Caminhão circula em Los Angeles, durante a Cúpula das Américas, com telão que traz a imagem de Dom Phillips e Bruno Araújo. Repercussão no mundo é a pior possível. E com razãoI
por Reinaldo Azevedo
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Pronto!
Já se sabe o que se temia saber: Dom Philipps e Bruno Araújo Pereira estão mortos. O governo Bolsonaro é culpado? "Culpa" é vocábulo oriundo ou da religião ou do direito penal. O governo Bolsonaro é responsável. E a "responsabilidade" integra o vocabulário da política e da moral.
Bolsonaro, como ficou evidente em mais de uma manifestação, preferiu culpar as vítimas. É o que também fazem os seus bate-paus nas redes sociais. A síntese é esta: "Conheciam os perigos; quem mandou?". Os facinorosos digitais, na verdade, já estão dedicados a uma campanha para demonizar o jornalista e o indigenista, a exemplo do que fizeram com Marielle Franco, assassinada no dia 14 de março de 2018.
No extremo da abjeção, chegaram a associá-la ao tráfico de drogas. Na sanha para atrair o eleitorado de extrema-direita, o então candidato ao governo do Rio Wilson Witzel, que disputava o segundo turno com Eduardo Paes em 2018, levou Daniel Silveira e Rodrigo Amorim a um ato para quebrar uma placa de rua em homenagem à vereadora. Silveira e Amorim já tinham sido eleitos, respectivamente, deputado federal e deputado estadual. Era a brutalidade em estado puro. Na foto, os três riem à larga.
Em 1976, Milton Nascimento e Ronaldo Bastos compuseram a música "Menino", em homenagem a Edson Luís, assassinado pela Polícia no dia 28 de março de 1968 no Calabouço, restaurante estudantil que ficava no Aterro do Flamengo. Diz a letra:
"Quem cala sobre teu corpo/ Consente na tua morte (...) Quem cala morre contigo/ Mais morto do que estás agora".
O bolsonarismo não cala sobre os corpos. Essa gente os proclama e os transforma em estandarte às avessas, como se fossem despojos que tomaram do inimigo. Assim, não basta que morram: também é preciso destruir a sua reputação, tentando impor-lhes uma segunda morte, como tentaram fazer com Marielle.
AS RESPONSABILIDADES
O governo Bolsonaro é culpado? É responsável pelo desmonte das políticas ambientais; pela incitação quase cotidiana, ainda que indireta, à invasão de terras indígenas; pela demonização das reservas; pela desqualificação permanente de lideranças e entidades que atuam em favor da preservação da Amazônia; pela incentivo à resolução de conflitos na base da bala; pela desqualificação dos críticos, mesmo os mais técnicos, que são tratados como inimigos.
A rede bolsonarista antecipou um argumento que o próprio presidente vocalizou em solenidade no Palácio do Planalto:
"Quando mataram a Dorothy Stang, ninguém culpou o governo. Era de esquerda".
No dia 12 de fevereiro de 2005, a freira norte-americana Dorothy Stang, naturalizada brasileira, foi assassinada com seis tiros na área rural do município de Anapu, no Pará. A morte da missionária foi encomendada pelos fazendeiros Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, e Regivaldo Galvão, o Taradão. Amair Feijoli da Cunha, o Tato, foi intermediário do crime. Rayfran das Neves Sales e o comparsa, Clodoaldo Carlos Batista, foram os executores.
Numa entrevista, Rayfran diz que não esperava que a morte da freira tivesse tamanha repercussão porque, vejam vocês, "quase todo dia morria gente lá". E depois emendou: "A mídia fez isso. Colocaram o que eles quiseram colocar. Eu não sou um monstro". E dá um sorriso.
Matadores não gostam da mídia.
O presidente era Lula. A ministra do Meio Ambiente era Marina Silva. É fácil enfrentar a questão proposta por Bolsonaro — até porque ninguém está "culpando" o seu governo. De fato, a gestão Lula não podia ser considerada responsável porque buscava combater a grilagem de terra e dava suporte à reforma agrária. O assassinato de Dorothy estava contra a metafísica influente do Palácio do Planalto então; já as mortes de Dom e Bruno estão a favor do Palácio de agora.
É claro que o presidente da República sabe a diferença. Assim como diferentes foram as reações.
Lula se pronunciou deste modo sobre Dorothy:
"É abominável que as pessoas ainda achem que um revólver 38 seja a solução para um conflito, por mais grave que ele seja. Nós não descansaremos enquanto não prendermos os assassinos e os mandantes do crime para que a gente mostre, claramente, que no nosso governo não tem impunidade".
Em seguida, referiu-se à preservação ambiental, à criação de reservas e a assentamentos:
"Essas coisas têm incomodado alguns reacionários, alguns conservadores da área madeireira. Porque os bons madeireiros estão trabalhando de acordo com o governo; estão fazendo parcerias com a ministra Marina [Silva, do Meio Ambiente]"
Bolsonaro preferiu atribuir a responsabilidade às vítimas:
"Esse inglês era malvisto na região porque ele fazia muita matéria contra garimpeiro, questão ambiental. Aquela região lá, região bastante isolada, muita gente não gostava dele. Tinha que ter mais do que redobrado a atenção para consigo próprio. E resolveu fazer uma excursão. (...) A gente não sabe se quando, saiu do porto, só dois, alguém viu e foi atrás dele. Lá tem pirata no rio, tem tudo o que se possa imaginar lá. É muito temerário você andar naquela região sem estar devidamente preparado fisicamente e também com armamento, devidamente autorizado pela Funai. Pelo que parece, não estavam".
Não havia, efetivamente, como responsabilizar — culpados são os assassinos — o governo Lula porque este buscava coibir, em vez de incentivar, atividades ilegais em reservas indígenas.
PARALELISMOS CANALHAS
Em conversa com uma militante bolsonarista, o presidente reclamou de uma decisão do ministro Roberto Barroso, que cobrou providências do governo. E citou os 60 mil desaparecidos por ano no país:
"Barroso podia dar cinco dias também para achar os 60 mil. Vem sentar na cadeira para dar dica de como achar os 60 mil desaparecidos e não só dois que estão lá porque todos merecem dedicação".
É outro argumento vomitado por seus apoiadores nas redes. O número, com efeito, é brutal, mesmo para um país com 215 milhões de habitantes. É evidente que são múltiplas as causas que o explicam — e não se descarte que parcela se deva à violência. Mas só os estúpidos, ou contaminados por incurável má-fé, ignoravam que o desaparecimento (e, agora se sabe, morte) de Bruno e Dom estava ligado a uma questão que diz respeito a políticas públicas e a escolhas feitas pelo Estado e pelo governo brasileiros.
A canalha igualmente grita: "Quase 60 mil pessoas são assinadas por ano. Por que duas fazem tanto barulho?" Noto que a política armamentista de Bolsonaro concorre para a carnificina. Mas isso fica para outra hora. Mesmo diante da tragédia civilizatória que representam essas milhares de mortes, o "barulho" por Bruno e Dom é justificável e tem de ser amplificado. Ainda que seus assassinos possam não ter a consciência de todas as implicações de seu crime, este tem uma óbvia dimensão política. Dada a orientação que hoje emana do Palácio do Planalto, pode-se falar que essas mortes são conexas à política oficial.
PARA ENCERRAR
E, se ainda faltassem evidências da responsabilidade do governo federal pela tragédia, convém lembrar que, enquanto Bruno e Dom estavam desaparecidos, Bolsonaro fez dois discursos furibundos contra reservas indígenas, ameaçando descumprir decisão judicial caso o Supremo não reconheça o tal marco temporal -- que é inconstitucional.
Vale dizer: havia dois defensores de reservas indígenas, provavelmente mortos, como o próprio Bolsonaro especulou, e ele fez proselitismo fascistoide contra terras indígenas. O bolsonarismo não consente nas mortes porque cala.
