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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

11
Jun23

O dono das ruas

Talis Andrade

carro luiz mendes.jpg

 

por Gustavo Krause

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A edição do Jornal do Comércio de 08/11/07 publicou artigo de minha autoria com o título: “Cabeça, tronco e rodas”, assim definido “Somos o novo centauro, gestado no século XX: metade homem, metade automóvel”.

A revolução industrial 4.0 completou a obra e botou “cabeça” no novo espécime batizado de “veículo autônomo” ou “veículo robótico” que dispensará o condutor humano para ser usado, em larga escala, como dono da rua, espaço que pertence ao povo.

Para mim, uma inutilidade. Não sei dirigir; tentei, era péssimo e um risco para a coletividade; não tenho habilitação; não sou garfado pelo IPVA, nem pela política de preços da Petrobrás.

Henry Ford, o visionário, jamais, imaginaria que a fabricação em série da invenção (modelo Ford T, 1892) chegasse tão longe: afetou a economia, os processos de produção industrial na prática e na teoria (o fordismo e o taylorismo), a cultura e, sobretudo, para o bem ou para o mal, o desenho urbano e o funcionamento das cidades.

A máquina, com cabeça robótica, segue desafiando a concepção do espaço urbano em que o coração – o sistema de mobilidade – com suas artérias (ruas, pontes, avenidas, calçadas, viadutos, vias navegáveis e subterrâneas) – fossem capazes de atender com qualidade as funções clássicas da cidade: trabalhar, habitar, circular e recrear.

Velozes, numerosos e furiosos, o ronco dos motores comprometeu a qualidade de vida das pessoas, transformando o prosaico direito do ir e vir numa batalha neurótica.

No Brasil, a urbanização acelerada transformou o país agrário, em curto espaço de tempo, num país urbano. A migração campo-cidade foi intensa, rápida e desorganizada. Antecipou-se ao ritmo do processo econômico que combina avanço tecnológico na agricultura associado ao crescimento da industrialização e à ampliação de um setor terciário capazes de absorver, em certa medida, o fluxo migratório.

De fato, a Humanidade nasceu no campo e foi morar nas cidades, construção notável do engenho humano como promessa de vida segura e boa para ser vivida.

No caso dos países pobres e em desenvolvimento, infelizmente, a urbanização fez do sonho uma distopia. Desnecessário descrever o que sentimos na própria pele. Cidades conurbadas, entupidas de gente e convivendo com toda ordem de problemas: da violência à poluição, passando pelo dramático cotidiano que é sair de casa para trabalhar.

Com foco na mobilidade, é correto afirmar que estamos diante da crônica de uma tragédia anunciada. Tudo que está às vistas tem uma explicação curta e grossa: o transporte individual deu de goleada no transporte público de passageiros com ajuda das políticas governamemtais. Prometem economia verde e incentivam a produção industrial de “carrinho”, “baratinho” e “poluidorzinho”.

Transporte individual, filho da poderosa indústria automobilística, ultrapassou os limites do suportável. Defronta-se com duas possibilidades: ou se adapta aos novos padrões de produção e consumo ou se inviabiliza.

Por sua vez, a oferta de transporte público como opção rápida, segura e confortável, daria o merecido descanso ao carro no seu verdadeiro abrigo: a garagem. Nada simples.

Porém, já vi e vivi experiências (década de setenta) em que órgãos de planejamento federal, estadual e das áreas metropolitanas (GEIPOT, EBTU, FIDEM E CONDEPE) com recursos nacionais e financiamentos externos criaram um cinturão de estacionamento periférico no Recife (Rua da Aurora e Ilha Joana Bezerra para 2.500 vagas articuladas com ônibus confortáveis e gratuitos até o destino final); ressuscitaram a frota dos ônibus elétricos (eficientes e não poluentes); viabilizaram a II Perimetral (Beberibe/Imbiribeira) com um mínimo de cirurgias urbanas; implantaram o 1º Terminal Integrado (Macaxeira) com ônibus vindos de Paulista e Igarassu; criaram o 1º corredor de transporte com faixa exclusiva para ônibus na Av. Caxangá.

No entanto, a dura realidade atropelou o planejamento urbano e uma governança eficaz de tal forma que a mobilidade urbana se soma ao enorme passivo social dos governos com a população brasileira.

