de violência policial

O estado com o maior número absoluto de mortes continua sendo o Rio de Janeiro —foram 1.245 pessoas mortas pela polícia em 2020. Ao mesmo tempo, o Rio teve a maior redução no número absoluto de vítimas (569) em razão de decisão do STF que restringiu ações policiais na pandemia. Sem as mortes computadas pelas polícias fluminenses, os demais estados brasileiros acumularam um aumento de 14% ante 2019.

O Amapá tornou-se o estado com a polícia mais violenta do país em 2020: sozinhas, as forças de segurança do estado tiveram uma taxa de letalidade de 13 mortes a cada 100 mil habitantes.

O Amapá também lidera em relação ao percentual das mortes violentas causadas pela polícia. No estado do Norte do país, 31,2% de todos os homicídios foram cometidos por policiais. Nesse quesito, Goiás vem logo em seguida, com 29,1% de todas as mortes atribuídas a agentes de segurança.

Para Samira, o crescimento dos índices de letalidade policial indicam que há uso abusivo da força por parte das forças policiais de vários estados brasileiros.

 

A GRANDE MENSAGEM É: ASSIM COMO A GENTE NÃO PODE ACUSAR QUE TODA MORTE POR INTERVENÇÃO POLICIAL É ILEGÍTIMA, A GENTE TAMBÉM ESTÁ LONGE DE PODER AFIRMAR QUE TODAS ESSAS MORTES ESTÃO LEGÍTIMAS. E TEM MUITA EXECUÇÃO QUE ESTÁ DISFARÇADA DE EXCLUDENTE DE ILICITUDE

Samira Bueno, diretora executiva do FBSP

 

Previsto no Código Penal, o excludente de ilicitude afasta a culpabilidade de condutas ilegais em determinadas circunstâncias, como em casos em que o agente de segurança mata em legítima defesa.

Em 2020, o número de agentes de segurança mortos no país chegou a 194 —22% a mais do que os vitimados em 2019. Desse total, 155 são policiais militares. O índice ainda revela que a maioria dos mortos (131) estava fora de serviço quando foram assassinados.

Negros são maiores vítimas

Apesar de serem 56,3% da população brasileira, os negros são vítimas de 78,9% das mortes cometidas por policiais no país. Em sentido oposto, os brancos —que totalizam 42,7% da população — foram vítimas de 20,9% das mortes.

Samira aponta que, além do racismo institucional presente nas corporações policiais, é preciso olhar esses índices como mais uma demonstração do racismo estrutural e da desigualdade racial no país, já que a população negra também é vulnerabilizada em uma série de outras questões, como acesso à renda e à moradia digna.

“É impossível não falarmos de racismo estrutural e desigualdade racial quando olhamos os dados de violência no Brasil. É a reprodução da máquina de moer gente que é a nossa sociedade”, afirma.

“Estamos falando também de um grupo que ocupa as piores posições em todos os indicadores socioeconômicos: renda, habitação precária, etc.. Esse é o legado de uma sociedade escravocrata por mais de 300 anos.”

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26
Jun21

Mães que perderam filhos em ações policiais relatam como a dor virou luta por justiça

Talis Andrade

Mães que perderam seus filhos por violência policial lutam por justiça

 

por Consultor Jurídico

Além da dor de perder os filhos jovens em ações violentas da polícia, Ana Paula Oliveira e Rute Fiuza têm em comum a queixa de não ter recebido o atendimento devido do poder público, bem como a determinação de transformar, como elas definem, “o luto em luta”.LUTO COMO MULHER, LUTO COMO MÃE - Geledés

As duas participaram do Painel "Violência do Estado", que integrou o webinário "Mães em Luta por Justiça: a Resolução CNJ 253/2018 e o Papel do Poder Judiciário", organizado pelo Conselho Nacional de Justiça nesta quarta-feira (23/6), com transmissão no YouTube.

O debate, proposto pelo Observatório de Direitos Humanos do Poder Judiciário, abordou a recente alteração do texto da Política Institucional do Poder Judiciário de Atenção e Apoio às Vítimas de Crimes e Atos Infracionais, definido pela Resolução CNJ 253/2018.