Ex-agente da Funai, Ricardo Rao fez curso preparatório com o indigenista desaparecido e vive na Noruega desde 2019, porque tem medo de regressar ao Brasil e ser assassinado
São Paulo (SP)– Com medo de ser assassinado, o indigenista Ricardo Henrique Rao, que foi colega de Bruno Araújo Pereira no Curso de Formação de Política Indigenista da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Sobradinho, no Distrito Federal, vive exilado na Europa desde 2019. Ele tem medo de morrer. Ele é um dos servidores da Funai que se sentem perseguidos por fazer o seu trabalho de fiscalização. Inicialmente, Rao viveu em Kristiansand, abrigado como asilado em uma comunidade no extremo sul da Noruega. Desde abril, mora em um prédio ocupado no centro de Roma, na Itália, equilibrando sua sobrevivência com os 150 euros que sua mãe lhe envia mensalmente.
Em 19 de novembro de 2020, um ano após se exilar, Ricardo Rao foi exonerado pelo presidente da Funai, Marcelo Xavier. Também escritor, ele prepara a publicação de um romance,Jumentos na BR, de 624 páginas, que tem como pano de fundo a substituição de jegues por motocicletas como meio de transporte no Maranhão. Ele vai dedicar o livro ao colega indigenista Bruno Pereira.
Pereira e o jornalista britânico Dom Phillipsdesapareceramjuntos em 5 de junho na região do Vale do Javari, em Atalaia do Norte, no Estado do Amazonas, na fronteira com o Peru. O desaparecimento da dupla, que investigava a ação de caçadores e pescadores ilegais, madeireiros, invasões de territórios indígenas e do crime organizado na Amazônia, causourepercussõesno mundo todo. Fontes indígenas informaram àAmazônia Realque ambos teriam sidovítimas de uma emboscada.
O destino de Bruno e Dom ficou mais claro após aprisãodo pescador Amarildo da Costa Oliveira, o “Pelado”. Na manhã de 4 de junho, ele e outros homens foram vistos ameaçando com armas Pereira e Phillips. O indigenista Ricardo Rao lembra que os indigenistas recebem ameaças com frequência, mas “o fato novo é que agora estão cumprindo”.
Ricardo Rao está em Roma como integrante de um grupo que pretende apresentar uma denúncia na Justiça Penal italiana contra o presidente Jair Bolsonaro, em nome dos cidadãos italianos que viviam no Brasil e morreram de Covid-19, por conta da atuação do governo na pandemia. O objetivo é tornar Bolsonaro réu em uma corte internacional. Eles estão fazendo um levantamento das vítimas italianas para entrar com a ação – estimam que algumas dezenas de italianos morreram no Brasil durante a pandemia devido a atos diretos do governo, e têm até setembro para finalizar seu relatório.
“A gente nunca engoliu esse governo criminoso, e vislumbramos o precedente do (juiz espanhol Balthasar) Garzón com o Pinochet e no precedente do coronel gaúcho (Attila Rohrsetzer) na morte e desaparecimento do italiano”, disse Ricardo Rao. O general Augusto Pinochet foi preso na Europa em 1998 por determinação de Garzón e Rohrsetzer morreu em 2021, pouco antes de sua condenação à prisão perpétua pelo assassinato do cidadão ítalo-argentino Lorenzo Viñas, em Uruguaiana (RS), em 1980.
Ricardo em foto de acervo pessoal na época das fiscalizações
Amazônia Real – Como você conheceu o indigenista Bruno Pereira?
Ricardo Rao –Conheci o Bruno quando fizemos treinamento juntos em Brasília e tambémestive em algumas missões com ele. Estou destruído. E estou surpreso, porque o que aconteceu com o Bruno é o que aconteceu comigo: eu pedi asilo depois que protocolei um dossiê, na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, denunciando milícias, madeireiras e traficantes no Maranhão. A gente só não tinha garimpeiro. Mas eu sempre percebi que a Polícia Federal e o Ministério Público Federal (MPF) cagavam para os índios, essa é a verdade. Eu sabia que se protocolasse o dossiê na Polícia Federal ou na Procuradoria da República, eles iriam vazar na mesma hora, não ia dar tempo nem de eu correr. E, para minha surpresa, nada foi feito. Surpresa não, eu esperava isso.
Amazônia Real – Você buscou asilo para não morrer?
Rao –Não sou covarde, não. Eu saí porque… Olha aí o Bruno! Olha aí o Bruno! Essa bola estava cantada. Não sei por que ele foi entregar esse relatório para o MPF e o DPF [Bruno Pereira iria entregar os flagrantes de crimes ambientais e das ameaças que sofreu na segunda-feira, 6 de junho]. Não sei como. Vazaram, vazaram. E os caras mandaram o “Pelado”, o “Churrasco” e os outros bandidos lá. Mas se nunca tinham feito nada com ele antes, por que fizeram agora? Fizeram porque os nomes que o Bruno apontou no dossiê dele foram vazados.
Amazônia Real – Você foi ameaçado muitas vezes?
Rao –Na Funai, no nosso cargo, quando a gente faz a repressão ao crime ambiental e à invasão, a ameaça é constante. Mas a gente nunca teve medo de ameaça. Nunca teve. Não era só um emprego para mim. Na Funai tem uma tradição: para os mais combativos, sempre houve a tradição de se fazer uma rotatividade para preservar. Ameaça sempre teve. No Mato Grosso do Sul, em Marabá, me ameaçaram dentro da Assembleia Legislativa. O Ricardo Bacha (ex-deputado) me ameaçou. Matamos um boi dele. O cara engorda o boi no pasto do indígena? Ameaça é o pão nosso de cada dia no ofício. O problema é que, depois do (Jair) Bolsonaro, eles passaram a cumprir as ameaças. E, com o Bolsonaro, o apoio relutante que a gente conseguia da Polícia Militar e da Polícia Federal virou hostilidade clara. Ali na região de Imperatriz (MA), esses caras estão trabalhando para os madeireiros. Um subcomandante da PM invadiu a minha sala no melhor estilo miliciano, com correntão de ouro e o cacete. Isso porque eu tinha apreendido uma motocicleta, e ele foi lá recuperar a motocicleta. De graça? Não, não é de graça. É porque o Lauro Coelho (madeireiro) está pagando mesada para eles. Apreendemos umcaminhão dele e iríamos queimar, mas a mata estava meio seca e, por receio de incêndio florestal, levamos o caminhão para a aldeia e o inutilizamos na marretada. Esses dossiês, esses vídeos, todo mundo está sabendo. O Flavio Dino (ex-governador do Maranhão) está sabendo, mas está todo mundo ‘encagaçado’. Hoje em dia, os governadores têm medo de PM, não dão mais ordem às PMs. O Flávio Dino é um homem honesto, mas não é um homem corajoso.
Amazônia Real – Ainda acredita que vão tentar matar você?
Rao –Desde o Bruno, eu não durmo direito. É uma culpa muito grande. Um cara gente fina, um rondoniano clássico, um exemplo pra nós. Estudamos juntos, fizemos treinamento em Brasília, bebemos pinga juntos. O que pode ter matado Bruno foi esse relatório. Mas respondendo à sua pergunta: o indigenista recebe ameaças frequentemente. O fato novo é que agora estão cumprindo. Um investigador carioca botou uma pistola na minha cabeça. E acho que ele está envolvido na morte do Paulino (Paulo Paulino Guajajara, Guardião da Floresta morto na Terra Indígena Arariboia em novembro de 2019). Depois que mataram o Paulino foi que vi que ia ser o próximo.
Amazônia Real – Como está vivendo aí na Europa? Recebe algum tipo de provento da Funai como ex-indigenista?
Rao –Eu não sei de onde vem a minha próxima refeição. Moro com vários veteranos da luta armada italiana aqui. São muito solidários, e os padres dão comida. Estou vivendo na miséria absoluta. A minha mãe me manda 150 euros por mês. É bom de trabalhar com os indígenas, porque a gente aprende a viver sem dinheiro. Meu contato com o Bruno foi no treinamento, e estivemos numa missão juntos em Marabá. Eu o encontrei em Belém e de lá fomos paraJacareacanga(PA). Era um amigo distante, digamos assim. O contato mais estreito foi mesmo na academia, passamos no mesmo concurso. E depois, em Belém e Jacarecanga.
Amazônia Real – Qual foi a justificativa para sua exoneração?
