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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

28
Fev23

Espanha aprova licença menstrual remunerada

Talis Andrade
Manifestação do 8 de março em Granada, na Espanha, em 2018 | Foto: J.M. Grimaldi/Junta de Andalucía

 

Licença para quem sofre com dores menstruais é rara no mundo e pioneira na Europa. Projeto também não define um máximo de dias para a ausência

 

 

A Espanha se tornou o primeiro país europeu a aprovar uma lei que permite às mulheres se ausentarem do trabalho devido a fortes cólicas menstruais. Aprovada por 185 votos a favor e 154 contra, a medida tem como objetivo quebrar o tabu em relação ao tema.

“Hoje é um dia histórico de progresso nos direitos feministas”, escreveu no Twitter a ministra da Igualdade, Irene Montero, do Podemos, partido de esquerda radical que é um parceiro minoritário na coalizão de governo com os socialistas.

Aprovada no dia 16 de fevereiro, o texto da lei estabelece que “as licenças médicas em que a mulher se encontre em caso de menstruação incapacitante secundária, ou dismenorreia secundária associada a patologias como a endometriose, serão consideradas situação especial de incapacidade temporária por contingências comuns”.

“Trata-se de dar uma regulamentação adequada a esta situação patológica de forma a eliminar qualquer tipo de preconceito negativo no local de trabalho”, acrescenta a lei, que não especifica um limite de dias para a ausência, considerada como “incapacidade temporária”.

Com a aprovação da licença menstrual, a Espanha une-se a países como Japão, Indonésia e Zâmbia, que também consideram a medida. Na Itália, um projeto de lei nesse sentido foi apresentado em 2016, mas nunca foi aprovado. Na Alemanha, mulheres podem solicitar ao médico da família uma licença por conta de dores menstruais – mas a decisão fica a critério do médico.

A mesma lei ainda facilita o acesso ao aborto legal, cria licença pré-parto para gestantes a partir de 39 semanas e outras regras para aumentar os direitos reprodutivos no país. Uma outra aprovação ainda amplia os direitos das pessoas trans.

A medida também prevê ainda mais educação sexual nas escolas e distribuição gratuita de contraceptivos e produtos de higiene menstrual nos institutos.

A Espanha é considerada um país referência para os direitos das mulheres na Europa, principalmente após aprovação de uma lei sobre violência de gênero em 2004. O governo de Pedro Sánchez se declara feminista e tem mais mulheres do que homens em suas fileiras.

18
Jan23

Justiça dá três dias para Bolsonaro explicar minuta do golpe

Talis Andrade

 

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Benedito Gonçalves incluiu o documento em ação que pede a cassação dos direitos políticos de Bolsonaro

08
Out22

Conheça 17 escândalos de corrupção de Bolsonaro

Talis Andrade
 
Charge do site Brazilian Report

 

Legado de destruição vai desde o superfaturamento de ônibus escolares a interferência na Polícia Federal com o intuito de frear investigações contra os filhos.

 

04
Out22

Líderes e chefes de Estado parabenizam Lula pela vitória no 1º turno

Talis Andrade

Charge publicada no jornal argentino La Nación

 

por Bárbara Luz /Vermelho

Diversos líderes e chefes de Estado da América Latina comemoraram a vitória de Lula (PT), candidato da coligação Brasil da Esperança, por terminar o primeiro turno das eleições presidenciais, neste domingo (2), à frente de Jair Bolsonaro (PL). Lula teve 48,43% (57 milhões) dos votos válidos.

O presidente do México Andrés López Obrador, o AMLO, foi um dos primeiros a parabenizá-lo. “Parabéns, irmão e companheiro Lula. O povo do Brasil demonstrou mais uma vez sua vocação democrática e, principalmente, sua inclinação para a igualdade e a justiça”.

Felicidades, hermano y compañero Lula. El pueblo de Brasil demostró una vez más su vocación democrática y, en especial, su inclinación por la igualdad y la justicia.

— Andrés Manuel (@lopezobrador_) October 3, 2022

 

O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, também felicitou Lula. “Parabenizo Lula pela vitória no primeiro turno. Felicito o povo brasileiro por sua enorme participação eleitoral”, escreveu em seu Twitter.