 

A mudança determina a adoção de medidas para "tornar visível, acessível, concreta e efetiva". A nova redação decorreu da interlocução do CNJ com entidades da sociedade civil e lideranças voltadas à proteção dos direitos fundamentais de populações vulneráveis e foi elaborado com a perspectiva de respeito à interseccionalidade de gênero, raça, classe e sexualidade.A violência policial contra negros como política de Estado no Brasil |  Notícias e análises sobre os fatos mais relevantes do Brasil | DW |  08.06.2020

Integrante do Movimento Mães de Manguinhos, do Rio de Janeiro, Ana Paula Oliveira perdeu o filho Johnatha de Oliveira, 19 anos, em 2016. "Ele foi assassinado com um tiro nas costas por um policial que já respondia a outros processos". Ao relatar as dificuldades da caminhada em busca de justiça, ela afirmou que encontrou mais criminalização.

"Na audiência, as perguntas de promotor e do juiz eram sobre a existência de tráfico na favela. Infelizmente, no Brasil, quando a polícia mata na favela, não mata só o corpo, mas faz tudo para tirar a dignidade da vítima. Saí do tribunal descrente e com a sensação de que aquelas pessoas não conseguiam se enxergar em mim."

Foi a primeira vez que Ana Paula entrou no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e ela lembra que, na ocasião, já convivia com diversas mulheres pobres, negras, moradoras da favela e mães de meninos assassinados pela polícia.

"Não foi difícil entrar no tribunal porque eu estava amparada pelos familiares e por outras mulheres que enfrentavam a mesma situação. A dor veio quando me deparei com o assassino do meu filho no corredor. Há sete anos aguardo que justiça seja feita e o policial segue solto com a certeza da impunidade."

Ana Paula enfatiza que a motivação do Movimento Mães de Manguinhos é para que outras pessoas não sejam assassinadas. "Temos que evitar que sigam matando nosso povo. Que a justiça atue para que outros casos não aconteçam e outras mães tenham direito de conviver com seus filhos."

Esse é o mesmo objetivo que estimula Rute Fiuza, do Movimento Mães de Maio do Nordeste, fundadora do Coletivo Familiares de Vítimas do Estado e Integrante da Coalizão Negra por Direitos. O filho Davi Fiuza tinha 16 anos e estava na porta de casa quando foi levado pela polícia baiana. O episódio ocorreu há sete anos e ele nunca foi encontrado.

"A polícia estava fazendo um treinamento na região. Pegaram Davi às 7h da manhã, quando ele conversava com uma senhora, que hoje se encontra em um programa de proteção a testemunha. Seus algozes estão livres e foram promovidos a capitães."

Rute destaca que, quando iniciou a luta tinha esperança de encontrar o filho, mas conheceu famílias que estavam na mesma batalha havia mais de 15 anos sem resultados. "Se já não fosse suficiente a dor de perder o filho, tenho que responder em audiência porque Davi estava na rua. Ele havia saído para comprar pão", desafabou.

O envolvimento com o tema, fez Rute Fiuza se tornar pesquisadora do Centro de Antropologia Ações Afirmativas e Políticas de Permanência da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), com apoio da Universidade de Havard (Massachussetts/EUA). Ela também organizou encontros com mães que enfrentam o mesmo problema na Colômbia e em Chicago (EUA).

"Nossa luta já ultrapassou fronteiras. A Anistia Internacional levou o caso do Davi para a Organização das Nações Unidas, que pediu a retratação do Estado brasileiro em 2019. Até hoje, não tivemos acesso à resposta."

A mediadora do debate, juíza da 5ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro Adriana Alves dos Santos Cruz, declarou que a morte de jovens negros no país é uma situação que se tornou inaceitável e é uma vergonha para o Estado brasileiro e para a sociedade. "A magistratura precisa aprender a ouvir. Nós, juízes, aprendemos oratória, mas não aprendemos a escutar. E isso precisa mudar."

Na avaliação da magistrada, os relatos apresentados pelas mães que perderam os filhos é uma vergonha também para o Poder Judiciário. "É uma vergonha que nosso sistema não esteja preparado para enxergar as pessoas. Agora, com a resolução, precisamos trabalhar para tirá-la do papel. Porém, cada juiz do Brasil não precisa de nenhum outro normativo para tratar as pessoas com dignidade e respeito." Com informações da assessoria do CNJ.