Rao –Eu não estou recebendo os vencimentos. A legalidade foi pro c… mesmo. Eu tinha nove anos de Funai. A gente passa por um estágio probatório de três anos. Se fizer cagada nesse período é exonerado. Mas eu não fui, cumpri meu estágio, tenho diversos elogios de superiores hierárquicos, tive promoções. Mas quando vim para a Noruega, pensei: eles vão abrir um PAD (Processo Administrativo Disciplinar), depois vão me intimidar, eu ganho tempo. Mas olha o que o Marcelo Xavier fez: eles me exoneraram. Para fazer isso, voltaram ao meu estágio probatório, encontraram uma irregularidade formal lá em Marabá, um burocrata que deixou de assinar umas folhas. O que fizeram? Eles me exoneraram retroativamente, alegando que eu não tinha superado o meu estágio probatório em 2015. O Marcelo Xavier mandou me exonerar retroativamente e me condenando a pagar seis anos de salários e diárias que ganhei enquanto exercia minhas funções.
Amazônia Real – Você chegou a trabalhar na mesma base que o Bruno Pereira?
Rao –A gente só usa o termo “base” quando se trata de povo isolado. Em Campo Grande (MT), Marabá (PA), Barra do Corda (MA) e Imperatriz (MA), que foram minhas quatro locações, não tinha povo isolado. Em Imperatriz (MA), tem lá com os Awa Guajá. Grosso modo, quando tem indígena isolado, qual é a estratégia? Trancar os acessos. Ninguém entra, ninguém sai. Se existe algum problema sério, a gente presta atendimento. Mas só se os indígenas vierem até a gente. Ficamos mais na contenção. É por isso que no Mato Grosso do Sul não tem base.
Amazônia Real – Tem planos de voltar para o Brasil algum dia?
Rao –Está todo mundo acovardado. Me preocupa minha dignidade. Estou me sentindo muito covarde. Depois do golpe, eu tomei uma atitude. Eu não fiquei parado não, irmão. Nem eu, nem o Guaraci (Mendes da Silva, primeiro indígena a ocupar um cargo de coordenador da Funai) nem o Bruno. Eu tentei, mas ia me dar mal. Era certo. Isso aí é a vergonha da Funai, porque esses indígenas aí não eram para eles estarem correndo risco. Quem ganha dez conto para correr o risco é o indigenista da Funai, não é o indígena, não. Mas sem ele não tem operação. E quem tem procurado os desaparecidos são os indígenas. Tão cedo eu não volto para o Brasil. Nem com a vitória do (Luiz) Lula (Inácio Lula da Silva). Os petistas não enfrentam, eles têm medo também.
O presidente da Funai, Marcelo Xavier, foi obrigado a deixar um evento em Madri depois que passou a ser atacado por grupos que questionavam sua presença em uma reunião internacional sobre a situação indígena.
Ricardo Rao, ex-funcionário da Funai, usou o evento para denunciar a presença de Xavier, alegando que ele não teria motivo para estar naquela sala. Constrangido, o presidente da Funai deixou o local.
"Esse homem não pertence aqui", gritou Rao, apontando o dedo ao presidente da entidade. "Esse homem é um assassino, esse homem é um miliciano", disse.
"Ele é responsável pela morte de Bruno (Pereira) e Dom Phillips. Você é um miliciano, bandido", completou Rao, que também deixou a sala. O UOL procurou a Funai e aguarda um posicionamento da entidade. Bruno, também ex-funcionário da Funai, e Dom, jornalista britânico, foram assassinados no Vale do Javari, no mês passado.
O incidente ocorreu na 15ª Assembleia Geral da FILAC, o Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e Caribe. O mecanismo se reúne nesta semana na sede do Ministério das Relações Exteriores da Espanha. Não ficou claro se o presidente da Funai voltou para a sala ou para qualquer outro evento.
A FILAC não é um órgão da ONU (Organização das Nações Unidas). No início dos anos 90, para marcar uma nova relação entre estados e os povos indígenas, a Cúpula Iberoamericana estabeleceu o mecanismo que, nesta semana, cumpre 30 anos de existência. Naquele momento, a adesão do Brasil foi assinada pelo então presidente Fernando Collor de Mello.
Mais protestos
Com diversos representantes de órgãos indigenistas e de povos indígenas presentes, a entidade Survival International ainda está planejando um protesto formal nas próximas horas diante da chancelaria espanhola contra a presença de Xavier.
Segundo eles, trata-se de um rechaço à gestão de Xavier e por causa da "cumplicidade frente ao genocídio indígena em curso no Brasil, assim como diante dos assassinatos de Bruno Pereira e Dom Phillips".
Manifestante diz que se exilou para não ser morto
Em novembro de 2019, depois de sofrer repetidas ameaças de morte, ver companheiros assassinados e ter até uma arma apontada para sua cabeça, Ricardo Rao decidiu que não poderia mais ficar no Brasil. Naquele momento, ele atuava como agente da Funai no Maranhão. Mas, para fazer seu trabalho, tinha de enfrentar não apenas os criminosos ambientais. Ele era alvo também de milícia e processos administrativos que, segundo o agente, se transformaram em instrumentos para silenciar e constranger os funcionários considerados indesejados.
Rao entrou na Funai em 2010, no mesmo período de Bruno Pereira, assassinado no Vale do Javari (AM). Hoje, ele vive em Roma, depois de ter passado dois anos na Noruega com um status temporário de exilado. Procurada pela reportagem, a Funai não respondeu aos pedidos de esclarecimento sobre o caso.
"A milícia controla hoje a Funai", disse o indigenista em entrevista ao UOL. "Sempre recebemos ameaças. Bruno recebeu, eu recebi e até minha mãe recebeu. Agora, a diferença é que as ameaças se cumprem. Quem faz a ameaça acha que pode matar. Afinal, o Bolsonaro falou, não é", afirmou.
Seu relato é de um órgão que foi desmontado nas mãos de Bolsonaro e de uma região que passou a ser controlada por ameaças, milícias e mortes. Antes mesmo de o governo começar, a simples perspectiva de uma vitória bolsonarista e seu discurso de ódio já havia sido traduzida no maior número de indígenas mortos.
Poucos, porém, imaginavam que o cenário seria tão rapidamente deteriorado. Sem confianças nas autoridades policiais locais, ele decidiu viajar até Brasília e apresentar um informe com todas essas informações ao Conselho de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados.
Dois dias depois, em 28 de novembro de 2019, ele embarcou para Oslo, onde pediu asilo por conta das ameaças que estava sofrendo. Seu pleito ainda foi sustentado por cartas enviadas por deputados para o rei da Noruega, ao primeiro-ministro e ao parlamento.
Rao recebeu um status provisório de asilo e foi hospedado na casa de pastores luteranos, enquanto seu processo estava sendo avaliado.
Mas, por ter também nacionalidade italiana, o pedido de asilo permanente poderia ser um negado e, dois anos depois de ter desembarcado na Noruega, Rao optou por se instalar em Roma, onde continua seu exílio.
"Eu quero voltar um dia. Mas não sei como. Eu tentei fazer barulho antes. Bruno ficou e morreu", completou o indigenista, indignado.
O presidente bolsonarista da FUNAI, Marcelo Xavier, foi expulso aos gritos em evento da ONU, na cidade de Madri, na Espanha!
247 -O delegado da Polícia Federal Marcelo Xavier, presidente da Funai, foi expulso nesta quinta-feira (21) do III Encontro de Altas Autoridades da Ibero-América com Povos Indígenas, que acontece em Madri, após ato de protesto de Ricardo Rao, ex-funcionário da Funai, que o acusou de ser o responsável pelo genocídio dos povos indígenas e do indigenista Bruno Pereira.
Logo após a denúncia do ativista, Xavier se retirou da sala e uma mulher gritou “fora Bolsonaro”.
Xavier é acusado por ativistas de seguir a cartilha de Jair Bolsonaro e promover um desmonte e aparelhamento no órgão, acobertando garimpeiros e deixando vulneráveis povos originários e o meio-ambiente.
Yahoo! - O momento foi gravado e, nas imagens, é possível ver Ricardo Rao, ex-funcionário da Funai, denunciando a presença de Marcelo Xavier. Rao afirmava que o presidente da instituição não tinha porque estar ali. Em seguida, Xavier deixa o local do evento.
“Ele não é digno de estar com vocês e o Itamaraty é uma vergonha”, disse Ricardo Rao sobre Xavier e sobre o Ministério de Relações Exteriores do Brasil.
