Uma romaria de procuradores colaboracionistas, de advogados novos ricos e delatores de empresas brasileiras ajoelhou aos pés do Tio Sam
VI - Como a Lava Jato escondeu do governo federal visita do FBI e procuradores americanos
por Natalia Viana, Andrew Fishman, Maryam Saleh/ Agência Pública/The Intercept Brasil
“Não há nenhum papel nosso concordando, com certeza”
Diante da hesitação dos procuradores brasileiros, os americanos foram rápidos e, a partir de dezembro de 2015, já havia delatores viajando para os Estados Unidos a fim de prestar depoimentos ao DOJ.
As notícias das viagens de Augusto Mendonça e Júlio Camargo, executivos da Toyo Setal, empresa que mantinha contratos com a Petrobras, que relataram terem pagado propina ao PT, causaram nova consternação na PGR, que voltou a pedir explicações à força-tarefa.
Mais uma vez, Dallagnol responde a Aras que não tem nenhum controle sobre as negociações diretas entre a Justiça americana e colaboradores da Lava Jato – mas se esquece de mencionar que as viagens para os EUA foram uma sugestão do seu grupo. “Lembro até que Vc tinha sugerido para preferencialmente as oitivas serem via MLAT, mas preferencialmente, ideia que só veio depois das reuniões deles e, em função disso, não temos mais controle”, escreve.
Aras retruca: “Lembro de quase tudo isso, Delta, menos de ter concordado com a prática de colaboradores receberem alguma espécie de aval do MPF para viajarem aos EUA, como andam dizendo por aí. O ok seria dado em pedidos formais de MLA, após pedidos de transferências de pessoas”.
“Pelo que entendi não há nenhum papel firmado por vcs concordando com tais viagens, ou há? Esse é o ponto da minha preocupação”, pergunta Aras.
Dallagnol responde de madrugada, à 1:04:07 do dia 7 de abril. “nenhum papela nosso concordando, com certeza”. E acrescenta: “O que fizemos foi apresentar e não nos opormos”.
“Melhor assim. Joia.” É a resposta de Aras.
Em 2016, procuradores do DOJ questionaram Cerveró, Costa e Youssef
Em julho de 2016, uma nova comitiva do DOJ veio ao Brasil para tomar depoimentos em Curitiba e no Rio de Janeiro. Dessa vez, a comitiva veio munida de MLAT e aparentemente seguiu as sugestões da equipe de Dallagnol, evitando questionamentos no STF.
O documento com a programação da viagem mostra que participaram da comitiva os advogados Lance Jasper e Carlos Costa Rodrigues, da SEC, e os procuradores do DOJ Kevin Gringas, Hector Bladuell, Davis Last, Gustavo Ruiz e, mais uma vez, Christopher Cestaro, atual chefão de FCPA do governo americano.
Da parte do FBI, vieram duas intérpretes (Tania Cannon e Elaine Nayob) e dois agentes: Becky Nguyen [nome falso] e Mark Schweers – ele já acompanhara a comitiva de outubro de 2015.
Entre 13 e 15 de julho, o grupo utilizou a sede da PGR no centro do Rio de Janeiro para ouvir o ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró e o ex-diretor de abastecimento Paulo Roberto Costa, ao longo de três sessões, totalizando nove horas de questionamentos a cada um. Quatro meses depois, em novembro daquele ano, a Folha de S.Paulo noticiou que Costa havia fechado um acordo para cooperar com o FBI e o DOJ, comprometendo-se a fornecer documentos e prestar depoimentos e entrevistas sempre que convocado.
Estavam presentes nas oitivas no Rio de Janeiro o procurador da Lava Jato fluminense Leonardo Freitas e membros da SEC, além dos advogados dos delatores. [Continua]