Mães que perderam seus filhos por violência policial lutam por justiça

14
Jun21

Rio acumula mortes por “balas perdidas” não investigadas

Talis Andrade

Cobrando justiça, familiares enterram Kathlen Romeu na tarde desta  quarta-feira | Voz das ComunidadesCASO KATHLEN ROMEU: Ativistas relacionam morte da jovem gestante à  necropolítica - Polêmica Paraíba - Polêmica Paraíba

Movimento negro faz vigília em homenagem a Kathlen Romeu em SP

 

por João Pedro Soares /DW

A designer Kathlen Romeu, morta aos 24 anos após ser atingida por um tiro na última quarta-feira (09/06), estava grávida de quatro meses. No momento do disparo, a jovem caminhava com sua avó em um acesso ao Complexo do Lins, zona norte do Rio. Elas planejavam o chá de revelação do bebê a caminho. Por ter presenciado o assassinato da neta, Sayonara Queiroz depôs à Polícia Civil nesta sexta. Ela é a única testemunha do caso. 

O depoimento foi interrompido diversas vezes pelo pranto de Sayonara. Ela trazia consigo um presente que ganhou de Kathlen. Dentro de uma pequena caixa, está guardado o par de sapatinhos de bebê com a inscrição “amo bisa”, junto com um bilhete que anunciava a chegada do primeiro bisneto. 

Nadine Borges, vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, acompanhou a família na Delegacia de Homicídios, onde ficaram por quatro horas. Rotineiramente, ela apoia familiares de vítimas da violência de estado no Rio de Janeiro. “O atendimento que prestamos não é só jurídico, mas emocional também”, diz a advogada, que demonstra especial preocupação com Jackeline Lopes, mãe de Kathlen. “Era sua única filha. Para ela, é como o fim da existência.” 

A família de Kathlen atribui o disparo que a vitimou a policiais militares. A avó, Sayonara, afirma que precisou insistir para os agentes transportarem a neta ao hospital, onde chegou sem vida. Segundo a versão da Polícia Militar, os oficiais teriam ido ao local prestar atendimento após ouvirem uma gritaria. A perícia mostrou que a jovem gestante foi morta com um tiro fuzil no tórax.

Lutar em meio ao luto

Em depoimento, os PMs dizem ter efetuado sete disparos de fuzil durante a ação que levou à morte de Kathlen. Nesta sexta, os 12 policiais envolvidos foram afastados do serviço nas ruas e tiveram 21 armas apreendidas para investigação. A Polícia Civil afirmou que PMs recolheram munição e estojos de cápsulas do local do crime, o que prejudicou o trabalho da perícia.

A mãe da jovem tem adotado um tom incisivo contra a violência policial e o racismo ao se manifestar publicamente. “Eu preciso gritar por justiça por Kathlen de Oliveira Romeu. Não foi em vão”, clamou, após prestar depoimento na sexta. Encontrar forças para lutar em meio ao luto é uma necessidade comum aos familiares de vítimas das “balas perdidas” no Rio. 

Em abril 1996, Maicon brincava perto de sua casa, na favela de Acari, zona norte do Rio, quando foi alvejado por PMs em confronto com traficantes na região. Embora o menino tivesse apenas dois anos de idade, sua morte foi classificada como “auto de resistência”. Até 2016, a expressão classificava os óbitos provocados por agentes policiais quando supostamente agissem em defesa de sua integridade.

“Não é estranho um menino de dois anos trocar tiros com a polícia?”, questiona José Luiz, pai de Maicon. Há 25 anos, ele luta por justiça no caso do seu filho, ao lado de coletivos de mães e familiares de vítimas da violência de estado no Rio. O caso de Maicon prescreveu após ele ter sido arquivado pelo Ministério Público do Rio (MP-RJ) em 1998.

“O crime não deveria prescrever se não foi apurado pelo órgão que deveria fazer a investigação. O MP é o principal responsável pela impunidade”, critica José Luiz. A Constituição Federal de 1988 atribuiu ao Ministério Público o controle externo da atividade policial. Na prática, todavia, essa fiscalização se mostra falha.