“Marcelo Xavier é um miliciano. Esse homem é responsável pela morte de Bruno Pereira e Dom Phillips”, afirmou o ex-funcionário da Funai, em referência aos assassinatos do indigenista e do jornalista, em 5 de junho, no Vale do Javari.
O evento do qual Marcelo Xavier participava era o Filac, o Fundo de Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e o Caribe. Na gravação, não fica claro se Xavier volta para sala após o ocorrido.
Segundo o portal Uol, Ricardo Rao entrou na Funai em 2010, no mesmo período que Bruno Pereira, e deixou o Brasil após sofrer uma série de ameaças.
“A milícia controla hoje a Funai. Sempre recebemos ameaças. O Bruno recebeu, eu recebi, e até minha mãe recebeu. Agora, a diferença é que as ameaças se cumprem. Quem faz a ameaça acha que pode matar. Afinal, o Bolsonaro falou, não é?” declarou Rao ao Uol.
George Marques
@GeorgMarques
Fora do Brasil eles não enganam ninguém. Em Madri, o presidente da Funai, Marcelo Xavier, foi expulso aos gritos de Fora miliciano
Presidente da Funai pediu à PF e Abin que investigassem indígenas
O presidente da Funai, Marcelo Xavier mantem a incoerência típica de ministérios e órgãos do atual governo federal. Sua atuação, alinhadíssima ao discurso de Bolsonaro, não só nega o direito às demarcações, como também, persegue indígenas. A Folha de SP teve acesso a três solicitações feitas por ele à Polícia Federal e uma direcionada à Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
Em 2020 ele apresentou uma notícia-crime contra a liderança indígena Almir Suruí. Xavier o acusava de estelionato e difamação, porque Almir fez uma campanha com objetivo de arrecadar contribuições para distribuir mantimentos às famílias dos Paiter Suruí, na pandemia.
Xavier considerou que Almir estava manipulando informações e que a sua campanha, na sua opinião, poderia prejudicar a imagem da Funai. Mas a Justiça Federal não viu provas e nem indícios de qualquer tipo de crime. Não satisfeito, solicitou à Abin o monitoramento do povo Paiter Suruí, por achar que foram divulgados dados inverídicos em relação ao enfrentamento da pandemia.
O presidente da Funai também apresentou uma notícia-crime à PF contra a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em 2020. Ele ficou incomodado com a série de vídeos “Agora é a vez do maracá” e acusou os indígenas de calúnia e estelionato por que a produção estaria culpando o governo Bolsonaro por genocídio. A liderança indígena, Sonia Guajajara chegou a ser convocada para prestar depoimento. A Justiça Federal encerrou o inquérito.
A Folha indica que ele também já solicitou a abertura de um inquérito da PF contra o procurador Ciro de Lopes e Barbuda, por ele ter elaborado um parecer jurídico a favor dos indígenas. O procurador vinculado à Advocacia-Geral da União atua na Funai.
Tendo conhecimento da iniciativa o Ministério Público Federal reagiu, apontando crime de constrangimento ilegal e então, pediu à Justiça Federal o arquivamento do caso.
Segundo a reportagem, a Funai foi contatada para comentar as solicitações de Xavier contra indígenas e o defensor, mas não houve resposta.
Desde o início de sua gestão, lideranças indígenas relatam dificuldade de interlocução com Xavier. O assassinato do indigenista Bruno Pereira – crítico da administração e do jornalista Dom Phillips trouxeram ainda mais foco para a incompetência de Xavier. Servidores da Funai anunciaram que entrarão em greve. Uma das reivindicações é que Xavier deixe o cargo. Há três anos com presidente da Funai – antes, atuava como delegado da Polícia Federal – costuma receber elogios das bancadas ruralista e da bala por postura e discurso a favor da exploração de minérios em terras indígenas, por exemplo. Leia mais
Para as entidades é preciso dar uma resposta contundente – e urgente – aos ataques que mostram a tática a ser usada no período eleitoral deste ano pelo presidente e seus apoiadores.
E o Aras, ein?
Central Eleitoral
@CentralEleicoes
Gilmar Mendes sobre urnas eletrônicas: "Até numa conversa com ele [Bolsonaro], brinquei, dizendo que tinha vontade de acreditar na fraude das urnas, porque, quando via nomes como Hélio Negão, Bia Kicis, ou coisas assim, pensava, poxa. Mas sei que eles foram eleitos".
“O tirano não ama, nunca amou. A amizade só se dá entre pessoas que cultivam o apreço mútuo. Não pode haver amizade onde há crueldade, onde há falsidade, onde há injustiça”. Somos todos companheiros, comemos do mesmo pão da existência. A Natureza colocou-nos todos em companhia uns dos outros. Esta é a compreensão central do pensador francês do século XVI Etienne de La Boétie, em seu clássicoDiscurso da servidão voluntária, sobre a existência humana. Por sermos todos companheiros, somos todos livres; cada um nasce de posse de sua liberdade, com a afeição para defendê-la.
Desta concepção decorre uma sua indagação: como podem tantos homens suportar o tirano o qual tem apenas o poder concedido por eles? Coisa estranhíssima preferirem tolerá-lo do que contradizê-lo. É lastimável ver um milhão de homens servir miseravelmente, com o pescoço em jugo, como que encantados e enfeitiçados por um mito, a quem não deveriam suportar suas maldades, pois age de forma desumana e feroz para com muitos. E complementa: o que faz com que um único homem trate milhões de humanos como cachorros e os prive de sua liberdade? (No Brasil, do governo Bolsonaro, há 33 milhões de pessoas submetidas ao jugo da fome).
Para La Boétie, é o próprio povo que ao se sujeitar, se degola. Tendo a escolha entre ser servo ou ser livre, abandona a sua liberdade e aceita o jugo, colocando-se numa condição subumana. Incrivelmente, segundo o autor, quando um povo se sujeita, adormece e perde a dimensão da liberdade perdida, tornando-se difícil acordar para ir em sua busca. Humanos nascidos sob o jugo e educados na servidão, contentam-se em viver como nasceram. Assim, a primeira razão da servidão voluntária é o costume. Sob o governo tirano é-lhes tirada toda a liberdade de fazer, de falar, de livre pensar, de se opor e de resistir. Todos se tornam limitados e uniformizados em suas fantasias, entorpecidos por prazeres oferecidos pela propaganda e por políticas de entretenimentos (motociatas, jetskiatas etc.), jogos, cultos religiosos miraculosos, atrativos desenvolvidos continuamente para adormecer o povo.
Mas o ponto central da tirania, a força e o segredo da dominação, segundo Etienne de La Boétie, são os cúmplices do tirano e de suas crueldades, todos aqueles que dele se aproximam e lhe declaram: “estamos juntos!”, tornando-se assim sócios dos resultados da pilhagem do bem comum promovida pelo tirano. São milhares de pequenos tiranos visando, pelo oportunismo e interesse próprios, às benesses e ao manejo do dinheiro, da riqueza e dos privilégios, para poderem isentar-se do cumprimento das leis e de suas penas, usando a tirania em proveito próprio. É essa gente que gera o tirano.
No Brasil, em julho deste ano, um jovem com epilepsia foi executado publicamente numa câmara de gás montada por policiais rodoviários federais na viatura oficial com a qual realizavam sua ação de violência contra aquela pessoa; nesta mesmo período ocorreu um estupro jurídico por meio de uma juíza ao impedir a interrupção legal da gravidez de uma menina de 11 anos violentada pelo seu tio; em seguida, um homem branco e agente público – promotor municipal – agrediu aos socos e pontapés sua colega de trabalho, pelas lentes do fantástico; recentemente foi apanhado em flagrante um médico anestesista estuprando mulheres durante procedimentos cirúrgicos hospitalares; os ativistas ambientais, engajados na defesa dos povos indígenas, Dom Philips e Bruno Pereira foram covardemente esquartejados na Amazônia, cujo crime ainda não foi totalmente elucidado; por fim, no último dia 10 de julho, em Foz do Iguaçu (PR), foi assassinado por motivo torpe, de natureza política, o militante do Partido dos Trabalhadores, Marcelo Arruda, durante sua festa de aniversário, pelo policial bolsonarista Jorge Guaranho, com tiros à queima roupa.