Felicito a Lula por su victoria en primera vuelta. Felicito al pueblo brasileño por su enorme participación electoral https://t.co/RiCnpW2lyh

— Gustavo Petro (@petrogustavo) October 3, 2022

 

Luis Arce, presidente da Bolívia, sublinhou que a democracia é o único caminho para o progresso e a paz social e reconheceu o esforço político que o povo brasileiro fez durante as eleições. “Parabenizamos o irmão Lula que venceu o primeiro turno das Eleições no Brasil e saudamos o povo brasileiro que demonstrou que a democracia é a única forma de construir sociedades justas, inclusivas e com paz social. #Força Lula”.

 

Felicitamos al hermano @LulaOficial que ganó la primera vuelta de las Elecciones en #Brasil y saludamos al pueblo brasileño que demostró que la democracia es el único camino para construir sociedades justas, inclusivas y con paz social. #FuerzaLula pic.twitter.com/psibBdwyE1

— Luis Alberto Arce Catacora (Lucho Arce) (@LuchoXBolivia) October 3, 2022

 

O presidente da Argentina, Alberto Fernández, também compartilhou mensagem de felicitações. “Parabenizo meu querido Lula por sua vitória no primeiro turno e estendo meu sincero respeito ao povo do Brasil por sua profunda expressão democrática”, disse.

Felicito a mi querido @LulaOficial por su triunfo en primera vuelta y hago llegar mi sincero respeto al pueblo de Brasil por su profunda expresión democrática. pic.twitter.com/wZTBXvt99B

— Alberto Fernández (@alferdez) October 3, 2022

 

Pedro Castillo, presidente do Peru, saudou nesta segunda-feira as eleições gerais “exemplares” realizadas neste domingo no Brasil. “Saudamos o povo brasileiro por sua vocação democrática e suas instituições eleitorais pela condução exemplar das eleições gerais.”, escreveu o líder peruano.

 

O Grupo Puebla comemorou os resultados obtidos por Lula no primeiro turno das eleições presidenciais brasileiras e exortou o povo a consolidar a justiça e a unidade.

“Com profunda alegria e esperança, o Grupo Puebla comemora o resultado eleitoral de Luís Ignácio Lula da Silva no primeiro turno das eleições brasileiras. Depois de ter sido vítima de uma das mais aberrantes operações de guerra jurídica que conhecemos, hoje Lula recebeu o reconhecimento de seu povo, renovando seu apoio e confiança em grande parte.”, dizia a nota.

“Conclamamos as forças democráticas e cidadãs a trabalharem juntas para que, no segundo turno, consolide-se o triunfo da esperança pelo qual a maioria dos brasileiros votou”, acrescentou o grupo político e acadêmico latino-americano que conta com a participação de 49 líderes políticos progressistas de 15 países.

O documento indicou ainda que, no dia 30, a decisão será “entre o futuro e o retorno ao passado; justiça social e império dos privilégios; entre um país respeitado internacionalmente, que lidera a integração latino-americana, e um concentrado em um falso nacionalismo, que não defende a pátria, mas a arruína”.

“Estamos certos de que, com Lula, triunfarão a esperança, a justiça e a unidade regional defendida pelo Grupo Puebla. Viva Lula! Superar!” conclui a declaração.

 

A eurodeputada da Alemanha, Anna Cavazzini, do Partido Verde, também parabenizou Lula e afirmou que é o momento de alcançar os não-votantes e eleitores de outros candidatos, para que o ex-presidente amplie sua liderança contra Jair Bolsonaro.

“Parabéns a @LulaOficial por ganhar de longe o maior número de votos nas #brasileleições! Isso dá esperança para a 2ª rodada em 30 de outubro. No entanto, mais de 43% dos brasileiros votaram em Bolsonaro, apesar de seu histórico devastador de políticas e seu fascismo aberto. Isso é preocupante.”, escreveu no Twitter.  

Congratulations to @LulaOficial for winning by far the most votes in #brazilelections !

This gives hope for the 2nd round on October 30th.

Yet more than 43% of Brazilians voted for Bolsonaro despite his devastating policy track record and his open fascism. This is worrisome.