“Omissão” Do Ministério Público

Um levantamento da organização Human Rights Watch mostra que o MP-RJ apresentou denúncia em 0,1% dos 3.441 casos de homicídios cometidos pela polícia de 2010 a 2015. Em maio, o MP sugeriu o arquivamento das investigações sobre PMs envolvidos na operação realizada nos morros Fallet-Fogueteiro, centro do Rio, que deixou 13 mortos, sendo nove em uma única casa, após 107 disparos.

Wallace Corbo, professor de direito constitucional FGV Direito Rio, avalia que o controle da atividade policial esbarra no discurso de que se vive um estado de guerra, ou exceção. 

“Essa lógica legitima qualquer tipo de violência e é o fundamento da atuação das instituições, em todos os níveis. O Ministério Público não tem qualquer incentivo para investigar operações e eventuais excessos, pois opera em uma lógica de cooperação com a polícia. Além de faltar estrutura, caso houvesse vontade de avançar, parte expressiva da sociedade vê positivamente as mortes por intervenção policial em favelas”, afirma.

O impacto psicológico sobre os familiares das vítimas pela falta de respostas pode ter consequências devastadoras. Janaína Soares, que já tinha perdido o marido em um assalto, viu o filho Christian, de 13 anos, morrer após ser baleado em uma operação policial em Manguinhos, comunidade na zona norte do Rio. Depois de três anos em depressão, Janaína faleceu por “causa indeterminada”, segundo os médicos. Familiares apontaram a tristeza como o principal motivo. O inquérito da morte de Christian ficou retido no MP-RJ.

Para o jurista Oscar Vilhena, membro da Comissão Arns, a falta de modernização das polícias e dos mecanismos de fiscalização independentes criaram um círculo vicioso de impunidade. “De maneira generalizada no Brasil, o Ministério Público não exerce essa função constitucional. A omissão do MP é, em grande parte, responsável pelo grau de impunidade e, consequentemente, pela persistência do alto grau de violência na ação das polícias estaduais”, diz.

Nadine Borges, da OAB-RJ, identifica uma queda de braço das forças de segurança do Rio com o Supremo Tribunal Federal (STF). Apesar da decisão que proíbe operações em favelas do Rio durante a pandemia, as incursões continuam a ser realizadas. A advogada critica o cenário de desrespeito generalizado aos direitos humanos.

“Vemos uma afronta clara ao STF, e a fraude processual tem virado roteiro das operações. Em qualquer lugar do mundo, a cidade teria parado por um crime como o que vitimou a Kathlen. Mas é gente pobre e preta morrendo dentro da favela. A existência dessas pessoas não faz diferença para o Estado”, diz.

Na quinta, o MP-RJ informou que irá conduzir uma investigação sobre a morte de Kathlen.

Emir Sader
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09
Jun21

Grávida morta por bala perdida em comunidade do Rio já tinha escolhido nomes para bebê

Talis Andrade

Jovem negra grávida é morta durante ação da PM no Rio de Janeiro - Ponte  Jornalismo

 

Por Matheus Rodrigues, G1 Rio

A designer de interiores Kathlen Romeu, de 24 anos - que morreu ao ser atingida por uma bala perdida no Rio - já tinha escolhido o nome do bebê, que esperava há 14 semanas. No Instagram, ela já havia anunciado a gestação e a escolha pelos nomes: Maya ou Zyon.

 

Neném, já me sinto pronta para te receber, te amar, cuidar!!! Deus nos abençoe”, disse a mãe na publicação.

 

Ela contou que estava com todos os sintomas de uma gestante. De acordo com a publicação, a jovem sentia azia, enjoos e uma “fome de leão”.

“Acordo as vezes assustada e pensando que não é real, mas aí vem uma fome de leão, uma dor de cabeça, um sono inacabável, uns enjoos incontroláveis e as azias que só Jesus me ajudando! Tem horas que penso que ficarei presa com os meus arrotos! É, tem sido desse jeito e nessa hora que eu lembro: Estou grávida”, diz o post na rede social.

A designer de interiores foi baleada durante uma operação da Polícia Militar enquanto passava na rua com a avó na comunidade do Lins de Vasconcelos, Zona Norte do Rio. Ela foi levada para o Hospital Municipal Salgado Filho, no Méier, mas foi a óbito.