O cultivo ao ódio é característico do presidente da República. O gatilho do crime de Foz de Iguaçu foi acionado por este, na medida em que alimenta sistematicamente essa cultura da violência.Para a antropóloga Adriana Dias,estudiosa de grupos nazistas e conspiracionistas brasileiros, há uma escalada de ódio e de violência no Brasil, alimentada com muita força nos grupos bolsonaristas dadeep web. Um dos exemplos da escalada de violência política apresentado por Adriana é a quantidade de cocaína apreendida na Amazônia com símbolos da suástica nazista.
Em 2018, em plena campanha eleitoral, o ex-capitão Jair Bolsonaro, então candidato à presidência da República, informou que sua “especialidade é matar”. Anteriormente já havia proposto diante das câmeras de televisão a necessidade de uma guerra civil para fazer o trabalho que a ditadura de 1964 não fez, isto é, matar uns 30 mil, começando por Fernando Henrique Cardoso.
Além disso, expôs claramente sua posição favorável ao “pau de arara” e à tortura. E, em comício no Acre, também em 2018, afirmou: “vamos fuzilar a petralhada”. Mesmo diante de todas estas afirmações, há entre os seus apoiadores, aqueles que se declaram “estar juntos” a ele, achando-o uma pessoa de grande sabedoria, inspirada por Deus e defensor da vida. Como afirma La Boétie, “os hipócritas criam suas mentiras para poderem fazer com que as pessoas acreditem nelas”. É preciso reagir já!
Lula: Como disse Dona Lindu, a saída é a Esperança
AMEAÇA: A recente escalada de violência fascista tem método. Em um dia, matam Bruno Pereira e Dom Phillips. Em outro, bolsonaristas infiltram-se em evento de Lula, no dia 21 de junho, apesar de toda a segurança que costuma envolver os atos de pré-campanha petista. Em outro instante, na última quinta-feira (7), uma bomba caseira cheia de fezes foi lançada antes da chegada de Lula a ato no Rio de Janeiro. Em mais um evento, atacaram também com fezes (por que bolsonaristas têm essa obsessão na fase anal?) o juiz que ordenou as prisões de pastores e do ex-ministro da Educação, por corrupção grossa com as verbas do MEC. Por último, um fanático discípulo do presidente Jair Bolsonaro, José da Rocha Guaranho, assassinou na covardia neste sábado (9) o guarda municipal e militante petista Marcelo Aloizio de Arruda, crime cometido diante de toda a família e amigos da vítima, que comemorava seus 50 anos com uma festa em homenagem a Lula. São eventos demais em apenas um mês.
Não se pode esquecer a transmissão da fala de Bolsonaro do mesmo dia 7 de julho, em que ele diz aos internautas: “Não preciso dizer o que estou pensando, mas você sabe o que está em jogo. Você sabe como você deve se preparar, não para o novo Capitólio, ninguém quer invadir nada, mas sabemos o que temos que fazer ANTES DAS ELEIÇÕES”. Mensagem mais clara do que mil sóis, significa: vamos bagunçar, vamos tocar o terror, vamos fazer esses caras se esconderem, vamos pra cima!
Para terminar esse rosário de atrocidades, hoje (11) o vice-presidente Mourão nos presenteia com essa pérola do cinismo, poucas horas antes do enterro do petista Marcelo Aloizio de Arruda:
“Não é preocupante. Não queira fazer exploração política disso daí. Vou repetir o que eu estou dizendo, e NÓS VAMOS FECHAR ESSE CAIXÃO. Para mim é um evento desses lamentáveis que ocorrem todo final de semana nas nossas cidades, de gente que briga e termina indo para o caminho de um matar o outro”, disse Mourão. FECHAR O CAIXÃO, Mourão? Que mensagem é essa, coveiro da Democracia?
ESPERANÇA: É vedado a quem quer que esteja do lado da Democracia intimidar-se. Mas precisamos ter tanta coragem quanto serenidade e sabedoria.
Eles querem a violência. Nós queremos eleições.
Eles estão com medo das urnas. Nós, não!
ESPERANÇA: Nós estamos com a maioria do povo brasileiro. Eles estão com os bandidos, assassinos e criminosos que querem golpear o povo e o País.
ESPERANÇA: O ato da chapa Lula-Alckmin no último sábado (9), em Diadema, cidade operária da Grande São Paulo, foi a consagração da esperança. Dias melhores virão, disse Lula, citando sua mãe, Dona Lindu. É disso que se trata. Ouvindo populares que estiveram presentes no ato, obtivemos depoimentos comoventes de vidas transformadas pelos governos petistas. É uma mãe que teve a filha com paralisia cerebral; depois de tantas lutas, a menina concluiu o primeiro grau. Então, ela conseguiu acabar o segundo grau. Então, ela passou no vestibular. E, agora, formada em Jornalismo, a menina autografou o livro sobre sua vida, com o qual presenteou Lula… (é de perder o fôlego!)… É a linda militante negra de Diadema, que se formou em Arquitetura graças às políticas públicas do PT; é a senhora nordestina que dormiu na praça da Moça, em Diadema, onde se realizaria o ato da chapa PT-PSB. Ela queria ver Lula de perto, o mais perto possível, e conseguiu ficar na primeira linha do público:
ESPERANÇA: A felicidade combina demais com a esperança. E era visível isso na fila para entrar na praça. Como todos tinham de passar por revista antes de entrar no local do ato, formaram-se enormes filas. Em vez de irritação, palavras de ordem, hinos e alegria. Cada delegação cantando suas músicas. E o ato começou com aquelas mesmas pessoas, entoando felizes o Hino Nacional, como que a dizer que o Brasil pode ser muito mais do que está sendo hoje.
ESPERANÇA: É preciso que STF, STJ, parlamentares, policiais, GCMs e soldados unam-se em defesa da Democracia, junto ao povo pobre e oprimido (e esfomeado).
ESPERANÇA: Bolsonaro quer chamar a covardia entre nós. Ao PT e às forças democráticas cabe honrar essa esperança e não se furtar à luta nas ruas e nas redes. #BolsonarismoMata. #BolsonarismoMata. #BolsonarismoMata. Temos de repetir esse mantra, e seguir, firmes e fortes, na defesa do Brasil. Temos de defender Lula e a esperança. Porque dias melhores virão, como disse Lula.
ESPERANÇA: As ruas e as praças são o território por excelência da Democracia. Com serenidade e sabedoria, anularemos quem nos quer mortos ou derrotados.
ESPERANÇA: O Brasil merece. Brilhar nossa estrela!
Mesmo após anos de evidências e fatos, como o assassinato de Marcelo Arruda, jornalistas e veículos ainda investem em uma polarização que nunca existiu
A ROUPA MAIS PREZADApela maioria dos jornalistas é aquela costurada com o fio da objetividade. Sentem-se não apenas mais bonitos, mas principalmente mais blindados e, portanto, mais seguros, com ela. Tornam-se semi-deuses: enxergam tudo do alto, sem se misturar com mesquinharias cotidianas como posicionamento político (coisa de ativista) e as questões do machismo (problema das mulheres), do racismo (problema dos negros) e do classismo (problema dos pobres).
Para costurar essa roupa-escudo, os jornalistas usam como principal matéria-prima os fatos e as evidências. É algo que vai na mesma linha do “cientificamente demonstrado”. Se algo aconteceu daquele jeito, só pode ser explicado pela descrição da ocorrência, como se um acontecimento não tivesse passado, contexto, futuro, raiz.
Pois bem, vamos brincar de Jornalista Equilibrado Usando Terno e Dono de Algum MBA Gringo e levar em consideração que os fatos são suficientes para explicarmos as coisas que ocorrem “lá fora”.
Moa do Katendê: assassinado com 12 facadas por um eleitor de Bolsonaro durante o primeiro turno das eleições presidenciais em 2018 após declarar seu voto em Fernando Haddad.
Jornalista espancada com pedaço de ferro e ameaçada de estupro também no primeiro turno das eleições presidenciais de 2018. Saía do local no qual havia acabado de votar quando dois homens a arrastaram pelo braço ao verem seu crachá de jornalista. Os agressores disseram que ela era “de esquerda”. Um deles usava calça jeans e uma camiseta preta com a foto de Jair Bolsonaro (PSL) e os dizeres “Bolsonaro Presidente”.
