Que a interrogada, realmente, assinou o termo de declarações constantes dos autos que contém acusações contra sua pessoa, porém o fez sob coação; que, apesar de estar grávida na ocasião, do que deu ciência a seus torturadores, foi torturada por indivíduos que eram trocados diariamente; que permaneceu presa durante dois meses, e várias vezes sofreu violências; que no próprio dia em que assinou o termo de declarações, ainda sofreu sevícias, mas não é capaz de reconhecer os seus autores; que, quase todas as noites, era submetida a interrogatórios rigorosos, tendo sido submetida aos interrogatórios completamente despida e recebia ameaças de que seu marido seria assassinado; que recebeu ameaças de sofrer pontapés no seu ventre, sendo que, algumas vezes, essas ameaçadas foram efetivadas; que as pessoas que procediam aos interrogatórios soltavam cães e cobras para cima da interrogada que, por vários dias, ficou sem alimentação alguma; que, em suma e finalmente, a interrogada quer declarar perante o Conselho que, na verdade, subscreveu o Termo de Declarações, mas exclusivamente porque temeu pela sorte de seu filho.
Miriam acabaria absolvida, mas os militares que denunciou permaneceram impunes. Mesmo que Miriam tenha dito não ser capaz de reconhecer seus algozes, era obrigação dos juízes mandarem apurar a grave denúncia de violação dos direitos humanos. Nada disso ocorreu.
O deputado Eduardo Bolsonaro, que no último fim de semana zombou de Miriam, ao dizer que tinha pena da cobra usada na tortura, voltou a demonstrar falta de compromisso mínimo com a decência e a civilidade.
Ao participar da transmissão de um canal bolsonarista no YouTube, Eduardo colocou em dúvida o caso de tortura.
“Ela só tem a palavra dela, dizendo que foi vítima de uma tortura psicológica quando foi jogada dentro de uma cela junto com uma cobra. Eu fico com a pulga atrás da orelha, porque você não tem um vídeo, não tem outras testemunhas, não tem uma prova documental, não tem absolutamente nada”.
Não tem prova porque a Justiça não mandou investigar, e caminhos havia. Era só começar por ouvir o escrivão e os oficiais que tomaram o depoimento da jornalista. Mas nada foi feito. Tecnicamente, pode ter sido até prevaricação, mas era uma ditadura, e o terrorismo, uma prática de Estado, acobertada por seus agentes.
Só é possível tomar conhecimento do depoimento de Miriam porque alguns brasileiros, correndo até risco de prisão, executaram o "Projeto Brasil: Nunca Mais”. Tiraram cópias dos processos que correram na Justiça Militar.
Sob a coordenação do advogado Sigmaringa Seixas, o jovem Avel Alencar, então com 17 anos, se trancava no início dos ano 80 todas as noites em uma copiadora em Brasília. E faziam reproduções dos processos que a equipe de Sigmaringa retirava, oficialmente, do Superior Tribunal Militar.
O resultado desse trabalho precioso é o "Projeto Brasil: Nunca Mais”, que mantém arquivado o processo em que Miriam faz a denúncia de tortura e que retrata uma época tenebrosa, que o Brasil, como mostram as declarações de Eduardo Bolsonaro, não superou.
Seu pai, que ocupa o Palácio do Planalto, disse em entrevista à rádio Jovem Pan, em 2016: “O erro da ditadura foi torturar e não matar”. Existe uma cobra maior do que aquela que aterrorizou Miriam, e ela ainda desliza pelo país, para infelicidade dos brasileiros.
Abaixo, cópia do depoimento de Miriam Leitão:
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Escrevi à tarde no UOL. Eduardo Bolsonaro tem de ser cassado por quebra de decoro por aquilo q disse sobre Miriam Leitão. E PGR tem de pedir abertura de inquérito por apologia da tortura. Simples assim.
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