 

Namorado diz: 'vou vencer por você'

 

O tatuador e designer gráfico, Marcelo Ramos, namorado de Kathlen e pai do filho que ela estava esperando, usou suas redes sociais para prestar uma homenagem à jovem.

Na postagem, ele diz estar sem chão com a morte de Kathlen.

"Nunca será esquecida meu amor, você, a Maya/Zayon sempre irão morar dentro de mim, estou completamente sem chão, as vezes é difícil entender a vontade de Deus, mas sei que você está melhor que nós. Aqui só vai ficar saudades e as lembranças de você, a pessoa mais radiante e animada que eu conheci na minha vida, vou vencer por você. Que Deus me dê força", publicou Marcelo.

 

Kathlen estava no ‘ápice’ da vida, diz amiga

 

Kathlen Romeu morreu vítima de bala perdida na região da Grajaú-Jacarepaguá, na tarde desta terça-feira (8) — Foto: Reprodução redes sociais

Kathlen Romeu morreu vítima de bala perdida na região da Grajaú-Jacarepaguá, na tarde desta terça-feira (8) — Foto: Reprodução redes sociais

Amigos e familiares lamentaram a perda da jovem para a violência do Rio de Janeiro. Nas redes sociais, algumas pessoas afirmaram que ainda não acreditavam na morte.

A atleta e amiga da vítima Isabela Ramona conversou com o G1 e afirmou que Kathlen Romeu estava muito feliz com a gravidez. Segundo Ramona, ela teve a vida interrompida no ápice dos planos com o namorado Marcelo.

 

A Kath estava muito feliz [com a gravidez]. Ela e o Marcelo estavam muito felizes, fazendo vários planos, comprando a casa deles. Ela tinha acabado de se formar na faculdade. Ela estava muito preocupada também com a questão da Covid e por ela estar preocupada. Interromperam a vida dela quando ela estava no ápice da vida dela”, disse Isabela.

Kathlen estava com a avó no momento que foi baleada. Ela fez um desabafo nesta terça enquanto estava no IML.

"A minha rua tá muito perigosa, eu não queria ter perdido minha neta e perdi desse jeito estúpido. Eu perdi minha neta num tiroteio bárbaro".

"A gente estava indo na firma da minha filha. Quando nós passamos a rua estava tranquila. Foi tudo muito de repente. A minha neta caiu, começou muito tiro. Quando eu puxei ela caiu, eu me machuquei ainda, me joguei para proteger ela, que está gravida. Eu só vi um furo no braço dela e gritei para eles me ajudarem a trazer. Perdi minha neta e meu bisneto", acrescentou a avó chorando.

31
Mai21

OAB-DF repudia ação truculenta da PM contra jovem negro

Talis Andrade

 (crédito: Twitter/ Reprodução)

Toda ação que mostra a abordagem ao youtuber negro, Filipe Ferreira, na Cidade Ocidental, foi gravada e postada nas redes sociais. Em nota, a OAB classificou a ação policial como "agressiva e preconceituosa"

por Veronica Soares/ Correio Braziliense
 
Uma abordagem policial ao atleta e youtuber negro, Filipe Ferreira, viralizou nas redes sociais, no sábado (29/5), e foi classificada pela Seccional do Distrito Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/DF) como mais uma atitude “agressiva e preconceituosa” por parte dos militares. No vídeo, que teria sido registrado em um parque da Cidade Ocidental (GO), dois policiais militares param o atleta, que treinava de bicicleta e, de forma truculenta, ordenam a ele para se posicionar para uma revista.
 

Durante todo o tempo, os policiais apontavam a arma para Filipe e mandava, repetidamente, que ele colocasse as mãos na cabeça. O jovem questionou a maneira como a dupla falou com ele, uma vez que estava apenas andando de bicicleta. O jovem chega a tirar a camisa para deixar claro o fato de não estar armado. Diante dos questionamentos de Filipe, a autoridade o algemou e disse que iria conduzi-lo à delegacia. A filmagem é cortada neste momento.