Jair Bolsonaro concede indulto ao deputado Daniel Silveira,condenado pelo STFapós atacar a corte e dizer que imaginava ministros“levando uma surra”.
Nas últimas semanas, diversos atos violentos em eventos envolvendo a campanha de Lula foram registrados, desde a explosão debombas caseiras com fezesà invasãode reuniões.
O assassinato do guarda municipal e tesoureiro do PT Marcelo Aloizio de Arruda, que comemorava seu aniversário de 50 anos quando foi atacado pelo policial penal federal Jorge José da Rocha Guaranho. O caso possui semelhanças com o ocorrido com Moa do Katendê: no caso deste, o criminoso se envolveu em uma discussão, foi até em casa e se armou com uma faca do tipo peixeira. No segundo, o assassino deixou mulher e filha em casa e voltou com sua arma de fogo. Mas Marcelo também estava armado: morreu após disparar contra Guaranho.
Eu sei, eu sei: você já leu tudo isso que está aqui. A gente se engana achando que jornalismo trata necessariamente de novidade. Na verdade, ele tem muito de repetição. E é exatamente isso que está acontecendo desde o último terrível fato elencado aí em cima, o assassinato de Marcelo. Mesmo após anos de evidências e fatos que desenham um ambiente político novo no Brasil, no qual o bolsonarismo passa a mirar diariamente uma arma real ou simbólica contra nossas cabeças, uma penca de jornalistas insiste em colocar o campo democrático na mesma balança do discurso de morte e extermínio do presidente.
Mas não é de qualquer “campo democrático” que estamos falando: é preciso nomear o ex-presidente Lula para entender melhor o fenômeno dos jornalistas e/ou articulistas “objetivos” que ignoram os adorados fatos quando o ex-metalúrgico ou o Partido dos Trabalhadores estão na roda.
Nos últimos dias, artigos como o escrito porRicardo Kertzman, na IstoÉ (coloca Lula e Bolsonaro como “as bestas do apocalipse”), e o de Fábio Zanini, naFolha(“Ato de bolsonaristas pelas armas, fala de Lula e crime no Paraná mostram clima desfavorável à pacificação”), entre outros, nos mostraram como barbárie também se desenha a partir do ar-condicionado do home office ou das redações.
“Nesse ambiente, eventos banais tornam-se mortais, especialmente se os dois lados estiverem armados”, diz um trecho do artigo do último colunista. Essa é uma falsa equivalência estarrecedora, e não somente pelo fato de dezenas de eventos violentos pulularem após o espraiamento do bolsonarismo no país, mas por diminuir o peso imenso da caneta e do discurso de alguém que está no poder – e ainda turbinadíssimo pelo Centrão.
Um lado é o presidente do Brasil. O outro é um candidato.
Um lado é o presidente do Brasil. O outro é um candidato.
Vou repetir: um lado é o presidente do Brasil. E ele é parte máxima de nossa institucionalidade.
A polarização política sempre existiu no país. O que é novo entre nós e que continua a ser tratada com punhos de renda é a violência do bolsonarismo
A polarização política sempre existiu no país. O que é novo entre nós e que continua a ser tratada com punhos de renda é a violência do bolsonarismo. O que não é novo entre nós é uma imprensa dotada de uma visão precária de democracia. Acho muito ruim que o candidato elogie atos violentos como o realizado pelo ex-vereador Manoel Eduardo Marinho, conhecido como Maninho do PT, como fez em um evento no fim de semana. Mas comparar essa fala infeliz ao paredão de violência do bolsonarismo é forçar a barra.
Perdi a conta do número de pessoas que me disseram ter vontade de se expressar politicamente usando bandeiras ou adesivos em seus carros, janelas, roupas. Não o fazem por uma razão simples: medo de apanhar na rua. Ou, como no caso de Marcelo, de serem assassinadas.
Vocês têm notícias de bolsonaristas com medo de usar adesivo do presidente ou pendurar em seus carros bandeirinhas do Brasil?
Estão chamando “um lado” (para usar o termo raso) que tem apanhado, morrido, se lascado e está em parte acuado, de “extremista”?
Nos últimos anos, a palavra “polarização” vem sendo repetida por uma estrutura midiática acostumada a binarismos diversos, explícitos em termos como “gente do bem” e, vejam só, “dois lados”.
Nessas lógicas binárias não se associam Daniel Silveira, funk misógino e os assassinatos de Bruno Pereira e Dom Phillips, por exemplo. Ou incentivo ao garimpo, racismo e xenofobia. Divide-se o bolsonarismo em gavetinhas e, usando-o aos poucos de cada vez, tem-se a impressão que ele pode não ser tão terrível assim.
Parte de nossa imprensa continua a tropeçar nas próprias platitudes ao se negar a trabalhar com a complexidade lá fora. Assim, constrói mitos e heróis, vilões e desgarrados, tudo a depender das suas necessidades econômicas e políticas no momento. A questão não são fatos, nem a leitura mais acurada dos mesmos, no final. A questão é – em nome de uma ideologia, bom dizer – instrumentalizá-los, mesmo quando flertam com a destruição de vidas.
Toda vez que equipara Bolsonaro e o bolsonarismo a qualquer coisa que já tenha acontecido na política brasileira, o jornalismo pula o cercadinho e vai fazer companhia ao presidente.
A democracia brasileira conviveu durante décadas com o pluripartidarismo sem que repórteres e editores precisassem recorrer a toda hora a termos que conformassem as legendas como “extremistas”. Isso era termo usado, no máximo, para tratar aquelas com poucas chances de atingir postos majoritários, como o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado, o PSTU, e o Partido da Causa Operária, o PCO, ambos à esquerda, ou o Partido de Reedificação da Ordem Nacional, o Prona, já extinto, à direita. O Partido do Movimento Democrático Brasileiro, PMDB, hoje Movimento Democrático Brasileiro, MDB, o Partido dos Trabalhadores, o PT, ou o Partido da Social Democracia Brasileira, o PSDB, por exemplo, transitavam entre centro, centro-direita e centro-esquerda, sem ocuparem os postos máximos da radicalização política.
Se nosso espectro político majoritário foi historicamente “equilibrado” ao centro com matizes à esquerda e à direita, o que muda no cenário para que a imprensa e mesmo nós, sociedade perpassada mais pelo senso comum do que pelo senso crítico, passássemos a ver tudo pela lente “radical”?
A instrumentalização da objetividade jornalística ajudou não só a propagar um racismo estrutural e epistêmico quanto nos trouxe de presente um Jair Bolsonaro
A resposta está no crescimento da ultra-direita brasileira, uma explosão de visibilidade embalada por ao menos três fatores. O primeiro é a consolidação de um contexto político e social mais conservador em todo o mundo, no qual se misturam, entre outros componentes, o colapso político de vários países causado por violentas disputas internas e uma onda inédita de imigração (foram 272 milhões de imigrantes em 2019, 51 milhões a mais do que em 2010, segundorelatórioda ONU). A precarização global do trabalho, resultando em um aumento de preconceito e violência sobretudo entre populações imigrantes, somente agrava essa questão.
O segundo fator se ancora na agudização dos sentimentos de raiva, impotência e medo derivados do contexto esboçado acima: trata-se da instrumentalização política de dados e algoritmos, principalmente nas redes sociais. O mais célebre escândalo desse uso indevido de informações foi protagonizado pela Cambridge Analytica, empresa que utilizou dados pessoais de usuários do Facebook para influenciar as eleições presidenciais americanas em 2016.
O terceiro fator para o crescimento da extrema direita no Brasil, apesar de seu precedente também global, ainda é pouco investigado entre nós – e é sobre ele que precisamos atentar: ele decorre dessa insistência em tratar Bolsonaro e o bolsonarismo como um extremo em oposição a outro, supostamente existente.
Vou repetir: de um lado está o presidente do Brasil. É o cargo máximo de nossa institucionalidade. Do outro, são movimentos sociais, candidatos, população.
Bolsonaro, como já escrevi, não nasceu somente graças ao Superpop e ao CQC, sejamos claros. Essa é outra platitude que só serve para manter bonitinhos os ternos e MBAs dos Jornalistas Equilibrados. Ele sofreu um banho de loja realizado pela imprensa que se autointitula como “profissional” e transformou o autor da frase “o erro da ditadura foi torturar e não matar” (dita em 2008 e 2016) em um cara “controverso”.