— Anna Cavazzini (@anna_cavazzini) October 3, 2022

Anna Cavazzini também se mostrou preocupada com o avanço do bolsonarismo no Brasil. “É preocupante que mais de 43% dos eleitores tenham votado em Bolsonaro, apesar de sua política de coroa e seu fascismo exibido abertamente. Isso mostra que o bolsonarismo agora está firmemente ancorado na sociedade brasileira.”

Besorgniserregend ist, dass mehr als 43 % der Wähler*innen für Bolsonaro gestimmt haben, trotz seiner Corona-Politik & seines offen zur Schau gestellten Faschismus. Das zeigt, dass der Bolsonarismo jetzt fest in der bras. Gesellschaft verankert ist.“ https://t.co/cujl0b9Qsz

— Anna Cavazzini (@anna_cavazzini) October 4, 2022

 

19
Set22

Feministas evangélicas unidas contra o fundamentalismo religioso

Talis Andrade

 

Foto: Fernando Tatagima

 

 

Mulheres que romperam com o conservadorismo, mas permanecem na fé, conciliam política e feminismo

 

 

 

A população evangélica é formada em boa parte por mulheres. E, ainda que as denominações sejam muitas e tenham suas diferenças, historicamente várias igrejas reproduzem a ideia de que mulheres não devem ocupar os mesmos lugares e nem ter os mesmos direitos que os homens. Então o que significa ser evangélica e lutar por igualdade de gênero? A Revista AzMina ouviu essas mulheres e a íntegra da matéria pode ser lida a seguir.

Thayô Amaral, 28 anos, foi expulsa da igreja Cristã Evangélica do Brasil, mas não desistiu da vida religiosa que marcou toda sua infância e juventude. Nas reuniões de família, sempre havia um louvor, um testemunho ou alguém da liturgia, fazendo parte das conversas.  “Eu nasci no que a gente chama de lar cristão.” Uma minoria em 1994. Hoje, o DataFolha registra que são 30% de evangélicos no Brasil, e eles são alvo de disputa pelos políticos nas eleições de 2022.

Ainda nos primeiros anos, Thayô estudava em uma escola no fundo da comunidade de fé, na cidade de Goiânia, em Goiás. Durante os cultos, o pastor sempre separava um trecho do discurso para dizer que os fiéis não deveriam se sentar na roda dos escarnecedores. Para os adultos, esse era o lembrete de que eles eram diferenciados e, por isso, não deveriam se misturar com pessoas que não pertenciam à comunidade. Para as crianças, o escárnio estava até mesmo nos aniversários infantis que tocavam a música da Xuxa, febre nos anos 90. “Era a demonização do que eles chamam de mundo”. 

Essa separação do “bem” contra “o mal” e do “nós” contra “eles”, comum em algumas igrejas, foi usada por Jair Bolsonaro para se eleger em 2018, e segue sendo estratégia para insistir no cargo em 2022 com a ajuda da primeira-dama, Michele Bolsonaro. Desenhando inimigos imaginários, como a ideologia de gênero, e falando que precisa proteger os valores tradicionais da família, ele mira nas mulheres evangélicas – que são 60% dos brasileiros que professam essa fé, de acordo com o DataFolha. A publicitária Thayô está entre elas, mas está longe de ser a eleitora que o candidato à reeleição espera. 

 

A construção do movimento

 

Foi em 2018, com a eleição de Bolsonaro e dois anos depois da presidente Dilma Rousseff ser retirada do cargo executivo, que boa parte do movimento feminista evangélico brasileiro começou a se organizar em coletivos. “Rolou uma explosão de manifestações, uma resposta ao fundamentalismo”, diz a antropóloga Simony dos Anjos, secretária executiva da Rede de Mulheres Negras Evangélicas. Na época, muito se falava sobre o impeachment ter ocorrido porque Dilma era mulher e as discussões sobre gênero começaram a ganhar o cenário com força. “A esquerda entendeu que precisava conversar com a ala evangélica”, destacou Simony.