Na nota postada no site da entidade na tarde de ontem, a OAB-DF afirma que, “ao longo de décadas, os negros e negras passaram por todo e qualquer tipo de discriminação; rotineiramente os jovens das periferias são abordados sem qualquer motivação idônea, simplesmente por serem negros e negras…É fato que é que as novas gerações já não aceitam abaixar a cabeça. A indignação é verdadeira e fruto de um rompimento com a subserviência”.

A entidade informa ainda que está em contato com advogados da cidade goiana onde ocorreu o episódio. “Dizemos Não ao racismo! Racismo não é mal-entendido. Racismo é crime!”, finaliza a nota.


Racismo Institucional

A reportagem mostrou a imagem publicada nas redes sociais para a professora da UnB e pesquisadora em relações raciais, Kelly Quirino. Para a pesquisadora, a ação truculenta é mais uma demonstração do racismo institucional presente na sociedade e no Estado Brasileiro, onde o sistema policial e judiciário trabalham com a ideia de que as pessoas negras “são criminosas”.

“A polícia, ao abordar uma pessoa negra, já parte do pressuposto de que aquele cidadão é um criminoso e chega apontando a arma”, relata Kelly.

Ela explica ainda que, infelizmente, ações como essa não são casos isolados. “Todos os dias, a polícia faz abordagens como esta, onde agride, aponta arma e faz pressão psicológica em pessoas negras apenas pela cor da pele, sem nenhuma justificativa ou suspeita. Essa abordagem traz impactos psicológicos, porque a todo momento ele pensa que vai morrer”, explica.

A pesquisadora lembra que a ideia de inferiorização de pessoas negras prejulgando-as como mais propensas a cometerem crimes foi construída ao longo dos séculos. Esse pensamento contribui para o fato de a polícia brasileira figurar entre as mais letais do mundo. “Isso precisa mudar. É preciso fazer uma reforma na polícia. Não pode continuar atuando para proteger pessoas brancas e ricas, e coagir e matar pessoas negras”, finaliza a pesquisadora.

17
Jan20

Do genocídio negro à ‘palmitagem’, debate sobre racismo se multiplica e enfrenta contradições

Talis Andrade

Após anos de avanços, discussão entra em nova etapa. Enquanto grupos organizados se unem contra Bolsonaro e a impunidade policial, novos atores abrem debates que terminam em brigas nas redes

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 “A desmistificação da ideia de uma democracia racial é uma agenda concluída. Você não consegue mais sustentar academicamente, institucionalmente, que o Brasil é uma democracia racial. O direito à educação não é o mesmo para o negro e para o branco”, explica Winnie Bueno, mestra em Direito e doutoranda em Sociologia.

“As pessoas negras são marcadas para morrer desde a maternidade, e isso não pode ser naturalizado”, diz Bueno. No Brasil, 75% das vítimas de homicídios, assim como das mortes cometidas por policiais, são jovens homens negros, segundo o Forum Brasileiro de Segurança Pública. Os números também mostram que a letalidade policial vem aumentando nos últimos anos em todo o país, de 2.212 pessoas mortas em 2013 para 6.220 em 2018. “Mas esse genocídio não está só expresso no número de homicídios. Também está inscrito numa dimensão intelectual, na dimensão da seguridade alimentar, da moradia, na taxa de suicídios...", completa Bueno.

É nesse contexto que o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Justiça, Sergio Moro, buscam aumentar ainda mais a imunidade de agentes públicos que cometem excessos. A primeira tentativa foi através do pacote anticrime, que a Câmara dos Deputados aprovou sem o artigo que ampliava o excludente de ilicitude. A segunda tentativa veio através de um Projeto de Lei, apresentando no fim do ano passado, que isenta de punição os militares e agentes federais que estejam agindo sob o decreto presidencial da Garantia da Lei e da Ordem (GLO).

A Coalização acredita que essas iniciativas do Governo, além de sua própria retórica de incentivo a letalidade policial, aumentaria ainda mais a violência estatal e teria consequências especialmente graves para a população negra, segundo denunciou na OEA e na ONU. “Há coisas que conseguimos combater por muito tempo e que agora estão de volta. E eles voltaram com mais força, mais organizados, usando os argumentos de antigamente”, explica Iêda Leal, pedagoga coordenadora nacional do Movimento Negro Unificado, onde milita desde 1988. “O que mais nos assusta mais é que tem adesão. Vamos precisar estudar um pouco mais esses inimigos para compreender como o racismo está se reorganizando para combatê-lo melhor".