Desde a madrugada de domingo, a respeito do assassinato de Marcelo, li várias vezes que um lulista e um bolsonarista “trocaram tiros”.
Alguém tem a festa invadida, a própria vida e a da família e amigos ameaçada por um homem armado. Usa seu próprio revólver para se defender. E o resumo é “troca de tiros”.
Poderia ser “legítima defesa”, mas estamos falando de algo que envolve o PT.
O fato é que o jornalismo “neutro”, empresarial, das redes e conglomerados mais assentados, passou a se constituir como norma. Tudo aquilo que não está conformado nele seria, assim, um desvio, uma anormalidade situada, como já colocou a pesquisadora e jornalista Márcia Veiga. Um veículo como, por exemplo, esteThe Intercept Brasil, foi e é criticado por se posicionar demais, ou, pior, por ser “ativista”. Mas, se entendemos que o Interceptfoi “ideológico” ao publicar as mensagens da Vaza Jato, devemos pensar o mesmo em relação ao Jornal Nacional no momento em que este vazou a ligação telefônica entre Dilma Rousseff e Lula.
Para marcar esse lugar que parece limpo e equilibrado, esse “estar acima das paixões”, nossos veículos naturalizaram o discurso criminoso de um político celebrizado midiaticamente. Primeiro, ele era apenas um cara controverso; depois, já presidente, um extremista que está em uma ponta enquanto Lula (cujo governo foi marcado por alianças com partidos como PMDB, hoje MDB, está na outra.
É fundamental perceber como o ex-presidente vai ser continuamente construído como o Bolsonaro do outro lado do espelho. Está posta a “polarização” que – sugerem esses veículos – nos apequena enquanto sociedade e da qual precisamos nos livrar; afinal, precisamos valorizar a democracia à brasileira, na qual indígenas e pretos são tratados como cidadãos de segunda classe e uma distribuição de renda mais justa é uma ideia estapafúrdia. A instrumentalização da objetividade jornalística (através, por exemplo, do jornalismo declaratório) ajudou não só a propagar um racismo estrutural e epistêmico quanto nos trouxe de presente um Jair Bolsonaro.
Enquanto imprensa e outras instituições fundamentais para a manutenção de nossa relutante democracia assinarem embaixo das práticas autoritárias e preconceituosas, enquanto normalizarem Bolsonaro o colocando como um espelho reverso de Lula, vamos seguindo o bonde em direção ao precipício. No volante, alguém “autêntico” que foi confundido pela imprensa séria como um tiozão do pavê que às vezes soltava um impropério.
Engraçado.
Folclórico.
Controverso.
“O avesso do fantoche é o terrorista”, escreveu o sociólogo Derrick de Kerckhove, que analisa democracia, dados e novos fenômenos da política. É uma análise que é também um retrato de um Brasil, onde, depois de pouco mais de um ano na presidência, o presidente resolveu levar até à imprensa que o ajudou a chegar ao poder, um humorista, o Carioca, vestido como ele mesmo, Jair Bolsonaro. Na ocasião, o presidente foi questionado sobre o PIB que crescera apenas 1,1% em 2019. Em vez de falar com repórteres, BolsonaroestimulouCarioca a distribuir bananas e a responder em seu lugar. Caos instaurado, perguntas não respondidas, bananas jogadas, selfies, apoiadores transmitindo ao vivo, gargalhadas, “mito”.
Vou repetir: é o presidente do Brasil. É o cargo máximo de nossa institucionalidade.
Há algo muito importante naquele dia e que talvez ainda não tenhamos entendido: Bolsonaro agiu com imensa coerência quando colocou um humorista para ser nosso presidente. Ali nos deu, jornalistas, uma lição: ao ajudarmos a eleger um cara “meio controverso”, demonstramos que podemos ser tratados como idiotas. Dos atos tantas vezes violentos contra a imprensa, talvez aquele tenha sido um dos mais didáticos, e mesmo lúdico: tivemos uma experiência única de ver alguém sem qualquer capacidade para responder pela República ocupar os holofotes da política para fazer graça, distrair, ocupar a nossa atenção.
Eu não estou me referindo ao humorista, e sim ao fantoche. Falo do seu avesso.
Vou repetir: ele é o presidente do Brasil.
*Segundo a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), em 2021 o Brasil registrou 430 casos de violência contra jornalistas. Foram mais casos que em 2020, quando foram registrados 428 ocorrências. É um recorde na série histórica, iniciada em 1990.
O indigenista Bruno e o jornalista inglês Dom Phillips foram barbaramente assassinados numa emboscada quando retornavam de excursão pelo Vale do Javari, região com maior população de indígenas isolados do mundo
Beatriz Matos durante a audiência (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)
A antropóloga Beatriz Matos, viúva de Bruno Pereira, pediu ao presidente Jair Bolsonaro (PL), o vice Hamilton Mourão e o presidente da Funai, Marcelo Xavier, que se retratem pelas declarações feitas sobre o trabalho do indigenista assassinado no dia 5 de junho, em Atalaia do Norte, no oeste do Amazonas.
Bruno e o jornalista inglês Dom Phillips foram barbaramente assassinados numa emboscada quando retornavam de excursão pelo Vale do Javari, região com maior população de indígenas isolados do mundo.
“Gostaria que o presidente do Brasil, o vice-presidente do Brasil e o presidente da Funai se retratassem em razão das declarações ridículas que fizeram. O presidente da Funai falou em ilegalidade da presença deles ali. O presidente da República falou coisas que eu me recuso a repetir aqui. Isso não é uma questão menor. É uma questão muito séria”, protestou Beatriz durante audiência na comissão temporária do Senado nesta quinta-feira (14).
Bolsonaro chegou a definir a excursão dos dois como uma “aventura não recomendada”. “Realmente, duas pessoas apenas num barco, numa região daquela completamente selvagem é uma aventura que não é recomendada que se faça. Tudo pode acontecer”, afirmou ao SBT.
Mourão disse que se há um mandante do crime contra o jornalista e o indigenista, “é um comerciante da área que estava se sentindo prejudicado pela ação principalmente do Bruno e não do Dom, o Dom entrou de gaiato nessa história. Foi efeito colateral”.
Embora Bruno e Dom estivessem na região de forma legal, o presidente da Funai declarou: “Esta não foi uma missão comunicada à Funai. A Funai não emitiu nenhuma permissão para ingresso. É importante que as pessoas entendam que quando se vai entrar numa área dessas, existe todo um procedimento”.
O indigenista Bruno Pereira e o jornalista inglês Dom Phillips (Foto: Reprodução)
Falta de condolência
De acordo com ela, a família também não recebeu uma palavra de condolência dessas autoridades. “No funeral do Bruno, tinham representantes do governo municipal, do governado estadual, não tinha do governo federal. Com exceção de vocês senadores e dos deputados, na Comissão da Câmara também, a gente não teve nenhum apoio”, disse a viúva.
“O Bruno era um funcionário público dedicadíssimo, seriíssimo, hiper comprometido com o trabalho dele. Por isso que os funcionários da Funai estão indignados, estão em greve, estão em movimento”, considerou.
Para ela, o presidente da Funai acusa o funcionário no lugar de tomar para si a investigação, a proteção, a indignação, o cuidado com a família. “É indignante a falta de apoio que a gente teve da esfera [federal] deste país. É indignante. A gente viu a manifestação do primeiro-ministro britânico, sabem, enfim”.
Na ocasião, Boris Johnson, então primeiro-ministro do Reino Unido, declarou-se preocupado com o desaparecimento deles e disse que seu governo “estava pronto para dar apoio no que o Brasil precisar”.
Funcionários da Funai desprotegidos
Beatriz, que já trabalhou na região, protestou ainda pela falta um plano emergencial para a segurança do Vale do Javari. “Os funcionários da Funai lá estão desprotegidos. O movimento indígena está desprotegido. Os próprios indígenas estão desprotegidos”, reclamou.
“É o lugar de vida dessas pessoas há milênios, há muito tempo. Antes de ter Brasil, os Marúbos estavam lá, construindo a sua vida, sua cultura, tudo que eles são hoje. Antes de ter a fronteira Brasil e Peru ali”, explicou a antropóloga.