A propósito, o Relatório Global sobre o Transporte Público (MOOVIT/2022), levantamento em cem grandes metrópoles, incluídas dez brasileiras, constatou nossas graves deficiências no setor.

Eis algumas conclusões do relatório: tempo médio de viagem, Recife 64 minutos, a segunda colocada no Brasil e sétima no mundo, atrás do Rio de Janeiro, 67 minutos; em tempo de espera é a quarta cidade do mundo e a primeira do Brasil. Por conta dos congestionamentos, dados do IBGE mostram que os moradores do Recife gastam nos deslocamentos 24 minutos a mais do que a média nacional.

O ex-Prefeito de Bogotá Enrique Peñalosa (1998-2001 e 2016-2019), um inovador em matéria de mobilidade social, aconselha: ao visitar uma cidade, o viajante deve prestar atenção para o cuidado com as calçadas e se diferentes classes sociais viajam em transportes públicos.

Em caso afirmativo, provavelmente, diz ele, estamos diante de uma cidade boa para viver.

21
Ago22

Sonhar com um milionário fascista na cadeia

Talis Andrade

 

 
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O alvoroço da semana é provocado pela possibilidade de ver um dos milionários tios golpistas do zap na cadeia.

É uma ilusão que vai e volta e enfeita os sonhos das esquerdas. Tem que chegar a hora de ver mais do que Sarah Winter e Zé Trovão nas grades.

Precisamos de um ricaço delinquente encarcerado, para que se cumpra uma etapa sempre adiada de reparação.

As esquerdas sonham com o momento em que um desses sujeitos graúdos que saíram do bueiro destampado por Bolsonaro entrarão num camburão.

É uma miragem recorrente. Mas dizem agora os juristas formados pelo lavajatismo que golpistas podem se articular em seus grupos de zap e conversar sobre a tomada do poder.

Eles teriam o direito de falar em voz alta entre eles. É o que dizem os justiceiros da direita, que desejam ferro e fogo para as esquerdas e moderação para a abordagem dos delitos de suas turmas.

De acordo com tese já disseminada, é preciso respeitar a privacidade dos golpistas descobertos pelo jornalista Guilherme Amado, do Metrópoles.

É como se um delegado de Sorocaba, Barbacena ou Alegrete descobrisse que uma quadrilha se prepara para tomar e saquear um banco da cidade, mas respeitasse a privacidade dos bandidos.

Porque, de acordo com esse raciocínio, a conversa fechada no grupo tem efeitos naquela bolha. O delegado só iria intervir se o plano fosse tornado público pelo Twitter.

O certo é que a ilusão de ver um fascista grandão na cadeia é um direito de todos e uma possibilidade real.

O jurista Wálter Maierovitch já pulverizou em artigo na Folha a teoria do golpe mantido em conversa privada como galhofa ou liberdade de expressão.

O grupo de tios endinheirados do zap caracteriza, segundo Maierovitch, crime de associação delinquencial, que recebe o nome jurídico de formação de organização criminosa.

E a prisão cautelar é uma hipótese a ser considerada, ensina o jurista. Maierovitch não diz, mas é preciso levar em conta que essa é uma possibilidade improvável às vésperas da eleição.

Mesmo assim, o impasse político não afasta completamente a hipótese, considerando-se que o golpe estaria sendo planejado para evitar a posse de Lula.

Como o plano é dar o bote depois da eleição, é nesse momento, pós-pleito, que iria se configurar a ameaça real.

O que a realidade nos impõe, destruindo sonhos coloridos nesse sentido, é que poderemos ter, com Lula eleito, a acomodação das pacificações.

E o grupo dos tios milionários do zap seria visto com o tempo como uma subturma de gente que não frequenta altas rodas e se contenta com o que, na definição de Maierovitch, são apenas associações delinquenciais.

A força do empresariado fascista em geral é outra, em toda parte. Eles aplicam golpes contra o Fisco e contra concorrentes, mas não têm mais poder para golpes políticos.

Até a ameaça de golpe dos milionários pode ser, como também é o blefe de golpe de Bolsonaro, mais um estelionato do capitalismo brasileiro.
 
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