Às vésperas de uma nova eleição presidencial (2022), Simony acredita que Michele Bolsonaro é a pessoa que tem conseguido se comunicar mais diretamente com a base evangélica. “Ela [Michele] diz que ora todo dia na cadeira do marido para ele ser um homem melhor e isso é exatamente a mesma coisa que a mulher evangélica faz pelo companheiro”, exemplifica Simony. Assim, além da identificação com a atual primeira-dama, o voto em Bolsonaro seria, também, um “gesto de fé.”, explica a antropóloga. É como se, ao ver que a oração de Michele foi atendida, convertendo Bolsonaro em um homem bem-sucedido e bom, essa mulher religiosa também pudesse crer que as preces dela, em relação ao próprio companheiro, também seriam.

 

Feminismo e direitos humanos sem intermediários

 

Olhar para as igrejas como uma realidade à parte da sociedade, segundo Simony, foi um dos erros que o movimento político de esquerda cometeu. “O evangélico é trabalhador, ele estuda, ele precisa de UBS (unidade básica de saúde). Qualquer discussão social e política vai ter efeitos na igreja”. Diferentemente do que por muito tempo se acreditou, os temas políticos ganham os púlpitos e pautam o comportamento das diferentes comunidades de fé. “A igreja não é uma bolha”. Não à toa, Simony ressalta que a Rede de Mulheres Negras e Evangélicas nasce em 2018, mesmo ano em que Bolsonaro se elegeu.  

 

Caminhos de diálogos

 

Várias das principais bandeiras da campanha de Bolsonaro, como a flexibilização do uso de armas, não convencem as evangélicas. “Muitas perderam seus filhos assim [assassinados]”, aponta Simony. Então, é preciso dizer que quando ela vota no Bolsonaro, ela está votando a favor das armas.” 

Quando o assunto é cuidado e proteção à família, a Covid escancarou os problemas na gestão da saúde pública, que levaram os pobres e pretos a morrerem mais. As demandas por atenção e sobrevivência estão represadas nessa população e, por isso, a fome e o próprio desrespeito às mulheres também são portas de entrada para conversar com a comunidade evangélica que é diversa e não representa um voto único. 

Simony dos Anjos é a candidata do PSOL à prefeitura de Osasco - Correio  Paulista

Simony dos Anjos, secretária executiva da Rede de Mulheres Negras Evangélicas, concilia fé e feminismo.

A Rede de Mulheres Negras Evangélicas se articula formando lideranças que sejam capazes de levar o feminismo para dentro de seus territórios. “Eu preciso que essa mulher entenda que Deus é mãe, porque se Deus fosse pai, no contexto brasileiro, seis milhões de pessoas não têm o nome do pai na certidão”, afirma Simony. E respeitar a fé dessas mulheres é fundamental para que o diálogo seja efetivo. “Quando essa mulher, negra, sozinha vai reconhecer o corpo baleado no IML, quem tá com ela lá? Deus.” 

 

 

 

Desinformação nos grupos religiosos

 

Dentre as coisas que assombraram as mulheres evangélicas nas últimas eleições, Simony recorda a ameaça de que a vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva levaria ao fechamento das igrejas, uma notícia falsa criada por grupos bolsonaristas, repetida exaustivamente. E esse é o tipo de coisa difícil de desconstruir quando espalhada em massa. “Nós somos 70 mulheres negras que estão nos seus territórios nas cinco regiões do País se comunicando com as suas bases.” O movimento é potente, mas precisa de apoio. “Enquanto nós temos um grupo de WhatsApp, o Edir Macedo tem uma TV, né?”.

Há uma produção de desinformação em andamento para atingir especialmente mulheres evangélicas, afirma Magali Cunha, pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião e editora geral do Coletivo Bereia – Informação e Checagem de Notícias. As notícias falsas, focadas nesse público, tendem a se concentrar em ideologia de gênero nas escolas, erotização de crianças e perseguição religiosa a cristãos – a chamada “cristofobia”. Além disso, o já conhecido “kit gay”.  “A ideia é impactar essa mulher que quer salvar a família”, explica Magali. 