Por fim, ela disse esperar que as mortes de Bruno e Dom, que comoveu o mundo, sirva para que se construa uma alternativa e melhore a vida dos que vivem na região. “É um absurdo o que está acontecendo ali neste momento! Então, a falta de ação imediata de um plano emergencial de segurança ali para os povos indígenas do Vale Javari e para os funcionários da Funai”.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-governador Geraldo Alckmin divulgaram nota conjunta de pesar pelas mortes do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, na qual prestam solidariedade aos familiares, amigos e amigas do indigenista e do jornalista.
“A confirmação do assassinato de Bruno Pereira e Dom Phillips é uma notícia chocante, que nos causa dor e indignação. Nossa primeira palavra é de solidariedade aos familiares, amigos e amigas do indigenista e do jornalista. Bruno e Dom dedicaram a vida a fazer o bem. Por isso percorreram o interior do Brasil, ajudando, protegendo e contando a vida, os valores e o sofrimento dos povos indígenas.
O mundo sabe que este crime está diretamente relacionado ao desmonte das políticas públicas de proteção aos povos indígenas. Está diretamente relacionado também ao incentivo à violência por parte do atual governo do país. O que se exige agora é uma rigorosa investigação do crime; que seus autores e mandantes sejam julgados. A democracia e o Brasil não toleram nem podem mais conviver com a violência, o ódio e o desprezo pelos valores da civilização.
Bruno e Dom viverão em nossa memória e na esperança de um mundo melhor”.
Ato contra Jair Bolsonaro e, no círculo, o militante Marcelo Arruda, assassinado por bolsonarista em Foz do Iguaçu (PR) (Foto: Oliven Rai / Mídia Ninja - Reprodução)
Bolsonaro acentua a divisão odiosa que ele próprio causa na sociedade brasileira
por Jeferson Miola
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A conversa telefônica de Bolsonaro com os irmãos bolsonaristas de Marcelo Arruda, militante do PT assassinado pelo bolsonarista Jorge Guaranho, evidencia o profundo entranhamento do fascismo na sociedade brasileira.
Ninguém esperaria Bolsonaro se solidarizar com a esposa e os filhos do Marcelo, a quem ele asquerosamente se referiu como “o cara que morreu” em uma “briga de duas pessoas”.
É notória a crueldade do Bolsonaro e da matilha fascista, a absoluta indiferença com a vida humana e o total desprezo deles com o sofrimento e a dor alheia. Aliás, eles exaltam a morte e a matança – principalmente da “petezada”, os inimigos que precisam ser aniquilados.
Bolsonaro é um ser poli-classificável. O perfil sócio-psíquico-ideológico dele é encontrável em manuais e enciclopédias.
Ele se enquadra ao mesmo tempo nas classificações [i] de genocida, segundo a Convenção da ONU sobre genocídio [1948], [ii] de sociopata, de acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Psiquiátrica Americana, e [iii] de fascista, conforme descreve o Dicionário de Política de Norberto Bobbio e autores.
Jamais se esperaria dele, portanto, um gesto de alteridade e empatia em relação à esposa e aos filhos do Marcelo.
Semanas antes do assassinato do Marcelo, Bolsonaro deu outro exemplo da sua desumanidade fascista. No Amazonas, promoveu uma motociata e tripudiou a dor e o sofrimento das famílias de Bruno Pereira e Dom Philips, eles também vítimas da lógica fasci-bolsonarista reinante no Brasil.
Por isso tudo, é de se questionar a respeito da real motivação dos irmãos em conversarem com o principal estimulador do assassinato do próprio irmão, usurpando a representação afetiva e, inclusive, legal, pertencente à esposa e aos filhos do Marcelo.
Um deles reclamou “a esquerda ficar utilizando meu irmão como palco de politicagem” [sic], no que Bolsonaro aproveitou para atacar a presidente do PT: “Com toda certeza, a Gleisi só foi aí no velório para aparecer. Não deixem que a esquerda tire proveito político do episódio”.
O outro irmão declarou que “o presidente nos procurou, nos confortou e disse que ele também não é simpatizante desse tipo de agressão”. E candidamente concluiu: “Deve estar na mente do presidente que agressões covardes doem no peito, doem na alma […]”.
É preciso se perguntar se os irmãos do Marcelo decidiram conscientemente servirem de instrumentos da propaganda fascista, mesmo feita às custas do irmão morto. Aquele irmão, aliás, que horas antes havia sido tratado pelo interlocutor deles com assombrosa insensibilidade e frieza como “o cara que morreu”.
A crueldade e a maldade do Bolsonaro, que é a expressão da máxima crueldade e maldade fascista, não tem limites.
Bolsonaro acentua a divisão odiosa que ele próprio causa nas famílias, nas escolas, nos clubes, nos grupos sociais; enfim, na sociedade brasileira.
O ódio fascista encontra enorme receptividade no imaginário e na subjetividade de parcelas significativas da mórbida sociedade brasileira. A adesão social à cosmovisão fascista não é nada desprezível, como confirma a resiliência eleitoral do Bolsonaro, a despeito das atrocidades e barbaridades cometidas por ele.
A escória fascista já pré-existia na sociedade brasileira desde antes do governo Bolsonaro; assim como Bolsonaro sempre existiu sendo o Bolsonaro que é desde antes de ser eleito.
A partir de junho de 2013 esta escória se liberou, saiu do esgoto e se encorajou com a onda fascista nascente. E com a eleição do Bolsonaro em 2018 os ressentidos, reacionários e odiosos ganharam força, vez e voz.
Varrer o fascismo da sociedade brasileira demandará muitos anos, senão algumas décadas de árduo trabalho em torno de um pacto civilizatório no país. O primeiro e decisivo passo para esta longa e complexa caminhada é a eleição do Lula em outubro próximo já no primeiro turno.
Contra os fatos não há argumentos. O terceiro Reich vitimou milhões.
O BOLSONARISMO tem como símbolo a arma de fogo. O slogan da campanha presidencial foi um fuzil, que iria exterminar os petistas, ou melhor a “petralhada”. Em um afã desumanizado e antipetista, logo antipovo.
A noite dos Cristais em 1938 ainda é investigada pela História; e seu saldo entre mortos e feridos foi de centenas. Mas o resultado geral do holocausto fez sucumbir milhões. O antissemitismo, o racismo, a intolerância, a perseguição foram a tônica em um cenário de guerra: concentrado na mente diabólica de um homem que falava de Deus; e se dizia deísta.
Só nos resta saber a qual “deus” ele servia...
Hitler queria conquistar o mundo; e matou em torno de seis milhões de humanos. E o bolsonarismo parece desejar pavimentar a estrada do povo brasileiro com aniquilamentos em uma marcha de superação do primo nazismo. Vide o assassinato do tesoureiro do Partido dos Trabalhadores Marcelo Arruda, no último sábado - 09/07/22- em sua festa de cinquenta anos. Ele foi brutalmente exterminado por um bolsonarista raiz; que idolatra o mito do novo nazismo sul-americano.
Símbolos do ativismo malsão que sonega à vida e faz de torturadores, como Brilhante Dutra: ídolos. A dança da morte está dando às cartas; e a desigualdade só aumenta. O pano de fundo de este espetáculo sangrento se expressa muito bem na fala de professores, que são as vítimas ideais do Sistema desigual e combinadíssimo, que nos rege secularmente, vejam: “Como se sentir motivado quando a Seeduc Não Cumpre a Lei Federal nº 11.738 de 2008, não cumpre 1/3 para atividades extra classes, nosso PCS (plano de cargos e salários foi atacado, não é mais automático), os enquadramentos por formação não são cumpridos e nossos auxílios VERGONHOSOS de alimentação e transportes NUNCA foram reajustados, isto a mais de seis (6) anos. ACORDEM.E nossa perda acumulada desde Jul/14 a Out/21 pelo IPCA é de 53,07%”. Outro símbolo disso é a imagem da mansão do ex-presidente da Caixa Econômica Federal; o do assédio.
Salários baixos ocasionam desestruturação social: crimes, corrupção e bolsonarismo. Dom, Bruno, Marcelo, foram vítimas de dias e noites de terror...outros menos visíveis também...e quem será a próxima vítima? Eu, vocês...o que sei é que um simples telefonema utilizado como peça de campanha não redime ninguém de erros plantados, nem ressuscita mortos.