Colorismo e palmitagem nas redes

Entre os vários debates sobre a questão racial que permeiam as redes sociais, dois deles chamam a atenção pela sua constância: o colorismo e a palmitagem. O colorismo é um conceito que chama a atenção para uma política de embraquecimento que resultou na hierarquização racial da sociedade brasileira, segundo explicam os estudiosos do tema. Isso significa que o nível e o tipo de preconceito que um negro sofre no cotidiano varia de acordo com a tonalidade de sua cor, a largura de seu nariz, a grossura dos lábios e a textura do cabelo. “O colorismo é braço do racismo, é uma metodologia que hierarquiza as pessoas dentro da composição dos grupos negros. É uma forma de controle, de mantê-las dentro do estereótipo daquilo que a gente entende por negro e obrigá-las a buscar o ideal de beleza, de competência, de história e de cultura associada ao etnocentrismo”, explica Alessandra Devulsky, doutora em direito político e econômico e pesquisadora sobre o tema. Uma das consequências do colorismo, exemplifica ela, é que os negros eleitos para o parlamento, os artistas negros que se tornam destaque ou os professores negros que são contratados são, em sua maioria, pessoas com a pele mais clara e que "se associam aos traços compreendidos da branquitude”. Por isso, prossegue, “é difícil ver artistas de pele escura tendo destaque”.

Já a palmitagem diz respeito aos relacionamentos amorosos inter-raciais, especialmente entre um homem negro e uma mulher branca ― essa última vista como padrão ideal de parceira, o que resulta na solidão das mulheres negras, segundo pesquisadores do tema. “Existe uma ideia de que é preciso embraquecer a família. Isso continua. Geralmente os homens negros, que são hipersexualizados e que têm uma posição financeira melhor, buscam as mulheres brancas. O padrão de beleza é branco. A mulher que merece ser amada, a mulher que é humana, é a mulher branca", explica a cientista política Nailah Neves, mestre em Direitos Humanos e Cidadania. As mulheres negras, explica ela, também tem essa mesma educação. “Primeiro porque nossos homens negros estão morrendo. Além disso, aquele homem branco que escolheu aquela mulher negra se torna o grande salvador, o príncipe encantado que habita no imaginário da mulher negra que vem de uma estrutura sofrida. Ele está no topo da pirâmide e pode pode dar aquilo que chamamos que é o padrão de relacionamento”, prossegue.

Dessa forma, explica Devulsky, colorismo e palmitagem estão diretamente interligados. Ela pondera que “amor não se regula”, mas defende “que afeto e beleza, assim como a ideia de competência e inteligência, são questões construídas" ao longo da história. “E quem estabelece o poder e a norma, daquilo que é aceitável e recompensado socialmente, não é o negro, que não ocupa posições de poder econômico e político”, explica. “Como então algumas pessoas integram a ideia de privilégio racial para poder salvar a família? A partir da miscigenação”, completa.

Por tudo isso, prossegue Devulsky, pessoas brancas e negras de pele mais clara ―especialmente mulheres― são priorizadas nas relações amorosas e de amizade, assim como nos círculos acadêmicos e empresariais. “Vamos escolher aquilo que nos parece mais positivo. E, quanto mais clara é minha pele, mais aceitação eu tenho, tanto no lado afetivo como profissional. Fica mais fácil adquirir status social”. Enquanto isso, “a mulher negra de pele escura segue na base dessa pirâmide de valores”, sem associação “à beleza ou à inteligência”, mas sim “ao trabalho braçal”. As cicatrizes na comunidade negras são várias, vão de problemas de depressão e autoestima à interiorização de estereótipos racistas. "Algo que não se resolve com esforço individual, mas sim com psicanálise e com transformação social, via distribuição de renda e de poder”, argumenta. Assim, conclui a pesquisadora, "a construção da ideia de negritude vai no sentido de resistir, de enfrentar o racismo e de buscar a igualdade racial revalorizando a africanidade pelo viés da sua ressignificação política”. [Transcrevi trechos de reportagem de Felipe Betim, in Em País]

 

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