O trabalho do Coletivo, no combate às fake news religiosas, se intensificou no fim de agosto de 2022, na mesma intensidade que o volume desse conteúdo aumentou. “A transmissão vem, principalmente, por parte de lideranças evangélicas e católicas de grupos conservadores aliadas ao bolsonarismo.” Mas não é só o compartilhamento que gera preocupação. “Na produção vemos algumas lideranças: o deputado Marco Feliciano, a pastora e ex-ministra Damares Alves e o pastor Silas Malafaia”, conta. 

Olhar para isso é importante porque para 13,2% dos evangélicos, os pastores e irmãos representam a fonte mais confiável de notícias. É o que indica um estudo publicado em 2021 sobre desinformação e evangélicos, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), da qual Magali participou. Foi a partir dessa pesquisa que o “Coletivo Bereia” nasceu. Entre os evangélicos entrevistados, 77,6% afirmaram que já receberam notícias falsas em grupos relacionados a sua igreja. 

Diante desse cenário, o grupo analisa notícias que circulam em mídias religiosas, assim como conteúdos voltados à religião, e carimba os fatos com avisos de: verdadeiro, impreciso, enganoso, inconclusivo e falso. “Projetos [jornalísticos] de checagem existem muitos no Brasil, mas nenhum voltado para o que circula sobre religião em ambientes religiosos”, destaca Magali. 

 

Igreja curvada ao bolsonarismo

 

A historiadora Agnes Alencar, 34 anos, se considera feminista e evangélica, mas rompeu com a igreja Batista depois da eleição de Bolsonaro. “Vi todos se curvarem diante dele.” Ao não se encontrar mais naquele espaço, decidiu produzir o EBDcast – Escola Bíblica Dominical -, um podcast para contar histórias da Bíblia em que mulheres são protagonistas. Um dos primeiros episódios traz a história das parteiras que aparecem em Êxodo, no antigo testamento. “Elas fizeram um movimento de desobediência civil, porque o Faraó mandou matar os primogênitos e elas não só não mataram como inventaram desculpas”, conta Agnes. 

Para ela, as evangélicas feministas precisam ser vistas como parte importante da luta das mulheres. “Ela pode nunca ter lido Simone de Beauvoir e, ainda assim, entender que o marido dela não tem direito de bater nela, que o corpo é dela”, aponta Agnes, que vive a experiência religiosa desde a infância. “Eu sou a quarta geração de evangélicos.” 

Para escrever os episódios do podcast, Agnes se inspira na teologia feminista, que tem a missão de fazer a leitura de textos sagrados, entre eles a Bíblia, a partir de uma perspectiva feminista. “Quando você é criado na igreja, você aprende a ler a Bíblia como seu pastor te ensina. Certamente, eles não têm uma leitura neutra.”  

Agnes Alencar (@agnesalencar) / Twitter

A historiadora Agnes Alencar defende uma leitura da Bíblia, a partir da história das mulheres.

 

Se dentro do universo eclesiástico, Agnes costumava comentar esses assuntos para uma turma de até dez pessoas, no podcast as reproduções chegam a 5.000. A maior parte dos ouvintes é de mulheres. Agnes não foge de assuntos como homofobia, racismo e igualdade de gênero, e o foco não está em quem está fora da igreja, mas dentro dela. “Quero que elas escutem o episódio e construam com a gente uma outra forma de ler a Bíblia, porque isso influencia como eu vou agir politicamente no mundo”.

 

Feministas cristãs

 

Quando, aos 14 anos, Thayô Amaral foi estudar em uma escola do Rio de Janeiro, encontrou um mundo diferente. Descobriu que o desconforto ao escutar que uma mulher não podia ser pastora, tinha um nome: machismo e passou a estudar sobre a luta organizada das mulheres. De volta a Goiânia, permaneceu como professora da Escola Dominical, mas foi repreendida pelo pastor por dizer ao seu aluno que ele podia brincar com uma bola rosa, pois todas as cores eram feitas por Deus. 

Sem pertencer a uma igreja, ela criou a comunidade “Feministas Cristãs” – hoje com 5.000 pessoas no Facebook. E o estalo pra isso veio quando se sentiu ofendida com um comentário sobre evangélicos dentro de um grupo de feminismo na internet. Ela conta que sentia a necessidade de afirmar, quase o tempo todo, que nem todos eram do mesmo jeito. “A gente não tem abertura nem na igreja nem no feminismo para conversar sobre as nossas faltas”, desabafa.  

Thayô Amaral on Behance

Thayô Amaral criou o grupo “Feministas Cristãs” para falar sobre a luta por igualdade com quem compartilha da mesma fé

 

Por muito tempo os temas mais discutidos no grupo das Feministas Cristãs eram: homossexualidade, submissão e sexo antes do casamento. Mas com a eleição de Bolsonaro, a situação política também tomou conta do debate. Thayô acredita que é possível desidratar as ideias do bolsonarismo com o mesmo instrumento que ele usou para se fortalecer entre as mulheres evangélicas: a bíblia. 

Parte da estratégia seria mostrar para fiéis que ainda estão ao lado do presidente as diferenças entre o Deus cristão e quem afirma representá-lo. “Jesus ficou na frente de uma mulher que ia ser apedrejada”. Ela reivindica visibilidade e o apoio de outras vertentes do feminismo para espalhar a mensagem, mas percebe que essa união ainda está longe de acontecer.  

 

Disputa por narrativas

 

É preciso lembrar também que o feminismo evangélico é um grupo heterogêneo. Há quem já esteja familiarizada com a luta das mulheres há mais tempo, assim como há fiéis que estão entrando em contato com o assunto pela primeira vez. No coletivo Evangélicas pela Igualdade de Gênero, “há quem ache que aborto é pecado, mas é a favor da descriminalização, e tem outras que já são engajadas na luta”, conta Izabel Lourenço, que faz parte da coordenação do grupo em Minas Gerais. Elas consideram importante se abrir para as diferenças, por isso investem na aproximação com essas integrantes. “A gente tem curiosidade de entender de onde vem essa mulher, sem condenar, mas trazendo fatos”, afirma Izabel.  

Quando o assunto é a teologia feminista dentro das igrejas evangélicas, Odja de Barros, 50 anos, é uma das maiores inspirações para as novas gerações. Nascida em Sergipe, aos 20 anos, ocupava um cargo de liderança dentro da Igreja Batista do estado, pertencente à Convenção Batista Brasileira. Ela já vinha estudando sobre a importância do protagonismo das mulheres na estrutura religiosa, e o impacto que isso poderia ter na própria comunidade a levou a assumir o lugar de pastora. 

Odja precisou ser estratégica para levar o feminismo ao púlpito. “Não trouxe primeiro com esse termo porque haveria uma rejeição de primeira, então comecei falando de gênero.” Na época, a direita conservadora cristã ainda não tinha inundado o debate com ‘a tal ideologia de gênero’.  “Se fosse hoje, não daria.”  

O primeiro passo que ela deu foi convidar um grupo de “fiéis” para fazer um estudo dos textos sagrados. O interesse foi geral. “Elas diziam que nunca tinham ouvido falar da Bíblia a partir das mulheres.” Em segundo lugar, com o grupo, Odja criou uma revista, escrita pelas próprias participantes, e, junto com elas, deu o nome de Flor de Manacá – uma árvore resistente, característica que Odja reconhece nas mulheres nordestinas. “Você as vê dizendo: ‘ah, eu sou uma Flor de Manacá’, e ela na verdade tá dizendo ‘eu sou feminista’, do jeito dela de dizer”, indica. 

Odja Barros: "a leitura machista da Bíblia é responsável pela cultura de  violência contra mulheres e LGBTs" - Brasil 247

Odja de Barros não se abstém de pautas como aborto e violência doméstica e leva o debate para as mulheres evangélicas

 

Doutora em teologia e pesquisadora na Igreja Batista do Pinheiro, em Maceió, no Estado de Alagoas, Odja não se abstém de pautas como direitos reprodutivos e sexuais. Mas, quando tenta espalhar a mensagem para outras comunidades de fé, ainda enfrenta muitos obstáculos. É que isso ameaça o poder de quem está usufruindo daquele espaço, daqueles privilégios, explica Odja, por isso é tão difícil acessar outros lugares.  A maioria das mulheres que compõem o seu ministério é branca e de classe média – recorte racial que predominou na maior parte dos grupos e coletivos ouvidos pela reportagem da Revista Azmina.

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